quarta-feira, maio 11, 2005

A Razão e a Presunção

Na Igreja da Santíssima Razão e dos Santos dos Últimos Dias, como nas Igrejas em geral, perigosos não são os sacerdotes: são os beatos. E, de entre estes, uma categoria acima de todos: os sonsos.
Todavia, quando descemos ao nível da micro-seita - de umas Testemunhas da Lógica, ou de uma "Igreja Universal" do Reino da Certeza, por exemplo -, tudo se transfigura. Crentes, beatos e sacerdotes não se distinguem. É tudo ao molho e fé no bolso. Movem-se todos num rebanho uniforme, mergulhados numa espécie de êxtase contemplativo da verdadeira Crença, robôs peregrinos e auto-depurados de quaisquer dúvidas, perfeitas máquinas de calcular destituídas de vontade e emoções. É o pensamento automático. O Vending-thinking, mais que o wishful-thinking. Um modelo vanguardista de chafariz: metem-se moedas e saem bicas mal-cheias ou sandes de Locke com presunto. Ou de apóstolos.
Possuem a verdade. Mas não se contentam de possui-la, de emprenhá-la, de viver com ela em santo matrimónio e ter dela meninos. Precisam de ostentá-la, de dar com ela na cara de quem passa, de exibi-la em cinto de ligas e mini-saia. No fundo, sentem-se tanto maiores e mais soberbos quanto mais se confrontarem com a destituição e penúria alheias.
Mas ai de quem não goste do afago, ai de quem lhes diga que aquilo cheira a peixe podre e eles a varinas da ciência, bufarinheiros da objectividade, ciganos de esquina do silogismo!...
Heresia! Sacrilégio! Vilipêndio! Ó deusa, crime de lesa-Fé!...
Não, meus amigos, livrai-vos de criticar a superficialidade, a leviandade, a ignorância! Porque isso, com garantia ISO 9000, é irracionalidade, fujamos! E depois de vos darem com a Verdade inteira e absoluta nas trombas, pespegarem-vos com tamanha desfaçatez no focinho, vão por mim: não é pera doce.
Em resumo: há quem confunda razão com presunção. E presunção e água benta, cada qual toma a que quer.
Por muito que isto custe ao bispo Edir Macedo e aos seus pios emuladores na blogosfera.

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