quarta-feira, outubro 31, 2012

Frases Assassinas -XII


Nestes nossos vis e apagados tempo, à falta de Deus, os aborígenes acreditam em qualquer farófia. E, com idêntica codícia, à falta de glória, cobrem-se de qualquer coisa... Ridículo, quase sempre.
Aliás, eu bem digo: o problema maior da gente actual deste país é bem pior que simples ignorância: é adolescência. Furiosa, relapsa e contumaz.

Sísifo revisitado



Qual é a saída alternativa num beco sem saída? Qual é o descaminho alternativo a este descaminho? Qual é o remédio alternativo ao arsénico? Tudo formas perversas de colocar uma pseudo-questão. Na realidade, não existe caminho alternativo a uma ausência de caminho, não existe direcção alternativa a uma ausência de direcção, como não existe sentido alternativo no reino absurdo, que é como quem diz, no reino do sentido nenhum.
Ora, o domínio  da pseudo-democracia (e toda a democracia realizada até hoje manifesta esse pseudonismo, dado que a república angélica que pressupõe não corresponde, nem de perto nem de longe, àquela que opera na realidade) coincide invariavelmente com esse império do absurdo. A ausência de sentido, todavia, não impede a existência de mandantes. Cada mandante, no prazo que logra e entretece, instaura o pseudo-sentido que muito bem entende - o pseudo-caminho, a pseudo-direcção, o pseudo-remédio. E, em simultâneo, por hábito e perversão intrínseca, proclama não apenas a excelência fatal desse des-vio (por onde trans-viaja),mas,sobretudo, a sua unicidade incontestável. Precisamente porque,  ao contrário da natureza, da realidade e até da lógica racional comezinha, no absurdo não ocorrem alternativas: cada caminho é único. A escolha é impensável - o absoluto e o instante entresgotam-se e absorvem-se. Tal qual Sísifo exemplifica pela eternidade.
A nós compete-nos ir rebolando o pedregulho da crise e do défice.

terça-feira, outubro 30, 2012

Frases Assassinas - XI

A cada nova legislatura que passa, somos visitados por (des)governantes que entram pela porta grande, com foguetório e fanfarra, e saem invariavelmente, pouco tempo depois, pela porta pequeníssima, quando não mesmo pelas traseiras. O que, manifestamente, é uma tremenda injustiça... É mais que evidente que mereciam - todos eles, em fila, e classe executiva - sair pela janela.

segunda-feira, outubro 29, 2012

O neo-abjeccionismo solene

É todo um panorama rilhafolesco e abracadabrante: o tão proclamado serviço público, dos ministérios às televisões, passando por chafaricas, repartiçosas e quartéis, está, em grande escala, pervertido e escarunchado por suinocéfalos que se servem do público, entre entranhados, migradores e ocasionais. À bica destes usufrutuários reinadontes, orbitam depois enxames de buliçosos e pressurosos serviçais, entre lugar-tementes, anelídeos-aspirantes e bispotes. Estes últimos exibem-se, não raramente, em blogues. Num surto esguichante de qualquer coisa da ordem dum neo-abjeccionismo solene, e infrene. Que parece consistir numa espécie de performance monótona, de tipos a exibirem-se em mergulhos acrobáticos sobre baldes repletos dos próprios despejos, onde previamente, com requintes de volúpia auto-anestesiante, trataram de diluir as próprias vértebras.

domingo, outubro 28, 2012

Frases Assassinas - X



A liberdade não se apregoa: exerce-se!
Por isso mesmo, não há regimes livres, nem economias livres, nem sociedades livres, nem, tão pouco, ideologias ou religiões libertadoras. O que há ou não há é homens livres. E a única dimensão em que o homem consegue manifestar  genuinamente a sua liberdade -que é a sua,intrínseca e humana liberdade, mas jamais  absoluta ou dissoluta  - é a dimensão do espírito. Ora, o que geralmente se assiste é a espíritos atrofiados, soterrados e acorrentados a bandulhos pantabsorventes em vociferante pregação e descabelada pugna por regimes livres, mercados liberalíssimos, sociedades liiberdadérrimas! Não admira: o paraíso terreal  sempre foi uma  ânsia e uma construção de escravos. Donde decorre que o éden planificado descambe invariavelmente no parque policiado, no presídio geral e na masmorra colectiva.
A liberdade, como exemplifica (segundo Aristóteles) o único Ser realmente livre do cosmos, tem um preço: a solidão.

sábado, outubro 27, 2012

Frases Assassinas - IX

Definir o relativismo como o principal mal do nosso tempo afigura-se-me duma superficialidade equívoca. Afinal, o relativismo, mesmo o moral, sempre foi (tal qual é) uma contingência e uma inerência da própria condição humana. O que a nossa época  apresenta de arrepiante e sobremaneira promissor aos piores cometimentos não é tanto o relativismo; é, para ser rigoroso na definição, o absoluto relativismo. Ou seja, a limite, é a negação absurda e impiedosa de toda e qualquer hipótese de relação, pela liquidação terraplenante de todo o tipo de referenciais. Vivemos um tempo de oxímoros

sexta-feira, outubro 26, 2012

Concorrência desleal



A jovem que leiloou a sua própria virgindade (julgo que apenas a vaginal) pela módica quantia de 600.000 euros diz que se não se sente, minimamente, prostituta. É evidente que não. Até porque a última coisa que qualquer tipo - por mais ingénuo que seja - espera encontrar numa puta é precisamente a virgindade. 

É uma empresária, pois claro. Mas sempre vos digo: sórdidos e batoteiros tempos estes, em que as rameiras profissionais já experimentam a impiedosa concorrência das virgens!...

quinta-feira, outubro 25, 2012

Estado quê?!...

Não sei porque raio insistem na fantasia. Não existe Estado Social nenhum. O que existe - e agora retirou a máscara de conveniência - é o Estado sociopata. Mas qualquer sociopata é mesmo assim: começa por ser melífluo, benemérito e ultra-solícito, apenas para conseguir o pleno acesso e a cega confiança da vítima.

quarta-feira, outubro 24, 2012

Um Postal Incorruptível. Mesmo!...




Lembram-se? Está sempre actual. Postei-o pela primeira vez em Maio de 2005. Repostei-o em Abril de 2006 e em Maio de2008. Tornei a postá-lo em Março de 2011. Volto agora com ele, em Outubro 2012, e, não queiram lá ver, permanece viçoso que nem uma alface, absolutamente incólume aos anos e às canseiras.

OS OTÁRIOS QUE PAGUEM A CRISE. É PARA ISSO QUE ELES EXISTEM.

Estou de acordo: "Os ricos não devem pagar a crise".

Em primeiro lugar, porque os ricos são o esteio da sociedade e do mundo. Se acabássemos com os ricos, para que farol guia olhariam os pobres, bem como os remediados e os quase nababos? Ficariam às escuras, pois claro, sem saberem para onde se dirigir nem que paradigma imitar. Naufragariam irremediavelmente de encontro aos escolhos, traiçoeiros e pontiagudos, da existência.
Nenhuma sociedade funciona sem um regime, e nenhum regime se aguenta sem paradigmas orientadores. Depois de inúmeras peripécias que seria fastidioso enumerar, o mundo ocidental arfa sob os primores duma plutocracia vigorosa. Não adianta fazer grandes ginásticas mentais à procura de mundos alternativos; é assim. A História, à boa maneira hegeliana, porta-voz do "Espírito", determinou-o.
Por conseguinte, sendo uma plutocracia, tem nos ricos o vértice da pirâmide – tal qual como se fosse uma monarquia, teria no rei; ou, uma teocracia, encontraria em Deus. Ora, se retirarmos o rei à monarquia, ou o Deus à teocracia, lá ruem ambas, a monarquia e a teocracia, sem apelo nem agravo. O mesmo acontece se retirarmos os ricos à plutocracia. Resulta no caos, na anarquia, desatam-se todos a comer uns aos outros. Descamba o carrossel numa depredação intra-específica sem regras, bestialmente destrutiva e causadora dos piores atropelos e sevícias à ordem pública e não só.
Assim, tal qual vamos, há uma ordem: os ricos comem todos os outros; os pobres são comidos por todos os outros; entre os ricos e os pobres existem uns terceiros que comem e são comidos. Se não é o melhor dos mundos, anda lá próximo. É como na selva: há um equilíbrio natural, racional, que visa a perpetuação do sistema ecológico. Têm que existir poucos ricos e muitos pobres, da mesma forma que devem existir poucos lobos para muitas ovelhas. Se existissem muitos lobos para poucas ovelhas, os lobos exterminariam as ovelhas e, depois, definhariam até à inanição por falta de alimento. A não ser, claro está, que os lobos mais fortes despromovessem os mais fracos a ovelhas e desatassem a pitar neles. Em todo o caso, isso não passaria duma solução de emergência e apenas adiaria o colapso inevitável do sistema.
Portanto, sendo os ricos o que de mais precioso tem o regime, convém preservá-los e protegê-los de todos e quaisquer percalços. Ora, um rico não é rico porque paga crises ou o que quer que seja. Pelo contrário, é rico porque lhe pagam inúmeras coisas: é rico porque recebe. Viaja isento, àborliu.
Também, ao contrário do que se pensa, o rico não é rico porque investe o que quer que seja: é rico porque acumula. Se o rico gastasse o seu precioso dinheiro –a sua essência, e substância inefável do sistema -, em negócios e fabriquetas, corria o risco de ficar pobre. Ora, esse é um risco que nenhum rico que se preze pode correr.
É claro que o pobre, e especialmente o pobre de espírito, cisma que assim é. Isso, porém, não nos deve surpreender: É conveniente ao sistema e ao rico que ele assim pense. Tratam até, ambos, de mimar-lhe essa imbecil convicção, de mantê-lo nessa ilusão mentecapta. Mas, na verdade, o rico apenas se dedica a multiplicar o seu dinheiro, velando, desse modo, pela própria saúde do regime e pelo equilíbrio do ecossistema.
Quer dizer, o rico nunca investe o "seu" dinheiro. Investe, isso sim, o dinheiro que o banco lhe confia para investir. O "seu" dinheiro significa apenas"crédito" junto da banca, funciona como uma espécie de brevet para "piloto de capitais". Porque o rico é essencialmente isso, um piloto de capitais, que se faz pagar a peso de ouro pela crematonáutica que exerce. O "seu" dinheiro é apenas aquilo que antes da operação a garante e que, terminada a mesma, resultará ampliado. A função do rico é tornar-se cada vez mais rico. O ser rico, bem mais que um estatuto, é uma dinâmica: cega, obsessiva, inexorável.
Então, com que dinheiro investe o rico? – Com o dinheiro dos outros, é evidente; precisamente aquele que a banca extrai à grande maioria.
E o que é uma "crise"? – É uma época de desequilíbrio financeiro, em que, por um lado o Estado através de impostos e taxas, e por outro a banca e seus associados, através de "empréstimos" (que mais não são que formas encapotadas de cobrar "taxas" e "impostos" muito acima dos do próprio Estado), deixaram ou ameaçam deixar a grande parte da população na penúria, senão mesmo à beira do colapso enquanto sociedade.
Se o dinheiro deixa de circular com a quantidade necessária a manter um fluxo de oxigenação saudável do sistema, isso só pode significar hemorragia algures.
Quando, em plena crise, a banca apresenta lucros fabulosos, isso significa que esse dinheiro foi sacado à população e entregue nas mãos dos tais "pilotos". O que estes fizeram, obedecendo à sua lógica intrínseca, foi ir investi-lo noutras paragens mais rentáveis. O objectivo do investimento não é criar postos de trabalho: esse é o simples meio. A finalidade é multiplicar o capital inicial. O resto é supérfluo e, em bom rigor, descartável, logo que a finalidade esteja alcançada.
Entretanto, o país de regresso à sua penúria tradicional, do ponto de vista dos ricos e seus acólitos, é positivo: quer dizer que o país, de volta ao terceiro mundo e à realidade, está a transformar-se num país mais competitivo, com mão de obra mais barata e menos esquisita. Para os pobres, os verdadeiros, também não faz grande diferença: abaixo de pobres não passam, e já estão habituados. Concentram-se no futebol, na pinga e lá vão. Os únicos que, de facto, têm motivos para se preocupar seriamente são aquela classe heteróclita e intermediária – daqueles que vivem digladiados entre a angústia de regredirem a pobres e a ilusão de, num golpe de asa, ou por qualquer súbita lotaria do destino, ascenderem a ricos. Esses, temo-o bem, vão ter que sacrificar-se, mais uma vez, pela competitividade do país. É, aliás, urgente que desçam do seu pedestal provisório e se compenetrem dos seus deveres atávicos. São para isso, de resto, que, cíclica e vaporosamente, são criados.
E dado que os pobres não pagam porque não têm com quê, e os ricos também não, por inerência de função e prerrogativa sistémica, resta-lhes a eles, os tais intermédios (ou otários, se preferirem), como lhes compete, chegarem-se à frente. Está na hora de devolverem a sua "riqueza emprestada", o seu "estatuto a prazo"; de se apearem do troleibus da ficção e retomarem o seu lugarzinho na horda chã, em fila de espera para o próximo transporte até à crise seguinte.
Não sei se campeia a justiça neste mundo. Duvido. Mas que reina uma certa ironia, disso não restam dúvidas.

Desvios

«Há um "enorme desvio" entre o que os portugueses esperam do Estado e o que estão dispostos a pagar por isso.», diz o Gaspar Coiso. 
Parte do desvio, eventualmente, deriva de duas espécies que vivem instaladas a expensas do Estado: a escumalha infra e a escumalha supra. Ou seja, a ciganagem à boleia e a ciganagem ao volante. Realmente, bem podem os contribuintes esperar e desesperar: enquanto o estado estiver congestionado por tamanha quantidade de parasitas, a gestão  e a digestão coincidem. Do estado tanto quanto do país.

Por isso mesmo, maior ainda é o desvio entre aquilo que os portugueses esperam daqueles que  elegem e aquilo que estes estão dispostos a fazer por isso. A única certeza é que saem cada vez mais caros, oferecendo, em contrapartida, um serviço cada vez mais reles, manhoso e hostil.

terça-feira, outubro 23, 2012

Já que estão com a mão nos efeitos, não esqueçam as causas!...



«Cientistas condenados a prisão por subestimarem riscos de sismo»



Bem, se já há cientistas a serem julgados e condenados por incúria em relação a catástrofes naturais, agora só falta  que, com urgente e simétrica justiça,  se levem a tribunal os políticos, os economistas, os financeiros e outros plantadores inveterados de catástrofes sociais. Se, em matéria de catástrofes e cataclismos, é merecedora de castigo a negligência com efeitos, muito mais condenável será a cumplicidade e a contumácia com causas.


segunda-feira, outubro 22, 2012

Coisas da Constituicinha


Num país que se tem esmerado e esfalfado nos últimos trinta e tal anos a parturir leis que, ou já nascem viciadas, desfloradas e prostituídas ou com intuitos premeditados disso mesmo, repolham agora uns tartufos peregrinos em cabeludo despique: uns conclamando que lhes andam a violar a Constituição todos os dias; outros bramindo que, bem pelo contrário, é a Constituição protuberante que os anda a bloquear, assediar e sodomizar a eles todas as noites! Ou seja, num lugarejo nauseabundo ounde a pedofilia jurídica é intra-uterina, nascitúrica, pós-natal e acrobática, e onde, com fanatismo inoxidável, ninguém, eleitos e eleitores,  liga pévias ao Programa de Governo, ao Código Civil, ao Código Penal, aos PDMs,aos RDMs, à REN, à Ran e onde nem mesmo o Código da Estrada escapa a ver-se remirado e desdenhado com sobranceria olímpica, imaginem, desatam agora num basqueiro a propósito duma carcaça qualquer, esfarolada e ressequida, dum animal abandonado na auto-estrada!... "Ai que era sagrado o bichinho!.."; ".Ai que me desalinhou a direcção, a porcaria do bicho!..."
Muitas vezes dou comigo a interrogar-me se não habitarei entre canibais!...

domingo, outubro 21, 2012

O Mal Comum - I




Um povo que perde ou abandona a noção de bem comum acaba fatalmente sitiado pelo seu reverso - o mal comum.
Dir-me-ão que o conceito de "bem comum" não passa duma obsolescência medieva, ou, pior ainda, salazarenta. Bem, entre outros seguramente óbvios, começo por fornecer um termo básico,  imorredouro - e nada metafísco, por sinal! -que traduz o "bem comum": território.
Quando na filosofia falamos em definições (singularidade essencial ao pensamento e à sua capacidade conceptual), significamos o estabelecimento de diferenças, linhas específicas de demarcação. São essas linham que permitem o pensamento, pois são elas que permitem a extracção do ser das coisas à indeterminação do caos. Andamos nisto desde Hesíodo. Dizer, assim, o que uma coisa é é sincreticamente estabelecer também o que ela não é.  Lembro-me de iniciar aulas de Ética com a seguinte afirmação peremptória (e provocativa): "Um homem não é uma puta". Partíamos do não-ser do homem para alcançar a sua essência prática.
Ora bem, como equivalente às definições, em termos de territorialidade, temos as fronteiras. Delimitam, definem e determinam. Ou seja, manifestam uma forma, uma essência e uma vontade próprias. A forma radica na geografia, a essência na demografia e a vontade na política. O que é que que acontece a um território que abdica das suas fronteiras?  Padece um triplo prejuízo: geográfico, demográfico e político.
Quando eu referia a definição negativa de homem como "não-ser puta" estava a sacrificar a erudição à eficácia. A mesma fórmula podia ser esboçada como "o homem não é uma mercadoria". E aqui entraríamos em confronto com toda a idade moderna, quer mercantileira, quer marxista, isto é, quer de esquerda, quer de direita, porque, no essencial, materialista toda ela. Entretanto, quem diz um homem, diz um país, ou seja, um território com o respectivo povo e o governo desse povo. E o que a máxima exprime não é simplesmente que a essência do homem não se vende nem compra; é bem mais vasto que isso: é que essa essência não se negoceia, não é negociável, não pertence de todo ao nível do comércio. É uma propriedade inalienável! Não pode ser submetida a qualquer tráfico, seja ele de conveniência ou de imposição.
Agora, repare-se: mais que curioso, é sintomático, como num tempo em que aqueles que erigem a propriedade como direito e conquista suprema da civilização mais não professem que a sua antítese, ou seja, que nenhuma propriedade no fundo  pertence genuinamente a nenhum homem pois todas elas pertencem ao mercado. Já que tudo é transaccionável, o homem resume-se apenas a um gestor de transacções, que age de acordo restrito ao interesse, à conveniência ou à imposição. E à imposição, imaginem, de quem? Pois, do Mercado!
A propriedade privada é um roubo, clamava Proudhon. Na verdade é um mito, uma fantasia, se tanto, um transe. Todo o nosso tempo é um atestado lúgubre do contrário da minha fórmula: o homem não tem nada de próprio e, não sendo nada de concreto, pode flanar na ilusão de que pode ter tudo e mais alguma coisa e, nessa exacta medida, ser tudo e o seu contrário: desde puta a semi-deus, ou mesmo nalguns casos mais delirantes, deus em pessoa. O resultado de homens impregnados desta substância mental é países e povos também eles entregues à voragem, não já apenas da necessidade, nas dos negócios e das transacções, ou seja, dos "Mercados". O caso é que doravante já não temos uma ordem que se eleva do caos, mas a desordem caótica instituída como ordem indiscutível, sublime e inescrutável..

Os apara-chibos

Na terminologia caguincheana, os "apara-chicos" do presente distinguem-se pelo ímpeto e furor com que ladram aos "apara-chicos" do passado. É sempre uma mera questão de rivalidades intestinas. Ou disputa gruim pela teta estatal. - os úberos são cada vez mais reduzidos e os porquinhos cada vez mais sôfregoss e numerosos. Por isso mesmo, a retórica cuinchante daquele que mama, em denúncia daquele que antes dele mamava transporta-me a uma merencória constatação: as quezílias entre "apara-chicos" são essencialmente ajustes de contas entre "apara-chibos". A delacção retroactiva funciona, na realidade, como alibi pessoal.

sábado, outubro 20, 2012

Frases Assassinas - VIII

Este país revela uma paixão exacerbada e devota pelas crises económicas e uma fobia supersticiosa às crises políticas. O que, longe de paradoxal, é perfeitamente compreensível: estas poderiam, de alguma forma   áspera e brusca, colocar em risco o idílio tanso em que, geralmente, decorrem aquelas.

sexta-feira, outubro 19, 2012

À espera do Milagre... apanha-se o Desespero.




Em vésperas das eleições que conduziram ao actual desgoverno da nacinha, conjecturava eu:


De boas intenções está o inferno cheio... e o erário vazio. Quanto ao negócio da contrafacção de promessas é melhor nem falar.
De tanto o pagode obnubilado ir às urnas, lá vai o país à sepultura.
Atrás de flautistas não são homens que enfileiram.

O grande e tortuoso mistério: se aquele que conduziu o país à bancarrota é o menos capacitado para o retirar de lá, como é que o processo que o conduziu a esse cargo é o mais adequado para reverter o desastre?
Em palavras mais simples: Como é que a mesma cegada que nos transportou ao abismo é, ao mesmo tempo, a mais capacitada e clarividente para nos retirar de lá? Como é que com a mesma máquina de fabricar sapos queremos agora fabricar príncipes?
Somos mesmo, como dizia Fernando Pessoa, uns perfeitos bolchevistas militantes: uma espécie tardia e gora de cristãos sem Deus, mas com uma crença obsessiva e redobrada no milagre. Só que, ainda por cima, o milagre por obra exclusivamente humana. A Santidade ao alcance das massas. Uma classe toda ela santa e angélica... Santa imbecilidade!

E de modo a que não falte inspiração a mais um dia de fúnebre peregrinação gaiteira, aqui deixo uma reflexão extremamente apropriada:

«Nas sociedades tradicionalistas são talvez os Mortos que mandam; nas sociedades democráticas, porém, é a própria Morte.»
Fernando Pessoa

....II...

Pois bem, um ano e tal depois, aí tendes o resultado de mais uma taumaturgia eleiçoeira. Ninguém imaginava na altura? Cinquenta por cento do país até já estava, mais que convicto, farto e vacinado... Tanto que nem compareceu ao funeral.

Se agora alguém devia estar a chegar-se à frente e a pagar, alegremente, mais que todos os outros - imensamente mais! - com a generalidade do seu erário privado, mais salários, pensões e alcavalas avulsas, eram aqueles que constam nos cadernos eleitorais como votantes. Então não eram eles os altamente responsáveis, os civicamente militantes, os superiormente cidadãos e coiso e tal? Os outros, os malvados e abjectos abstencionistas, não foram deportados para o limbo da não-existência?  Pois então, agora, os campeões da goela, os superlativos da silva,  que assumam!... Que paguem! Votaram, não votaram? Elegeram, não elegeram? Então, agora, aguentem! A democracia, como diz os outro, é um luxo ultra-dispendioso? Aqueles que andaram dela a encher a boca, e de enfiada o bandulho, que arrotavam postas, flatulavam anátemas e grunhiam solenidades e urgências de estalo, agora que entreguem a alcatra a magarefe - a alcatra , o lombo e a rabadilha! Que paguem, padeçam e emigrem antes de todos os outros! Os anafados primeiro!

no pequeno país onde os habitantes recusaram pagar a factura dos bancos na bancarrota.


«Desemprego passou dos 12% para os 5% na Islândia»


Infelizmente, nós vivemos vegetamos num pequeno país onde os mainates da banca (mascarados de governantes) decidirem que compete aos habitantes, sobretudo contribuintes, pagar a factura da bancarrota bancária.
O resto, dum modo geral, é ruído onde começa a ser indestrinçável a estupidez sectária e a filha da putice  entranhada. E ufana.

Mas pronto, foi a sorteio da natureza: a eles calhou-lhes os vulcões que emitem lava e cinza; a nós calhou-nos os vulcaninos que cospem baba, banha e lixo mediático. Em compensação, recebemos um clima suave e aprazível. Magra, escassa e baldada indemnização, pelos vistos. Eles sempre conseguem conviver com os vulcões deles; nós, tudo o revela e anuncia, ainda vamos acabar expulsos e expatriados pelos nossos.

quinta-feira, outubro 18, 2012

A Instituição Castrada

Os nossos bravos e galhardos militares são extremamente tolerantes... Quando toca a irem-lhes à pátria. Mas quando toca a irem-lhes ao bolso, aí a coisa pia finíssimo! E só não não direi que equivale a irem-lhes ao cu ( isso, mais que habituados, eles até já ganharam vício democrático), porque, na verdade, equivale a irem-lhes à alma!
Isto é tanto mais triste e justo, quanto está a ser escrito por um oficial "Comando".


quarta-feira, outubro 17, 2012

Brigada do reumático II

Estamos em Outubro e hoje deparei com uma notícia sugestiva:

«Meio milhar de militares no 'quartel-general' de Passos»


Mas bem mais interessante, e em tudo parente desta, é uma outra notícia de Agosto deste nosso ano da desgraça de 2012:

«Cavaco Silva promove 22 altas patentes militares num só dia»



Em plena crise ( e no mês de férias , para não criar muitas ondas), eis que o país acorda com mais 9 novos tenente-generais, 11 major-generais e 2 contra-almirantes. Tudo coisas urgentes, prioritárias e inadiáveis, neste tempo de vacas esquálidas, como é bom de ver. Por estas e por outras, já vi a bernarda muito mais longe de estoirar. E, às tantas, como qualquer bolha de pús, até me interrogo se o melhor mesmo não seria esta porcaria rebentar duma vez por todas!...




terça-feira, outubro 16, 2012

O Labirinto (r)




Escrito há um ano atrás...


Em Portugal, há excesso de função pública e um défice crescente, a desmesurar-se, de serviço público. O "funcionário", regra geral, não tem em mente servir o público, mas servir-se dele. E se isto se passa a jusante, a montante cumpre-se o exactíssimo reflexo no espelho: basta substituir a palavra "público" pela palavra "Estado".
Não julgo que seja um fenómeno exclusivo do nosso país. Toda uma Europa burocratizada vive este mal-estar intestino, este conflito nas vísceras entre "Função" e "Serviço", ou melhor dizendo, entre o verbo "funcionar" e o verbo "servir". Quer dizer, aumentam quotidianamente as realizações e reinvenções peregrinas que vão funcionando, mas diante das quais, o cidadão minimamente desperto se coloca uma interrogação inevitável: Para que é que isto serve? Ou melhor, a quem é que isto serve?...
É mesmo uma pergunta que assombra cada vez mais o nosso mundo. Destrambelhado mundo que, quanto mais se complica, se "moderniza" e reforma, mais absurdo parece. Como o labirinto, dentro do qual perdemos há muito toda a orientação e zanzamos dementes, irremediavelmente perdidos, sem memória da entrada nem, tão pouco, a mínima noção ou fé na saída. Escutando apenas, cada vez mais próximo, o resfolegar lúgubre da Besta que lá reina. Os gregos chamavam-lhe Minotauro. Nós havemos de chamar-lhe o quê?...
Porque quando o mundo deixa de ser construído para o homem, passa o homem a ser criado para o labirinto.

Frases assassinas - VII


No fundo, bem no fundo, estão a imolar-se países para que a Banca se salve. Pune-se o consumidor, o junkie mais que inveterado, mas poupa-se o dealer, a bem do negócio. Só a corrupção passiva merece, assim, repreensão e castigo. A activa passa por virtude empresarial e mais valia económica.

segunda-feira, outubro 15, 2012

Prémio quê?...

O Prémio Nobel da economia é, por um lado, uma redundância - do Prémio Nobel da Literatura (agora reduzida, nem sequer à ficção, mas à poesia-científica; e por outro, um prenúncio pomposo (e inquietante) - ao Prémio Nobel da Astrologia.

domingo, outubro 14, 2012

Um áspero milagre



Um Cardeal patriarca a emitir juízos sobre manifestações políticas constitui adorno em tudo equivalente  ao de certas seitas ateístas em viçosa campanha contra a ida das pessoas a Fátima. Uma forma de conciliar ambas as aberrrações era, eventualmente, converter o Santuário em ponto de reunião tanto para manifestações como para peregrinações. Calavam-se, assim, as duas geminadas sandices  e, de caminho, tanto quanto justamente protestar contra os desgovernos da república, os manifestantes aproveitavam para, em uníssono e sincero clamor, pedir um milagre a Nossa Senhora, a saber, um governo sério e honesto para o país, uma coluna vertebral para os habitantes e um castigo divino e exemplar para os corruptos e trafulhas  (imunes e ufanamente impunes a todos os tribunais deste mundo).  Porque, à velocidade que isto desliza, está mais que visto que, um tão útil quão mirabolante fenómeno, ainda para mais de tão exigente e tripla complexidade, por estas paragens, não vai lá com eleições, decerto também não irá  com manifestações, pelo que, tudo o indica, só mesmo com um milagre.
E capacitemo-nos: é bem menos exasperante e estúpido rogar à Senhora que está no Céu do que esperar o quer que seja da Merkl que, para mal dos nossos pecados, temos e aturamos na Terra.



sexta-feira, outubro 12, 2012

Por sina (r)


Parece que, segundo fórmula conhecida, Salazar "queria levar os portugueses a viver habitualmente". Ora, se bem que a sabedoria popular ensine que o "hábito faz o monge", entre nós não fez. Entre nós, a tendência sempre foi mais para fazer o frade. O feijão-frade. O bifronte. O que se traduz, por exemplo, em várias duplicidades singulares e maravilhosas: frequentar a missa e o bordel; confessar-se ao prior e à bruxa; pedir a Deus e comprar ao Diabo; vestir do direito e fardar do avesso; comer à mesa e debaixo dela. Tudo isto e muito mais, bem como vice-versa, com a mesmíssima cara ambivalente e bífida.
Poderá parecer contradição atávica apenas a quem não entenda a evidência elementar: um povo destituído de profundidade é imune à contradição. Ao nível da rama, por onde sistematicamente colibriza, pasta e delibera, a necessidade e a possibilidade geminam-se, fluindo ambas ao sabor da aragem. Cumulando que, em matéria de ventos da História, qualquer flato mais estrepitoso, em prenúncio de romarigante foguetório, lhe serve.
Não lembrava ao Diabo impor o monasticismo a uma gente que, claramente, está viciada - até à medula, até à oitava geração, até à segunda natureza! - no meteorismo. Lembrou ao Salazar.
Ciclicamente, com o sentido de humor que só a liberdade verdadeira e absoluta permite, os Deuses, sensibilizados pelo clamor dos batráquios bem pensantes, enviam uma cegonha. Portugal, é certo, merecia outra gente. Mas isso não é só Portugal, é o planeta inteiro. Esta gente que somos, por lei eterna, merece o que semeia e colhe o que cultiva. Abro apenas uma excepção: a nossa esquerda. Essa, sobretodos angélica e insaciável matilha, não merecia, nem hoje nem nunca, um Salazar: merecia um Vlad. O Empalador.

Relembrando a Pequena Ogreterra




Começo por dizer que não simpatizo minimamente com esbirros. As polícias são instituições modernas prometidas aos mais lúgubres experimentalismos e instrumentalizações. Isto não invalida o reconhecimento da função social destas coorporações. Se não existisse a polícia, provavelmente, o canibalismo já teria descido da economia aos restaurantes. Por enquanto só ainda vai nos mercados. Mas é manifesto: perdido o medo ao inferno e às respectivas penas resta o medo à polícia e aos tribunais. Aquele, aliás, veio, sistematicamente, sendo substituído por este. Se repararmos com atenção, os terroristas do nosso tempo, para efeitos concretos, fazem as vezes dos súcubos, íncubos, bruxas, judeus e demais hostes satânicas da Idade Média. E a Nova Igreja a que chamam Estado - o Ídolo Frio de que falava Nietzsche -, aposta num policiamento cada vez mais concentracionário e intrusivo das multidões, dos indivíduos e, por herança preciosa, das consciências. A pretexto, como é da praxe, duma luta contra a intrusão de entidades invariavelmente híbridas, misto de demoníaco e fantasmagórico.
Resumindo, o alienígena tenebroso continua à solta, à espreita, e neste parque infantil onde nos apascentam, para efeitos de vigilância, o esbirro de Deus cedeu a vez ao esbirro do Estado. Quer dizer, para o que dantes desempenhava o pastor humano, agora basta o cão polícia. Não abona muito da saga mental cá da rapaziada, pois não. E para agravar a vergonha, calcula-se que em breve o cão será substituído por um robot (ou drone, que é assim uma espécie de robot alado). Chamamos progresso à desumanização. Certo é que a máquina sairá ainda mais barata que o animal. E o medo, suspeito bem, é o lubrificante dos ogres que por aqui se abastecem.

Frases Assassinas - VI

Aqueles que não acreditam em "homens providenciais" são aqueles que, regra geral e em contrapartida, acreditam, piamente, em estados providenciais, ou em Mercados providenciais, ou em ideologias providenciais, ou em ciências providenciais, ou em seitas ou mafias providenciais.

quinta-feira, outubro 11, 2012

A Reforma do Ensino (nova reclamação)

Bem, talvez nos encontremos mergulhados neste desastre completo (como ainda há pouco ouvi proclamar ao João Salgueiro)porque, em devido tempo, não soubemos encetar a "reforma educativa" que se impunha e eu venho, há quase dez anos, reclamando no deserto...
Nunca é demais reclamar, pelo que aqui reclamo mais uma vez (e reclamarei as vezes que forem necessárias, até que a morte me tolha)...


Eu pergunto-vos: "que raio de porcarias, que ror de inutilidades e matérias desnecessárias, andam a ensinar nas escolas e universidades deste país?..." A quantidade exacta ninguém sabe, mas o resultado está bem à vista: 40.000 licenciados no desemprego (que entretanto já devem ter duplicado) fora os que andam a monte ou se esconderam em casa, com depressões, envergonhados e cabisbaixos. E também os que trabalham de chófer de táxi, de caixa de hipermermado, de portageiro ou a dar serventia a trolhas gozões (mas agora já nem isso). Pois, uma catástrofe social... e de quem é a culpa?... A culpa, toda a gente sabe, é da falta de preparação para a vida profissional, da inadequação gritante dos curriculos às necessidades laborais e, sobretudo, aos hábitos e critérios empregadores do mercado. Ora, este, o bendito mercado, está cada vez mais esquisito e exigente; arreiga-se encanzinadamente às suas prerrogativas e ninguém o faz arredar pé. 

Assim sendo, está mais do que na hora de dizer aquilo que toda a gente pensa mas ninguém diz. E, ao mesmo tempo, iluminar duma vez por todas certas cavalgaduras burocráticas que prometem reformas, mas não mexem uma palha e, ano após ano, deixam tudo na mesma. 

Pois bem, esta reestruturação curricular que apresentarei de seguida, é infalível, panaceia mais que garantida (verificada nas mais elevados potências mundias de ponta), e aplica-se universalmente a todo e qualquer curso, seja de letras ou ciências. Introduzam-se as cadeiras que passo a referir, conforme o ano que sugiro, e vereis se não é remédio santo. 


1ªAno - Subserviência. 

Sem conhecimentos avançados desta disciplina, como é que alguém pode singrar na vida profissional ou almejar a uma carreira de sucesso neste país?!... Impossível, digo-vos eu e sabeis vós melhor que ninguém. Quem não subserve não sobrevive. Se este instrumento mediador supremo, todo e qualquer conceito, técnica ou conhecimento torna-se estéril, inútil. Um tipo é barra em medicina, direito ou arquitectura, mas não tem as noções básicas de subserviência... pra que lhe serve o curso? - pra nada; contempla o diploma e morre de fome. 


2º Ano - Bajulação e Graxismo

Uma vez instruído na "subserviência", o futuro quadro precisa de fórmulas elaboradas para a aplicação da mesma. É aqui que surge a "bajulação e graxismo". Saber bajular e dar graxa ao chefe é fundamental para o aspirante a bons salários e regalias sociais. A capacidade técnica, a competência profissional, sem um bom domínio da "bajulação e graxismo", além de se tornarem inócuas, devêm absolutamente contraproducentes e prejudiciais ao proprietário. Pior que não saber bajular o chefe só há uma coisa: não saber bajulá-lo e ser competente. Invariavelmente, o chefe, a qualquer nível na escala hierárquica, tomará isso como uma ofensa pessoal e ameaça velada ao seu ganha pão e marisco. 


3ºAno - Insectomorfismo e Ética. 

Dominadas as artes da subserviência e da bajulação, aquele que aspira a altos cargos, sobretudo na administração pública, tem que adquirir uma perfeita moral camaleónica e um estômago à prova de bala. Um adestramento exaustivo na habilidade de se transformar em insecto, de preferência rastejante, torna-se, então, necessário. Esta aptidão tem que devir segunda natureza, avatar sempre pronto a ser exibido. É certo e sabido que, a todo o momento -às vezes, mesmo quando menos se espera -, na vida profissional portuguesa, surgem bruscas mas imperiosas requisições deste desempenho. Nada como o indivíduo estar preparado. 


4ºAno - Macaquice transcendental 

Na vida adulta e, sobremaneira, na carreira profissional, cá do burgo, ser é ser macaco. O "ser macaco" engloba e sintetisa, numa espécie de concentrado vitamínico, vários princípios de acção fundamentais ao percurso do futuro quadro. A saber: o princípio da imitação (de superlativa importância), o princípio da velhaquice (não menos importante), o princípio do oportunismo (idem, idem) e o princípio da etiqueta e protocolo (o mais transcendente e esotérico de todos). A rapidez na imitação, a predisposição à velhacaria, o sentido oportunista e a perícia no protocolo constituem as metas de todos os finalistas. 


Ultrapassado o 4º Ano, eis que se inicia o Estágio. Este será integralmente passado em testes e aulas práticas no Simulador de Trabalho. A razão é simples: 

Sendo o verbo "fazer" inconjugável per si no nosso país, onde só aparece transmudado em "fazer de conta" ou "fazer que faz", era mais que evidente que não fazia qualquer sentido mandar os recém-licenciados e candidatos a futuras mordomias estagiarem em locais efectivos de trabalho, dignos apenas de gente desclassificada e analfabeta (como fábricas, empresas transformadoras, centros agro-pecuários, etc). Consciente desse erro tradicional, o meu plano propõe, outrossim, que eles estagiem em "locais virtuais" de trabalho, semelhantes àqueles que ocuparão no futuro. É para isso que serve o Simulador. 
Assim, da mesma maneira que um governante actual "faz que governa", mas não governa; ou um director geral "faz que dirige", mas não dirige; ou um deputado "faz que representa" mas não representa; também o futuro governante, director, deputado, etc, tem que aprender esses primores técnicos do "faz que faz mas não faz " e "faz de conta mas não é", enfim, as múltiplas manhas e ardis da simulação laboral. Onde pontifica sobretudo, como requinte mor, o desembaraço na ocupação simultânea de vários cargos e a invisiblidade durante grande parte do mês. 
A excepção singela a esta regra do "faz que faz" (e como toda a regra tem que ter a sua excepção) reside estritamente no "sacar" (salários, subsídios, mordomias, etc). Aí, nem os actuais, nem os futuros, "fazem que sacam"...Não, aí, sem dó nem saciedade, escrúpulos ou hesitações, não "fazem que sacam": sacam mesmo!... 



PS: Repito e sublinho: quanto às outras disciplinas de cada curso, pouco interessam; bem como a sua aprendizagem ou aproveitamento. Agora estas, que acabo de referir, são nucleares e de transcendente importância.


PS2: Vão-me obstar, vossências, que já há frutos mais que evidentes deste sistema de ensino no próprio governo da república, como já existiam e amarinhavam até nos anteriores. O actual primeiro-Ministro, a coisa Relvas, por exemplo,  e mais não sei quantos...  Falácia, meus caros, nada mais que falácia! Essa gente não é a prova acabada dum sistema aberto e democrático, mas o resultado de estrita esquemática individual. Estamos assim perante meros autodidactas. Ora, o que se pretende é o acesso geral instituído, a igualdade de oportunidade a todos os cidadãos em idade escolar. O que alvitro é que a possibilidade duma carreira no estado e na generalidade das administrações empresarias se torne possível a qualquer cidadão, por mais destituído de bens, conhecimentos, contactos, escrúpulos e mesmo ideias que seja. De resto, um pouco à semelhança do que já acontece na Presidência da República.

quarta-feira, outubro 10, 2012

Frases Assassinas - V

Não discuto com toxicodependentes. Tomem lá uma moeda e vão arrumar o mundo. 

Quadras ao gosto da PGR




Até já no Brasil, senhores,
vão presos por corrupção!
Um dia destes até em Angola...
Só em Portugal é que não!...

Até já no Brasil, meu Deus
corruptos vão prá prisão!...
Qualquer dia até na Nigéria
Só em Portugal é que não!...

Nada de reduções!

Sou absolutamente contra a redução dos deputados palramentares. Quem me conhece sabe perfeitamente que sou pouco dado a parcialidades. Por isso mesmo, advogo, com todas as minhas forças, a remoção - remoção completa!   Por defenestração, linchamento festivo, fuzilamento sumário, despedimento com justa causa, tanto faz; quanto a isso não sou esquisito. Longe de mim pôr-me com picuinhices numa hora destas.
De resto, não sei como seria possível reduzi-los... de vermes, passavam-nos a quê - micróbios? Mentalmente, já se confundem com  bacilos...

terça-feira, outubro 09, 2012

Frases Assassinas - IV


Não tenho nada de especial contra ajuntamentos festivos de marionetes, títeres, anõezinhos e insectos rastejantes. Desde que, claro está, não sejam às expensas do erário público e se intitulem, enganosamente, de "cimeiras".
Uma humanidade com cimos daqueles é uma planície a putrefazer-se.

Naufrago, logo existo



No princípio dos anos oitenta, Portugal tinha acabado de fugir cobardemente de África e, após ensaios estonteantes de paradisíacos lestes, preparava a adesão desesperada à Eurapa. Resultado: bancarrota.
Trinta anos depois, amainada a cornucópia de fundos comunitários e várias orgias de crédito coalescente, Portugal está plenamente integrado na Europa... e novamente na bancarrota. 
Dir-se-ia, assim, que enquanto para os outros povos a bancarrota é uma calamidade, para os portugueses, em contrapartida, é uma mania. Pela via socialista, pela via capitalista, por outra via qualquer, inventada ou por inventar, hão-de lá ir sempre dar. Decorre alías, isto, dum facto muito evidente e fundamental: entre nós a crise não constitui precalço. Bem pelo contrário, constitui vício. Ou estamos nela ou a agenciar diligentemente pretextos para nela retouçarmos ou mergulharmos a pique. Tarda, pois, em se reconhecer o óbvio: ele há povos intrinsecamente masoquistas. Ou então é o que nos resta das Descobertas: a volúpia excitante do naufrágio. Como já não temos mais nada para descobrir, resta-nos naufragar a torto e a direito. Por tudo e mais alguma coisa.
Quiçá, aquilo que aos outros abate, a nós alimenta-nos.

PS: Mesmo a nossa já famosa e lambuzadíssima democracia, não se distingue a avantaja ela sobre todas as outras nesse primado  eloquente de ter por universal não o sufrágio, mas o naufrágio?...

segunda-feira, outubro 08, 2012

Frases Assassinas - III

À medida que os humanos se tornam cada vez mais estúpidos, as suas armas ficam cada vez mais inteligentes.

Ainda a propósito desta Coisa Pútrida




«A República Velha* nada alterou das tradições desonrosas da Monarquia. Mudou apenas a maneira de cometer os erros; os erros continuaram sendo os mesmos. Em vez de um regimen católico, um regimen anticatólico, isto é, um regimen que logo arregimentava como inimigos os católicos. Em vez de uma República portuguesa, de um regimen nacional, uma república francesa em Portugal. E assim como a Monarquia Constitucional havia sido um sistema inglês (ou anglo-francês) sobreposto à realidade da Pátria Portuguesa, a República Velha foi um sistema francês sobreposto à mesma realidade pátria. No que respeita aos erros de administração - a incompetência, a imoralidade, o caciquismo - ficámos na mesma, mudando apenas os homens que faziam asneiras, que praticavam roubos e que escamoteavam "eleições". De sorte que a República Velha era a Monarquia sem Rei. Por isso é justo dizer que o 8 de Dezembro foi a queda da Segunda Monarquia.
Como podiam deixar de ser assim? Os homens do Partido Republicano tinham a mesma hereditariedade nacional, tinham vivido no mesmo meio que os da Monarquia; porque milagre teriam uma mentalidade diferente? Se Portugal tivesse regiões diferentes, nitidamente diferentes, se a Revolução de 5 de Outubro tivesse trazido para o poder homens de uma região diferente daquela de onde soessem provir os homens da Monarquia, então haveria homens diferentes no poder. Mas eram os mesmos políticos profissionais, os mesmos advogados da mesma Coimbra, os mesmos copistas da França - como podiam ter mentalidade diferente?»

- Fernando Pessoa, "Da República"

E relembro a frase assassina: Ao ritmo pastoso e emético das nossa revolucinhas, uma evidência coa e sedimenta: este país não evolui, deteriora-se.




* Entenda-se a República expelida pelo 5 de Outubro de 1910

domingo, outubro 07, 2012

Frases assassinas - II


Saibam que os hipócritas e fariseus deste mundo não se enrabam. Pois não, empalam-se. Com humor. E sem piedade.
Porque se os enrabássemos, o prazer seria todo deles; e assim, bem empalados, o prazer é todo nosso.

Bem a propósito... Peritos e Depressões (r)




No JN, informavam-nos aqui há anos que a "maioria das depressões não é tratada por peritos". É claro que não, até porque, em Portugal, praticamente, não existem peritos para tratar de depressões. O que existe, em barda, em catadupa, em viveiro permanente, são peritos em criar depressões: economistas, políticos, jornalistas, politólogos, comentaristas pantófagos e humoristas, entre outros. E fora os meteorologistas.
Quando apontam os psiquiatras como peritos estão claramente a mangar connosco. Os psiquiatras não são peritos, são especialistas. Não no tratamento, mas no desenvolvimento e rentabilização das depressões. Compete-lhes zelar para que cresçam saudáveis e viçosas. Supervisionam a sua nutrição e cultivo.
Resulta disto que os deprimidos mais lúcidos mas menos abonados recorram, geralmente, à auto-medicação, tentando, entre outras panaceias, a taberna mais próxima. Já os mais abonados recolhem-se, por costume, a uma casa de alterne que não exija sufrágio universal, nem filiação partidária.
Alternativa vantajosa ao psiquiatra, para o jet-set, é a bruxa. É igualmente charlatã, mas imensamente mais pitoresca. E o paciente não paga para ainda ter que ser ele a contar a história. Com a nigromante, arrota, mas, ao menos, escuta um monte de histórias. Cada fita mais fabulosa que a anterior. E não é só ele que arrota: ela também. Arrota, ronca, gargafunga. Imita vozes cavernosas. Cavaqueia com os espíritos e convoca congressos de defuntos. Em suma: uma one-woman show. "Belo circo!", congratula-se o paciente à saída. "Dei-lhe mais vinte euros e ainda me ordenhou", gabou-se o Engenheiro Ildefonso, um dia destes, no rescaldo satisfeito duma dessas visitas. -"Mãozinhas milagreiras!"
Terapia obscena? Mas, estou em crer, plenamente eficaz. Ele não me pareceu nada deprimido. É certo que também não estava antes, mas podia muito bem tê-lo ficado depois. Como, aliás, e amiúde, acontece. Basta imaginarmos um desbraçado qualquer diante daquela fronha olheirabunda do Dr. Daniel Sampaio... Até o Conde Drácula, quase garanto, seria mais animador. Pelo menos de papo cheio não teria aquele aspecto macilento dum onanista zombi. Meia hora nas imediações dum psica-veterinário de tal envergadura e fica o assunto arrumado. Ou seja, um gajo entra deprimido e, à falta de eutanásia portátil ou duma janela aberta, sai directo à ponte ou passagem de nível mais próxima. Macacos me mordam se o figurão não tem uma avença choruda com a Servilusa.
Bem, mas perguntar-me-ão, "agora a sério, ó Dragão, então não existem mesmo genuínos peritos no tratamento de depressões em Portugal?". Existem, claro que existem. Mas são cada vez mais raros. E caríssimos! Balurdiosos! Um bom ponta-de-lança, por estes dias, custa uma fortuna. E nunca se sabe se não vai estranhar o clima. Ou a alimentação.

Frases Assassinas - I

Ainda não perceberam que os fatigados da colonização, os dispépticos do Império estão prometidos a colónia ou, no melhor dos casos, a protectorado de Impérios alheios. Vão ser os pretos do Império anglo-saxónico, ou da "Metrópole" Espanhola, ou, sublime perspectiva, mainates na colónia balnear da Europa Esterilizada. É claro que os assimilados sonham sempre com gerências e gorjetas chorudas...

sábado, outubro 06, 2012

Um pingo de auto-crítica e dois de vergonha na cara (r)




«Não é outro a causa do teu mal; tu próprio és o teu inimigo.»
- Sófocles, Édipo Rei


Para nós, portugueses, tão grave quanto a nossa falta de auto-estima só existe uma coisa: a nossa falta de auto-crítica.
Parece um paradoxo mas não é.
O caso, tudo o indica, é que muito poucos querem ser portugueses agora, no presente. Uns porque, pura e simplesmente, não querem ser portugueses, isto é, querem ser estrangeiros ou imitá-los religiosamente -são os assimilados, tal qual eram os pretos mais evoluídos das nossas antigas colónias; outros porque querem ser portugueses do passado; outros ainda porque não sabem o que querem, se é que querem alguma coisa fora do seu perpétuo êxtase umbilical - sendo que o umbigo, não raras vezes, serve de esgoto à vesícula. Existem também umas espécies mistas -dos que querem ser estrangeiros no passado e dos que querem ser estrangeiros no futuro - que consideraremos, por economia de texto, implícitos às duas primeiras.
Daqui, como é fácil de ver, resulta não o paradoxo, mas o quotidiano: o ser português aqui e agora, em plena tempestade, à beira do abismo não lhes interessa. Por um lado, só lhes merece desdém, sobranceria, rancor, quando não ódio declarado (e daí a falta de auto-estima); por outro, na medida em que não pertencem, em que não se integram no cenário, nunca se sentem minimamente responsáveis nem são, por inerência, em modo ou tempo algum, passíveis de reparo (e daí a ausência de auto-crítica). O país vê-se assim perspectivado ou dum promontório alienígena ou dum pedestal alienado.
Não deixa de ser curioso que todos eles - os que querem ser estrangeiros, os que querem ser passado e os que não sabem o que querem porque querem tudo e mais alguma coisa -, concordam num aspecto fulcral: o sórdido presente do país não é consequência nem do estrangeiro, nem do passado, nem da preguiça volitiva congénita ou da cobardia instituída. Não, dir-se-ia que este presente infame eclodiu por geração espontânea ou por acção exclusiva daquela meia dúzia de irredutíveis que não quer, nem hoje nem nunca, fugir para o passado, nem para o estrangeiro, nem para uma contemplação maravilhosa do umbigo.
Quer dizer, há uma unanimidade em toda esta gente na desestima do Portugal presente e na crítica desapiedada aos desgraçados portugueses que ainda resistem e, por conseguinte, devem ser responsabilizados. Atente-se em como se produz o inefável concílio: para os estrangeirados a culpa é dos nacionais; para os passadistas a culpa é do presente; para os umbiguistas a culpa é dos outros.
Cumpre assim perguntar: afinal, quem são estes portugueses detestáveis do presente - os tais que não se refugiando no estrangeiro, no passado ou no umbigo, arcam com as culpas pelo Calvário acima?
Bem, certamente que não são as elites. Essas, como lhes compete e é apanágio da horda há uns séculos a esta parte, querem ser estrangeiras seja lá de que maneira for - no presente, no futuro ou no passado, mas estrangeiras. Maiores toca-pívias que as elites - do sucessozinho a qualquer preço, da vida fácil, do venha-a-nós - tenho sérias dúvidas que existam.
Também não são os agarrados da ordem - às telenovelas, publicidades, créditos e telechupetas todas que houver -, essa vasta chusma de migrantes/emigrantes, em acto ou potência, em catapulta ou lista de espera, no desemprego ou a borrarem-se de medo dele. Tais mamíferos de imitação, se as elites querem ser estrangeiras, então eles, por gana suprema, querem ser como as elites. E quando falam mal delas é, nitidamente, à maneira da raposa na fábula das uvas inatingíveis: "estão verdes, não prestam, só os cães as podem tragar."
O que é que sobra?
Sobra não sei exactamente quem, não sei exactamente como, nem sei exactamente onde, mas suspeito que, na realidade, não existe, e, se existe, então, seguramente, é uma espécie em via de extinção. Uma espécie que, com dificuldade crescente e algum desespero à mistura, luto por vislumbrar em mim próprio.


Talvez seja por isso, por gastarmos o tempo a aspirar ao que não somos e a deitar as culpas sobre algo que não existe, que acabamos por não viver nem sair de cima. Há lições que são eternas e vêm dos primórdios. Há verdades mais antigas que a nossa amnésia. Encontrar-nos-emos no lugar e na hora em que deixarmos de fugir de nós próprios.
Nem que seja para arrancarmos para sempre os olhos, por nos ser insuportável a visão do monstro em que nos tornámos.

Morte a crédito



A República feudalista barricou-se no Pátio da Galé; a Monarquia ornamental perliquitetou pela Ginjinha do Rossio. Lembra-me isto  aquele que eu sempre considerei o melhor slogan da blogosfera: "a situação é desesperada mas não é séria."
Ó Pátria, que outrora conquistaste oceanos e agora te finas em mares de cuspo!...

sexta-feira, outubro 05, 2012

Haja luz!...



Decididamente, há pessoas com uma falta de fé arrepiante. Como é que podem duvidar que já se avista a luz ao fundo do túnel?  Há uma luz mais que evidente! E aproxima-se...a grande velocidade!...

O problema é que não somos nós que vamos a caminho da luz, mas a luz que está a vir para cima de nós?  Não se pode ter tudo, ora essa!  Deixem-se de pieguices!...

Fugiu-lhes a bandeira para a verdade!...



«Bandeira portuguesa hasteada ao contrário.»

Não concordo. Por uma vez a bandeira até foi hasteada correctamente. O país é que está de patas para o ar... Não é visível na fotografia, porque no friso em exposição adjacente, pontifica um conjunto de invertebrados lombricóides por natureza destituídos de patas. O  que, como é óbvio, torna impossível qualquer tentativa de referenciação perspectivante.

Sim, está de patas para o ar e está ocupado pelo inimigo. É o chamado dois em um. Curral de gado que, após tosquia, aguarda a esfola; e valhacouto de fedífragos, rameiras e sabujos.

quarta-feira, outubro 03, 2012

Momento excepcional




Já me perguntaram porque é que eu nunca falo de futebol aqui no blogue. Bem, falo de política. Falar de política e de futebol, no Portugalzinho actual, seria redundante. Nada tem que ver, como certificam certos snobes culturistas, com uma indignidade assuntosa do jogo da bola. Por muito indigno que o futebol seja, nesse qualificativo, é seguramente menos vil e indigente que a política hodierna.  Basta dizer-se que embora pululem e açambarquem, aqueles cromos, uns quantos lastimáveis pasquins pseudo-desportivos, ainda não trepam nem se recreiam (e locupletam!) nas páginas do Diário da República. Por conseguinte, que ninguém duvide: se algum dia falar de futebol, deixo de falar de política. De resto, basta atentar nas relações que as direcções dos grandes clubes têm com os seus adeptos para constatar como são decalcadas a papel químico das relações que os políticos eleitos mantêm com os seus eleitores. Na essência, para ambos, direcções dos clubes e governos da república, a instituição resume-se a um mero entreposto comercial, uma estrita forma de extrair comissões lucrativas de transacções com o estrangeiro.
O valor do eleitor corresponde integralmente à sua capacidade de sustentar (e sobretudo legitimar manhosamente) o Estado, isto é, quem o pilota e ordenha. Ora, da mesma forma que as quotas dos sócios não conseguem sustentar o clube e assim a direcção deste passa a valorizar mais os seus clientes externos em detrimento dos sócios internos, também os contribuintes dum determinado país, a partir do momento em que não conseguem abastecer o estado de todos os semprecrescentes e luxuriantes apetites deste, promovem a que os tripulantes do mesmo transfiram a prioridade e a   finalidade dos seus serviços da clientela indígena para a exógena. Quer dizer, passa a estar mais interessada, essa espécie de jóquei prolífero e morbidamente obeso, em agradar e cumprir para com o estrangeiro do que para com a sociedade que o suporta. Precisamente porque esta deixou de ter a capacidade de suportá-lo. O que o transporta, sem grandes escrúpulos nem hesitações, à pendura de outras sociedades mais vantajosas, porque munificientes. Só pessoas muito ingénuas é que ainda não perceberam que os homens de estado do nosso tempo vão buscar o modelo não à democracia, mas à profissão mais antiga do mundo. Donde mana o dinheiro é para onde vai a dedicação, a perna aberta e a ternura dispendiosa. O paralelismo entre o Estado actual da Nacinha e a manteúda do regimento é absoluto.
Entretanto, o Estado alter-dependurado, uma vez insuportável no plano financeiro,  devém também, e muito rapidamente, insuportável no plano social. Transferindo toda a afeição para o novo mantenente, passa a despejar todo o desprezo e as agressões, recriminações e represálias mais recorrentes e impiedosas sobre  o antigo. Nada como a ruína finaceira para se invocar a crueldade gelada e retorcida das amázias de luxo. Na prática, o que geralmente acontece, sobretudo em países modernos e vanguardistas como o nosso, é que não tendo moeda para desvalorizar, o Estado desvaloriza os seus sócios internos. São despromovidos de contribuintes a confiscados. Por isso mesmo,  o  português avulso, não escorado em qualquer esquema de protecção mutualista de índole mafiosa, dum modo geral, continua sem perceber que, nesta peculiar crise de proporções cataclísmicas onde veio atascar-se, não está - nem vai - ser tratado como paciente, mas como arguido. Debalde esperará que o socorram, curem ou por qualquer forma o aliviem, quando o que exclusivamente se pretende é que ele pague pelos seus putativos crimes. Pelo que chega a ser caricato observá-lo na sua viagem para o cadafalso, onde o aguarda a execução precedida de suplício, clamando, em pranto, por uma anestesia.
Nem vaselina, quanto mais anestesia!...


terça-feira, outubro 02, 2012

Cassandras ao Desbarato (r)




Perguntado sobre o que de mais injusto lavra no país, o cidadão avulso não hesita: a Justiça; inquirido sobre o que de mais desgovernado, impestenejante, dispara: o Governo; interrogado sobre o que de mais errático, grosseiro e analfabeto, nem vacila : a Educação. E o restante vai pela mesma tabela... O mais doente? A Saúde. O mais mentiroso? A Informação. O mais vulgar e rasteiro? As Elites. O mais delapidador? A Economia &; Finanças. O mais imundo? A Asae.

É todo um país virado do avesso. A berrar pelas costuras. Mas o mais sintomático é que não estamos perante mero paleio de táxista. O problema é que a realidade escorreu e liquefez-se num sórdido charco de absurdo cada vez mais alucinante. Já não são apenas simples verbos delirantes que vão ao volante de táxis: são Cassandras. À realidade, os politólogos, pantósofos e analistas lambuzam-na, quando não estão de pata alçada nela; eles, todavia, os outrora tresloucados motolálios, doravante chocalhantes de lucidez, proferem-na.
Ressalta uma, entre muitas evidências: Não foi só a completa noção de higiene mental básica que o país perdeu; foi a inteira noção de ridículo.