domingo, janeiro 31, 2010

Da desfaçatez parasitante

O facto de serem invariavelmente tipos apinhados em blogues colectivos quem mais proclama a soberana excelência do individualismo diz tudo sobre o que significa esse "individualismo".

Não obstante, dá-me imenso gozo ver resmas de fedelhos de popa, cuja única finalidade na existência é fazer conhecimentos, arranjar contactos e cunhar amiguices, a clamarem, em tom solene e lacrimijante, pelo império do mérito e da probidade. Autênticas putas de vão-de-escada a bradarem pela moral e bons costumes!

sábado, janeiro 30, 2010

Iahvé visto por Homero


«Na gruta habitava um gigantão, que vivia solitário, a apascentar o seu rebanho. Não tinha relações com os seus vizinhos; morava só e não respeitava nenhuma regra. Era um portento colossal, em nada semelhante aos homens que comem pão.»

- in Odisseia, Rap IX

Afinal, o Mono era Poli. Femo.

Do Macaco de Sótão ao Macaco de Laboratório


Lendo isto -e nem é preciso ser com muita atenção - percebemos facilmente o que separa o reverendo Richard Dawkins do reverendo Pat Robertson: um espelho.

Ou seja, o fetichismo científico, no essencial, não se distingue do fetichismo religioso. De facto, apenas compete com ele... no acessório.

Fatalmente, a treta evangélica haveria de redundar no evangelismo da treta. Uma peçonha nunca vem só. Na melhor das hipótese (que, neste caso, coincide com a pior) Dawkins é só o upgrade de Robertson, o Robertson 2.0, ou, para usar uma linguagem ainda mais querida ao macaquinho: a "evolução" do Robertson. Ora, a urgência primeira da nova versão é declarar aos quatro ventos e brisas associadas, tanto quanto a obsolescência, a inutilidade da versão anterior. Enfim, coisas do pensamento ortopédico: uma vez na cadeira-de-rodas da ciência, o aleijadinho mental, com a arrogância própria dos novos-ricos, atira fora o deus-muleta. E trata de considerar, com a estupidez gémea siamesa da arrogância, que estar ainda mais (toxico)dependente é estar mais evoluído.
Pelo que, bem vistas as coisas, o upgrade só não é um downgrade porque o nada não tem degraus. Impossível determinar escalas na nulidade. O que disto tudo resulta, deixo ao critério e à inteligência (ou penúria dela) do leitor.

sexta-feira, janeiro 29, 2010

O Triunfo do postiço




Acontece que não sou democrático. Não gosto de democracias. Burguesas, populares, representativas, representadeiras, liberais, chamem-lhe o que quiserem: repugnam-me. Mas não as deprecio porque, em contrapartida, aprecie tiranias ou despotismos descabelados. Desprezo-as, precisamente porque desprezo despotismos exacerbados e, de todos eles, não há nenhum mais vil, absolutista e opressor do que o da mentira. E da sua primogénita mimada: a mediocridade.

quinta-feira, janeiro 28, 2010

Traídos pelo défice (ou pelo Castelo do Queijo)

Visto que hoje é 28, ontem foi dia 27 (descobri há bocadinho, dia de Santo Holocausto)... e, todavia, pasmai ó leitores, no Blasfémias, acabo de comprovar com a plenitude destes que a terra só não há-de comer porque o fogo se lhe antecipará, nem a Helena Matos, nem o (ó tempero, ó molhos!) inefável CAA se dignaram acender uma velinha que fosse. Quer dizer, nem postal, nem postala, nem postalinho: um deserto de lágrimas! Uma secura trans-saariana digna dum Paris-Timbuktu! Que pode significar um megaprodígio destes? Que poderemos esperar ou ante-visionar na sequência de tamanha despiedade? Que audácia inaudita adentanharão a seguir: convidar-me para escrever no Blasfémias?


Abaixo de cão

Os poetas - os autênticos e, por isso mesmo, raros - são tratados com menos consideração que os cães. E não me refiro aos cãezinhos da burguesia que avistamos, de pelo escovado e barriga farta, a passearem os respectivos serviçais por esses trotadeiros de bairros coquetes. Não, refiro-me a rafeiros vadios mesmo, daqueles famélicos e remelosos, abandonados à sua sorte e em espera para o desenlace final no asfalto. É que estes, ao menos, depois de mortos, são abandonados pelos parasitas. Ao contrário dos poetas: depois de mortos é que os atraem. Em verdadeira chusma.

Lembra-me um dito que havia na tropa (no tempo em que havia tropa), que servia de slogan na recepção ao instruendo:
"Estás dois abaixo de cão e três acima de polícia".
Se fosse hoje, por mim, remodelava-o:
"Estás dois abaixo de cão e três acima de polícia. O que significa que se não és poeta, pareces."

quarta-feira, janeiro 27, 2010

Deveras ou devaras

Para que houvesse segredo de justiça, convinha, em primeira instância, que houvesse justiça. Não havendo justiça, é mais que lógico - é fatal - que não haja segredo de justiça. O que há, em compensação, é todo um segredo de injustiças, ou, mais exactamente, todo um rol de injustiças perpetradas no maior sigilo - o sigilo típico das seitas, das lojecas, das capelinhas e das amigalhaçarias (ou estrebarias sofisticadas).
Da mesma forma, para que houvesse justiça no país era essencial, antes do mais, que existisse, na realidade, um país. Ora, é bem patente que não existe. O que abunda é a desagregação, metódica, obsessiva e sistemática, dum país. O que campeia e reverdeja é uma multiplicação desenfreada de egos, ruídos, micróbios descomunais e aparelhos digestivos. Com a agravante de toda esta mixórdia enxamear em regime de absoluto despotismo, durante o dia, e de tribalismo vermicular, durante a noite.
Assim, não havendo país onde guardar a justiça, falta necessariamente esta e rarefaz-se, por inerência, o segredo nesta. Não havendo recipiente onde guardar a água potável, derrama-se o precioso líquido no chão imundo, onde, em vez de matar a sede das gentes, se converte em lama e atoleiro para o humano passante, tanto quanto em parque de recreio para o suíno residente. Exaspera-se naturalmente um onde goza bestialmente o outro.
Mas porque desaparece o país? Tal qual a função faz o órgão, faz a gente o país. Em faltando aquela, mirra este. Sumindo-se os homens, devém estéril a justiça. Ora, ao ritmo com que isto marcha, o caso é que, no balanço actual demográfico, entre bácoros e humanos, não patinam apenas estes em franca minoria: já estiveram mais longe da extinção.

No país das Papoilas Saltitantes


Alguém terá -alegadamente! - pago aos jogadores do Leixões para "travarem" o Benfas. (Não travaram: perderam por 5 e acabaram o jogo reduzidos a 9). Felizmente, ninguém precisou de pagar ao árbitro da partida, nem aos trafulhas da Liga ou da polícia judicida: trabalham todos por puro amor à camisola.

Ai, ai: agora é que eu lhes fui mesmo à vaca sagrada!

terça-feira, janeiro 26, 2010

Pessoa corrigido




Pois grande será a poesia, a bondade e as danças...
- pelo menos nos breves intervalos das matanças.
Grande o mar, o sol e a efemeridade dos prazeres;
mas o melhor do mundo, mesmo, são as mulheres.
-Sem elas é que, de todo, não haveria crianças.



sábado, janeiro 02, 2010

Silêncio


Sabem os entendidos das coisas do mar que um profundo silêncio antecede, por regra, formidável tempestade.