sexta-feira, fevereiro 29, 2008

Desgresso

E para aqueles que se babam com as glórias do instante a ferver, e proclamam as maravilhas do progresso da última moda, vale sempre a pena comparar a moral do nosso tempo, pilotada por miniaturas de cata-vento, com dois simples aforismos:
1. «Anima-te por teres de suportar as injustiças; a verdadeira desgraça consiste em cometê-las»;
e 2. «Haverá flagelo mais terrível do que a injustiça de armas na mão?»

Ambos foram escritos há mais de 2 milénios. Respectivamente, por Pitágoras e Aristóteles.
E razão tinha Hesíodo.

Húmus sapiens

Quando oiço dizer que grassa a impunidade, sorrio amargamente. Toda a moeda tem um reverso. Ora, se há impunidade para algo decerto não abunda para o seu contrário. Se os corruptos vicejam, abre a caça aos honestos; se a mentira é premiada, vituperada será a verdade; se a subserviência e a sabujice conquistam a corte, resta a valeta aos vertebrados.
Num mundo às avessas, a contaminação também é uma forma de higiene; a sujidade também é uma forma de limpeza.
Não há impunidade, meus amigos. Se julgais isso, estais redondamente enganados. Sei bem do que falo. Tenho não apenas grande, mas recente e bem viva experiência. Pelo contrário, cada vez há menos. Mais assanhados e torcionários que os medíocres não existe. Mais vigilantes, esbirros e persecutórios não encontrareis em lugar nenhum de nenhum tempo. Se não garantirem a terraplenagem, a rasteiragem absoluta, a forragem mental, como poderão sobressair, destacar-se, reluzir que nem torres sobre um mar de vermes anilídeos obrigatórios?
Como qualquer bom cancro, representam a parte que, não contente de se marimbar para o Todo, desata a carcomê-lo, a destruí-lo, em suma, a convertê-lo à sua imagem e semelhança. Na proporção ínfima, escaninha e perversa, que o caracteriza, o micróbio quer imitar e usurpar Deus. Lateja em ímpetos de absorver galáxias.
E não é apenas o triunfo dos porcos: é, sobretudo, a Idade da Vermicompostagem e do Húmus sapiens. Vós sois a minhoca. Com que eles pescam? Não, com quem fazem o hamburguer.

quinta-feira, fevereiro 28, 2008

Termópilas

Este blogue, segundo o visitómetro, oscila entre os trezentos e os quatrocentos leitores/dia. Bem, digamos que são trezentos. Não me levem a mal, mas prefiro "Trezentos". Tem história. É um número lendário. E agora, que me aproximo das Termópilas e já escuto o fragor da tempestade que se anuncia, tem a sua graça que Trezentos me acompanhem.

Trabalhos na estrada


Este blogue está provisoriamente com o template merdoso, por motivo de obras. O template sublime estava instável, com manias, a desaparecer e aparecer quando lhe apetecia, a embirrar com os leitores, a gozar comigo, pelo que chamei o Webmonstro para se entender com a criatura.
Eu sei, a mim também me dá vómitos. Mas é só por um dia.

Actualização: Já não está. Se alguém ainda tem problemas, pronuncie-se.

Declaração de interesses



Admiro espíritos, não admiro espelhos.

quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Correio dos Leitores - Verdade, Exagero e Mistério (3ª parte)


E chegamos, finalmente, ao mistério, esse vau derradeiro.
Sibilino, o leitor, profere: «O mal desta merda também é os gajos que teem muita prosa mas passam o dia com o cu sentado no banquinho a falar mal de tudo e de todos». Há aqui algo de profundamente misterioso. Vou tentar, numa primeira etapa, traduzir; e, numa segunda fase, decifrar. Pelo meio, armarei o embrulho e a confusão do costume. Apertem os cintos e vamos a isto!
Ora bem, "gajos que passam o dia com o cu sentado no banquinho a falar mal de tudo e de todos", suponho que se tratem de gajos atracados num snack, cervejaria, tasca ou petisqueira. Ou então nalgumas repartições públicas. Certamente não se refere a blogadores. Pelo menos eu, quando estou sentado ao computador, a dactilografar estes humildes postais, além de não destratar tudo e todos como já lhe expliquei exuberantemente, também não falo. Estou aqui caladinho e concentrado. De resto, o meu computador é ainda mais bronco do que eu, pelo que, mesmo que eu arrazoasse com ele, não entendia nada, o palerma. Porém, admito que possam existir computadores inteligentes e, eventualmente, blogues seus derivados - pois se até bombas já há. Também não me custa aceitar que, ao jeito de escolas de boas maneiras para cachorros, possam haver por aí academias de línguas para computadores - glossopicadeiros trepidantes onde estes tamagógicos seres aprendem a fazer postais à voz do dono. Ou do cão. O meu, infelizmente, ainda não é desses: ainda não argumenta e filosofoca sozinho. Nem executa acrobacias, passerelles ou piscinas, tão pouco. Mas, vá lá, tem a vantagem de não ter que andar eu de luvinha atrás dele.
Por outro lado, também não me sento em banquinho, mas numa velha cadeira. Portanto, tudo somado, é intrigante: não tenho muita prosa, não sento o cu em banquinhos, não passo o dia nisso, piloto silencioso que nem um túmulo, logo não é a mim que o caro leitor alude. Quem será? Ou então, daí, donde me está a mirar com esses que a terra lhe há-de jantar, não só não me está a ver bem, como, diria mesmo, o subjuga tremenda alucinação ou delírio.
Também a expressão inaugural "o mal desta merda" me causa espécie. Qual merda? O país não é, certamente. Concederei que o governo é uma merda, que as elites são uma merda, que os partidos são uma merda, que o regime é uma merda, que a televisão é uma merda, que a imprensa é uma merda, que a cultura é uma merda, que a universidade é uma merda, que uma vastidão de abcessos institucionais e super-gatunos privados são uma merda, mas o país não é nem pode ser uma merda. De modo nenhum! E por uma razão muito óbvia e simples: o país padece-a, à reles e fecal substância. Sustenta-a e suporta-a. Carrega com ela, estóica e abnegadamente, pela ladeira abaixo. Mas por isso mesmo não a pode ser. Fazem dele uma merda, põem-no - pior que no faz-de-conta - no faz-de-merda, mas merda é que ele não é. Merda é apenas quem o faz fazer figuras dessas. Quem se faz passar pela merda que ele não é, nem nunca foi, nem nunca será. Porque ele é ou não é, país. Merda é que nunca.
Queixa-se então, o leitor, do mal de qual merda? - Do governo? Dos partidos? Da televisão? Dos cleptocratas com alvará e concessão? De qual exactamente? Mas, agora reparo... diz "mal da merda"... Qual mal? O mal da merda seria certamente o nosso bem e o bem do desgraçado país. Ora uma merda tão ufana, triunfante e soberba, mal é que não sofre nem experimenta, só acumula o bem, melhor dizendo, os bens. Mal?... Mal é de nós!, reféns da merda e expropriados do país.
Ou então, por especial deferência, admitamos que de facto, e apesar da caleidoscópica miragem, o leitor abespinhado, com esses "tais sentados militantes a dizerem mal de tudo e de todos", significa na verdade os blogadores impenitentes. Nesse caso, olhe, atentando bem, até faria sentido. Eu, por exemplo, até me orgulharia de ser o "mal dessa merda", isto é, dessa quinquilharia mental que vermina e desliza pegajosamente pelos corredores e vestíbulos do rapa-tacho. Digo-lhe: não me importava nada. Mesmo sabendo que toda a minha prosa seria pouca e todo o mal possível seria ínfimo. Apenas, talvez, um pouco menos insignificante do que é.
Mas se os significa a eles e a mim, ressalta, acima de todos, um enigma maior. Afinal, onde reside o problema:
Em blogarmos durante o dia? - Se fosse durante a noite já não haveria problema?
Em blogarmos sentados no banquinho? - Se fosse numa cadeira, num sofá, numa poltrona ou num caixote, seria mais aceitável?
Em blogarmos sentados? - Qual a posição que não o escandalizaria? De pé? De gatas? De cócoras? A fazer o pino? À canzana? Deveria compendiar-se um Bloga-sutra onde viriam consignadas todas as posições apropriadas, condignas, quiçá higiénicas, saudáveis, iogis, eventualmente sujeitas a fiscalização pela ASAE?...
Em blogarmos sentados com o cu? - Sugere que talvez devêssemos sentar-nos com a cabeça, pensarmos com o cu e dactilografarmos com os pés? Bem, deve ter razão. A Moda até já deve ser essa. O arcaico e obsoleto, mais uma vez, sou eu. Vendo bem, espreitando em redor, é bem provável que a maioria já faça assim.
Está o mistério resolvido.
A ti, leitor, seja lá quem fores, agradeço-te a crítica. Pois como dizia Aristóteles acerca da verdade: ninguém falha nem ninguém acerta completamente uma porta.

Chama o Guterres!...


E mais um pacote de pipopas para se irem entretendo a rilhar no intervalo...

Através da besta do Timshel, que lê merdas inenarráveis e outras coprologias inóspitas, fico a saber desta seguinte pérola do JotaPum-Pum: "O que é que acontecia se aparecesse alguém a falar normalmente com dúvidas, reconhecendo erros, hesitações, com convicções mas sem tanta certeza, discutindo mais do que proclamando? Cada vez me parece mais que talvez, talvez, tivesse uma oportunidade. Não sei. talvez."
Portanto, segunda esta receita peregrina, para que tudo melhore consideravelmente, basta que os políticos deixem de discutir política (coisa que seriamente não fazem, não sabem nem querem saber) e passem a discutir a relação com a maior das seriedades... como aqueles casais modernos em pré-divórcio. Enfim, o país está transformado numa novela da TVI. E o Pacheco, feito conselheiro matrimonial, o que lhe recomenda é que se assuma. Abençoado cura!...

E o pacóvio do Timshel, com aquelas sinapses que Deus lhe deu e o tintol arruinou definitivamente, acha que isto é um sinal de maturidade. Maturidade?!, abisma-se o leitor. Pois, pois é, leitor: Ma-tu-ri-da-de. Mas não se espante: é como agora chamam à mariquice. E à gralhada choramingas.
É isso que queres?
Governar de malmequeres
política a supositório
palanfrório
e clisteres?
- Olha, chama o Guterres!...

Bode's Delusion

Como interlúdio para quem não gosta de cansar a vista e prefere fatigar a mente, aqui fica uma pergunta em dilemática forma:
O que é que é mais perigoso ou prejudicial a uma causa: ser atacada por estúpidos, ou ser defendida e sustentada por mentecaptos? Ou dito doutra forma: "qual é o maior risco para um castelo: ser atacado por aleijadinhos ou ser defendido por paralíticos enfezados?"

(Eu dou uma ajuda à resposta: há quem diga que o maior risco para a vítima é um mau advogado.)

Correio dos Leitores - Verdade, exagero e mistério (2ª parte)



Falarei, em seguida, do exagero.
Pois bem, o leitor exagera quando proclama e decreta, logo de chofre: «O mal desta merda tambem é os gajos que teem muita prosa mas passam o dia com o cu sentado no banquinho a falar mal de tudo e de todos».
E, repare, exagera em dois sentidos: 1. quando diz que "têm muita prosa" - é claramente um exagero, porque muita prosa tinha o Dostoievski, muita e boa -; e 2. quando deduz que "falam mal de tudo e de todos" - exorbita nitidamente, como lhe passarei a demonstrar.
Em primeiro lugar, nunca aqui, que me lembre, falei mal, a não ser que se refira àquelas caralhadas, conas da tia, putas que pariu e demais pirotecnias vernaculares indispensáveis a qualquer português genuíno. (Como deve saber, o português paradigmático inteiro é constituído por duas metades: um Bocage no hemisfério esquerdo e um Agostinho Macedo no direito. Exemplo mais aproximado que eu dificilmente encontrará em lugar algum.) Mas decerto não se refere a essa artilharia gráfica que alguns enfezados literários, todos abstémios e assépticos, taxam de coprolalia. Refere-se, outrossim, na sua áspera invectiva, se bem o vislumbro, ao acto de menoscabar, caluniar, insidiar, vituperar alguém ou alguma coisa. Coisa que, far-me-á a justiça, também nunca aqui perpetrei: caluniar, desdenhar ou menoscabar é um tipo chamar excremento a um palácio. Ora, o que eu faço é, sempre que se me depara, chamar excremento a um excremento. Não procuro dizer mal: procuro dizer a realidade. Tenho culpa que o esterco pulule em cornucópia? Preferia talvez que eu chamasse palácio ao excremento? Lamento, mas nem em acto nem em potência. Nem nas fábulas, sequer, me lembro de alguma vez qualquer fada madrinha ter operado a partir de fezes sólidas. Abóboras, ratinhos, peças de frutas, ainda vá lá, mas bosta humana é que não.
Além disso, o meu cuidado, fará a fineza de concordar, não se tem limitado ao rigor no retrato ou à veracidade na reportagem: também tem primado pela adequação na atitude. Aos dejectos, sociais ou políticos, tiro-lhes o retrato, não me rebolo com eles. Sobretudo, faço por não cair numa figura muito patética que por aí se pratica: gente zangada, desgrenhada, vocifeirante, a apontar excrementos em toda a parte (o que não é difícil, porque de facto eles abundam se é que não formiguejam), porém, sem tento nem tino, a ralhar e a barafustar à desfilada, do alto de pedestais de virtude onde entrevemos, por entre os clarões e negrumes da borrasca, reedições em calças da Titi do Raposão. Até já vi tipos adultos, presumo, a desafiarem cagalhões para a porrada; outros, positiva e quase ininterruptamente, engalfinhados neles, numa zaragata homérita que só visto. Sujamente visto, neste caso. É triste. Nessas romarias não me meto. Se aponto um excremento, em poltrona ou altar, é para me rir dele. Para nos rirmos, eu e os que comigo gargalham. E quanto mais adorado, mais idolatrado e campeão da Jet-seita, mais riso merece. Mas a boa distância, de largo, que o alcance da pestilência não é pequeno. E sabendo que é sempre preciso redobrada atenção, não se vá descarrilar no bizantinesco caso da ralhadela desarvorada ao dejecto mais não soar que àquela velha e típica frase: "está verde, não presta, só os cães o podem tragar!"
Por conseguinte, ó caro leitor, exagerou bestialmente: nem digo mal, nem mal de tudo e muito menos de todos. Ao contrário de si, que, logo por azar, veio acusar-me de maledicância num postal em que eu bem-dizia os grandes das nossas letras em justo contraponto aos excrementos da nossa praça. Atarantado com um barrote, largou a recriminar-me um cisco. É certo que ainda tentou atenuar a coisa, em jeito de compensação, quando me amnistiou metade da pena, condenando-me apenas a passar aqui o dia. Agradeço-lhe ter-me poupado a noite, mas, mesmo assim, é exíguo como indemnização.

No postal seguinte, finalmente, procederei à autópsia do mistério.

terça-feira, fevereiro 26, 2008

Correio dos leitores - O Português: verdade, exagero e mistério (1ª parte)



Entretanto, pelas caixas de comentários abaixo, leitores desconsolados debulham-se em rebates e queixumes que só fazem é angustiar-me e submergir-me na insónia crónica.
Até porque repica uma objecção que volta e meia me aventam, começo por um caso gravíssimo, a quem já respondi sucintamente na própria caixa mas que, dado o clamor triplo que concatena -ou concadela, não posso jurar -, considero útil administrar um cuidado paliativo extra. E concatena -ou concadela, talvez - um clamor triplo porque congrega no mesmo pacote uma verdade, um exagero e um mistério.
Vamos à verdade. Cintila e relampeja quando o caro leitor digifera:
«O Português vai ser sempre a mesma merda porque só a vê em todo lado, tudo está podre, tudo está infecto, nao há solucão!»
Ora bem, há alguma verdade nisto, não há como negá-lo, nem vislumbraria eu qualquer vantagem em tal. O português, de facto, pela-se pelo bota-abaixo, pela sátira, pela anedota, pelo escárnio, pela detracção e por todas essa gimnochocarrices associadas e convulsivas. Porém, isso não é defeito. Não senhor, é feitio. Faz parte essencial da circunstância de ser português. Porque é que julgam que o telemóvel e o automóvel entre nós usufruem da dignidade soberana de próteses nacionais? Ora, porque amplificam o alcance e a oportunidade para o exercício dessa idiossincrasia, nem mais. De resto, entre nós, televisões, rádios, jornais, blogues, etc.,etc., são mero pretextos para dizer mal. Todos os dias. Todavia, o português, o genuíno, o autêntico -ainda grande parte da população, apesar de tudo-, não diz mal por maldade: diz mal por necessidade. Quem não diz mal, em Portugal, na hora presente, ou é porque está armado em estrangeiro, ou é porque está morto. Há ainda outra razão capital que já explico, mas esmiuçemos, para já, estas.
O português, num aspecto deveras mimoso, não se distingue actualmente da grande maioria dos povos europeus: todos são sodomizados e fazem geofelatios à americana, excepto os ingleses que é mais anillingus ininterruptus. Só que os alemães, franceses, italianos e restante pelotão da frente, além de já estarem habituados há mais tempo, além de gostarem por vício e além de até em boa medida merecerem, usufruem de outros a quem podem por sua vez sodomizar, o que, em parte, lhes serve de desculpa e alívio. O problema é que entre esses outros estamos nós, portugueses. O que, pelo meio d'outras coisas pouco edificantes, significa que temos o pelotão da frente todo atrás de nós, uma grande nave alienígena os pulverizasse a todos!... Ora, o português, o português que se preze, não gosta de ser montado. Tendo, em tempos, andado ele a cavalo, permaneceu nostálgico, renitente, alérgico. Montam-no - montam-no os europeus, montam-no os americanos, montam-no os chineses, até já o montam as suas antigas montadas -, mas ele não gosta. Dir-me-á que é um igrato? Mas o certo é que não há maneira de se habituar. Desdenha, resmunga, rosna, diz mal. É a réstea de dignidade na valeta da abjecção. A sua língua é a sua torre de menagem, o último baluarte. Come mas não cala; engole mas vomita.
Depois, existe aquela minoria de pseudo-portugueses, geralmente arvorada em elite, mas que não são mais que delegados de propaganda mérdica do estrangeiro. Esses, compreensivelmente, não dizem mal: têm a língua ocupada com outras ginásticas mais gratificantes, a boca cheia de mastigarem o erário público e entufam bolsas à maneira dos esquilos e doutros roedores armazenistas da república. Tudo junto, dá um monturo considerável, senão mesmo um himalaia de bosta, mas também um excelente combustível para o fogo posto e ateado da malfalância.
Finalmente, resplandece aquela outra razão capital para o luso-maledichote galopante que eu prometi revelar. Consiste num indivíduo único que açambarca e megafoneia de tal ordem todo o bem que se poderia dizer do país, que mesmo todos os outros juntos a debitarem mal, dia e noite, não são suficientes para equilibrarem minimamente a balança - e a maior chatice é que acumula com as funções de primeiro-ministro.
Por conseguinte, não se agaste o leitor com os portugueses, nem comigo por ser um deles até à morte. Em boa verdade, não necessitamos de nenhuma (nas suas severas palavras) "merda" especial, mágica ou miraculosa, que nos "faça abrir a pestana". A pestana temo-la nós aberta, oh se temos!, e tanto assim é que vemos bem a porcaria que nos assola, encurrala e oprime. E tão bem a topamos que a vemos claramente vista (como dizia o ilustre zarolho) em todo o lado, pois em todo o lado ela se instala, abivaca e monta loja. Não, amigo leitor, o que nós precisávamos mesmo, o que carecíamos já quase em desespero, era dum remédio santo, urgente, cicatrizante, que nos ajudasse a fechar e a trancar devidamente este maldito olho que, embora cego, anda desmedidamente aberto, mal frequentado e só o que faz é mirrar-nos e encerrar-nos os horizontes.


E agora, se me dá licença, escalpelizada que está a verdade, deixaremos os outros dois fregueses - o exagero e o mistério - para o postal seguinte. Aos restantes leitores, gente distinta, convém-lhes que eu não os mace excessivamente, e a mim convém-me fazer render o peixe.

As 12 palavras de Hércules

O Luís Simões, que é poeta com um talento muito especial para aforismos (já lhe topei alguns de boa cepa), teve a amabilidade de me convidar para um desafio de 12 palavras. Como eu estimo todas as palavras da língua portuguesa, o que fiz foi aquilo que os medievais chamavam bibliomancia: consistia em abrir a Bíblia à sorte e atentar no que lá anunciava. Neste caso, porém (e por razões óbvias), pratiquei com o Dicionário da Língua Portuguesa. Abri-o doze vezes ao calhas e o resultado foi o que passo a expôr:
- Herdade; Rapinador; Uliginário; Iluminação; Orelhão; Retábulo; Flagelação; Pêntodo; Exótico; Etapa; Paripinulado; Encarapuçar.

Tudo isto deve ter um qualquer significado esotérico que me escapa, mas que -excepto o "orelhão", delator claro da minha colossal burrice - vou tentar decifrar numa próxima passagem pela condição animal. Entretanto, tratarei de pensar em 12 vítimas a quem flagelar com mais esta corrente. Fora os três que, desde já, levam com ela e por uma razão muito simples: são os meus monárquicos de estimação.
Portanto, ao JSM (com dois abraços que lhe estou em dívida); ao Afonso Henriques (com saudações ao Jaime); e ao Corcunda (pela sua coerência e constância a toda a prova. Até porque, mais ainda que castelos, admiro catedrais na areia.)

PS: O postal chama-se 12 palavras de Hércules porque para levantar o dicionário em causa é quase precisa uma força de Hércules. Como sou forte e irascível, mas não tanto quanto o lendário filho de Zeus, infelizmente, tive que recorrer a uma mini-grua.

A Certeza fundadora

A verdade é que aldrabei no postal anterior. Propositadamente. Porque, de facto, o que o texto original de Hesíodo diz não é "No princípio, gerou-se o Caos". Não, em rigor, o que afirma é: "primeiro que todos surgiu, certamente (ou verdadeiramente), o Caos".
Por conseguinte, sabemos mais qualquer coisa além de que ele foi "o primeiro de todos": sabemos que isso é uma certeza, uma verdade. Que não há dúvida que primeiro que tudo esteve o Caos. E este pormenor da certeza, do não haver dúdida, como devem calcular, é um detalhe extremamente significativo.
Porque esta certeza num caos anterior donde emerge e se resgata um cosmos não mais deixará de presidir ao processo de reencarnação cíclica do mito. Essa certeza no caos, no horror prévio donde brota a beleza celestial, devirá o fundamento invariável de todas as arquitecturas civilizacionais - de todos os "progressos". De tal modo que, transpondo agora aos nossos tempos, a erupção duma nova ordem -pensemos por exemplo no episódio comunista - mais que o nebuloso projecto num céu futuro, funda-se e constrói-se na certeza dum caos precedente. O a-topos (a utopia) celestial radica, assim, e invariavelmente, num a-topos tenebroso.
Quer isto dizer que as novas ordens não vivem apenas da efabulação duma utopia futura: vivem sobretudo do engendramento duma utopia passada. Como sustentáculo para um lugar que não existe ainda no presente (nem acabará por nunca existir no futuro) precisam dum lugar que nunca existiu no passado. À falta dum certeza no futuro, encasulam-se, galvanizam-se e aturdem-se com a certeza no passado - a certeza no caos.
É assim que, citando agora um exemplo próximo e doméstico, a nova ordem do 25 de Abril, muito mais que num qualquer projecto idílico de que percebe e anuncia vagamente os contornos, justifica-se na certeza desse caos anterior, subitamente escancarado, da "longa noite fascista".
Lei fatal: Toda a ordem parte da descoberta dum caos. Uma descoberta que, no caso humano, é predominantemente uma invenção. Tanto quanto uma necessidade arquitectónica. Sem um horrendo caos anterior a sustentá-la, a nova e bela ordem ruíria em três tempos.

segunda-feira, fevereiro 25, 2008

A Força do Mito

Eu acredito que os mitos se repercutem através dos tempos. Revisitam-nos ciclicamente. Há um, pelo menos, que é prova disso. E é um mito tanto quanto uma ideia hipnótica. Foi Hesíodo quem a patenteou para a posteridade na sua Teogonia, quando registou: "No princípio, gerou-se o Caos".
"No princípio" significa aqui "antes" - antes do tempo, antes da história, antes da ordem, antes do cosmos, antes de tudo. O Caos será posteriormente o "indeterminado" de Anaximandro, que é o primeiro a tentar dar-lhe vestes filosóficas, mas o caos é, sobremaneira, esse proto-topos e proto-tipo donde tudo emerge - desde o cosmos à própria possibilidade da linguagem, ou seja, da istória (que é mythos mas também é lego). Com a agravante, nisto tudo, do proto-topos ser simultaneamente um a-topos, isto é, o lugar primordial é um não-lugar, porque está antes e fora de todos os lugares. Tudo o que o texto nos diz sobre ele resume-se, de resto, a uma palavra: "protistos". O primeiro de todos.
Mas um antes, necessariamente, pressupõe e desencadeia um depois. Tal qual um primeiro institui outros, restantes e seus subsequentes. A ordem é, assim, e igualmente, uma sucessão. Ao Caos sucede e acontece o Cosmos. Nisto, timbra-se a primeira noção de progresso de que há memória. Constitui-se um cosmos como um progresso a partir dum caos. Um cosmos que a história e a palavra vão iluminando e patenteando, em contraposição a um caos sombrio, inóspito e anterior. Não é coisa insignificante, como iremos ver.
No exercício da ambiguidade típica do pensamento grego, Hesíodo, tendo estabelecido esta ideia de progresso cosmogónico na Teogonia (onde basicamente trata da condição divina), fundará, todavia, nos Trabalhos e os Dias (onde reflecte sobre a condição humana) uma ideia diametralmente oposta. De facto, aí, com a sua teoria das Idades, apresentará a história humana como uma decadência decorrente duma Idade do Ouro primordial até uma Idade do ferro actual (ao tempo dele) e que agora, no nosso, decerto oscilaria entre a Idade do Plástico e a Idade do Lixo. Dito sucintamente: para Hesíodo, a História do divino reflecte um progresso; a História humana ostenta e está condenada a uma decadência. Quiçá, como se o divino protagonizasse uma força que se ergue e diferencia do caos; e o antropológico uma fraqueza que para ele tende e regressa.
Só que o antropos, mais tarde apelidado e reduzido a Homoios, tem essa coisa chamada Hubris a trabalhá-lo. Não o larga para onde quer que vá. Impele-o obsessivamente para a mistura, para a Hybridação. A história atesta como passa o cosmos a recriar o caos em forma de balbúrdia, de babel. Mas não é apenas com a bicharada e a macacada que se confunde - bem mais sinistro: é também com os deuses. Quanto mais baixo resvala mais rebenta de ambição. Como na fábula do batráquio a inflar-se para ruminante. Porfiadamente, o mortal cobiça o eterno, quer transformar os seus "trabalhos e dias" numa "teogonia". Anseia transplantar-se para outra história menos penosa e fadada ao fracasso, à decadência e à dissolução. Isto, ao mesmo tempo que se vai cada vez mais afundando nelas. Projecta-se deus, no espelho celeste, do fundo dos abismos. O seu trovão é um clamor das profundezas; o seu raio um mero vulcão de desespero.
E é assim que, dois ou três milénios mais adiante, vamos encontrá-lo. Adolescente ébrio a acelerar e artilhar tunnings numa teogonia roubada...aos próprios pais. E hoje, fardado de Deus, em frenético e patético carnaval, lá marcha, suíno doravante alado, supersónico; anjo democraticamente saguim. Mas perguntem-lhe pelo caos. Disso ele sabe, é doutor. Tem a escola toda. Já se lhe entranhou até aos ossos. Escorre-lhe pela medula, a esse aprendiz de Medusa.
Perguntem-lhe em Paris, em 1789... "O Caos? Não tem nada que saber: Antes de nós era o Caos!...", roncará. Perguntem-lhe em Lisboa, em 1910: a mesma resposta, com igual empáfia. Perguntem-lhe ainda em Moscovo, em 1917, perguntem-lhe em Berlim em 1935, ou perguntem-lhe outra vez em Lisboa, em 1974: idem aspas, com descomunal jactância.
É verdade. Antes deles era necessariamente o caos, depois deles, ou sem eles, será sempre o dilúvio, o abismo, o caos recauchutado. É esta a receita. E a sina desta teogonia de pechisbeque, desta génese e batalha cosmética entre deuses de chumbo, deuses de plástico e deuses de lata.
Sem um caos prévio como poderiam eles emergir -melhor, donde brotariam eles? Sem um caos de pedestal onde se poderiam eles plantar em gloriose? Sem o abismo e todos os demónios que lá fermentam e decocam, viriam eles, bombeiros municipais e voluntários do universo, salvar-nos de quê?
E triste de quem não percebe que reside nesta mania "cosmogónica", nesta tara progressista a tradição mais antiga e avassaladora da nossa cultura.
Basta ir perguntar aos cristãos triunfantes do império... "O caos? - Ora essa, que pergunta! - Rir-se-ão. - Antes de nós era o caos!..."
E depois deles, naturalmente, será o dilúvio. Aliás, já foi. Pois, assim como para os outros o mundo, segundo garantem, principiou em 1789, para eles dir-se-ia que acabou.

Percebeis agora a força dos mitos, ó onanistas do conhecimento e da lógica?
A razão é só a pornografia do mito.

domingo, fevereiro 24, 2008

A barriga do Eça

Ora bem, no decurso da rude abordagem e subsequente rol de patifarias, violências e deborda-forações aqui recentemente perpetradas, um dos passageiros do infausto galeão maltratado decidiu insurgir-se contra a qualidade do serviço. Em voz indignada, num escândalo incontido, bradou:
«O Eça andou a comer à conta da mesa do orçamento do estado e da mulher e assim, bem podia pregar o que quisesse, sempre de barriga cheia.»
Vamos lá a ver, ó caro senhor: de barriga vazia, nem o Eça nem ninguém, consegue pregar coisa que se veja. A maior parte do tempo, terá que andar à cata de côdea para lá meter; a sujeitar-se a sabe Deus o quê para angariar sustento; e a delapidar o melhor das ideias com essa opressão solene do sórdido come-e-caga.
Por conseguinte, se o orçamento do Estado e o orçamento da esposa serviram para encher a barriga ao Eça, abençoados orçamentos que para alguma coisa de jeito serviram. Bendita ilha num oceano de delapidações frívolas e inúteis! Acredite pois: não só não vejo nenhum inconveniente nisso, nenhum deslustre moral, como não me parece, sequer, que existam. Ignóbil, vil e pocilgabundo, considero, isso sim, quando o orçamento do estado serve para sustentar catervas de medíocres, exércitos de incompetentes, chusmas de ineptos e enxames de puros filhos da puta, como é hoje, em regime de soltura, o caso. Ou seja, que o dinheiro do estado sustente ou ampare tipos talentosos, gente que engrandece o país, não vislumbro nenhum mal e, pelo contrário, classifico da mais elementar justiça. Agora, que o erário público sirva de mama vitalícia a anõezinhos, parasitas, pilha-comissões, respectivas famílias, amigos, compadres, vizinhos e outros badamecos coalescentes que só diminuem esta nação, a reduzem à mendicidade económica, à indigência moral e, de arrasto, a transportam à cova escura, aí, sem a menor dúvida, reconheço, além duma infâmia sem nome, uma hecatombe geral.
De resto, o problema actual do Estado e respectivo orçamento é precisamente o estar convertido no tabernáculo da mediocridade e da safadeza, já para não falar da mais vil traição e proxenetismo. Há quem diga que há cem anos também já era semelhante. Pois, mas há cem anos ainda pagava ao Eça, ao Oliveira Martins, enquanto agora só empanturra e locupleta micróbios e percevejos. Quanto mais não fosse, aí teríamos uma prova eloquente da vantagem da monarquia do Sr. Dom Carlos em relação a esta nhanhocracia de três vinténs. E isto apesar da monarquia do Sr. Dom Carlos, como ele próprio amargamente constatava, estar tudo menos de boa saúde.
Mas pior ainda que tudo isso, por incrível que pareça, é o facto e o caso do actual Estado e respectivas famílias aboletadas se constituírem como mecanismo exterminador, desmobilizador e terraplenante de toda e qualquer manifestação ou eclosão de real talento neste país. Mais, nesse capítulo, Estado e policiativa privada dão as mãos e esmagam em conjunto. Trituram e liquefazem. São vasos de merda comunicantes; e são vasos de guerra unidos contra o futuro e a sanidade mental, já de si exausta e exígua, deste povo e deste resquício de país. O que qualquer aprendiz deserdado de artista explica - quase instintivamente - a outro é que "ou desposas, sabujas ou chafurdas com um deles, ou não vais a lado nenhum!"
Por outro lado, e por todo este zoológico que já naquele tempo abundava, sendo rico por parte da mulher só beneficiava e fortalecia o Eça, não só no património e na tranquilidade necessária à concentração e elevação criadoras, como, sobretudo, na insubserviência ao Estado e aos seus mandarins do dia. Permitiu-lhe, enquanto escritor, não ser um bivalve apaniguado, um papagaio de carroça, um mero lacaiozito a soldo da burrocracia -ontem como hoje - instaurada. Que o Eça não partilhasse das minhas ideias e humores políticos, nem a mim me incomoda nem a ele o despromove. Que ele tenha auferido de luxo e eu de pobreza, melhor para ele, pior para mim. Que poderia ele ter feito melhor, não direi na política por respeito a quem de mim discorda, mas na obra literária, quero crer que sim, que tinha talento para bem mais. Eventualmente, para lá do português do seu tempo, devia ter alvejado o Homem de todos os tempos. Tolheu-o, quiçá, por ironia do destino, o provincianismo atávico e o luso-umbigismo endémico.
Mas com todas as suas virtudes e defeitos, ao Eça -como ao Ramalho, ao Oliveira Martins, ao Camilo, ao Herculano, ao Bocage, ao Cesário, ao Camões, ao Pessoa, ao Vieira, ao Gil, ao Almada e a todos os grandes das letras deste país -, o que tenho para lhes dizer, do fundo da alma e do coração, hoje e sempre, dê lá por onde der, tussa a vaca, muja o boi, é um "MUITO OBRIGADO, CAVALHEIROS!" Possa eu chegar-vos algum dia aos calcanhares e já não irei mal, nem corará a pátria mãe de todos nós.
Tão pouco seria digno dum homem, quanto mais dum Dragão, andar a aliviar-me das digestões pelos toutiços das estátuas: mais pareceria um pombo empapuçado, anilhado e arrulhejante.
Portanto, ó senhor sicofanta da barriga do Eça, antes de enviá-lo borda-fora, quero que saiba e se compenetre do seguinte: é mil vezes preferível um orçamento que sirva também para atestar a barriga ao Eça do que um Orçamento que serve apenas para encher o cu a todas estas antas e bacilos ambulantes. E agora, se quer discutir pentelhuras e naniquices, discuta com os tubarões! Tenho dito.

sábado, fevereiro 23, 2008

Orelhas à la planche

Caro MCB, se julga que me equivoquei, julga bem. Sou um equivocado nato. Mal estava a sair da fábrica materna e reparei logo que me tinha equivocado. Que, para minha infinita penúria, estava a nascer na espécie errada, no planeta errado e no tempo mais que errado de todos. Pior que isto, só mesmo ter nascido verme, micróbio, barata ou americano. Mas, em contrapartida, se julga que eu insinuei porcarias e torpezas dessas, julga mal, julga péssimamente, tresjulga, e está, claramente, a querer competir comigo para o título mundial de equívocos pesados. É uma tentativa relevante, determinada, mas não desperdiçe talento e energias: sou campeão mundial vitalício, perpétuo, indestronável. O cepro, a coroa, o trono, o império, do equívoco, são todos meus. Não estão ao mero alcance humano. Tenho uma vida inteira devotada ao desporto. Sou, da cabeça aos pés, sem esquecer as mãos que muitas vezes com eles permuto, um mapa vivo e ambulante de taças, medalhas e cicatrizes. Só o faqueiro triunfal que carrego nas costas, qual Atlas da quixotice, deixaria prostrado e ofegante qualquer estivador audaz (ou andaluz) logo ao fim de passo e meio, se tanto.
Por conseguinte, não desça Vossência da inteligência que possui e da consideração que lhe tenho, e trate de não confundir ironia com insinuação. Porque era simples a ironia. E não cuidava de apontar vilezas que de todo não vislumbro, mas uma incongruência óbvia que o meu caro amigo faz por reavivar e reeditar em mais uma versão revista e aumentada. Precisamente quanto reincide a perguntar-me, e cito: "Ora diga lá com franqueza se o Pacheco Pereira e o António Barreto - nunca os vi, nunca com eles falei - não farão alguma diferença no cômputo de cretinos e sanguessugas que polvilham a ressequido bolo do regime ?"
Note bem, pergunta-me a mim, César Augusto Dragão, pelo Pacheco Pereira ou pelo Toninho Barreto. Acha que é pergunta que se faça? O que é que entende que se vai falar do Pacheco, do Barreto, ou de quaisquer destes telepapagaios louros oxigenados daqui por 100 ou duzentos anos? Presume que alguém se vai dar sequer ao trabalho de culpá-los por todos os males, desventuras e aluimentos da pátria? Mais pertinente e comezinho ainda: acha que eu perco o meu tempo com anõezinhos mentais desses? Para anão basto eu. Já me chega o espelho. Tolha-me o intelecto mas não me tolha a vista: deixe-me ao menos gastar e regalar os olhos da cara que me resta com gigantes. Ou, pelo menos, gente de estatura admirável, como o Camilo, o Eça, o Oliveira Martins ou o Ramalho. Gente que (fora o Camilo) você zurze à desfilada, sem dó nem tino, num varapejo onde nem o Pessoa e o Almada escapam ilesos e comem por tabela e pela medida grande, ao mesmo tempo que me pergunta pela distinção do Pacheco Pereira e do António Barreto. Ora batatas! Ora bróculos! Está a ver a cabidela em que se meteu? Não me deixou alternativa senão a abordagem punitiva. Afinal, você reconhece a distinção de anões vivos, mas não respeita a distinção de gente grande morta. Para a moral dos nossos convivas irrequietos, do Lopes Santana ao Pacheco Luiz, recomenda a benevolência, a compreensão, a indulgência; para a moral dos outros antanhíferos, que lhe contendem não sei com que fantasia, é tronco, pelourinho, queima de efígie à revelia e malditos sejam mais as respectivas mães?! Que macaco lhe mordeu? A esquerda andou a dessedentar-se-lhe nas jugulares? Porque isso das ASAEs históricas, das brigadas profilácticas e demonizantes sobre o passado é típico deles, com mil raios. E agora que eu subo a bordo, de sabre à dentuça e bacamarte em riste, dou consigo empoleirado no cesto da gávea a batalhar nuvens e gaivotas. "Belo!", desabafei com o meu imediato. "Temos Íxion nas Caraíbas. Diz a Sua Senhoria que intervale um instante nos seus elevados afazeres e faça a fineza de arrear cá abaixo, ao tombadilho da realidade, que eu tenho uns certos assuntos a tratar com as suas digníssimas orelhas!..."
Pois agora que já tenho as suas orelhas, passo ao tempero apimentado das mesmas...
A geração de 70 estava impregnada de francesismo e jacobinite? Estava. Polvorosa descoberta. Era a moda da época. Babavam-se então com a França e a revolução benemérita como agora se babam com a América e a revolução democrática. (Está a apertá-lo muito, o garruço?) É verdade; em 1871, o próprio Eça escreve a Emídio Garcia: "Eu mesmo que te falo sou membro da Internacional" (...); e mais adiante:" Trata pois de espalhar por aí tanto quanto possível As farpas que são a vanguarda e as primeiras sentinelas de descoberta do movimento revolucionário." E noutra carta do mesmo ano, desta vez a João Penha, o mesmo Eça anuncia: "No estado em que se encontra o País, os homens inteligentes que têm em si a consciência da revolução - não devem instruí-lo, nem doutriná-lo, nem discutir com ele - devem farpeá-lo. As "Farpas" são pois o Trait, a pilhéria, a ironia, o epigrama, o ferro em brasa, o chicote - postos ao serviço da revolução.»
Donde, a sua objurgatória primeira, ó Miguel, até tem fundamento e mérito, tem até o meu aplauso, só não tem a minha bênção porque exorbita, efabula e incongrui. Exorbita na malignidade de cancro, fonte de todo o mal, com que os estigmatiza; efabula no idílio prévio e circundante, erro típico do diagnóstico à pressão; e incongrui no tom de púlpito evangélico, quando, de quotidiano, tudo faz V. por emulá-los e replicá-los. O facto é que Vossência é demasiado liberal, modernofórico e xenófago para servir de porta-bandeira ou arauto peregrino duma tal desinfestação. Tivesse lá vivido e não ponho as mães no lume que não caísse na mesma esparrela. Por isso, o seu postal, com menos brilho literário, mas com bem mais autoridade moral e coerência política poderia ter sido escrito e assinado pelo jovem Corcunda. Aí, eu nada teria a apontar. O hábito e o monge estariam em perfeita harmonia e sincronia. No seu caso, porém, o hábito súbito não desfaz o toreador costumeiro. Não lhe faltando um certo fundamento, falta-lhe todavia a consistência quase toda. Sobra-lhe em brilho o que carece em densidade. E quando me diz que a "geração de 70" não morreu, que vaga ainda fantasmagoricamente entre nós, sinto-me inclinado a acreditar. Sensação que se avoluma sempre que dou consigo, comigo e outros figurões que tais a galope, de farpa em riste e bordão em cascata. Ou, glosando o Almada, "coragem, ó émulos portugueses hodiernos, já só vos faltam as qualidades!..."
Esta, em resumo, daqui donde o observo, foi a figura que Vossência fez e que eu, porque o considero, achei por bem avisá-lo. O hábito vai descosido e deixa ver as lentejoulas. E um enfermeiro armado de bandarilhas é capaz de não inspirar a conveniente tranquilidade e confiança aos doentes.
No mais, faço-lhe a justiça de louvá-lo pelo desassombro e pela audácia, e ainda mais agradecer-lhe a ocasião para estas esgrimas e pilhagens que, bem mais que réplicas, tréplicas ou sarréplicas, eu estimaria que tonitruassem a animados colóquios.
A terminar, duas breves notas, que a prédica já vai longa.
Se pensou que eu era mais camiliano, pensou mal. Não sou mais nem menos. Nem camiliano nem queirosiano. Não é comigo essa cisma. A minha escola é outra. E como considero a política actual o ramo mais pobre da literatura, não misturo alhos com bugalhos, nem deixo que considerações da ordem do esgoto interfiram com perspectivas do nível da varanda (resultaria em trica e mexiriquice da laia dessas ficções pouco asseadas que fazem passar por "História", "sociologia", "politologia" e outras mixórdias que tais). Agora que o Camilo - que muito prezo, tal qual o Queirós, como grandes estilistas desta Língua nossa que foram-, foi tudo menos livre, temos a sua própria obra - e o esbanjamento monumental de talento que constitui - a demonstrá-lo. Ficamos com a ideia dum empreiteiro de novelas. Um Cervantes que se vendeu a retalho. Às mijinhas. Nem imagina os nomes que eu chamei ao Camilo ao terminar a última página da "Queda dum anjo".
Por último, absolutamente livre é que o meu prezado amigo também não é. Nem vossência nem nenhum dos frágeis, patéticos e confusos mortais que por este mundo do diabo penam ou fazem penar os outros. Absolutamente livre, que eu saiba, só o Deus de Aristóteles. Não queira V.Excª competir com Ele na autonomia e comigo no equívoco. Meta-se com as nuvens, desanque as aves (que as temos cá muitas, pernaltas, raras, canoras, de arribação), mas não se meta com a Transcendência!


PS: A Hubris atrai fatalmente a Ate. Uma lição imemorial que tendemos a esquecer.

PS 2: Aquela da psicanálise foi bem metida. Com o tempo ainda faço de si um brutamontes cá da minha Irmandade da Costa. Já faltou mais.

PS 3: Entretanto, em sua honra, acabei por inventar o verbo "incongruir". Ou seja, ser incongruente.


sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Primeiro Assalto

Por conseguinte, ó caro Miguel, sejamos francos: o seu postal (e respectivas sequelas) não é de falta de mérito que enferma: é de falta de moral. E inerentemente de credibilidade; ou seriedade, se preferir. O Mérito da forma e o mérito de alguma verosimilhança no conteúdo são evidentes e seria eu o último a contestá-los. O problema está na fragilidade moral do autor para o exercício, amplificada pelo exagero zelote na atitude. E estou a ser benévolo no adjectivo por especial consideração ao alvo e capital recomendação do meu imediato: “tu vê lá não maltrates muito o nosso benfeitor, esse verdadeiro galeão dos ovos de ouro!”...
De resto, forneço-lhe já um exemplozinho muito concreto e vá preparando a pomada e o gelo. Vossência, no fulcral, vitupera aqueles canhestros ancestrais por tudo terem destruído e nada terem restaurado. Nas suas eloquentes palavras, o que naquela “geração de literatos e diletantes”o incomoda e lhe causa biliosa dispepsia “é a afectação e o desprezo que votou a tudo aquilo que nasceu com assinatura portuguesa, um ódio quase doentio ao povo comum, a xenofilia provinciana, o tom doutoral com que foi ridicularizando, diminuindo e delapidando tudo”. Ora, isto deixa o seu leitor habitual baralhado e a interrogar-se: “mas este digníssimo senhor está a fazer crítica ou auto-crítica? Está zangado com os anciãos ou com ele próprio? Desatou aos tiros aos alicerces ou à consciência pesada? Porque, repare, logo mais adiante, o caro amigo confessa solenemente: “Salvar o país é salvar-nos da mediocridade, da pobreza e do miserabilismo. Tenho, como todos, vergonha da generalidade dos portugueses...” Não nota o paralelismo? Bem vê, eles, aqueles notáveis trapalhões, também tinham vergonha da generalidade dos portugueses e também se predispuseram a salvar o país, por intermédio dessa afanosa (e recorrente) operação cosmética que consiste em salvar Portugal dos portugueses. Devia pois ser vossência mais afável com os seus egrégios bisavós. E arquétipos.
Até porque se partilhavam a sua ideia, escasseavam, clamorosamente, da riqueza opulenta das suas ferramentas. Estavam sózinhos, cercados e desamparados contra uma desbordante maré que acabou por arrastá-los e submergi-los. O Miguel, em contrapartida, permite-se esses luxos optimistas, consagra-se a essas sobrancerias culturais sobre aqueles desvalidos infelizes porque se sente rodeado, escorado e estribado, contra a generalidade dos portugueses vergonhosos (entre os quais milita desventurado este seu criado, esbracejando com denodo pelos turbilhões da maré promovida entretanto a enxurrada), por uma sólida plêiade de coadjutores estrénuos e montadas vigorosas. Assim, repassando fugazmente em memória alguns desses instrumentos providenciais em quem o estimado amigo, ao longo dos tempos e ao sabor das conjunturas, tem depositado loas e sumptuosas condecorações, ouso destacar, a título meramente emblemático, o Pacheco Pereira, o António Barreto, o Paulo Portas, o Manuel Monteiro, o Santana Lopes, entre outros vultos imensos da cultura, da moral, dos bons costumes, da coerência, do portuguesismo e do génio puro redentor da nossa pátria. Deve estar, Vosselência, lembrado, decerto; não me force a ter que recomendar-lhe os seus próprios arquivos blogográficos ou a ter que andar eu próprio, de cana e anzol, à pesca neles de tão fina flor aos molhos. Sou pirata, não sou peixeiro.
O resultado, porém, está à vista e era fatal. Tendo gasto a bateria de encómios e medalhas de mérito com gigantes destes, só lhe acabariam por sobrar menoscabos e desdéns para aqueloutros pobres diabos de há cem anos. Azar o deles. Sorte a nossa.


PS: Vossência, que andou também lá pelas fileiras decerto recorda como apelidávamos a "medalha de mérito"...? Pois, isso mesmo: "Vinhos e petiscos".

quinta-feira, fevereiro 21, 2008

Plonger le diable

«Os Franceses falam muito do espalhafato que faz Satanás quando o mergulham dans le bénitier. Eu nunca assisti a essa espalhafatosa afronta feita ao venerável Pai da Mentira; nem V. também, suponho eu. No entanto imagina V. bem como Belzebu berrará e escoucinhará, ao sentir o contacto untuoso do detestável líquido. Pois, querido amigo, assim eu escoucinhei e berrei, enquanto V. com mão dura e forte, me estava mergulhando na água benta da sua Crónica sobre Os Maias.
V. concordará que esta analogia é rigorosa. Eu, com efeito, represento para V. Satanás, o pai de toda a falsidade. Eu sou aquele mafarrico que escolhe, para personagens do seu livro, não sei que janotas petulantes e estrangeirados, em vez de dar, nessas páginas, o lugar proeminente ao Marquês da Foz, aos empreiteiros das obras do porto de Lisboa, aos rapazes beneméritos que foram premiados na escola, aos construtores do bairro Estefânia, ao conselho de Estado, etc, etc. Eu sou aquele porco-sujo que pretende que as mulheres de Lisboa têm amantes, e que, nos jantares de sociedade, em vez de discutirem Hegel, o positivismo, e a psicologia das religiões, falam de criadas e de cabeleireiros! Eu sou aquele génio da maledicência, que afirma que os esplendores da Avenida são talvez inferiores aos da Via Ápia, e que a sociedade que a frequenta não é talvez nem a mais culta nem a mais original do Universo, etc., etc., por aí além.
Por outro lado a sua Crónica, meu caro Fialho, é uma bela pia de mármore, cheia a transbordar de água benta da virtude, do patriotismo, e da fé em Lisboa como capital da civilização. E, portanto, o que V. fez com a sua costumada veemência foi plonger le diable dans un bénetier. Daí os berros e os couces.
Couces e berros, sobretudo de espanto. Porque enfim, eu tudo podia esperar do seu espírito, tão impressionável e ardente, menos essa atitude de pudidícia ofendida e de magoado patriotismo. O que era com efeito de esperar, dada a sua índole e os seus escritos, era que V. criticasse o livreco, sob o ponto de vista do próprio livreco: e que, como legionário da mesma legião, ocupado também nesse belo trabalho da literatura contemporânea, que consiste em fazer o inquérito experimental das sociedades, me censurasse só por os meus golpes não serem bem destros, nem bem certeiros, nem bem úteis, nem bem claros, nem bem eficazes. Mas vê-lo de repente surgir no campo inimigo, com uma sobrecasaca séria de conselheiro de Estado, gritando - "Em Lisboa não se pode tocar! Tudo aqui é puro, belo, e grande. Vergonha ao maldizente que ouse rir da cidade incomparável, perfectissima Urbs!" - eis o que verdadeiramente me assombrou! Porquê tão singular mudança? Ó Fialho, foi V. eleito director-geral dum banco? É V. o inspirador dum sindicato? Recebeu V. das mãos do monarca, a Grã-Cruz de Sant'Iago? Está V. director-geral duma grande repartição do Estado? Que interesse supremo o fez aliar-se ao conselheiro Acácio? Está V. por acaso apaixonado pela mulher do Acácio, e finge-se assim púdico, ordeiro e patriota, para lisonjear o benemérito e cornudo homem?... Sapristi, je crois que j'ai touché juste! Nessa sua crónica sobre Os Maias, Fialho, há uma mulher! Se assim é (e estou certo que é assim), como V. deve ter sofrido, pobre amigo! Conheço essa situação, é medonha!... É ela ao menos bonita e cochonne?
Sério, sério - a sua Crónica, escrita com a sua costumada verve, espantou-me. Que V. fizesse ao calhamaço um enterrement de 1ª classe, bem está! O grosso cartapácio, com mil bombas, fervilha de defeitos. As duas próprias cenas que V. incondicionalmente louva, estão bem longe de me agradar! Mas que V. fizesse a vista grossa sobre esses defeitos, para se lançar sobre mim com indizível fúria e acusar-me de falta de respeito pelas nossas virtudes, pela nossa elevação moral, pela grandeza da nossa civilização, e pelo esplendor de Lisboa como capital - é forte! Coisa espantosa ver o meu velho e rebelde Fialho repetir, quase ipsis verbis, um grande rasgo patriótico do Tomás Ribeiro, há anos, nas câmaras declarando "traidores os que faziam, em escritos públicos, a crítica dos nossos costumes!" O Ramalho, fez, sobre essa saída do lírico da Judia, um artigo extraordinário nas Farpas.
Esta carta vai longa. E não me alargo por isso mais, além deste ponto de vista da sua Crónica - que foi o que me impressionou. Havia, porém, nela, ainda outros detalhes, que eu desejaria discutir com Você, violentamente. Assim, diz V. que os meus personagens são copiados uns dos outros. Mas, querido amigo, uma obra que pretende ser a reprodução duma sociedade uniforme, nivelada, chata, sem relevo, e sem saliências (como a nossa incontestavelmente é) - como queria V., a menos que eu falseasse a pintura, que os meus tipos tivesses o destaque, a dissemelhança, a forte e crespa individualidade, a possante e destacante pessoalidade, que podem ter, e têm, os tipos duma vigorosa civilização como a de Paris ou de Londres? V. distingue os homens de Lisboa uns dos outros? V., nos rapazes do Chiado, acha outras diferenças que não sejam o nome e o feitio do nariz? Em Portugal há só um homem - que é sempre o mesmo ou sob a forma de dândi, ou de padre, ou de amanuense, ou de capitão: é um homem indeciso, débil, sentimental, bondoso, palrador, deixa-te ir: sem mola de carácter ou de inteligência, que resista contra as circunstâncias. É o homem que eu pinto - sob os seus costumes diversos, casaca ou batina. E é o português verdadeiro. É o português que tem feito este Portugal que vemos.
Outra coisa bem singular é V. duvidar da exactidão de certos detalhes, traços de sociedade, como as senhoras falando de criadas ou apostando dez tostõezinhos nas corridas, etc. Oh homem de Deus, onde habita V.? Em Lisboa ou em Pequim? Tudo isso é visto, notado em flagrante, e por mim mesmo aturado sur place!
Mas não palremos mais. Vocês, em todo o caso, hão-de findar por me fazer zangar. O Carlos Valbom acusa-me de escrever à francesa, e com galicismos que o arrepiam: e diz isto em períodos absolutamente construídos à francesa, e metendo em cada dez palavras cinco galicismos! V., por outro lado, nunca tomou a pena, que não fosse para cair sobre os homens e as coisas do seu tempo, com um vigor, uma veia, um espírito, um éclat que fazem sempre a minha delícia. E quando eu faço o mesmo, com mais moderação, infinitas cautelas, et une touche trés juste - você aparece-me e grita-me, "aqui-del-rei patriotas". É escandaloso. Para vocês tudo é permitido: galicismos à farta, pilhérias à pátria, à bouche que veux-tu! A mim, nada me é permitido. Ora sebo!
Positivamente, basta de cavaqueira.
Diga ao Oliveira Martins que eu lhe mando, por este correio, mais fradiquice. E Você, caro Fialho, creia sempre na sincera estima e verdadeira admiração, com que lhe aperta a mão o seu muito amigo...
Eça de Queirós »


Isto, que acabo de transcrever, respondeu Eça a Fialho, em 8 de Agosto de 1888.
Vem a propósito duma pergunta que coloquei a mim próprio: "que raio responderia o Eça ao intrépido (e ingrato) MCB?"
Suspeito bem que, em alguns trechos particularmente suculentos da carta em epígrafe, seria "quase ipsis verbis". Bastaria comutar "a sua crónica sobre Os Maias" por o "seu postal sobre a maldita Geração".


PS: Esta foi só a cortesia preliminar que corresponde ao arvorar do pavilhão.

Meta-formosuras

Felizmente, para nos compensar e indemnizar, com juros, da maldita Geração (de Mil e Oitocentos), temos a bendita Geração (de Mil e Novecentos). É o 70 ao espelho, ou seja, é o 007. Porque o espelho está muito reduzido, já é apenas um caquinho de espelho (senão não cabia no país). Porém, como não celebrar mais este progresso inaudito? - Cem anos de fermentação prodigiosa, de pinote cultural intenso, que permitiram à maldita Geração da blague metaformosurar-se na bendita Geração do blogue.
Como dizia o outro, "aqui nada se ganha, nada se perde, tudo se transtorna."


PS: isto sou só eu a aquecer os reactores. Aquele postal é uma mina.

quarta-feira, fevereiro 20, 2008

Escandalinhos da Porcalhota

Quero declarar aqui, solenemente, o seguinte:
Que haja por aí blogadores a oficiarem a soldo ou pela trela do actual governo da nacinha é fenómeno decerto plausível, mas que, desculpem lá, não me escandaliza minimamente. Nem me preocupa, tão pouco. Moço de fretes ou biscateiro, mais que uma tradição, sempre foi uma vocação endémica neste país. Agora chamam-lhes tarefeiros, mas vai dar ao mesmo.
De resto, fosse eu de escândalo fácil e mais depressa encontraria motivos para isso na vasta e estrídula horda de blogadores que, visível e sistematicamente, debita por aí a soldo de governos estrangeiros.
Se bem que, por outro lado e vendo bem a coisa, entre uns e outros acaba por nem sobressair diferença de monta. Na medida em que o governo português trabalha a soldo e pela trela de interesses estrangeiros, quer os que blogam para o aparente governo português, quer os que digitam directamente para as potências alienígenas, todos puxam para a mesma banda e cumprem os preceitos de cocheiro comum, peados que troteiam e arreatados que vão na quadriga de serviço à mesma carroça.
Direi até mais: Que o dinheiro dos nossos impostos e contribuições sirva para gratificar estas alimárias de estrebaria também não me apoquenta. Sequer um bocadinho. Até porque creio que, em grande parte dos casos, nem seja isso que aconteça. A maior parte dessas bestas resfolega e esfalfa-se toda na esperança de sórdidos favorzecos. Nem é paga em dinheiro, mas em trem de cozinha. Derretem-se por "contactos". Untam-se todos com vaselina, viram puta gratuita de alto a baixo, na pura mira de facilidades ou promoções agilizadas. Outros ainda, mais que as mães, montam bicha e colocam-se em bicos de patas à procura de oportunidade, de vez, de lugarzinho na baia. Aquilo fervilha em cascata: há os lacaios pagos (uma elite pomposa) e, depois, por ali abaixo, os sabujos dos lacaios, os lacaios dos sabujos e, finalmente, na subcave do monturo, os manteigueiros noviços, capachos entusiastas da inteira confraria. Acreditem, com meia dúzia de patacos e dois ou três berlindes coloridos faz-se girar todo um escarrocel destes! Portanto, não há-se ser por aí que perigará todo o vosso belo erário público e púbico. É pois escandalinho da treta, uma queixumice dessas.
Não; escandaloso, escandaloso mesmo, se é escândalo sério que procurais, é o tilim sonante da vossa atávica carneirice servir para pagar principescamente à chusma que nos desgoverna. E mais escandaloso ainda -escândalo de bradar aos céus que até a mim me faz corar! - é o desplante cumulado da impertinência que persiste em chamar governo a uma comissão liquidatária destas!...
Sim, sou sincero: o que escandaliza é haver ainda quem diga que eles blogam para o governo. Governo... Qual governo?!!

terça-feira, fevereiro 19, 2008

Agora é o Verbo. No princípio, não sei.

Não há apenas verbos reflexivos: também os há compulsivos. São verbos que são utilizados pelos povos, no linguajar como na realidade, duma forma automática. É assim que alcançam o estatuto de tique idiossincrático. Ou seja, tornam-se veículos quotidianos da própria existência.
Nos americanos, por exemplo, temos, à cabeça de outros igualmente espectaculares, o verbo "bombardear". Entre os alemães, por szeu turno, resplandece o verbo trabalhar. Da mesma forma que entre os ingleses, campeia o verbo snobar ou entre os franceses, o verbo "bavarder" (palrar ou tagarelar). Americano que não bombardeie (em acto ou em espírito) não é digno desse nome. Tal qual inglês que não olhe por cima da burra, alemão que não se desunhe a produzir ou francês que não gralhe pelos cotovelos. Não exercendo o verbo colectivo, não exercem a existência individual.
Assim, quando compra o jornal de manhã, ou atende ao primeiro telejornal do dia, o americano digno desse nome passa revista e confere: "Ah, hoje estamos a bombardear o Paquistão!...Óptimo." E fica tranquilo, de alma restaurada, para o resto da jornada. O sol nasceu; a terra gira no seu eixo normal; a vida prossegue em bom ritmo. Enquanto bombardearem alguém, acredita. Deus existe e bafeja. Aquele pesadelo lúgubre que, lá no fundo, o angustia (e que consiste em acordar e ler, ver ou ouvir nas notícias: "Hoje não bombardeamos ninguém - estamos a ser bombardeados!..."), fica, para já, sem efeito. Dissipa-se até ao dia seguinte.
Também o alemão, ao escutar, ler ou televisionar os gráficos e estatísticas das produções, exportações e demais realizações, proclama com orgulho e sem rebuço: "Ah, hoje exportámos X BMWs e vamos produzir mais Y Wolkswagens. Wunderbar!, tudo corre sobre rodas!"
Naturalmente, por esta altura da perlenda, o leitor já se perguntará: e o português? Ó Dragão, o português faz como? Que tremendo verbo o avassala?
Bem, o português, como não podia deixar de ser, mais ainda que o judeu, é um caso único. Porque o lusitoino, além de dois ou três verbos compulsivos que o movem de arrasto -como sejam, telefonar, acelerar, viajar ou opinar catedraticamente -, é o único povo que congrega num mesmo verbo a compulsão e a reflexão. Por outras palavras, constitui-se como a única espécie de gente ao cimo deste desgraçado planeta cujo principal verbo compulsivo é simultaneamente reflexivo. Trata-se, como já devem ter adivinhado, do verbo "governar". Em Portugal, governar é sempre -e freneticamente - governar-se.
Se bem que no restante seja igual. Como em qualquer democracia, da américa à alemanha, os que exercem o verbo colectivo automático exercem-no em nome de todos. E, para que o primor seja completo, todos se revêem e comungam, em espírito, dos feitos, proezas e cometimentos dessa sua elite consignatária.

Às avessas

Chamam-lhe democracia porque, em tese, o povo é que escolhe, que determina, que elege. Mas mais valia, a bem do rigor e da prática, chamarem-lhe demorreia, já que na verdade o povo não elege, rejeita. É assim entre nós desde 1974 e é assim por esse mundo fora, onde quer que a tranquibérnia fabulosa grasse.
Na primeira vez que fomos às urnas, logo após a golpada florida, tratou-se de rejeitar os comunistas. Depois, rejeitámos, sucessivamente, a "direita", o Bochechas, o Cavaco e, mais recentemente, a Guterrada e os Santanóides. Da próxima, será para deitar ao lixo a actual socratristeza.
Portanto, de eleição a coisa tem muito pouco. Tirando as seitas de apaniguados e amanuenses partidários que, compreensivelmente, lá peregrinam por afazeres profissionais, a generalidade da população não comparece animada de grande intuito ou vocação. Nenhum bem espera desencadear: apenas, por sina, estrebucha para obviar a um mal maior. Por isso mesmo, bem ao contrário de eleger governo, melhor devia dizer-se que aflui para derrubar o governo (mal) eleito. Assim, à demorreia chamam democracia e às rejeições chamam eleições.
Dir-se-ia que, bem no fundo, mais não fazem que replicar, duma forma serôdia e frouxa, a golpada matriz da trôpega cegada. Em resumo, de quatro em quatro anos, derrubam governos. Esporadicamente, nem isso.

segunda-feira, fevereiro 18, 2008

Crudelíssima realidade

«Grandes reservas de petróleo descobertas no norte da Albânia.»

Será por isto que os Américas gostam tanto dos albananeses?
Mas não só.

Evolucinha, ou Do homem reprimido ao papagaio livre



Foi Heine quem disse que "onde os livros são queimados, os seres humanos serão queimados a seguir".
É muito pitoresca esta imagem da queima de livros. Todos os progressistas da paróquia correm a concordar e a conclamar, acenando com inúmeros exemplos históricos, todos eles hediondos. Eu próprio não vejo como negar que, numa espécie de lei perversa ou vínculo fatal, fazem primeiro aos livros e depois fazem às pessoas. Apenas acho que toda esta boa gente devia ver o filme na íntegra e não apenas na parte que lhe convém. As infâmias que começam por se fazer aos livros e prosseguem depois nos homens não são apenas queimá-los. Envenená-los, castrá-los, emporcalhá-los, esvaziá-los, uniformizá-los, traficá-los também acontece frequentemente e está até, hoje em dia, deveras banalizado. Só que aí, os mesmos que se insurgem contra a combustão forçada não descortinam qualquer problema ou vício. Nem, em boa verdade e coerência, poderiam fazê-lo: seria estarem a bradar contra o progresso.
Antigamente, queimavam os livros. Agora calcinam, amputam e esterilizam o espírito de quem poderia lê-los. Ou ditam por encomenda à mentezinha alugada de quem os escrevinha.

domingo, fevereiro 17, 2008

Prémio merecido

Se é verdade que foi Ramos Horta quem propôs Durão Barroso para Nobel da Paz então há uma certa justeza e merecimento no tiro (ou tiros, não sei bem) que lhe ministraram. No fundo, o Reinado estava apenas a cumprir a sua (dele, Ramos Horta) bela lógica: demandava fazer as pazes com ele. Promovendo, por outro lado e em reforço, a que descansasse em paz. Aliás, duvido que exista mesmo método mais eficaz de pacificar pessoas do que esse: matando-as. Só a quantidade de países, regiões e povos que têm sido pacificados dessa maneira!...

O Motor do "Pugresso"



O livro (capa em epígrafe) já é de 1995, mas tem especial interesse na medida em que é escrito por um autor judeu, professor na Universidade John Hopkins, que analisa o tema duma perspectiva pró-judaica.
Uma recensão não menos interessante e sugestiva pode ser lida aqui. Adianto alguns realces da mesma:
«German Jews gained significant power in the United States after the Civil War, largely in the realm of finance. Jews financed the U.S. regime's Civil War debt, the debts of the reconstructed Southern states, and the nascent industries» (...)
«The Jewish role in the Progressive movement crested in the Wilson administration, with Louis Brandeis playing a major role in the creation of the Federal Reserve System and the Federal Trade Commission.» (...)
«It was with Franklin Roosevelt's New Deal that Jews gained long-term power in the United States, power that continues into the present. Jews served as Roosevelt's idea men and staffed his New Deal agencies.»(...)
«In the 1960s, the Jews played key roles in the civil rights revolution and the concomitant Great Society programs. For Jews, Ginsberg points out, support for black civil rights was not only a "moral commitment" but also an "important political tactic" to weaken the white South and the ethnic machine politicians in the North, and, as a consequence, increase their own relative power within the Democratic coalition.» (...)

Finalmente, em citação directa do próprio texto de Ginsberg:
«From the 1970s onward, Jews led or were influential in most, though not all, of the political reform, feminist, consumer rights, gay rights, environmentalist and other public interest groups and related foundations, study groups, and think tanks that came to dominate the Democratic party during the 1970s and continue to be the leading forces within that party today
Uma obra de leitura obrigatória, portanto.

sábado, fevereiro 16, 2008

Epistoleirices - I

Epistoleirices porque acerca de tiroteios (duelos, surrealismos, suicídios, etc) epistolares.
Sem mais delongas nem rosarices, vamos à primeira - de Eça de Queirós a Oliveira Martins (em 1884).

«Meu querido Oliveira Martins

Estive ontem ainda bastante incomodado; estou agora à espera do meu doutor; e não creio que possa ainda hoje fazer essa peregrinação de amizade, a Santo Antero e ao bom Lobo. Pois apetecia-me bem esse passeio!
Estou aborrecido com a persistência deste incómodo e indignado por ter descoberto que a sua causa está nestas comidas do Hotel feitas à francesa. Sempre a França e a reles tradução que dela fazemos! Tudo isto se deve à revolução de 89; e eu agora sempre que me dirijo ao water-closet, de calças na mão, vou rosnando as piores pragas contra os Enciclopedistas! Quando voltará este desventuroso país à sua tradição que é o senhor D.João VI, o padre, o arrieiro, o belo caldo de galinha, o rico assado no espeto e o patriótico arroz no forno! Mas não! Querem ser liberais, filósofos, franceses, polidos, ligeiros... Consequência: o País como tu sabes, e eu com soltura há oito dias. Irra!
Vê se me mandas outro Friedlaender (que trate do luxo, das belas-artes, etc). E se fores à Póvoa, dá um grande abraço ao querido Antero e ao velho amigo Lobo.

Teu do c.
Queirós»

sexta-feira, fevereiro 15, 2008

Humor científico


Entretanto, os cientistas procedem a mais uma mirabolante descoberta:
Cada vez me convenço mais que esta ciência hodierna ricocheteia (ou serve de bola de squash) entre o óbvio e o obtuso.
Porém, hilariante mesmo é a brilhante conclusão que retiram desta retumbante e originalíssima descoberta: congratulam-se por poder muito bem vir a ser útil para a gestão de desastres. Alguém os informe que, até hoje, tem sido determinante é em provocá-los, não raramente, sobretudo nos últimos cem anos, ao nível de catástrofes de magnas proporções. Ainda agora andam nisso.
A sério, pergunto-me se a ciência não será uma forma perversa de humor.

Có-Kosher

(imagem em epígrafe: escova de dentes Kosher certificada pelo Ultra Orthodox Court of Jerusalem. )

Um artigo científico onde se expunham as semelhanças genéticas entre os Palestinianos e os Judeus sefarditas causou imenso escândalo...



Agora adormeçam-nos com cegarregas da "liberdade de expressão" e outras lengalengas de embalar meninos.
Até porque são curiosíssimos estes tempos em que desgraçadamente vivemos. Por regra, todo o nazismo é execrável, todo o nacionalismo hediondo, todo o racismo nojento e todo o colonialismo infame. Excepto, como é óbvio, em se tratando do sionismo israelita. Aí, súbita e meticulosamente, o nacionalismo devém absolutamente virtuoso, o racismo extraordinariamente benigno e o colonialismo vai imacular-se e legitimar-se a episódios bíblicos de mais de 2000 anos. É a excepção que confirma a regra? É a raça excepcional, sobrehumana?
Não sei. Mas suspeito bem, porque vejo e porque se vê nitidamente (cada dia com mais clareza), que quanto mais a humanidade vermina e rasteja, maiores eles parecem. Mais majestosos, geniais e superlativos. Não me restam grandes dúvidas que no dia, já não decerto longínquo, em que estivermos todos reduzidos a homúnculos morais, sobranceirem então eles, em toda a sua pujança, realeza e esplendor. Nesta miserável terra de cegos, quem tem um olho é rei. E mesmo quando esse olho é cego e sujo, a vantagem é daquele que levou milénios a treinar-se e adestrar-se nele. E a fazer dele periscópio.
Mas eles, quem? - Os "Judeus"? Alguns sê-lo-ão, com certeza, os proxenetas globais deste mundo, eventualmente os mais tartufos, ascáridas e jactantes. Outros, menos berrantes, são doutra esporradela qualquer. Mas todos se irmanam na grande puta que lhes serviu de mãe e no cornudo enxofradinho que imaginam e emulam feito pai. Piores que eles só mesmo aquela escória gentia, judaica, avulsa, burguesa em suma, que lhes delambe o rabo e lhe inveja o monco.
Se o nazismo alemão foi uma bela merda, o nazismo kosher mete nojo aos cães.

Esforço de guerra

Confirma-se: as escolas americanas, no âmbito do esforço global da luta contra o terrorismo, foram convertidas em carreiras de tiro. A lei presidencial que o instituíu foi já devidamente ratificada pelo congresso e senado, mas permanece confidencial, de modo a não prejudicar a concentração dos alvos.
Só numa segunda fase é que estes serão informados. Quando se passar da carreira para o cenário real, de assalto e limpeza. Os alvos poderão então armar-se e ripostar à sua escala, mas os atacantes virão de blindado apoiados por helicópteros e caças-bombardeiros.

Duma lógica cristalina


Houve um sujeito, político e governante famoso, que disse o seguinte:
«As ideias são mais perigosas que as armas. Não permitimos que os nossos inimigos tenham armas, porque raio havemos de permitir que tenham ideias?»
Aposto que não adivinham quem seja. Mas que há uma dose de arrepiante verdade no argumento, isso é difícil negar. E o pior é que não é apenas uma verdade de índole meramente teórica ou retórica: por regra, é uma realidade, mais ou menos ostensivamente, praticada neste mundo.
Sendo que os mais venenosos e tóxicos talvez não sejam aqueles que a praticam duma forma crua e aberta.

Agarrem-se ao Titan!



Invista nas luas de Saturno. Os cientistas acabam de descobrir que Titan tem centenas de vezes mais hidrocarbonos (leia-se gás, petróleo) que a Terra.
Literalmente, o maná chove dos céus. Significa tudo isto que, além de podermos lá pesquisar ossadas de dinossauros e sedimentos de florestas jurássicas, corremos ainda sérios riscos de encontrar os primórdios da raça eleita. É só lucro!

quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Mais Anúncios

«Deixem o ministro da Economia falar»

Sim sim, deixem falar o Mantorras!

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Lista dos principais patrocinadores ( e respectivas gratificações antecipadas) dos candidatos democratas à Casa Branca:


HILLARY CLINTON:
DLA Piper $471,750
Goldman Sachs $413,361
Morgan Stanley $362,700
Citigroup Inc $350,895
Lehman Brothers $241,870
JP Morgan Chase & Co $214,880
EMILY's List $213,266
National Amusements Inc $210,010
Kirkland & Ellis $179,676
Greenberg Traurig Llp $177,800
Skadden, Arps et al $167,796
Merrill Lynch $165,042
Cablevision Systems $145,313
Time Warner $144,977
Microsoft Corp $143,459
Bear Stearns $141,835
Latham & Watkins $138,598
Patton Boggs $137,200
Ernst & Young $126,865
PricewaterhouseCoopers $121,939

BARACK OBAMA:
Goldman Sachs $421,763
UBS AG $296,670
Lehman Brothers $250,630
National Amusements Inc $245,843
JP Morgan Chase & Co $240,788
Sidley Austin LLP $226,491
Citigroup Inc $221,578
Exelon Corp $220,267
Skadden, Arps Et Al $196,420
Jones Day $181,996
Citadel Investment Group $171,798
Harvard University $164,978
Time Warner $155,383
Morgan Stanley $155,196
Google Inc $150,329
University of California $140,429
Jenner & Block $136,565
Kirkland & Ellis $134,738
Wilmerhale Llp $119,245
Credit Suisse Group $118,250

Conforme podem conferir aqui.

Repórter Flash - Entrevista com o Presidente da Liga dos Cateturéticos Anónimos (1ªParte)



Passo a transmitir a reportagem do Repórter Flash. Vai para o ar com algum retardo, porque tenho que fazer a tradução simultânea do Caguinchês para o português, de modo a que os leitores entendam sem dificuldades de maior. peço-vos que desliguem os telemóveis, de modo a não interferir na transmissão.

- Alô, repórter Flash!...



- Alô, Dragão! Ora, cá estou eu, Flash Berto, o repórter enterprisas –aquele que vai onde nenhum humano foi antes. Após alguns precalços e um grande susto, eis tudo pronto para a nossa primeira reportagem de exteriores. Comigo está o Presidente da Liga dos Cateturéticos Anónimos, o Dr. Quitério Espigão. (A negritado, as minhas perguntas e reparos sempre inteligentes e oportunos ; a não negritado as respostas dele).

- Bom dia , Dr. Quitério!
- Bom dia, caro Flash Berto!
-Dr Quitério Espigão, em primeiro lugar, o que raio vem a ser um cateturético?
- Bem, meu caro, antes de tudo, o cateturético é um desgraçado, um tremendo dum infeliz. Porque sofre desse vício nefasto e auto-destrutivo que é a cateturese, ou seja, a mania de mijar de pé.
- Diabo, mas há outra maneira?
- Claro que há: a maneira saudável, higiénica, correcta. E conveniente, segundo as novas tendências comunitárias.
- Não me diga que temos que empontar uma perna contra a parede, como os cães!...
- Oh, nada disso. Essa, aliás, não só não é uma postura anti-cateturética como, pior ainda, é a variante cínica da cateturese. Acontece sobretudo nas fases de ressaca. Em noites de lua cheia, essa mesma fase cínica pode até degenerar em licantrópica: aí, nem quero pensar, mijamos alucinadamente e uivamos. Não, a postura moderna e aconselhável segundo a nova etiqueta e protocolo é mijar sentado. Na sanita. Como as gajas. E por imposição delas.
- Percebo, em vez de mijarem feitos cães ou lobisomens, mijam feitos galinhas. Fantástico! Mas fale-nos então da cateturese, ó doutor. Isso é assim uma espécie de alcoolismo?...
- Ah, pior, muito pior! A começar que o alcoólico, geralmente, ministra desopilantes sovas na esposa. Connosco é ao contrário: se a megera descobre, quem as amarga somos nós. São tareias monumentais. Acompanhadas de tortura psicológica, no mínimo. E trabalhos forçados aos pratos.
- Mas como é que ela descobre? Vocês mijam sob vigilância? A gaja escolta-vos feita polícia? Faz rusgas inopinadas ao WC?
- São os salpicos, senhor, os malditos salpicos! Nós bem recorremos a técninas ultra-subreptícias - regamos com furtividade de pele-vermelhas; estudamos tácticas camuflantes; um visionário chegou a vender um adicionante de cerveja, baseado numa fórmula alquímica medieval que, segundo ele, tornava o mijo invisível, à maneira dos espiões -, mas debalde. Elas têm um faro para os salpicos que só visto. É verdadeiramente infernal. Mirabolante. Acredite: é pior que um radar, um sonar e um scanar tudo junto. Sim, isso e a fisiognomia: adivinham-nos na cara. Lêem-nos na fuça e já está. Desatam a apitar. Parecem aquelas barras à porta das lojas. Uma algazarra que Deus nos acuda.
- Incrível! E E porque é que não tentam mijar fora de casa? Ir a um café, por exemplo?
- Não resulta. Dá-nos o stress pré-traumático. Bloqueamos da bexiga. Depois, para acalmar os nervos desatamos a emborcar canecas e imperiais de empreitada, o que só agrava a crise. Aqueles que têm coragem para despejar no urinol do snack ou cervejaria ainda é pior. Mal entram em casa, com ar selecto e descongestionado, aliviadinhos da silva, logo a fulana explode: “Quê, não vais à casa de banho? Aí há gato: ah, filho da puta que andaste a mijar de pé!” E se o indivíduo protesta que não senhor, nao bebeu nem mijou, ainda é pior: “ah, porcalhão imundo!, que andaste a regar as paredes e os candeeiros do município!...”, logo troveja ela. E lá vem borrasca. Devo dizer que as penas para a cateturese são mais severas do que para a bebedeira. Outrora, segundo relatam os antigos, a megera mais assanhada, de rolo da massa em riste, ficava de atalaia, à espera e, farejando o odisseu regressado, alvitrava: “andaste a beber! Andaste às cadelas!...” Agora não. Agora, de bastão eléctrico à cintura, respinga: “andaste a mijar de pé!...” E o pior é que, na maior parte dos casos, é verdade. Fila-nos em flagrante vertical, se assim se pode dizer. E à distância!...
- Espantoso! Mas como é que a gaja tem artes para telescopiar e pidejar num tal caso longínquo?
- Ora, em casa são as putas das pingadelas, as denunciantes; na rua são as cabronas das sacudidelas, as delatoras!... Aquilo tem uma visão infraurética ou ultravioleta que não perdoa. Ultravioleta e ultraviolenta logo a seguir.
- Mas... e vocês aturam um massacre quotidiano desses?...
- Que remédio. Até porque aqui ainda vamos nos preliminares, o cataclismo ainda vai no adro! É a fase idílica, por assim dizer, do casamento fresco. Rapidamente, a coisa deteriora-se. Depois da desgraça, chega a ruína. Logo logo, entediam-se de nos darem porrada e desatam a recorrer aos tribunais. Mal damos por nós, temos os bolsos esvaziados e as testas ernamentadas por exércitos de advogados e amigalhaços da onça em tirocínio para conselheiros matrimoniais. Já não falando nos tele-sexólogos. Em menos de nada, estamos com divórcios às costas, custas em cima e pensões cavalares nos filhos dela. É a todo este precipício que o maldito vício nos arrasta!...
- Mas vocês não o combatem com todas as vossas forças?
- Não, isso são as gajas: combatem-nos a postura eréctica com todas as forças delas. Nós é mais com todos os nossos cagaços. E olhe que são muitos e grandiosos. Começamos por prometer que não tornamos a mijar de pé nunca mais. Juramos a pés juntos e a debulhar-nos em lágrimas. Sentados, claro está. Verter água pelos olhos na posição vertical também não seria civilizado.
- Ah, quer dizer que também não convém chorar de pé? Eu, por exemplo, nem de pé nem sentado nem deitado, por mais que tente e esprema não consigo!...
- De todo. Um homem deve chorar, pelo menos, uma vez por semana. Convém manifestar a sua delicadeza e sensibilidade. Mas sentado, naturalmente. Munido de lenço de papel apropriado, isto é, descartável. É assim que determina a Televisão.
- Mas continue. Dizia-nos que juravam a pés juntos nunca mais derramar na vertical...
- Pois, pois é. Juramos e tornamos a jurar. Mas aquilo fica a moer-nos, a aguilhoar-nos. Se nos fechássemos numa redoma talvez resultasse. Ou nos criogenizassem por uns tempos. Mas assim é difícil. Chega a parecer impossível, sobre-humano. Mal saímos porta fora, as tentações são muitas. Os desafios ainda mais. O dilema do urinol, sobretodos, afecta-nos.
- O dilema do urinol, Dr. Quitério?...
- Estão mal concebidos. São arcaicos. Não cumprem os novos requisitos anatómicos e ergonómicos. Mesmo que quiséssemos, não conseguíamos...
- Isso tudo para dizer o quê?
- Então, não é possível um tipo sentar-se num urinol. Quando muito, põe-se de cócoras. Mas mijar de cócoras, embora não tão grave quanto mijar de pé, também não é aceitável.
- E já experimentaram mijar de joelhos?
- Bem, experimentar, já experimentámos de tudo. Até houve excêntricos das acrobacias que mictaram a fazer o pino. Porém, mijar de joelhos, o chamado genufluxório, além de nos arranjar problemas com a gaja, também nos metia em sarilhos com a sociedade laica, a respectiva constituição e os seus ferozes ateístas de guarda. Regar de joelhos, nem pensar!... Aliás, nem regar, nem pensar e, ainda menos, rezar!...
- Portanto, por falta de sensibilidade social e apetrechamento adequado no mobiliário público, vêem-se quase constrangidos a mijar de pé?
- Claro. Já viu bem a atrocidade, a violência? Um tipo guarda castidade catetotúrica um mês inteiro. Entre a retrete e o penico, abivacamos as nalgas e gastamos horas. Para depois, na primeira cervejaria ou marisqueira sermos confrontados, diabolicamente, pelo urinol obscurantista e obsoleto. E lá vem a recaída! Duas ou três canecas depois, e já mijamos de pé, em grande camaradagem. Seis ou sete mais à frente e, às vezes, em plena via pública, além da mijadela erecta, até já damos autógrafos às paredes. Regredimos à mais atroz das infantilidades, veja bem!...
- Entretanto, ó Dr. Quitério, ocorreu-me o seguinte: se agora têm que mijar sentados como é que cagam? - De pé? Quer dizer, como é que diferenciam uma coisa da outra?
- Ah, cagar na retrete lá de casa, nem pensar. Só em segredo, às escondidas. Quer dizer, sem emitir qualquer tipo de ruído ou odor, nem deixar o mais ínfimo vestígio. A gaja nem pode sonhar que fizémos uma coisa dessas! Por regra, para cagar em casa, numa emergência, agora temos a fralda conjugal: fazemos nela, deitamos no contentor do lixo e vamos lavar o cu à cagadoria.
- Cagadoria?!
- Sim, é análogo àqueles centros de lavagem automóvel, com aqueles jactos e escovilhões, só que é especialmente adaptado a peões. Digamos que é um centro de autolavagem do peão. Mas é relativamente oneroso e raro. Os menos abonados, fazendo uso do lendário sentido de desenrascanço português, vão de carro aos centros de lavagem automóvel e, uma vez lá dentro, baixam o vidro e põem o rabo à janela. Lavam o carro e, de bónus, abluem também o cu. Quem experimentou, sai de lá fresquinho e enxuto. Mas é preciso cuidado e algum comedimento, porque parece que cria habituação.
- Outra questão, ó Dr. Quitério: existe alguma lei, decreto ou portaria que obrigue um gajo a mijar como uma galinha?
- Bem, sabe que antes da lei jurídica e como seu fundamento alicerçafórico existe a lei natural. Ora, neste caso, embora ainda não exista propriamente uma lei jurídica –se bem que para lá se caminhe a passos largos de gigante -, existe, todavia, uma lei natural deveras importante: a lei de conservação da espécie.
- A lei de conservação da espécie, como assim?
- Então, se não mijamos sentados, elas, por superior e último castigo, não abrem as pernas nem nos deixam foder. E sem isso, a juntar a toda aquela panóplia de pílulas, borrachas, espumas espermicidas, clínicas de aborto e sexólogos esterilizantes, como há-de a espécie medrar e proliferar?...
- Bem visto.


E agora, caro Dragão, vamos ter que fazer uma pausa na entrevista, porque o nosso convidado de hoje, o Dr. Quitério Espigão, deu-lhe a ansiedade e vai ter que ir ali fazer uma mijinha. Devidamente sentado, pelo que implica uma demora maior. Já voltamos. Mete a publicidade!


- Então até já, ó Flash Berto!...

quarta-feira, fevereiro 13, 2008

Insólito e simbólico



Um fenómeno insólito (foto em epígrafe) que aconteceu recentemente no Rio de Janeiro.
Eu diria que há qualquer coisa de majestoso, poético e simbólico na imagem. É claro que, cientificamente, um tal evento não passa duma trivialidade. Mas os símbolos são lixados. Não cabem nas prateleiras. Nem nas caixinhas dos puzzles.

Ligeiro contratempo

Acaba de me ligar o Repórter Flash Berto (nome artístico do Engenheiro-Arquitecto-Diácono & Webmonstro Ildefonso Caguinchas nas suas noveis atribuições, Deus nos proteja). Surgiu um contratempo durante o percurso que eventualmente atrasará a reportagem tão ansiosamente aguardada. Comunicou que se sentiu subitamente indisposto do testículo esquerdo. Teve que encostar, de emergência, à berma e aguardar que a crise passasse. Felizmente, não foi preciso chamar o INEM, porque uma jovem profissional de enfermagem e cuidados "inofensivos" (sic) que aguardava autocarro nas imediações prontificou-se a socorrê-lo por uma módica quantia. Estava mesmo, cheia de brio profissional e fervor deontológico, a fazer-lhe uma respiração boca à... bem, boca à glande ou à gaita, como lhe prefiram chamar, por alturas do contacto telefónico. E via-se que o tratamento porejava rigor e competência, pois ele arfava e mal conseguia articular discurso compreensível (mais ainda do que é normal). Do que consegui decifrar da algaraviada resfolegante, realço a seguinte lamúria recorrente: "Valeu-me este anjo, ó Dragão, valeu-me esta santa e benamérica cricatura!...Nem sei o que seria de mim, neste descampado com uma crise destas, se não fosse ela!..."
De modo a desancalhá-lo daqueles baixios inopinados, e porque o conheço bem, limitei-me a recomendar-lhe, em tom caridoso e inquietante:
-"Veja lá, ó Repórter Flash Berto... Veja lá se a enfermeira, por acaso, não é daquelas epilépticas com boca de guilhotina!... "
O terror ainda é o melhor estimulante e desentupidor de vias que se conhece.

Mais prodígios e coisas assombrosas

Por motivos alheios à minha vontade, de vária ordem e quadrante, este blogue corre sérios riscos de ter que encerrar as portas.
Mas entretanto, e enquanto a espada de Dâmocles, o machado de Cronos e as correntes da Ananké não se abatem, lutaremos bravamente e sem tremor. Até ao último fôlego.
Nesse sentido, prosseguem as safras e prodígios. Remodelado o template, o webmonstro Ildefonso Caguinchas, levado de seiscentas audácias e outras tantas petulâncias, assumiu a pasta de Ministro das Entrevistas e, em perfeita sincronia com a gerência deste infame batel danado, abraçou a buliçosa indústria de repórter de exteriores.
Está neste momento, se não me falha o relógio, a caminho de entrevistar o Presidente da Liga dos Cateturéticos Anónimos. O resultado deste fantástico diálogo será publicado aqui brevemente. E em directo.
Aproveito para esclarecer a mudança última e inopinada de template. Tive que accionar o de reserva porque o principal, o dos veleiros na tempestade, motivou grande escândalo nos tipos (uns super-coninhas canadianos) onde eu tinha, como dignamente me competia, pirateado a imagem. Retiraram a dita e colocaram em seu lugar uma imbecilidade patética que grasnava mais ou menos assim:
«Beware!
This blogger steals graphics from websites. »
Honrou-me muito tamanha e tão justa publicidade. Mas é preciso ser estúpido para subir a bordo duma nave pirata, apontar histéricamente para o capitão e, em tom esganiçado, alarmajar: cuidado, este tipo pilha e assalta!"
Pena a coisa não passar-se ao vivo, que até lhes dava o tratamento do bom velho Capitão Low. Não o da primeira fase, aquele sensaborão de se lançar que nem um possesso a cutilar desenfreadamente os burgueses prisioneiros - desse, ele, em boa hora acabou por se entediar, até porque o salpicavam todo da merda que têm nas veias a fazer o lugar de sangue -; mas a variante mais calma, e infinitamente mais estética, em que apenas os obrigava a comer as próprias orelhas, devidamente cortadas, com sal e pimenta.
Gostava que isto ficasse bem claro: pilhei-lhes o graphic com todo o gosto, mais que merecidamente, e só não lhes subtraio a carteira, a conta bancária, a viatura e a mulher por nítida falta de tempo, pachorra e meios apropriados.
Eu ando a penar sem remissão
o extermínio que perpetrei p'los mares
quando, sob a bandeira de Mombars,
andei co'a alma em transmigração.