sábado, setembro 26, 2009

Os Costas em castelo

«Apontou Vª Excª à execração pública o autor de semelhante trecho, desapiedado e mau. Peço encarecidamente a Vª Excª que me deixe vincar bem o quanto eu, longe de retirar essas frases, mais convictamente e mais ardentemente as apoio e as vinco. O chefe do partido democrático não merece a consideração devida a qualquer vulgar membro da humanidade. Ele colocou-se fora das condições em que se pode ter piedade ou compaixão pelos homens. A sua acção através da sociedade portuguesa tem sido a dum ciclone, devastando, estragando, perturbando tudo, com a diferença, a favor do ciclone, que o ciclone, ao contrário do Costa, não emporcalha e enlameia. Para o responsável máximo do estado de anarquia, de desolação, e de tristeza em que jazem as almas portuguesas, para o sinistro chefe de regimentos de assassinos e de ladrões, não pode haver a compaixão que os combatentes leais merecem, que aos homens vulgares é devida. Costa nem sequer tem o relevo intelectual que doure a sua torpeza. A sua figura é a dum sapo que misteriosamente se tornasse fera. Pode ter-se compaixão por aqueles por quem se tem ódio. É impossível a compaixão por aqueles por que se tem ódio e nojo, conjuntamente. Por isso eu quero frisar - e sei que ao frisá-lo estão comigo os votos de grande número dos portugueses, dos católicos oprimidos, das classes médias atacadas, dos cidadãos pacíficos assaltados nas ruas, de todos aqueles que o general Pimenta de Castro representava - que só não se regozija, no desastre acontecido a Costa, a circunstância, que infelizmente se parece confirmar, do seu restabelecimento.»

- Fernando Pessoa (in A Oligarquia das Bestas)

O que Pessoa, com toda a propriedade, justeza e razão, diz de Afonso Costa pode - e deve - ser dito, redito e proclamado acerca dos sucedâneos hodiernos deste. Eu, pelo menos, não encontraria palavras mais justas para embrulhar e condecorar, sem excepção, todos os primeiros-ministros deste regime pós-revolucinha dos Cravões. E estou seguro que amanhã, ganhe quem ganhar, será mais uma coisíssima destas a ver-se entronizada.

Aproveito para informar que, com a generosidade fogosa que me caracteriza, inauguro neste feliz postal as comemorações do centenário que se avizinha (e traz tanta besta ocupada).

sexta-feira, setembro 25, 2009

Declaração de não-voto




Eu já aqui o disse, preto no branco, mas aproveito para repetir (nunca é demais): Eu não voto. Nem hoje, nem ontem, nem amanhã, nem nunca. Mas não é por comodismo, preguiça ou indiferença: é nojo mesmo!

O problema fulcral de Portugal (do que resta dele, enfim) não se resolve com partidos políticos. Isso seria pedir ao problema que se auto-resolvesse.

Votar é coadjuvar, colaborar, ser conivente na legitimação deste regime de para-feudalismo recauchutado, importado e sulfatado que, pior que simplesmente oprimir, nos pulveriza, liliputeia e aniquila em câmara lenta. Agora dourem a pílula - na verdade, o supositório -, com as baboseiras canoras que a formatação consinta. Cubram-na com os cremes ou chantillis que mais vos convenha ao paladar. No final de contas, tudo isso tem um nome muito simples, concreto e técnico: é a vossa vaselina. Barrem-se nela. E que vos faça bom proveito.

Banzai!

«Japan Abandons America»

Ora bem. Nem tudo são más notícias!...
Mas temo bem que, subitamente, se comece a recordar toda uma série de atrocidades do tempos em que o Japão saltava ao eixo e, por conseguinte, era cúmplice naquelas coisas que Hollywood sabe.

quinta-feira, setembro 24, 2009

Lesa-democracia

Agora é que os tipos do Irão a arranjaram bonita. Menoscabar os tampinhas ainda é como o outro: cobra a título de folclore. Mas ir-lhes à algibeira desta forma atroz... Isto ainda vai dar calor no estreito e os preços do petróleo em ascensão súbita à estratostafera (se me é permitido o neologismo acintoso).

domingo, setembro 20, 2009

A Osmose

Meditando sobre o postal anterior, e em especial sobre os números, ocorreram-me algumas intuições premonitórias que não desmerecem partilha.
Para começar, aqueles 76 milhões de "gravidezes indesejadas"/ano...
A semântica é elucidativa: não tardará muito e haverá "numerus clausus" não só para a universidade, a academia e a carreira artística, como também para a própria vida. Além disso, 76 milhões (molhões, se preferirem) de gentinha não planeada ou autorizada (e, por conseguinte, clandestina) à flor do planeta autorizará, por certo, o abate de outros tantos para efeitos ( e enfeite) de balanço anual e contas (acerto, esse, que, de resto, já presumo mais ou menos em andamento).
Depois, aquele atestado de estupenda contabilidade marçana onde somos solenemente notificados da poupança que representa, em toneladas de dióxido da treta, cada 7 dólares de "planeamento familiar". Magnífico, irmãos! Nada como o investimento em preservativos para antipirético global. Já imagino até a euforia da Goldman Sachs a traficar produtos financeiros em conformidade. Cada barrete que o indígena, no seguimento da cabeça de cima, enfie na cabeça de baixo, vai ajudar a salvar os gelos polares e, por alma deles, os insectódromos à beira-mar plantados. Aceitam-se apostas.
Isto - toda esta obsessão planificadora da incubação alheia -, entretanto, transporta-me a algumas considerações abismais. A principal é que estes tipos neo-tudo e mais alguma coisa, que manifestam uma verdadeira e ululante fobia por tudo o que seja ou represente planeamento económico, regulação financeira ou travão industrial, depois, numa espécie de compensação perversa, desatam em ímpetos e fogosidades de planeamento familiar, como se, afinal, o verdadeiro culpado da poluição global não fosse a emissão de gases, mas a emissão de esperma. Quer dizer, a culpa não é do consumo desenfreado, nem da ganância massificada e exorbitante; não, a culpa é do caralho. E da sua cúmplice pérfida no sinistro empreendimento: a vagina fértil. Torna-se assim mais que evidente que tal qual os comunas cultivavam o frenesim de planear e controlar o colectivo, estes agora ardem em furores de planificar e formatar o indivíduo. A minha explicação para um fenómeno do entroncamento destes? Se repararmos com alguma atenção, constataremos que grande parte destes mercantileiros fanáticos do presente foram comunistas ferozes no passado. Não perderam as taras, nem minimamente delas abdicaram: apenas as transferiram. Não foi, pois, o sujeito que mudou: foi sòmente o objecto. O filho da puta, profissional, aliás, possui essa idiossincrasia bestial: é imutável, insensível e acima de tudo, imune. À realidade.
Nunca tive problemas com Jesus. "Estradas de Damasco" é que, nem com molho de cebolada, engulo. O verniz muito superficial dos marranos, sejam eles de que escória forem, estala-lhes com a facilidade inerente aos caprichos da moda ou aos solavancos da conjuntura. E muda de cor -e de cor apenas - conforme muda o vento.

A verdade é que nem o capitalismo triunfou duma vez por todas, nem o comunismo faliu de vez. Nem esse mal apenas, nem esse bem tão pouco - foi o pior de dois mundos: fundiram-se. À competição sucedeu a amálgama. Culminar inerente à trampa: a osmose.

quarta-feira, setembro 16, 2009

A Fabulogogia ou Educação pela Fábula

«Logo, devemos começar por vigiar os autores de fábulas, e seleccionar as que forem boas, e proscrever as más. As que forem escolhidas, persuadiremos as amas e as mães a contá-las às crianças, e a moldar as suas almas por meio das fábulas, com muito mais cuidado do que o corpo com as mãos. Das que agora se contam, a maioria deve rejeitar-se.
- Quais?
- Pelas fábulas maiores avaliaremos das mais pequenas. Pois é forçoso que a matriz seja a mesma e que grandes e pequenas tenham o mesmo poder. Ou não achas?
- Acho. Mas não entendo quais são essas maiores que dizes.
- As que nos contaram Hesíodo e Homero - esses dois e os restantes poetas. Efectivamente, são esses que fizeram para os homens essas fábulas falsas que contaram e continuam a contar.»

- Platão, "Política" (vulgar, e grosseiramente, traduzido por "A República")



Uma república onde não caibam os poetas não lembra ao diabo e talvez só lhe sirva a ele. Todavia, lembrou a Platão. Entendeu que do seu mundinho perfeito deveriam ser expulsos Homero, Ésquilo, Píndaro e Sófocles, só para citar alguns dos gigantes sobre cujos ombros ele, o contador de Sócrates, assentava. É certamente digno de riso e mereceu bem todos os sarcasmos abençoados que Diógenes lhe dedicou.
Isto não retira grandeza a Platão, apenas lhe retira algum brilho. Ou, melhor dizendo, apenas lhe confere um lado sombrio, como é próprio dos astros que gravitam em redor das estrelas. As suas destilações políticas, de resto, são o mais pobre que a sua filosofia tem, não tanto ao nível do diagnóstico, mas de todo ao nível da terapia. E aí inaugura uma galeria de tecelões da utopia e tricotadeiras da felicidade pública que teve no hirsuto Marx o último - tanto quanto o mais rasteiro e lamentável - dos epígonos. Platão, aliás, como castigo (ou recompensa), merecia visitar, em peregrinação turística, a União Soviética das sistemáticas purgas e atestar, na realidade concreta, da excelência das suas receitas.

Entretanto, podemos constatar como esta "educação pela fábula" nunca foi tão efectiva e exuberante como nestes nossos dias. Dispenso-me de enunciar algumas das principais. Quem tiver olhos que veja; quem tiver coração que pense.

terça-feira, setembro 15, 2009

A Genealogia do Matadouro - V. Assírios e paradigmas

Julgo que vem muitíssimo a propósito esta reposição. Até porque não sei se repararam mas a imagem em epígrafe no postal anterior refere-se a Assur...

Então, aí vai. Para os mais dados à dispepsia, recomendo um bom alka-seltzer após.

«Nada é mais estranho à mentalidade do oriente Antigo do que o amor pela paz, afirmado ruidosamente, ao longo de toda a História, desde os romanos até á época actual. Porque, para os reis de Assur e alguns outros, como os da Babilónia, do Urartu, ou os soberanos hititas ou kassistas, a guerra não é uma calamidade, mas um culto prestado aos deuses. A dignidade da guerra está no seu carácter religioso; o inimigo não só é um criminoso, como é um sacrílego e nenhum castigo será demasiado cruel. É claro que um bom despojo, em homens, em animais, em ouro ou em objectos preciosos, constitui um ganho não negligenciável, mas a economia não explica tudo. Muitas guerras, na verdade, só servem para afirmar um poder, um apetite de domínio, a vontade de hegemonia que são os mobiles determinantes das expedições que resultaram na constituição desses imensos impérios heteróclitos fundados por assírios, hititas ou babilónios.
Esta ânsia de poder traduz-se muito cruamente na condução da guerra e no tratamento dado aos países e aos povos vencidos. Não se contentam em pilhar, devastam; incendeiam as aldeias; arrasam as cidades e destroem as colheitas. Amontoam pirâmides de cabeças à entrada das cidades; degolam vivos os chefes inimigos; empalam prisioneiros e só deixam ruínas atrás de si. Adad-Nirazi II reivindica o título de aniquilador e a glória de Sargão é a de espalhar lágrimas para todo o sempre.
Os inimigos são sub-homens para os quais não pode haver piedade.»
- Guy Richard, "A História Inumana"


«Depois de tomar uma cidade, Assurbaníbal gabava-se: “Corto-lhes a cabeça. Asso-os no fogo, uma pilha de homens vivos e de cabeças contra a porta da cidade hei-se pôr. Os homens empalarei com estacas. A cidade eu destruí, devastei. Fiz dela um montão de ruínas, os jovens e donzelas na fogueira queimei”.
Esta espécie de chacina ritual é particularmente endémica na guerra de cerco, embora ocorra a seguir a acções de campanha. Claramente distinta do confronto táctico propriamente dito, parece mais estreitamente aparentada com experiências relativas à caça. Bastante literalmente, o vencedor põe de parte quaisquer sentimentos de vulgar humanidade e entrega-se à matança pela matança. Se era por faltarem ao homem os mecanismos inibitórios de um predador natural ou simplesmente por ajustamento cultural, é impossível dizer de momento. Mas a espécie humana, e particularmente os Assírios, pôs uma terrível capacidade ao serviço da causa da guerra e da política, uma capacidade que um dia levaria aos campos da morte de Auschwitz e à colocação de armas nucleares com populações urbanas por alvo.
Mas, como sempre, por detrás da sangueira andava o dedo calculista e o interesse egoísta. Mal parava a matança, começava o roubo e a exploração económica.»
- Robert L. O’Connell, “História da Guerra”

«Terminado o massacre dos habitantes de Ai tanto no campo como no deserto, para onde haviam saído em perseguição dos israelitas, depois de todos terem sido passados ao fio de espada, todo o Israel voltou à cidade, matando toda a população. O número dos que morreram naquele dia, entre homens e mulheres, foi de doze mil, todos da cidade de Ai. (...) Os israelitas tomaram para si os rebanhos e o espólio da cidade, conforme o Senhor havia ordenado a Josué. Josué incendiou a cidade de Ai, reduzindo-a para sempre a um montão de ruínas, como ainda hoje está.»
- Antigo Testamento, Josué, 24-27


sábado, setembro 12, 2009

Extermínios (com)Prometidos


Agora, para loucuras mais sérias - ou a continuação das mesmas, mas com invólucros bem mais perigosos:
«The rise of Israel's military rabbis»

Este trecho, então, é delicioso:
«Rabbis handed out hundreds of religious pamphlets during the Gaza war.
When this came to light, it caused huge controversy in Israel. Some leaflets called Israeli soldiers the "sons of light" and Palestinians the "sons of darkness". »


Embora, ressalve-se, nada original.

Para uma demonstração eloquente, socorro-me dum historiador que, além de conceituado, é judeu. A páginas tantas, escreve ele numa das suas obras mais importantes:
«Nos manuscritos do Mar Morto surge uma versão muito semelhante. Quem quer que tenha sido a seita que os concebeu, subscrevia por certo - pelo menos em determinada época - grande parte da demonologia aceite pelos judeus que escreveram e leram os apócrifos. Por outro lado, em alguns desses escritos encontra-se uma ideia que haveria de ter um desenvolvimento espectacular nos séculos seguintes: a ideia de que o Diabo (Belial, Satanás, ou como quer que se lhe chame) conta com servidores entre os homens e as mulheres vivos, colaboradores humanos, por assim dizer, das hostes de espíritos do mal. No documento conhecido como "A Guerra dos Filhos da Luz contra os Filhos das Trevas, escrito provavelmente no tempo de Jesus Cristo, a seita prepara-se para uma guerra de cinquenta anos durante a qual os seus membros, na qualidade de "Filhos da Luz", exterminarão os gentios, denominados para o efeito "Filhos das Trevas" e também "Filhos de Belial".»
(- Norman Cohn, in "Europe's Inner Demons")

Podemos assim constatar que a seita não evoluiu muito, se é que evoluiu alguma coisa. ´Mas isso não constituíria novidade, nem problema, se não amanhecesse à pendura duma singular e revolucionária circunstância: é que agora já tem armas nucleares. Para não falar, por mero pudor, de todo num arsenal convencional até aos colmilhos.

Quanto ao título e modelo para estes rabis agit/prop, resume-se em duas palavrinhas: comissários políticos.

Além disso, não menos evidente - embora constante, grosseira e militantemente escondido - é o facto historicamente comprovado dos sectarismos peregrinos duma qualquer "Terra Prometida" (leia-se judaísmo e neo-judaísmo, vulgo protestantismo), demandarem com afã de possessos e paixão de alucinados tanto um território quanto um extermínio. O contrato de promessa, de resto, garante esses dois quesitos essenciais (e animadores da aventura): a Terra e o extermínio de quem lá habita. No fundo, as duas faces da mesma moeda, com que uma qualquer divindade de submundo e subúrbio cósmico gratificará, um dia, decerto fantástico, os seus inermes sabujos.



quinta-feira, setembro 10, 2009

Revisionismo Culinário - 2. Leitão à Bairro Anti-semita




«O leitão à Bairro anti-semita é uma iguaria de excelente qualidade, preparada com um bacorinho de 8 a 10 kilos, que, depois de assado, dê 4 a 6 kilos no máximo.
É condimentado com uma pasta de alhos moídos, sal, banha e pimenta preta, e assado em espeto de madeira, em forno de lenha.
Serve-se com laranja, alface e batata cozida com a pele.»

Depois, trincha-se em nacos sugestivos e espalha-se pelo cemitério judeu mais próximo.

Revisionismo culinário - 1. Cozido à Anti-semita

Ingredientes:

«1/2 galinha gorda - 350 gr de presunto - 350 gr de carne de vaca - 1 chouriço de carne - 1 chouriça de cebola - 1 morcela - 1 farinheira - 250 gr de orelheira de porco - 2 pés de porco - entrecosto - 3 cenouras - 1 couve tronchuda - 5 batatas - 350 gr de arroz - sal»

Confecção:

«Numa panela grande com água, introduzem-se as carnes, excepto o presunto e o chouriço,» que devem primeiro ser passados pelo Hanuchà. «Quando a galinha estiver meio cozida, introduzem-se então, o presunto e o chouriço. Meia hora depois, retira-se metade do caldo e reserva-se.»

« Com metade deste caldo cozem-se os legumes. Rectifica-se os temperos.

Com a outra metade, prepara-se o arroz. Põe-se o caldo a ferver, à parte, juntando mais um pouco de água, a quantidade necessária de modo a que fique um arroz solto.

Levantando fervura, junta-se o arroz e deixa-se cozer. Rectifica-se os temperos.

Para servir, coloca-se a galinha e a carne de vaca cortadas aos bocados, no centro de uma travessa e à volta, põe-se a orelheira e o presunto também cortados aos bocados, o chouriço às rodelas, as cenouras, as batatas e as couves. O arroz serve-se numa travessa à parte.»

Depois, leva-se tudo, com muito cuidado, e deposita-se na sinagoga mais próxima. Os pés de porco, naturalmente, em destaque.

terça-feira, setembro 08, 2009

Anti-semitismo às fatias


Alguém -criaturas certamente hediondas e perversas, em quantidade incerta mas seguramente fervilhante - depositou, por perfídia calculada e ódio antigo, fatias de bacon nas maçanetas e no buraco da fechadura da porta da sinagoga de Leeds. Pois é, leitores, leram bem: fatias de bacon! Toucinho, senhores! E então, que mal é que isso tem?... Mas será que sou eu, agora, que estou a ouvir bem?! Mangais? Nem me digno responder-vos. Cedo a palavra, para o efeito, à voz cabal e autorizada, bem como representativa, de "Dan Cohen, chairman of the Leeds Jewish Orthodox Community Group". Chocado, horrorizado, declarou aos repórteres:
This is massively offensive. This is no different to daubing a swastika on the door. This is of that magnitude and it's very worrying.»

-«É um crime de ódio!» - Brama, entretanto, Trude Silman, presidente da HSFA (Holocaust Survivors Friendship Association).

E a polícia, preocupada, nervosa, já enviou peritos, às brigadas, a fim de esquadrinharem os maculados portais em busca de impressões digitais.
Impressões digitais? Mas então o demónio não tem cascos? Não seria mais pertinente pesquisarem pegadas?...

PS: Vencido o pasmo, espero conseguir, num próximo postal, algumas elucubrações apropriadas a uma monstruosidade destas.

segunda-feira, setembro 07, 2009

Judas

Tratos de polé -quanto a mim, bem merecidos - em Santo Churchill. Uma colecção de factos difíceis de confinar ao armário da história ou de continuar a esconder sob o tapete da propaganda.

(...)

Da Decadência (rep)

«(...)Eu queria-me entender com o sr. Deputado, a fim de tirarmos algum proveito deste debate; mas S.Excª, pelos modos por me ver assim minguado de afeites poéticos, acoima-me de absurdidade, e despreza-me!...Valha-me Deus! Se o sr. dr. Libório me não lançasse da sua presença com tamanho desamor, havia de perguntar-lhe por que foram Atenas e Roma bem morigeradas quando pobres, e corrompidas quando ricas e luxuosas. Havia de perguntar-lhe que artes e ciências progrediram entre os Sibaritas e Lídios, povos que a mais elevado grau de luxo subiram. Havia de perguntar-lhe por que foi que os Persas acaudilhados por Ciro, cortados de vida áspera e privada do necessário, subjugaram as nações opulentas. Havia de perguntar-lhe por que foram os Persas, logo que se deram às delícias do luxo, vencidos pelos Lacedemónios.
A suprema verdade, sr. Presidente, a verdade que os arrebiques da retórica não sofismam é que, à medida que os impérios antigos se locupletavam, o luxo ia de foz em fora, e os costumes a desbragarem-se gradualmente, e o pulso da independência a quebrantar-se, e os cimentos das nações a estremecerem. Depois, era o cair do Egipto, da Pérsia, da Grécia e Roma. »

- Camilo Castelo Branco, "A Queda dum Anjo"

O diagnóstico é de 1866. Fá-lo Camilo pela boca do seu personagem, o debutante e "incorruptível" Calisto Elói. A obra, a muitos títulos notável, esboça um retrato desapiedado dum parlamentarismo à portuguesa, já naquela data convertido em colmeia de estrangeirados, parasitas, sanguessugas e similares.
Mandando também eu às malvas os "arrebiques da retórica", digo que o nosso Camilo, que de burro não tinha nada, não pôs o dedo na ferida porque esta geralmente até reflecte dignidade, luta ou sacrifício, mas pô-lo certamente no líquido fétido e purulento que preenche os furúnculos ou as gangrenas. Ontem como hoje.
A corrupção, aliás, desde sempre, serviu (e serve) à mesa do luxo. Naturalmente, propaga-se em forma de cascata: desde os que se empanzinam, lá no alto, de caviar até aos que rapam as migalhas, lá debaixo.

domingo, setembro 06, 2009

O Casino da morte

Com os meus agradecimentos ao leitor que me alertou para este caso...

«Novos investimentos exóticos surgem em Wall Street»

«Os banqueiros pretendem comprar "life settlements", seguros de vida que os doentes e idosos vendem em troca de dinheiro - US$ 400 mil por um seguro de US$ 1 milhão, digamos, dependendo da expectativa de vida da pessoa assegurada. Depois, eles planejam "securitizar" essas apólices, no jargão de Wall Street, reunindo centenas ou milhares delas em títulos remunerados. Então eles irão revender esses títulos para investidores, como grandes fundos de pensão, que receberão o retorno quando as pessoas asseguradas morrerem.

Quanto mais cedo o assegurado morrer, maior o retorno - apesar do fato de que, se as pessoas viverem mais do que o esperado, os investidores podem ter pouco retorno ou até mesmo perder dinheiro. De qualquer forma, Wall Street lucraria ao embolsar taxas consideráveis para criar os títulos, revendê-los e negociá-los»


Vai-se a ver e ainda instituem a eutanásia por imperativos económicos. Até aqui limitam-se a sacrificar-lhes o dinheiro dos contribuintes. Qualquer dia, o dinheiro não basta: vão ter que ser os próprios contribuintes. Ou seja, até aqui é "a bolsa ou a vida!"; mais lá para diante será "a bolsa e a vida!"
Bem digo eu que o Deus-Lucro é um ídolo tenebroso, insaciável e sanguinário.


Atentado à treta

Quanto à remoção da Moura Guedes, ocorrem-me duas ou três considerações elementares. Em primeiro lugar, chamar-lhe "atentado à liberdade de informação" parece-me um exagero optimista. Significaria que as televisões em geral, e aquele albergue espanhol em particular, informam. Todos sabemos que intoxicam, mistificam, traficam, impingem, vigarizam, lobotomizam, etc, etc -ou seja, desinformam, deseducam e desenfreiam -, informar é que não. Tudo menos isso. Por conseguinte, a ser atentado a alguma coisa, seria à liberdade de desinformação, ou, dito com maior rigor, à liberdade de propaganda. A distinta perua teria todo o direito a fazer propaganda contra o Pinóquio tal qual outros, noutras televisões, por alma de outras gamelas, têm a fazer a favor. Ou há moralidade ou comem todos. Como não há...
Assim, a remoção dum estafermo desta envergadura dos ecrãs, em absoluto, e despido de certo tipo de preconceitos e vistas torcidas, pode até considerar-se um acto de higiene. Se acompanhada do encerramento daquela lixeira a céu aberto que é a TVI, alcançaria mesmo o cúmulo de sanidade pública. E se coroada, logo de enfiada, do encerramento e terraplenagem da SIC, da RTP, então, seria oiro sobre azul. Direi até que, a partir daí, talvez o país recuperasse da zombificação em que, artificial e lorpamente, o mantêm. Talvez um silêncio límpido e súbito nos resgatasse a todos desta telenovela em que, entre estarrecidos e resignados, acordamos todas as manhãs.
A democracia está em risco? Espero bem que sim. Pelo menos esta da treta, do alterne gatuno, das seitas cleptocráticas à desfilada e ao despique. Hão-de um dia rebentar de tanta podridão, já que à saciedade são imunes.

sábado, setembro 05, 2009

Papilas desgostantes

Sempre me fascinaram energúmenos que conseguem distinguir objectos, coisas, entidades ou instituições onde eu, por mais que aguce a lupa, não consigo detectar qualquer diferença. Rigorosamente nenhuma, sublinho. Por exemplo, há tipos que são capazes de comparecer perante mim, com a maior das seriedades, e proclamar-me um ror de destrinças monumentais entre o excremento e a bosta. Ou entre a porcaria e a trampa. Conseguem até ser prolixos, luxuriantes, não raras vezes feéricos, nos flagrantes delírios. Confesso que é gentinha que, ao mesmo tempo que me fascina, também me repugna, quando não me dá visceral asco. É quase instintivo. Mas tenho igualmente que conceder que talvez o defeito possa ser meu. Como só consigo ver bem ao longe, à distância, e tenho imensa dificuldade em ver ao perto, e ainda mais em rebolar-me e retouçar naquilo que, em perfeita sincronia, observo com grande minúcia científica, pode resultar daí a minha incapacidade para certas visões meticulosíssimas.
Embora, lá bem no fundo, eu saiba que o órgão dos sentidos a que eles recorrem para achar tão suculentas diferenças entre o PS e o PSD, digo entre a bosta e o esterco, até nem seja , calculo, o da visão, mas, com toda a certeza, o do paladar. Se repararmos bem, é uma distinção que eles trazem sempre na ponta de língua. Na ponta e na puta.
Impossível acompanhá-los nesse simpósio.


PS: Por aqui se vê que todos esses blogues veneradores da Bruxa e do Pinóquio (passe a redundância), mais até que uma questão de mau gosto, constituem um caso flagrante de mau hálito.

quinta-feira, setembro 03, 2009

Eleicinhas

Não sei quem vai ganhar a velhacagem eleiçoeira que se avizinha. Não sei e, para ser franco, não me interessa. Mas sei, de certeza, quem vai perder. É o do costume: o país. Portugal, chamaram-lhe em tempos. Mais um prego no caixão e mais um certame de vermes.
Entre o Pinóquio e a Bruxa, o diabo não escolhe: patrocina.

quarta-feira, setembro 02, 2009

Uma casa portuguesa, com certeza

Também há notícias, raras é certo, que nos convocam à meditação. É duma dessas (no "Global", de 1 de Setembro) que transcrevo a parte mais suculenta e substancial. Na verdade, toda ela, mas não temam que é pequena, sintética e, atrevo-me a dizê-lo, deslumbrante. Ora tenham a bondade de ler:
«Suspeito de tentativa de homicídio, na zona de Famalicão, foi detido pela PJ um homem de 45 anos.
Durante uma discussão com ameaças verbais, também dirigidas ao filho de ambos, de 15 anos, que veio em socorro da mãe, o arguido "terá tentado estrangular a vítima com um cabo eléctrico, tendo sido impedido pelo menor que atingiu o progenitor na cabeça com uma marreta", refere a PJ.
O arguido tentou ainda atingir os dois familiares com um machado, o que também não conseguiu por ter sido impedido por uma terceira pessoa.»

Leitores, uma narrativa destas transporta-me, no mínimo, ao matutanço. Convocam-me, desde logo, dois enigmas: 1.Como é que, depois de ser atingido com uma marreta na cabeça, o arguido ainda teve forças para contra-atacar com um machado?; e 2. Donde surgiu a "terceira pessoa" que impediu, de alguma forma, esta última e selvática carga?
Ora bem, vamos à primeira.
Parto do princípio que, a não ser nos argumentos de Hollywood, qualquer ser humano, mesmo no estado agudo de psicopatia, uma vez atingido na cabeça com uma marreta, fica indisponível para movimentações imediatas. Portanto, das duas uma: ou o menor não atingiu o progenitor na cabeça; ou não o atingiu com uma marreta.
Agora, quanto à "terceira pessoa", a tal que neutralizou a tentativa de familicídio à machadada...
Saiu de dentro do armário? Brotou de baixo da cama? Estava escondido na varanda? E recorreu a que tipo de ferramenta socorrista: picareta? Moto-serra? Gadanha? Arranca-pregos?
Como vêem, caros amigos, um ror de questões inquietantes. Certeza só há uma: é uma casa portuguesa, com toda ela.

terça-feira, setembro 01, 2009

Do vácuo ruidoso

Fruto dum materialismo balofo e grosseiro que, nos últimos séculos, tem avassalado as mentes, corrompido os corpos e viscerado as almas, vem-se caindo, mais até que na tendência, no vício de confundir essência com circunstância. A pobreza ou a riqueza não são essências humanas: são meros acidentes, puras circunstâncias da existência. Não é menos homem o homem apenas porque é pobre, nem é mais homem o homem só porque é rico. Bem pouco é ter muita coisa - ninharia, na verdade. Ter não acrescenta nada ao ser de cada qual. Apenas o nanifica, mutila e irrisa quando se arroga aleives de substituição. É melhor o inválido só porque tem uma cadeira de rodas? Vale mais o aleijadinho só porque possui um ror de próteses? Só num mundo em que todos se degradem a inválidos e aleijões. Só numa enfermaria de amputados e autofágicos.
"Ah, mas não é nada disso!" - proclama-me o junkie porta-coisas. "Os meus teres não diminuem o meu ser; pelo contrário, amplificam-no!" E, como prova eloquente dessa excelência, apresenta-me uns ouvidos descomunais, uma língua desmesurada, uns olhos ultra-devassantes e um naríz de enormíssimo alcance. Ouve, vê, fareja e palra cada vez mais longe, cada vez mais alto e, em suma, cada vez mais. No entanto, pensa, reflecte e compreende cada vez menos. Esta hipersensualidade exorbitante é só a máscara do seu raquitismo espiritual. O excesso de sensações, de sensacionalismos apenas promove, por arrasto, a ausência clamorosa de senso, o atrofiamento de toda e qualquer hipótese de sensatez. À medida que se inunda de mundanidades, esvazia-se de si; na proporção em que se embriaga e empanturra de sentidos, perde o sentido. A enxurrada, porém, não é só de fora para dentro, pelas comportas abertas da imbecilidade cultivada, premiada e campeã: de refluxo, é também despejo. O porta-coisas lava o cérebro no esgoto do mundo. E se é verdade que a função faz o órgão, não é menos verdade que a prótese apenas preenche o seu vazio, quando, como é avassaladoramente o caso, não o engendra e fabrica.