segunda-feira, agosto 22, 2022

Coincidências e vigarices

 Dois dias antes da fatídica explosão do carro de Dugin, a televisão ucraniana, no canal 1+1 (o mesmo que eleiçoou a anão Zelento) fazia dele uma espécie de Rasputine putiniano. 

Os ucranistões - a seita de Kiev - são peritos em inventar realidades paralelas. Eles e os progressistas que os manipulam, bem entendido. A coisa, assim vista de fora, quando transborda na comunicação social globoxidental, semelha uma espécie de aldeia dos macacos: um guincha, desata tudo numa ensurdecedora guincharia geral. Às tantas, já nem se destrinça quem é que guincha primeiro, ou seja, quem manipula quem. Se atentarmos ao nível das administrações - amerdicadanas e europeias - fica até a ideia que um bando de rogue intelligence (ou alienígenas, sabe-se lá, já estou por tudo, até pela teoria fetiche do Caguinchas) telecomanda uns através dos outros.  Mas adiante.

Querem-se implantar, básica e grosseiramente, duas vigarices: que Putin é o Kremlin; que Dugin é o "cérebro de Putin". Se pensarmos que toda esta "teoria da conspiração" é oriunda duma associação de zombies, ficamos, desde logo, esclarecidos.

1. Putin é um realista, moderado e, até há bocadinho, "pró-ocidental". O seu paradigma é Pedro, o Grande. Herdou o descalabro resultante de Catastroika, ou seja, a segunda debacle auto-inflingida pela Rússia: depois da Revolução de Outubro, a "democratização". Isto é, depois da ingestão de cianeto, a bebedeira de 605 Forte. Que o urso tenha resistido e sobrevivido às duas doses, só atesta da sua enorme força vital e resistência sobrehumana. Deviam meditar um pouco sobre isso, as bestas actuais do oxidente. Leiam o " A Rússia sob a Avalanche", de Soljenitsine, e está lá o caderno de encargos e o mapa de viagem de Putin. Eram até amigos. Todavia, o próprio Soljenitsine não é pacífico no actual Kremlin. Que não se resume ao presidente da Federação Russa. Inventar que Dugin é um novo Rasputine não passa de teoria de conveniência: convém à propaganda diabolizante do Vladimiro. Na verdade, escoraria mais num Maquiavel, ou até num Salazar, a fórmula putinesca de exercício do Poder. E uma das provas é que não se trata, em momento, tendência ou manifestação alguma, dum radical. A última dúvida que houvesse sobre isso, desfez-se agora na Intervenção Militar na Ucrânia: há bandeiras da Rússia, do Império Russo, da União Soviética e até de Cristo hasteadas nos blindados. Isto é o oposto do radicalismo, do sectarismo, da divisão. Pelo contrário, é a assunção plena do passado, sem traumas nem mutilações, e o prosseguir adiante. Precisamente o contrário do que se passa hoje connosco: patinamos no mero cuspir no passado, confinados num limbo algures entre a lobotomia e a amnésia, sem irmos a lado nenhum. E quem diz Portugal, pode mesmo dizer a Europa quase inteira.

2. Por outro lado, o que não se perdoa a Putin não é uma qualquer putativa nostalgia de Império, como se ele já não tivesse território bastante com que se coçar. Ou como se ele é que andasse a infestar o mundo de bases, basinhas e basetas. O que é inadmissível é ele ter recuperado a soberania da Rússia. A soberania plena. A defesa intransigente dos interesses do povo dele contra os manda-chuvas globais, deuses de hospício auto-eleitos, por pluto-sufrágio  e criptarquia rastejante. Esse é que é o pecado imperdoável. Pior: o mais abominável dos exemplos planetários. O hediondo horror não é ele estar a conspirar ou planear um Império imaginário; não, o ominoso, aos olhos das bestas, é que ele está a levantar-se contra o Império efectivo, concreto, vigente. Felizmente, o Putin não é um santo,  senão estava lixado e, a esta hora, já teria experimentado o martírio inerente à categoria. Deus no-lo guarde assim, por muitos e bons anos.

3. Argumento extremo, a limite, admissível: Putin seria mais uma manifestação da dialéctica hegeliana: a tese - o Império; a antítese - a União Soviética; logo a síntese: a Federação Russa de Putin. Não vou muito por aí (Hegel faz parte dos meus ódios de estimação, juntamente com Descartes e vários outros), mas, se assim fosse, restar-me-ia um derradeiro voto: aguardemos que a Providência Divina nos conceda a Graça de alguém que faça a síntese entre a tese -  Estado Novo, e a antítese - a herpecracia instalada. Não é fácil, mas os grandes Homens são para as ocasiões.

4. Por fim, isto dos filósofos se meterem em política nunca deu bom resultado. Meterem-nos outros, sem procuração, nela, embora ainda mais frequente, tão pouco tem sido brilhante; longe disso. A filosofia está para a política como Deus está para o mundo: só funciona bem fora dele. Tal qual os faróis orientadores: se a luz guia está no próprio navio, é certo e seguro que vai acabar por naufragar contra os escolhos, durante a tempestade. Ou do mesmo modo que o maestro dirige a sinfonia de fora da orquestra.

5. Derradeira nota: com isto tudo, e apesar de tudo isto, o facto é que se promoveu Dugin. E lá se deu mais um passo na ficção paralela: Dugin existe, é importantíssimo, mais, é determinante. E, sobretudo, é mais uma prova incriminadora e denunciante do plano diabólico de Putin. Quem o acusa? O próprio Diabo.


PS: Por via das dúvidas, deixo a minha definição de "Filosofia". Como eu a entendo e pratico. Cito (-me): "Filosofia antiga é a mais desbragado dos pleonasmos. A filosofia germinou, floresceu e deu frutos na Antiguidade.  O resto são notas de rodapé.»  Acrescentaria apenas, em tom laminar, que um dos grandes problemas da humanidade é dedicar à filosofia a atenção inversa que dedica aos contratos bancários. E quanto mais pequenina a nota e a letrinha da nota...

7 comentários:

Anónimo disse...

https://t.me/loordofwar/37349?comment=62853

Ricciardi disse...

A admiração por Putin não é um exclusivo do Dragão. Nada disso. Os amigos de Putin são estes respeitáveis regimes: China, Coreia do norte, Venezuela.

O que é que os admiradores de Putin tem em comum. São todos comunistas.

Mas, então, se são todos comunistas, por que raios há uma certa direita que gosta muito do Putin?

Porque é uma direita ostensivamente autocrática. Não é uma direita normal, democrática. Não, é uma direita tão extremada quanto extremado é o comunismo à esquerda.

Sao tão extremadas que acabam por se unir.

E depois dizem que o Putin é um realista, tal e qual Pedro o Grande, esse realista emperdenido.

Não. Putin é, isso sim, um grande filho da puta. Como filho da puta foi o Bush filho quando invadiu o Iraque.

Sendo, portanto, um filho da puta, não admira que tenha alguns simpatizantes. São uma espécie de irmãos, de pai diferente. Filhos da mesmíssima puta.

Rb

Vivendi disse...

https://www.20minutos.es/noticia/5043638/0/rusia-acusa-servicios-secretos-ucrania-preparar-cometer-asesinato-hija-dugin/

Anónimo disse...

O Vlad é tão malvado que propôs aos americanos que a Rússia entrasse na Nato. Fecharam-lhe à porta na cara.
https://amp.theguardian.com/world/2021/nov/04/ex-nato-head-says-putin-wanted-to-join-alliance-early-on-in-his-rule

No final dos anos 90, os russos assumiam-se como plenamente europeus, empenhados na construção de uma Europa das nações.
https://www.russiamatters.org/analysis/alternative-history-would-russia-nato-and-eu-be-game-changer-wests-rivalry-china

Mandaram o Putin passear. É um belicista muito muito mau, não queremos misturar-nos com essa gente.
Agora não temos pitroil nem gás nem parceiros para enfrentar a China.
Estamos todos de parabéns.

Miguel D

Vivendi disse...

O assassinato de Dugina está resolvido, o principal:
Os serviços especiais ucranianos estão por trás do assassinato
🔻 Intérprete - cidadã da Ucrânia Natalia Vovk, nascida em 1979
🔻 Ela chegou à Rússia no dia 23 de julho com a sua filha Sofia Shaban
🔻 Alugaram um apartamento na casa onde Dugina morava em Moscou
🔻 Mini Cooper foi usado para espiar a Dugina. Os números foram alterados três vezes - matrículas do DPR, Cazaquistão e Ucrânia foram usadas
🔻 No dia do crime, Vovk e sua filha vieram ao festival da Tradição, e após uma explosão controlada no dia 21 de agosto, saíram por Pskov para a Estónia

Ricciardi disse...

Miguel, temos pitroil, teremos gás e outras alternativas e, cereja em cima do bolo, a dependência dos russos será nula.

Vamos ver, a Rússia é, em termos económicos, pouco maior do que a Espanha. Com o PIB que tem não aguenta esforços de guerra por muito tempo. Para este tipo de PIB as guerras devem ser curtas, rápidas, contundentes. Se assim não for, começa a pesar imenso nas contas do país e das pessoas que lá vivem.

Na Rússia o negócio do momento são as sucatas. Aviões e automóveis estão a ser desmanchados para fornecer peças a outros. Por causa das sanções. Chega mesmo ao ponto de ser mais caro comprar uma peça na sucata do que uma peça nova. À medida que o tempo passa e a guerra continua (e já lá vão 6 meses) às sanções começam a criar sérios problemas na cadeia económica russa. Não é apenas aviões e automóveis. É tudo. Peças para frigoríficos, televisões, etc.

Este caminho é o caminho para a ruína da Rússia. A China está a dar um abraço de morte à Rússia extorquindo -lhe o gás e petróleo ao preço da uva mijona, gerando uma dependência da Rússia grande a preços reduzidos. Além disso encharca a Rússia de produtos chineses para substituir as importações do ocidente.

É claro, os produtores de gás e petróleo que antes vendiam para a China e para Índia vão procurar novos mercados e encontram na Europa um excelente mercado.

Em suam, a China são a ganhar, os EUA e os países do golfo saem a ganhar porque venderão o seu gás e petróleo. A Rússia sai sempre a perder.

Qual é então a alternativa da Rússia de Putin?

Como referi, o caminho é a ruína, exceto se o Putin invadir mais países para lhes subtrair riqueza.

É agora a única via para não caminhar para ruína. Invadir países. Casaquistoes, Moldávia etc e subtrair-lhes riqueza ao bom jeito hitleriano.

Financiar, pois então, a guerra, com os recursos dos países invadidos.

Putin pode por a mão na consciência e perceber que cometeu um erro. Mas não vai fazer isso. Isso seria o seu fim nos meandros do Kremlin. Fazia-lhe a folha rapidamente.

Portanto, é atacar mais países a solução.

Como o ocidente percebeu isso logo desde o início, o que é raro, agiu como raramente age. Com determinação e sem qualquer ponto de negociação que não seja a retirada da Ucrânia.

Com um bônus. Ficamos a saber que as forças armadas russas são uma valente merda. Em seis meses ainda só ocuparam uma pequena franja leste da ucrania. Não conseguem grandes vitórias contra um país sem aviação, sem organização militar, com déficit tremendo de material.

Rb


Figueiredo disse...

Resposta ao comentador Miguel D:

A República Popular da China (RPC) não precisa de ser enfrentada porque não é nenhuma ameaça, aliás a República de Portugal só tem a ganhar com o estreitamento dos laços diplomáticos, económicos, e culturais com a China, tendo em conta os séculos de relações amistosas e de benefício mútuo que os Portugueses têm com esse país e outros do Continente Asiático.

A Federação da Rússia (FR)é o maior país da Europa e Super-Potência Europeia desde sempre; Portugal muito deve a esse grande Estado-Civilização que nos prestou um auxílio fulcral - e de forma genuína - na resistência e expulsão dos Franceses durante as Invasões Napoleónicas.

O Continente Europeu só tem a ganhar com o fortalecimento das suas relações com a Rússia em todos os aspectos, ao invés de continuar a ser vassalo e explorado, pirateado, saqueado, e submetido ao sub-desenvolvimento pelo regime da Inglaterra e sua nefasta e extremista ideologia liberal, que tanto mal tem feito à Europa e ao Mundo.

Neste momento podíamos estar a receber petróleo e gás de alta qualidade e a um preço baixo vindo da Rússia, mas graças às ilegítimas ditaduras liberais Ocidentais patrocinadas por Davos, vamos entrar num ciclo de empobrecimento geral criado propositadamente por essa escumalha para nos manter dependentes dos Anglo-Saxónicos (Inglaterra e Estados Unidos da América do Norte) e seus lacaios que nos vão vender gás e petróleo de inferior qualidade e a preços altíssimos.