E finalmente, após longas férias, cá está o vosso repórter adorado, leitoras, ex-leitoras e futuras leitoras!... Quanto aos leitores, coragem rapazes, é difícil, mas se treinardes muito, um dia sereis quase como eu.
Vamos ao assunto, à vaca -na verdade, nem se percebe bem que raio de bicho é, se vaca, se boi, se voi, ou baca, ou bezerro, enfim, chamemos-lhe rês - fria. Congelada, liofilizada e ultrapasteurizada, aliás.
Comigo (a relativa e prudente distância, entenda-se) está o representante do +, também conhecido na língua dos camones bífidos como "Plus". Passemos às hostilidades...
Repórter Flash - Prefere que o/a/os/as/etc trate por "Mais" ou "Plus"?
Representante + - Pode ser Plus, se bem que objsectualmente me assuma como NBSWT, com os pronomes lhe, convosco; as proposições após, até; e os advérbios tão, decerto e rapidamente.
Repórter Flash - NBSWT?
Representante + - Não Binário Station Wagon Turbo.
Repórter Flash - Ah...Percebo. Encontrou, portanto, aí, nessa sigla, a sua identidade - ia dizer sexual, mas se calhar o mais correcto é dizer "de género"?
Representante + - Sim, sim... De género.
Repórter Flash - E sente-se feliz, plenamente realizado?
Representante + - Razoavelmente satisfeit-lhe, mas estou sempre em trânsito. Aspiro a tornar-lhe NBSUV.
Repórter Flash - Traduzindo para os leigos...
Representante + - Não Binário Sport Utility Vehicle
Repórter Flash - Ah, pois. Devia ter adivinhado. Mas eu é mais futebol e gajas, carros nem por isso. Só se for para endrominar as gajas ou apanhar boleia para o estádio. E, se não é indiscrição, quando foi que fez a transição para o seu género actual? Isto é, segundo os termos mais categorizados, quando é que saiu o armário?
Representante + - Nunca saí do armário, que nojo! O armário é mais para LGês e outros pindéricos. Nós, os/as/x/y/xyw NBSWT, saímos da garagem, caro senhor! Da garagem!...nada de confusões.
Repórter Flash - Pronto, ainda bem que esclarece. Não queria ofender. Saem, portanto, todos da garagem, jamais do armário, é isso?
Representante + - Todos, também não é bem assim. Todinosco. E algunosco não saem da garagem. Caso de NBMini ou NBF - saem do parque subterrâneo. Ou do alpendre da padaria.
Repórter Flash - NBMini, acho que entendo, mas NBF...?
Representante + - Não Binários Furgão.
Repórter Flash - Eh voilá e olari! Muito bem. Avancemos para o cerne da reivindicação: estão então em protesto; já marcaram um buzinão para tempo indeterminado; vão avançar com marchas lentas na auto-estrada e engarrafamentos de pontes. Os nosso leitores precisam de ser informados dos motivos para tanta irritação social e ruidosa reclamação. Quer iluminar-nos?
Representante + - Estamos/as/lhes indignados! Não se admite! Trata-se clara/o/lhes e ostensivamente duma plusfobia do próprio Estado - uma descriminação, uma violência, a redução ao incógnito, ao indeterminado, ao mero signo aritmético da adição toda uma minoria oprimida, ignorada e desconsiderada. Pretendem varrer-nos para debaixo do tapete, é o que é. Refiro-me ao novo artigo da Lei orçamental onde somos esmigalhados à insignificância dum apêndice onomástico. Um etc e tal. E note-se todo o próprio acinte normatóxico do "etecétera" - porque não "homocétera", já pensaram nisso?!
Repórter Flash - Diz bem, nunca me ocorreria. Estou banzado!...
Representante + - E depois, repare, violência doméstica... e a violência no trânsito, não conta? Os táxistas, já viu? São um perigo, uma ameaça vocabular e vernacular a todo/a/lhe/'nosco NBSWT, TDI, SUV, GTI e até S! E os polícias, outros que tais. Já não falando nos trolhas encarrapitados nos andaimes, ou escavando valas e largando dichotes boçais!... Uma vergonha! Uma violência a céu aberto!... Um trauma à nossa espera a cada esquina. Um nojo. Gentinha pobre, invejosa e ressabiada!...
Repórter Flash - Pois, realmente... assim posto. E como explica tamanha e tão inusitada desconsideração?
Representante + (furioso) - Racismo ideológico! Descriminação social invertida! Cripto lóbi!
Repórter Flash (esboçando um quase salto) - Poça, até me assustei! Como assim?
Representante + - Governo socialista, constituição socialista, maçonaria, Ilda, Bloco, PAN e toda essa seita esquerdoida! Como são dominados, lambuzados e infestados pelos LGTBI, pura e simplesmente, não querem saber dos outros. Sim, porque os que saem do armário têm é ódio e inveja daqueles/as/lhes que saem da garagem! Típico da gente minúscula, pequenina, carunchosa! Aposto que não sabia...
Repórter Flash - Completamente nas trevas. Mas isso é muito grave... Paridos pelo armário contra paridos pela garagem, que tremenda sarrafusca!...
Representante + (quase aos gritos) - Gravíssimo!! Típico do Terceiro Mundo!... do quarto século, DC!... É gentalha retrógrada, sectária e apeada mental! Só pretendem e porfiam é no ascensorismo bancário! E administradeiro!... Corruptos!... Só pensam neles. Os outros: hetecétera!
Repórter Flash - Segundo diz a meu chefe Dragão, "outro" diz-se "hetero". Ou "hetero" significa "outro", já não me lembro bem. Julguei que a "heterofobia" era o que vos animava e congregava a todos/as/lhes, lá nesse vosso arraial LGBTI+...
Representante + - Sim, é verdade. Só que eles/as/o raio que os parta são duplamente heterofóbicos, isto é, praticam a heterofobia boa e a heterofobia má. Explicando melhor: o ódio aos outros, normais (que é bom), e o ódio aos outros/as/lhes, anormais mas superiores (que é péssimo). E esta lei é o exemplo acabado disso. Ódio e inveja, sobretudo esta, convém nunca esquecer. São a Lumpenagem do género! Saíram do armário mas vivem à espreita duma arca do tesouro onde se meterem e saquearem! Tudo não passa dum pretexto para mera ascensão no mobiliário! Do armário para a arca e desta, em passo acelerado, para o cofre-forte.
Repórter Flash - Estais portanto a ser vítimas, presumo...
Representante + - Duplamente vítimas! Bivítimas! Vítimas a dobrar - do Estado, através da lei vassoura; e dos mentores do Estado, através do lóbi do armário! Um descomunal icebergue de que apenas assinalarei algumas pontas mais evidentes: veja bem, violência doméstica e violência contra género, esgatafunham e borratam eles no articúlo miserável. Pensemos num Pansexual, está a ver?, não só não pode estar confinado a uma relação, como, tão pouco, a um género. Mesmo, até a uma espécie. Por definição e vocação, pode sentir inclinação, quer amorosas, quer identitárias, com outras espécies. Senão até por objectos inanimados, quer de índole especificamente erótica, quer, mesmo, utilitária. Agora considere: imagine o berbequim adaptado que, por alguma excitação eléctrica, o agride analmente, causando-lhe lesões com internamento hospitalar... Vai-se arguir quem: o utensílio ? O retalhista que o vendeu, caso ainda esteja na garantia? A EDP, por pico na rede sem aviso? Quem? E é violência doméstica ou violência bricolage? Contra género não é de certeza. Mesmo um pansexual que viva em união de facto com um pepino/a ou curgete... Se, num ímpeto de excitação, o comer literalmente em salada. Pode ser considerado "violência doméstica"? Duvido muito. Está a ver o absurdo legal?...
Repórter Flash - Estou, estou... Com muita clareza.
Representante + - E agora ainda mais grave: um Assexual. Eis alguém que não experimenta qualquer necessidade de intercâmbio sexual, erótico, ou equivalente e apenas sublima tudo isso através duma dedicação canina ao trabalho... passando os dias a olhar para o umbigo, e as noites a olhar para a televisão ou para o monitor do portátil (peregrinando o ebay, a amazon ou a CNN panda). Sem sexo, que género é o dele? Sem família, qual a possibilidade de violência doméstica? Zero, duas vezes zero. A não ser que se suicide. Mas, nesse caso, vão incriminar e prender quem?
Repórter Flash - Ocorreu-me agora: um parassexual, isso existe?
Representante + - Mesmo que não existisse, a partir do momento em que o menciona passa a existir. Excelente alvitre, aliás. Um parafílico é um parassexual. E aí está mais uma acha para a fogueira, mais um argumento superlativo a dar força ao nosso protesto. Um fetichista que coabita com um ursinho de peluche, não é gente? Não é digno de protecção legal? Um casal sado-masoquista hardcore cuja relação e prazer orgástico resulta precisamente da prática de violência doméstica? Vão ser ilegalizados? E mesmo, atente, um pedófilo culinário que mantém múltiplas relações picantes com séries sucessivas de jaquinzinhos, pipis, leitões à bairrada ou choquinhos com tinta... Que protecção ou repressão pode ter ele, segundo esta legisladela mal amanhada?... batatas, digo-lhe eu.
Repórter Flash - Batatas, de facto. Eventualmente assadas. E olhe, já agora, sem querer abusar da sua sapiência, elucide-me: sendo um Não Binário, concebe a possibilidade da existência dos Não Trinários? E que viriam a ser? Partindo o princípio que não estou a colocar uma questão estúpida e sem sentido...
Representante + - Não, de modo nenhum. Tem todo o sentido. Estamos no âmbito da metassexualidade. Pessoas que estabelecem relações fora da normatoxicidade triangular; masculino/feminino/divino...
Repórter Flash - Portanto, se bem calculo: Pessoas que conseguem estabelecer relações anormais com o Além?...
Representante + - Exactamente. Pessoas que vivem relações íntimas com almas ou entidades do outro mundo...
Repórter Flash - A que antigamente se chamavam possessos?...
Representante + - Sim, ou pastores evangélicos. Em qualquer dos casos, essa taxonomia negativa, tratava-se duma violência detractora e maldizente por parte dos poderes patriarcais, ditatoriais e normatóxicos instalados. Contra todos os NT (não trinitários), ou seja, aqueles que mantinham relações fora da igreja.
Repórter Flash - Outrora denominados bruxas, feiticeiros, videntes e médiuns de pé de galo?
Representante + - Todos esses. E também cartomantes, necromantes, astrólogos, iluministas, economistas e, na actualidade, mais fervorosos e alucinados, analistas político-militares. Ah, nunca esquecendo os psicanalistas - da escola Ikea, ou Conforama, ou Jom e seus derivados. E a toda esta multidão desalojada o que diz o decreto? Nada. Não existem. Durante um sabatt solsticial, o bode presidente, de mau humor, assesta uma cornada mais contundente numa das voláteis núcegas fazendo-a cair da vassoura abaixo e causando-lhe inúmeras escoriações e esfolamentos... Que formação tem a transpolícia para responder a um fenómeno destes, que ferramentas judiciais? Enquadramento legal, viste-o? Eu também não. Um possesso, coisa aliás comum, é espancado pelo seu cônjuge cavalgante. Vão identificá-lo e autuá-lo como, ao abusador? A transpolícia, entre os seus auxiliares científicos, tem um exorcista- ainda para mais especialista em hipismo sobrenatural?... Está a ver o completo contra-senso?
Repórter Flash - De olhos esbugalhados.
Representante + - Escreva aí: não nos calaremos! Ninguém nos calará! É um escândalo. Um despautério legal!
Repórter Flash - De facto. Entretinto, esta conversa, se bem que fascinante, já vai longa. Temo que o nosso tempo de antena esteja a expirrar. Uma última questão, de índole até mais curiosa que científica: Quando e por que motivo sentiu a necessidade, vocação, expediente, ou o que lhe queira chamar, de sair da garagem e aderir a esse grande movimento civilizacional LGcoiso&tal Plus ?
Representante + - Olhe, para lhe ser franco, foi por ocasião dum grande desgosto amoroso...
Repórter Flash - Não me diga que alguma boazona, no corolário da adolescência, lhe deu uma formidável tampa...
Representante + - Não. Foi quando não me convidaram para a Opus Dei.
Pronto, queridas leitoras, cavalheiros, antepassados do Além, foi a entrevista possível. Um bom 2023 para todos, que cheguemos ao Natal de saúde, e aqui deixo um último pensamento edificante: É lixado o amor... ao dinheiro.
Ildefonso Caguinchas
(Engenheiro Arquitecto Webmonstro e Jornalista agnóstico)