segunda-feira, fevereiro 28, 2011

Mentalidade Protestante




A descrição deveras ilustrativa dos habitantes da Nova-Inglaterra, no século XIX, feita por um observador da época:

«Os habitantes religiosos e politicamente livres da Nova-Inglaterra são como uma espécie de Laconte que não faz o mínimo esforço para se libertar das serpentes que o envolvem. Mamon é o seu ídolo, ao qual adoram não só com os lábios mas com todas as forças do seu corpo e do seu espírito. A seus olhos a Terra é apenas uma Bolsa; estão convencidos que não têm cá em baixo outro destino que não seja tornarem-se mais ricos que os vizinhos. O comércio apoderou-se de todos os seus pensamentos e o seu único entretenimento é trocar objectos. Quando viajam, transportam, por assim dizer, o balcão e a mercadoria às costas e só falam de juros e lucros; e se, por instante, perdem de vista os seus negócios, é só para meterem o nariz nos negócios dos concorrentes.»

Parece que a epidemia que grassava na Nova-Inglaterra no século XIX se tem vindo a propagar ao resto do mundo. Como Cristo, também já o anticristo passeou entre nós. Chamava-se Calvino.

domingo, fevereiro 27, 2011

O paradigma reencontrado


Que a superioridade da mentalidade protestante sobre a cultura católica em matéria de virtude democrática seja flagrante parece-me pacífico. Agora, que se rebusque em Nossa Senhora a justificação para tão avantajada e vantajosa predisposição é coisa que nem lembraria ao diabo (embora não me ocorra pôr as mãos no fogo pelos filhos dele). É como ir garimpar no Além réus para uma qualquer pocilga deste mundo. E já que, na verdade, é dum superior desembaraço no chiqueiro mundano que se trata, nada como atentar no animal emblemático, que é como quem diz, no paradigma instigador, mais até que inspirador. Em síntese: não é a Mãe Celeste, nem o jardim tão pouco: é o porco. Tudo se resume à relação cultural com este modelo tutelar e totemístico: os católicos comem-no; os protestantes imitam-no. Ficam-se aqueles, preguiçosos, pela alarvice; labutam estes, incansáveis, pela perfeição.

domingo, fevereiro 20, 2011

Subsídio para a questão do (des)ensino

Deviam capacitar-se todos os ilustres pensadores e opinadeiros das redondezas, e duma vez por todas, que nem as pessoas são chouriços, morcelas, linguiças ou qualquer outra modalidade de enchidos, nem a formação das pessoas obedece a regras típicas de salsicharia. A não ser que a questão se resuma a discernir qual o tipo de vazadouro mais apropriado para as digníssimas famílias depositarem as respectivas proles em idade aprendiz, durante o horário de serviço, que é como quem diz durante o maior número de horas possível; qual o aterro fito-sanitário mais selecto ou apenas menos oneroso para o contribuinte, esse otário incurável. Ou qual o picadeiro de apicavalgaduras com os melhores palhas, jóqueis e treinadores
De facto, o cerne do problema começa por algumas definições muito simples, mas deveras necessárias. Cito apenas um par delas: a) se a escola deve ser um local para adestramento de insectos colectivos ou formação de pessoas; b) se a escola deve integrar-se num esforço colectivo de formação de caracteres, ou apenas numa engrenagem geral - e generalíssima - de deformação e esterilização de mentes.
A limite, a questão até se resume a uma perplexidade muito breve, crua, mas todavia eloquente - a saber, porque é que o Liceu Nacional D.João de Castro do meu tempo, que era uma escola pública, como a generalidade das escolas públicas dos anos 60/70, dava uma abada de dez a zero nos melhores alfobres privados dos dias que correm?
É que, ninguém tenha dúvidas, dava mesmo. Eu, que fui um aluno pouco notável, a não ser na devoção ao futebol e à garupa das colegas, sou um exemplo vivo disso tudo. E não é preciso ir ao extremo de citar um super-liceu, verdadeiro olimpo das letras e ciências, como era o D.João (reitorado pelo temível e inigualável Luís G. Silva, se bem me lembro). Qualquer outro liceu vulgar, meramente humano e banal daqueles tempos, mesmo no Porto estou em crer, ou até no bairro de Alvalade, fosse este em Lisboa ou Luanda, funcionava dez vezes melhor que os melhores desta miserável e estéril época. E o busílis é, na verdade, esse: porque é que um ensino que outrora funcionava agora disfunciona?
Bem, pela mesma razão que tudo aquilo que funcionava mal no antigamente agora ainda funciona pior, tanto quanto tudo aquilo que funcionava razoavelmente, que não era assim tão pouco, agora, após não sei quantos experimentalismos e frankenstoinices de importação, disfunciona com alarvidade monumental. E essa razão tem um enunciado muito simples e prático: é que tudo o que se faz e tem feito nestes últimos trinta anos, a nível público, público/privado (e até privado, passe a redundância tripla) mais que texto para uma qualquer melhoria dos serviços e mecanismos da sociedade, tem servido de mero pretexto para o enriquecimento e o sustento sumptuoso de meia dúzia de indivíduos, geralmente organizados em forma de quadrilha legal, vulgo partido político. E isto, desenganem-se os sonsos da praxe, não é mera conversa de táxista. Pois da treta, em bom rigor, já nem sequer é a conversa: é o país.

sábado, fevereiro 19, 2011

Breve manual de economia medieval para otários


Talha - obrigação pela qual o servo deveria passar, para o senhor feudal, metade de tudo que produzia nas terras que ocupava no feudo.

Corvéia - obrigação que correspondia ao pagamento através de serviços prestados nas terras ou instalações do senhor feudal. De 3 a 4 dias por semana.

Banalidade - obrigação que correspondia ao pagamento pela utilização das instalações do castelo. Se o servo precisasse usar o moinho ou o forno, deveria pagar uma taxa em mercadoria para o senhor feudal.

Portanto, ó caros democratas do cuspo, é só substituir "feudo" por "Estado" (entre "finanças" e "Segurança social"), "talha" por "contribuição", "corvéia" por "imposto", "banalidade" por "portagem", "taxa moderadora" ou "de estacionamento", e, claro, "servo" por "contribuinte". E pronto, aí tendes toda a vossa tão cantada e lambuzada "modernidade". A única diferença é que o "senhor" agora não é apenas um, são muitos. Mas todos a viver à grande e à francesa. Ao pé deles, o velho senhor feudal até faria figura de asceta.

PS: Ah, pois, e outra diferença catita é que eles agora já não aceitam pagamento em géneros. Tem que ser tudo em metal sonante.

PS 2 : E de bónus ainda tendes algo que eles não tinham: juros!

sexta-feira, fevereiro 18, 2011

Tanatodiceia Europeia (rep)

O problema, se me permitem recordar, é que a Europa saiu derrotada da Segunda Guerra Mundial. Não tanto a Alemanha, que claramente aspirava a megalomanias peregrinas e apenas perdeu a sua própria autonomia, mas o Império Britânico. Com a queda deste (e dos outros por arrasto), faliu a tentativa civilizadora europeia à escala global e triunfou a Terceiro-mundização do Planeta através dos seus motores principais, apenas hostis porque rivais: os Estados Unidos, a União Soviética e a China.
Ora, se o colonialismo, por dinâmica intrínseca e necessária, implicava uma gradual europeização do "terceiro mundo", posto que baseado numa deslocação de populações europeias e em consequentes laços comunitários a longo prazo, já o neocolonialismo, como a realidade não pára de demonstrar, instala ora o caos ora a exploração desenfreada por cleptocracias convenientes, donde resultou, primeiro, a retirada trágica das populações europeias e, logo de seguida, o êxodo das populações indígenas. Uma vez que a civilização não resolveu o problema no seu local próprio, importou-o. Recebe-o agora em sua casa. Falhada a europeização do Terceiro Mundo, é agora a Europa que se africaniza, muçulmaniza e orientaliza. Perdida a sua cultura, entrega-se agora à multicultura, ou seja, a qualquer cultura - na verdade, cultura nenhuma.
Também, se a civilização europeia, na sua acção colonial, constituía, para as populações autóctones, uma forma de ultrapassagem do tribalismo, ao retirar, devolveu-os à selvajaria - amplificada agora por armamento moderno e manipulação à distância. Mas pior que isso: ao perder, ela mesma, a sua cultura baseada na nação própria e no Deus comum, a Europa resvalou para o tribalismo -tenha essa tribo a forma de gang, partido, facção, seita, sindicato, claque, bando ou sociedade secreta. Como em África, as tribos predominantes são transfronteiriças e promovem cleptarquias supranacionais. Alegremente, o mundo inteiro resvala e patinha no animismo: a Ocidente adoram-se - não pedrinhas, tótens ou entidades naturais, mas - bugigangas, maquinetas ou tótens artificiais. Com a vaidade acrescida de quem se acha o cúmulo da modernidade.
Entretanto, esta Europa cada vez mais americanizada - estes Estados Unidos da Europa * (que mais não são que a balcanização ao retardador desta) que se cozinham à surrelfa e por determinação "superior" -, revelam bem o modelo genético do seu demiurgo - o melting-pot de mão-de-obra emigrante, capital à rédea solta, e lucro acima de tudo.
No meio de tudo isto, não deixa de ser irónico, até natural -e sintomático! - que os nossos jovens, bem intencionados, generosos, mas lavados ao cérebro desde pequeninos, queiram ser Europeus num tempo em que a Europa se vem entregando, sob patrocínio e imposição cripto-alógenos, a um lento e rasteiro hara-kiri.
Para a Nova (Des)Ordem Mundial, que não é europeia, a Europa é só mais uma neocolónia. E as massas que nela habitam, de múltiplas cores e credos, são gado. O que, diga-se de passagem, elas tudo fazem por merecer.
Por mim, cá vou rezando às grandes catástrofes naturais. Tenho fé.


*Nota - Onde os "estados do Sul" se renderam sem a dignidade mínima duma guerra.

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

Da Distracção Imperatriz


Ao fim de nove anos lá descobriram a velhota morta. Ao fim de mais de trinta ainda não se aperceberam que o próprio país faleceu. Para a velhota ainda havia a atenuante de estar escondida em casa, longe das vistas e, pelos vistos, dos narizes. Mas o país, caramba, putrefaz-se em plena rua, na via pública, a céu aberto!...
Tudo indica que, em 1822, não foi uma constituição que Portugal adquiriu: foi uma doença terminal. Venérea.
A República? Há muito que degenerou em império: Da distracção.

quarta-feira, fevereiro 16, 2011

Dos Pitas aos Pinas, passando pelas Pu...

Desta croniqueta , dum tal Manuel António Pina, retenho e sublinho estas duas passagens:
a) «Escritores e artistas raramente são exemplos morais recomendáveis.»
b) «A História está cheia de obras sensíveis e generosas, às vezes de grande riqueza moral, realizadas por gente feia, porca, má ou nem por isso.»

Não conhecendo eu tão preclaro opinadeiro, googlei em busca de mais informações. Informa-me a wikicoisa tratar-se dum (sic) "jornalista e escritor português", além de advogado goro, especializado em "poesia e literatura juvenil". É premiado, laureado e mencionado, com traduções lá fora. Não será um Saramago, mas não se pode ter tudo.

Ora bem, é no afã de nos tentar moralizar contra as touradas, essa barbárie nacional que cumpre erradicar duma vez por todas, quanto mais não seja a bem do estômago hiper-sensível das pessoas generosas como ele (presumo), que o sensível e generoso Pina nos proporciona tão suculentas e trepidantes considerações.
O problema é que das duas uma: ou o seu apelo, opinião ou exemplo não são recomendáveis, pelo que se dispensam liminarmente; ou pura e simplesmente se expulsa da categoria de escritor ou artista. Nesse caso perora-nos em que condição - advogado? Jornalista? Bem, se os escritores e artistas não são recomendáveis, que dizer então de advogados e jornalistas? Entre aqueles e estes, no bordel da imoralidade, poucos duvidarão que abisma a diferença que separa frequentadores de profissionais. Se pensarmos que o advogado, ainda por cima, cumula com o jornalista , então será para dizer que o plumitivo não conclama para que o oiçam, mas apenas para que o corram a tomates e hortaliças. Em resumo, o Pina auto-desqualifica-se. Começa por mutilar-se, ao mesmo tempo que alardeia ir bater o record do mundo da progenitura. E, não obstante, pagam-lhe. À palavra? À linha? Ao caractér? Assombroso!

Quanto ao segundo trecho, convém que não fiquemos pelas meias-tintas e passemos, duma penada, à tela completa. Assim, tanto quanto atestada "de obras sensíveis e generosas, às vezes de grande riqueza moral, realizadas por gente feia, porca e má," a História também está infestada de obras feias, porcas e más, quase sempre de enorme indigência mental, produzidas por gente sensível e generosa. Felizmente que você não é feio, nem porco, nem mau, ó Pina (como Céline, por exemplo): São só as suas obras. São só os seus exercícios de fornicoques e gramaticoques que, a fazer fé na presente amostra, metem nojo às suiniculturas e beiram a vileza mais aleijona. Porque você, benza-o Deus, em contrapartida, é uma excelente pessoa, do mais sensível e generoso que imaginar se pode. Um campeão da filantropia (da filotauria, melhor dizendo) e delicadeza. Sorte a sua. Azar o nosso.


domingo, fevereiro 13, 2011

Em bom Portugês - III. Os Retardados Morais

Então é o quê? Pura chutzpah - eu traduzo: pura desfaçatez estanhada e atávica? Cito até um paradigma anedótico mundialmente famoso: um judeu vai a tribunal depois de ter assassinado o pai e a mãe, e apela como atenuante maior a situação de se encontrar órfão... (são os judeus que assim galhofam acerca deles próprios)...
Mas devo reconhecer, a bem da verdade, que até nem são, maioritariamente, os judeus (se é que um gajo no meio de toda esta mixórdia palrante ainda consegue discernir papagaio de caturro) que se prestam a estes figurinismos da treta. Não; são, quase sempre, aquilo a que eu chamo de retardados morais. Os requentados palhadinos da pretérita e putativa vítima. Requentados e escantados, sobretudo. Com escarépio na mioleira infectada pelas redacções a reclamar zaragatoa da grossa. Agora que já não há nazis, que o nazismo foi pulverizado e terraplenado até ao entulho e cinza, é que eles vêem nazis por toda a parte, como se de um misto de bolor e gambozino se tratasse. Agora que já passou, que está morto e enterrado, é que eles montam guarda, nocturna, diurna e mediurna! É que eles espiolham, esquadrinham, farejam e plantam cruzes suásticas ao desbarato! Plantam, que é como quem diz: colam a cuspo. Agora que o assunto já é presunto é que eles patrulham, policiam e zumbem, à maneira das varejeiras, de roda do assunto. É que ruminam e regurgitam a matéria. Agora é que eles gritam: "agarrem-me! segurem-me! senão eu desgraço-me!..." Podem chacinar, genocidar e sarrafaçalar à fartazana no presente, que eles não vêem, não estão, já deram e, acima de tudo, estão de plantão ao massacre excepcionalíssimo, granfiníssimo, alambicadérrimo do passado. Não pensam porque estão ocupadíssimos a não esquecer. Entenda-se: bobis a bobinar e rebobinar a cassete. A ladrar ao passante incauto: "Nunca mais!"
Nunca mais, o caralho! É todos os dias, se preciso for. O mesmo Caim de roda dum qualquer Abel, a mesma filha-da-putice ultra-estanhada e entranhada até à quinta casa. A mesma crueldade viçosa e javarda. Especialmente vigorosa para com o indefeso. Especialmente imaculada se exercida em nome do Santo Mercado. Só que doravante, e com uma frequência bem pouco edificante, a vítima profissional emula o carrasco-fetiche. Copia-lhe os tiques, os ademanes necrobióticos. Calça-lhe as luvas, as botas e o chicote. Triste amostra de humanidade. Digna de inveja? Só se for às hienas e às ratazanas.
No circo fariseu em que descambou o mundo, estas focas apenas empinam a bola ética no alto do focinho habilidoso porque acreditam, pavlovianamente, que vão ganhar um qualquer peixe com isso.

sábado, fevereiro 12, 2011

Em bom Português - II. Para acabar de vez com a Questiúncula

Em oito anos de existência houve um colectivo que, mais que nenhum outro, padeceu a minha crítica feroz: os portugueses. O meu próprio povo, a minha própria tribo, a minha própria gente. Nunca vi ninguém enxofrar-se ou arrepiar-se todo por causa disso. Até é catita. Ou não constituísse desporto nacional: a auto-flagelação. Dou outro exemplo: Gil Vicente. Naquele seu famoso auto das barcas. Pois bem, o homem corre a sociedade portuguesa da época de alto a baixo: malha em clérigos venais, malha na nobreza arrogante, malha na magistratura corrupta, malha na plebe manhosa, malha na agiotagem gentia, e tudo muito bem. Muito artístico e louvável. Mas quando refere o judeu à toa, de bolsa e bode à ilharga, aqui d'el rei que não se admite, é anti-semitismo, é brutal preconceito, rasure-se e descafeíne-se a obra!... E isto não sei quantos séculos depois. Como aquela cena necrófaga do holocausto dos anõezinhos que já custou aos munícipes lisboetas mais um mamarracho de péssimo gosto no Largo de S.Domingos. Ou esta "petição" perfeitamente anedótica do mesmo crono-jaez. (Note-se o poli-requinte: "judeus sefarditas portugueses". Mas "nacionalidade portuguesa a que título? Israel, já não serve?...)
Tudo isto é exactamente o quê? Já chegámos onde?...
Quer dizer, eu posso vociferar "os portugueses, essa resma de gastrópodes ranhosos e rastejantes, de casa às costas e corninhos retrácteis a fazer de antenas de telemóvel" e nenhum português se ofende por aí além, porque além da generalidade dos leitores não se sentir essencialmente identificado com a definição, usa o sentido de auto-crítica para reconhecer alguma verdade em relação ao acessório e conjuntural. Mas se eu refiro os judeus em termos que não sejam apologéticos e encomiásticos, rompam de pronto, e por turnos, uma série de energúmenos, entre osmóticos, híbridos ou puros sangue de corridas, num basqueiro de alarvidades e palermices que só visto.
Repito e sublinho: Significa isto o quê? Que os judeus estão acima da crítica, da ironia, dos sarcasmo? Mas porque carga d'água estariam? Porque são santos à nascença? De pau carunchoso, todos somos. Porque foram massacrados às carradas? Bem, os portugueses também foram, no século XX, e à catanada. Os ruandeses idem. Os congoleses ainda andam nisso (o contador já vai nos milhões). Se vamos por aí, pelo horror do massacre, a tiro e a gás sempre foi menos asselvajado e atroz do que por obra e desgraça de alfaia agrícola. Ou preferiam a sachola ao chuveiro? A indústria, fazendo fé em Hollywood, sempre usou de cuidados e suavizações absolutamente impensáveis à barbárie. Ninguém os violou e esquartejou de empreitada, entre urros escarros e vitupérios. Até porque para Suas Excelências um campismo selvagem desses seria inadmissível: a coisa, necessariamente, e ainda que sob a cobertura de engodo perverso, teria que meter vagon-lit, serviços de hotelaria, com pensão completa, sauna e actividades lúdicas, e tudo isso, claro, em ambiente ultra-pasteurizado. Foi a qualidade dos serviço que defraudou monumentalmente as expectativas? Ah, não, a excepcionalidade única dos metagnominhos, a distinção bizarra, foi a intenção de extermínio étnico planificado. Quer isso então dizer que o extermínio à bruta e de improviso é menos digno de honraria, já que menos doloroso não parece? Mas mesmo admitindo que sim, mesmo dando de barato tamanha frescura, em que é que se distinguiram as vítimas XPTO dos ciganos ou dos deficientes mentais? Na mera aritmética? No campeonato do genocídio,a medalha é ao quilo? Mas estamos a falar de frangos, de formigas ou de pessoas? E, já agora, sempre adianto: nada tenho contra a atribuição dum país por decreto a coitadinhos. Mas fico sinceramente à espera de idêntica gorjeta indemnizatória aos ciganos e aos mongolóides. E não me venham certos maldosos com a solércia de que aquilo já é o três em um, dado que o judeu já acumula e refina as outras duas espécies, porque eu não embarco nessa. Embora se fosse a fazer fé nas patranhas da Esther Mitzschlrfsdr ou lá o que é, papagueadas ad nausea por não sei quantos tartufos de ocasião - a saber, de que a população portuguesa tem uma percentagem enorme de sangue hebraico (como se o carácter dum povo fosse medido a cabidelas e papas de sarrabulho) -, me sentisse tentado a acreditar nesse género de culinárias: estaria até explicada, duma vez por todas, a nossa estupidez atávica, a nossa tendência para a imbecilidade congénita, para a toinice desenfreada, para a velhacaria hipócrita, e o lugar exuberante, profissional e renitente que ocupamos na cauda dos povos europeus.

quarta-feira, fevereiro 09, 2011

Em bom português - I

É claro que isso dos judeus como se todos os judeus fossem iguais, por atacado, não existe. Ou existe tanto, enquanto forma de enunciação, como existe "os portugueses", "os "ingleses", "os americanos", "os alemães", "os espanhóis", "os ciganos" ou "os esquimós", entre uma miríade de outros povos, etnias ou meros grupos excursionistas, musicais ou recreativos.
Mesmo os Beatles, que eram apenas quatro, não coincidiam nas personalidades nem nas idiossincrasias ou singularidades de cada um deles. A começar pelo instrumento... No entanto, em conjunto, produziam determinado produto característico. E quando dizemos os Beatles isto, ou os Beatles aquilo, pró bem ou pró mal, estamos pura e simplesmente a estabelecer uma crítica, elogiosa ou depreciativa, a um determinado conjunto. Um conjunto de indivíduos não significa que os indivíduos são todos iguais: quer dizer apenas que partilham determinada característica.
Tudo isto para explicar uma coisa muito óbvia e simples; quando referimos em género, ou em espécie, quer dizer isso mesmo - género ou espécie. Não significa indivíduo. Desde Aristóteles que o critério está bem delineado e exposto, pelo menos para todo aquele que não se contente com o ser papagaio e procure ser algo mais: humano, por exemplo. Aliás, esse é precisamente, desde o livro Zeta da Metafísica, há 24 séculos, o limite da própria ciência humana: não alcança o indivíduo. E era bom, para variar, que o indivíduo se capacitasse disso. Poupava-o a muitos amargos de boca e figuras tristes. E dispensava-o, ainda mais, de cada vez que ouve falar em espécie, de ir a correr enfiar-se lá dentro, como se lá coubesse por inteiro e absoluto. Não cabe. E é extremamente estúpido meter-se, clamando para que não o metam. Não verdade, não metem: apenas lhe abrem a cancela e estendem a passadeira. O resto ele executa sozinho. Enfia cabeça no balde e brada ó da guarda que o querem afogar.
Pode parecer que esta elementar noção da diferença entre género, espécie e indivíduo é um mero bizantinismo académico. Não é. Houve um tipo que disse que a ignorância é o mal. Se não é, imita-o - ou, no mínimo, aduba-o e faculta-o - muito bem. Pode parecer que o principal foi uns terem metido outros feitos gado em vagões de comboio. Pode parecer que o algoz reúne toda a factura e deve pagar o preço inteiro, com juros e sobretaxas. Mas, de facto, tanto ou mais grave que haver uns prontos para fazerem dos outros insectos (que sempre os há, ainda hoje para aí zanzam sob os mais diversos, insuspeitos, coloridos e melífluos trajes) é o facto de haverem outros a pensarem-se como gadeza ou como insectos colectivos. Isto é, pior, realmente pior que haver gente a querer enfiar outra gente em comboios, é haver gente predisposta a entrar neles. E gente a treinar e adestrar gente para esse efeito.
Não sei quantos judeus foram massacrados durante o III Reich. Assim, assado, desta ou daquela forma. Essa contabilidade não me seduz nem excita muito. Tudo aquilo foi um descalabro, esse episódio e a própria guerra onde decorreu. Um puro hino à impiedade, agora na sua forma industrial. Tenho por Hitler a mesma consideração que tenho por Staline, Churchill e Rooseveld: Quatro hienas de alto coturno que, se vistas do céu como representantes da nossa espécie, hão-de causar nojo e vómito à galáxia inteira. Todavia, no que às específicas atrocidades cometidas pelos alemães sobre judeus concerne, em Nuremberga (e até hoje em imarcescível patíbulo) foram julgados, demonizados e banidos da raça humana os culpados? Julgo que não. Os Nazis - no seu departamento especializado - foram apenas os carrascos, os executores. Portanto, condenou-se o carrasco, o imolador. Falta julgar quem conduziu as ovelhinhas ao sacrifício, quem entregou as rezes nas mãos do carrasco. Os mentores (mentecaptores) do carrasco? Bem, continuam por aí na maior; Darwin já é santo e Hegel, só para citar os mais emblemáticos, para lá caminha. Apenas o pobre Nietzsche, que continua pau para toda a obra, padece no pelourinho. Ah, e, claro, Céline. Foi depois de ler as Bagatelles que o Himler entendeu a chacina asséptica como imperativo categórico.
Então e os mentores da ovelhinha? Os pastores e seleccionadores da dita? Foi el-rei Dinheiro, o tal deus profano, que joeirou? Quem teve dinheiro para pagar a portagem safou-se, quem não teve foi para o calvário? Para meu grande espanto, o Rothschild austríaco safou-se com uma perna às costas. Quando até era suposto simbolizar o judeu na sua máxima perfídia e malfeitoria. Era suposto e merecido, reconheça-se. E no entanto... ei-lo feliz e contente nos Estados Unidos, depois de passar pelas mãos das SS. Amáveis que eles foram, os da caveira. Dá cá parte da massa e vai-te lá embora.
Bem, quanto aos mentores da ovelhinha, há quem diga que saíram altamente gratificados de todo aquele imbróglio. Andam por aí, arrotantes e pesporrentes, a tentar limpar as mãos ao anti-semitismo e a não sei mais quantos mil gambosinos de ocasião. Suspeito até que nisto, como em tudo, se cumprem atavismos ancestrais. Tal qual se referia no tempo de Herodes: "a maior parte dos animais oferecidos para os sacrifícios são cegos, coxos ou doentes".
Cegos, digo agora eu, porque não vêem para onde vão; coxos, porque não conseguiram fugir a tempo; e doentes, porque já nem oferecem resistência ao seu destino.

terça-feira, fevereiro 08, 2011

Também tu, Brutus?!...

«Cristo não tem inimigos mais venenosos, mais encarniçados, mais amargos que os judeus.»(...)
«Quando Judas se enforcou, os judeus talvez tenham enviado os seus servos, com pratos de prata e jarros de ouro, para recolher a sua urina com os outros tesouros, e em seguida comeram e beberam essa merda, e desse modo adquiriram olhos tão penetrantes que descobrem nas escrituras glosas que ali não encontraram nem Mateus, nem o próprio Isaísas (...)»
«Quando Deus e os anjos ouvem peidar um judeu, quantas gargalhadas e quantas cabriolas!(...)»
«são usurários, parasitas, estrangeiros que nada deveriam possuir (...), mas que se tornaram nossos patrões no nosso próprio país (...)»
«Observai tudo o que os judeus sofreram desde cerca de mil e quinhentos anos, e bem pior lhes acontecerá no inferno (...)»
«filhos do diabo (...) feiticeiros (...)»
«Seria preciso, para fazer desaparecer essa doutrina de blasfémia, atear fogo em todas as suas sinagogas e, se delas restasse alguma coisa após o incêndio, recobri-la de areia e de lama a fim de que não se pudesse mais ver a menor telha e a menor pedra de seus templos (...). Que se proíbam os judeus entre nós e no nosso solo, sob pena de morte, de louvar a Deus, de orar, de ensinar, de cantar. »

- Martinho Lutero, "Contra os judeus e suas mentiras" / "Shem Hamephoras"

«No entanto há muito mais exemplos de meninas e meninos sacrificados que de meninas e meninos comidos. Quase todas as nações conhecidas sacrificaram crianças. Os judeus imolavam-nas. Era o que se chamava condenar ao anátema e constituía um verdadeiro sacrifício. Ordena-se no capítulo 27 do Levítico não se pouparem as almas viventes prometidas, porém em ponto algum se prescreve que sejam comidas. Isto era outro caso: tratava-se exclusivamente de uma ameaça. Como vimos, disse Moisés aos judeus que caso não observassem as cerimónias, não só teriam sarna, como as mães comeriam os próprios filhos. Positivamente, no tempo de Ezequiel os judeus deviam comer carne humana, pois diz esse profeta no capítulo 39 que Deus os faria comer não apenas os cavalos dos seus inimigos, mas ainda os cavaleiros e os outros guerreiros. De facto, por que não teriam os judeus sido antropófagos? Seria a última coisa a faltar ao povo de Deus para ser a mais abominável nação da terra

- Voltaire, "Dicionário Filosófico"

Olha, o Grande Reformador e o Grande Iluminador também andaram a inspirar o Adolfo!... A este, espero que o banam imediatamente das celebrações francesas!...

PS: Detalhe nada desprezível: o termo anti-semitismo foi apenas cunhado no século XIX. Imagino que o controlo de uma certa imprensa nada tenha a ver com isso. Mas o que é certo é que, rapidamente, cobrou retroactivos (que, diga-se, remontam à antiguidade clássica europeia).


Contra o anti-semita Marxar, Marxar!...

«Consideremos o Judeu real, não o judeu do sabat, como o faz Bauer, mas o Judeu de todos os dias.
Não procuremos o segredo do Judeu na sua religião; procuremos o segredo da religião no Judeu real.
Qual é o fundo profano do judaísmo? A necessidade prática, a utilidade pessoal. Qual o culto profano do Judeu? O tráfico. Qual é o seu Deus profano? O dinheiro. Pois bem, a época actual só poderá emancipar-se a si própria emancipando-se do tráfico e do dinheiro, logo do judaísmo real e prático.
(...)
Reconhecemos pois, no judaísmo, um elemento anti-social geral e actual que foi levado pelo desenvolvimento histórico (no qual os Judeus, sob este aspecto negativo, participaram activamente) ao seu ponto culminante do tempo presente, a um nível em que terá necessariamente que se desagregar.
No seu significado último, a emancipação judaica consiste em emancipar a humanidade em relação ao judaísmo.
(...)
Não se trata de um facto isolado. O Judeu emancipou-se de uma maneira judaica, não só tornando-se senhor do mercado financeiro, mas porque, graças a ele e por ele, o dinheiro se tornou uma potência mundial e o espírito prático judeu, o espírito prático dos povos cristãos. Os judeus emanciparam-se na mesma medida em que os cristãos se tornaram Judeus.»

- Karl Marx, "A Questão Judaica"

Olha, o Karl Marx, afinal, também era nazi!...

domingo, fevereiro 06, 2011

Génios, Nuvens e Quimeras, Parte II

Ah, bem, pois... obstar-me-ão os manhosos do costume, mas Pessoa apenas queria metralhar portugueses avulsos, pelas ruas, o que é compreensível - e até desculpável, se pensarmos que se trataria, muito provavelmente, de pobres, velhos e desocupados. Aliás, bem vistas as coisas, descontada a violência e alguns estragos de somenos, até resultaria num contributo generoso para o "bem comum" no seu totem actual, vulgo "redução do défice".
Agora anti-semitismo é outra louça. Um trem de cozinha completo, com serviço de chá e tudo. Detestar judeus e, por alguma forma, intenção ou sequer pensamento, beliscá-los, melindrá-los ou amesquinhá-los na sua incomensurável virtude, isso, no mínimo, além de lesa-majestade, é associação criminosa, holocausto na forma tentada, conspiração para genocídio, pogrom de terceiro grau e mais não sei quantas contravenções gravíssimas. E, aí, Céline estará condenado ao fogo eterno da danação. Arreou forte e feio, sem meias-tintas nem contemplações, ainda mais numa época tenebrosa, de paroxismos germanoides e seiscentos diabos à solta. Em contrapartida, o nosso Pessoa seria anti-democrático, nos seus delírios mais excêntricos, mas não seria anti-semita (até porque alguns até sugerem que ele, como todos os grandes génios do mundo, seria de sangue judaico - só assim sendo, de resto, explicável tamanha inteligência e talento).
Pois bem, Céline granjeou notória e famigerada reputação graças, em especial, àquela obra - dita panfletária - intitulada "Bagatelles pour un Massacre". Nela, o seu móbil-mor de execração e alvo de artilharia é o enlace íntimo que, durante a sua viagem à União Soviética, vislumbra entre o judeu e o comunista russo. Passo a transcrever algumas passagens eloquentes. De Céline, mas também de Pessoa sobre o mesmíssimo assunto...

«O russo é um carcereiro de nascença, um chinês falhado, torcionário; o judeu enquadra-se-lhe na perfeição. Escória da Ásia, escória de África... foram feitos para casar... é o mais belo casamento que alguma vez terá saído dos infernos... não me aflige nada dizê-lo... de pois de uma semana de passeios tenho as minhas opiniões bem formadas..»
- Céline, "Bagatelles pour un Massacre"

«São por isso os judeus orientais, e maximamente os judeus russos, que albergam, nutrem e espalham o igualitarismo como doutrina. Fazem-no sobretudo, como é natural, onde encontram para isso ambiente, e esse ambiente é fácil entre os povos meio selvagens como o russo, ou entre as camadas meio selvagens como são, pela barbárie da semi-ignorância, os operários de todo o mundo. O comunismo de hoje - que, como ideia, só os idiotas sabem o que é - é o produto híbrido, e por isso estéril, do misticismo judaico e da estupidez europeia. Não esqueçamos: da estupidez europeia.»
- Fernando Pessoa, "Do Judaísmo" in Ultimatum e Páginas de Sociologia Política,pp 362

«No momento actual, a única coisa verdadeiramente grave para um grande homem, escritor sábio, cineasta, administrador de finanças, industrial, político (então aqui, a coisa é gravíssima!) é estar de más relações com os judeus. Os judeus são os nossos patrões... aqui, além, na Rússia, em Inglaterra, na América, por todo o lado! Fazei de bobo, de insurrecto, de intrépido, de anti-burguês, de enraivecido cavaleiro andante... que o judeu se está cagando! Galhofices... Tagarelices! Mas não ouseis tocar na questão judaica, se não quiserdes que vos lixem o coiro... Veloz como uma bala, eliminar-vos-ão, de uma maneira ou doutra... O judeu é o rei do ouro da banca e da justiça... através de um testa de ferro ou ao quadrado. Ele possui tudo... Imprensa... Teatro... Rádio... Câmara... Senado... polícia... Aqui ou além..»
- Céline, "Bagatelles pour un Massacre"

«(...)Não se trata da acção política dos judeus. Essa é evidente e natural; tem-se aproveitado, não só da Maçonaria e da ideologia igualitária, mas de tudo quanto, de origem judaica e não judaica, possa de facto, devidamente utilizado, servir para dissolver a civilização tradicional, greco-romana e cristã, da Europa e do mundo europeizado.»
- Fernando Pessoa, "Do Judaísmo", idem.


Pois é, caros amigos... Afinal, pelo critério actual, tão exaustivamente exercido e do qual eu também já comi por tabela, Pessoa não era apenas anti-democrático: era também anti-semita. Fico a aguardar petições de despejo dos Jerónimos e protestos contra toda e qualquer celebração pública e oficial do poeta da Mensagem. Antigamente, a coisa chegava de Paris aqui com, pelo menos, 20 anos de atraso. Mas agora com as redes sociais e a internet, nunca se sabe. O saloio, doravante, é turbo.

Mas não esqueçamos, nunca esqueçamos: A ESTUPIDEZ EUROPEIA!





Génios, Nuvens e Quimeras




Antes de falarmos de Céline em espécie, recordemos um pouco do nosso Fernando Pessoa. Até porque o que eu aqui escrevi há anos, e que transcrevo de seguida, acerca do génio português é praticamente extensível ao francês, como
, de resto, ponderarei num futuro postal.



« Os que querem um Portugal honesto, feliz, rico e honrado, querem a negação da acção civilizacional portuguesa, querem que desçamos ao burguesismo nacional duma pseudo-nação como a Suiça ou a Bélgica, querem que abandonemos o nosso grande papel na construção do novo mundo, que abdiquemos de realizar em espírito aquilo que realizámos outrora em corpo – o alargamento do mundo e a descoberta de novas terras, de novos mares, de novos céus. Mais alta é a missão portuguesa do que tudo quanto pode sugerir a barriga dos portugueses, nessa pervertida teoria política que toda a chusma de traidores e de idiotas que são os nossos políticos e os nossos jornalistas querem impôr a Portugal. Mais alta é a obra, e ela, a ser feita, terá de ser feita, terá de ser feita quebrando aos pés toda a longa podridão humanitária, democrática, organizando uma aristocracia forte, dominando completamente a nossa plebe ineficaz salvo escravizada. (...)
Criar em Portugal o sentimento duma missão civilizadora! Esse deve ser o nosso ideal. O resto não importa. Que para chegar aí seja preciso varrer à metralha as ruas, calcar aos pés a felicidade e a liberdade do povo, arremessá-lo como um ariete de encontro às barreiras do nosso espírito – Que importa isso, se só assim, podemos deixar ficar Portugal no mundo depois de ele desaparecer?
Grande e difícil é a obra! Grande e difícil o varrer dos ideiais democráticos, humanitários e utilitários. Mas a grande obra anti-cristã (anti-cristã em tudo, anti-democrática, anti-católica, anti-monárquica) deve ser feita. Tristes de nós se faltarmos à missão divina que Aquele que nos pôs ao Ocidente da Europa e tais nos fez quais somos, nos impôs quando nos deu este nosso acesso e trancendido espírito aventureiro. Depois da conquista dos mares deve vir a conquista das almas. »
- Fernando Pessoa, “Páginas de Sociologia Política”

Imaginem que o maior poeta português era vivo e escrevia num blogue. Talvez se chamasse “Heteronimia”, “Heterografia”, ou coisa que o valesse. Imaginem que ele postava o texto em epígrafe. Calculem a gritaria, o alarido que se não levantava: Nazi! Nazi!! Estou em crer que a “esquerda lacoste” levantaria barricadas; a “esquerda pink”, lavraria protestos e apelaria ao índex. A direita quéque faria coro com e “esquerda pink”, clamando “nada de confusões, somos democratas”. O PR faria uma das suas redondas alocuções ao país. Em suma: chovia granizo, chuva zangada de todo o lado. Disparando em todas as direcções, o poeta da “Mensagem” tornava-se alvo de todas as partes.
E, todavia, o homem era um génio. Um daqueles raros que visitaram aqui o rincão. Como explicar esta tempestade furiosa? Habitava um monstro dentro dele? Um psicopata? Na sua múltipla personalidade estava incluído um Adolfo qualquer coisa? Acometiam-no delírios em que se fantasiava de tirano louco subjugando uma Europa fumegante, em escombros, a seus pés?
Verificado tão tenebroso depoimento, atestados os seus ignóbeis propósitos anti-democráticos – saliento: mais anti-democrático é difícil! – deviam ser as suas ossadas despejadas dos Jerónimos e substituídos pela dona Amália? Deviam ser os seus livros proibidos e varridos para fora das livrarias e bibliotecas? Devia ser o seu nome lançado ao opróbrio e a sua efígie queimada em praça pública? As ruas e alamedas com o seu nome deviam ser rebaptizadas? O quê?...
Enquanto as autoridades ponderam e cozinham a sentença, eu ouso ir divagando o seguinte:
É evidente que o nosso Fernando andara a ler Nietzsche. Ora, os efeitos inebriantes do filósofo alemão são por demais conhecidos, eu que o diga. É, pois, um Fernando Pessoa alterado, fora de si, heteroposto, que se imagina correndo a saloiada cá do bairro a pontapé e à metralha por amor duma louvável quimera que, num instante fugaz, o desinquietou. Não é que eu próprio, às vezes, não comungue de sonhos desses; simplesmente, uma coisa é a ficção, a fantasia filosófica, outra, bem diversa, é a realidadezinha e o “malhão, malhão”. Dir-me-ão: pífia justificativa, ó Dragão! E se algum exaltado avulso, desses símios de imitação que não podem ver ideia nenhuma que não queiram logo macaqueá-la, desata a exercitar-se nesses propósitos pelas avenidas?...Sim, o que vai ser das pessoas que forem por ali a passar?!...”
Concedo que a justificação não é das melhores. De facto, metralhar as ruas em tese, nada tem que ver com metralhá-las em sede própria. Não muito tempo depois do nosso Fernando ter escrito isto, houve até uns folgazões de gosto mais que duvidoso que sonegaram as metralhadoras da tese e foram experimentá-las na rua. Os resultados foram trágicos. Ora, isso é tão aberrante como pegar nas metralhadoras da rua e ir metralhar na tese; ou então chamar os polícias de ronda, para virem com os cassetetes da rua bater ao filósofo por causa da tese. (Tudo isto, nunca esquecendo que colocar uma tese explosiva nas mãos dum macaco é tão perigoso como colocar uma granada, admito-o).
Mas continuo na minha: o que era mesmo importante, higiénico, edificante era que, como dizia Baudelaire, se deixasse a cada qual a sua quimera. Que deixássemos de meter o naríz nas quimeras dos outros, e as quimeras dos outros na nossa cabeça. Não são inalações que se recomendem, sem as devidas precauções. Apreciemo-las, por cortesia, ou por fruição artísticas. Ninguém pode dizer que “Esse deve ser o nosso ideal. O resto não importa. Que para chegar aí seja preciso varrer à metralha as ruas, calcar aos pés a felicidade e a liberdade do povo, arremessá-lo como um ariete de encontro às barreiras do nosso espírito – Que importa isso, se só assim, podemos deixar ficar Portugal no mundo depois de ele desaparecer?”, não é bonito, mesmo sublime, enquanto literatura. Eu, pelo menos, não digo.
E mais sublime ainda se pensarmos nos efeitos devastadores que seguramente causará nas carinhas sonsas dos filisteus cá do burgo. Mas livrem-se de atrelar ficção tão garbosa à carroça trafulha da política: perde-se a genialidade e não se logra benefício nenhum. Pelo contrário, garimpa-se imundície pegada.
Por conseguinte, e em conclusão: Respeitemos os desabafos e telhas dos génios, pois é um direito exclusivo que lhes assiste. Guardemo-nos de interferir com eles, quando passeiam entre as nuvens o bando trovejante das suas quimeras. Velemos-lhes as jornadas, mas devidamente abrigados dos seus raios, sempre prontos a fulminar o basbaque incauto.
Quanto aos coletes de forças, coleiras, trelas e açaimes que a prudência recomenda, são arreios, na verdade, indispensáveis, não aos génios, seres inexpugnáveis por natureza, mas aos políticos, essa matilha acéfala, tumultuosa, que em tempo ou modo algum convém ser deixada à solta!... Para que, sobretudo, não conspurque nem perturbe com as suas badalhoquices e macacadas – nem, pior ainda, armadilhe de porcarias – a digressão nefelibata dos outros.

E quando, em dias de festa, virdes o povo entusiasmado, atrás dos políticos, em animadas e turbulentas caçadas, desviai-vos para bem longe. O povo tem uma tara: perseguir desilusões.

sábado, fevereiro 05, 2011

Redução, não!


Não vou ao ponto de proclamar (como faz, peremptório, o meu sócio e compadre Ildefenso Caguinchas), que sou a favor da redução de deputados no palramento, de preferência a tiro. Embora, ao ponderar mamíferos da envergadura dum Sérgio Sousa Pinto ou dum Francisco Assis, a tentação seja grande. Não que sejam muito piores que qualquer um dos outros (tudo aquilo é avulso, amorfo e aleatório): são apenas mais pesporreicos e irritantes. Para falar com franqueza, até nem sou a favor da redução de deputados: penso mesmo que a defenestração seria o tratamento mais adequado. Isto, para a generalidade. Porque para os cabecilhas de bando, eufemística e pomposamente catalogados de "lideres de grupo parlamentar", entendo que devem reservar-se honras de "devarandação". O certo é que, via janela ou via varanda, há todo um excedente que urge evacuar, catapultando. Que esse excedente coincida com o plenário, isso já é detalhe onde o assombro compete com a evidência, e o estado de semi-falência das finanças públicas apenas agudiza e amplifica.
Eu sei. Algumas almas mais sensíveis e delicadas estão já, debulhadas em lágrimas, a deplorar a violência e o desamparo da queda; outros, que sempre os há calculistas e maquiavélicos nestas ocasiões, hão-de desaprovar porque assim só promoveremos os criminosos a mártires; outros ainda, os mais básicos e mentecaptos, engrenarão na ladainha do nazi, fássista e mais não sei quê, que, lá bem no fundo do armário psico-seboso, lhes preenche as titilações libidorreicas; etc, etc, bla-bla-bla.
Aos primeiros, respondo que, bem pior que esta violência imaginária sobre meia-dúzia de legisladrões contumazes, me angustia e comove imensamente mais a violência real, metódica e quotidiana dessa meia-dúzia sobre milhares, e o desamparo da queda dum país e dum povo inteiros às patas dessa vil e irrecuperável corja. Aos segundos, direi que antes fazer deles mártires do que permitir que eles continuem, ad aeterno, a martirizarem-nos a nós. Finalmente, aos terceiros, que posso eu dizer? Devolvê-los expressamente, e em passo de corrida, ao orifício matriz seria baldado e duvidoso: é inextricável que tenham saído pela frente ou por trás (embora, tendo em conta o odor do raciocínio, qualquer indivíduo adulto não constipado aposte sem hesitar na cloaca do esgoto).
Quanto ao edifício propriamente dito, não é destituído de beleza arquitectónica. O problema, nos últimos cem anos, ou coisa que o valha, tem sido a frequência. Da União Nacional à Desunião Nacinhal, a diferença é a que medeia entre o estábulo do regime e o templo da democracia. Ou dito mais lucidamente: entre a estrebaria e a casa de putas.

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

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«J’ai rien en spéciel contre les Juifs en tant que juifs, je eux dire simplesment truands comme tout le monde, bipèdes à la quête de leur soupe... Ils me gênent pas du tout. Un Juif ça vaut peutêtre un Breton, sur le tas, à égalité, un Auvergnant, un franc-canaque, un “enfant de Marie”… C’est possible… Mais c’est contre le racism juif que je me révolte, que je suis méchant, que je bouille, ça jusqu'au’tréfonds de mon benouze!... Je vocifere! Je tonitrue! Il’s hurlent bien eux racistes! Ils arretent jamais! Aux abominables pogroms! Aus persecutions seculaires! C’est leur alibi gigantesque! C’est la grande tarte à leur crème!»

- Céline, "Bagatelles pour un Massacre"