«Nunca o acusaremos o bastante por ter feito do cristianismo uma religião deselegante, por nele ter introduzido as tradições mais detestáveis do Antigo Testamento: a intolerância, a brutalidade, o provincianismo. Com que indiscrição interfere em coisas que não lhe dizem respeito, de que nada entende! As suas considerações sobre a virgindade, a abstinência e o casamento são muito simplesmente de causar náuseas. Responsável pelos nossos preconceitos em religião e moral, fixou as normas da estupidez e multiplicou todas essas restrições que ainda hoje paralisam os nossos instintos.
Dos antigos profetas não tem nem o lirismo nem o tom elegíaco e cósmico, mas apenas o espírito sectário, e tudo aquilo que neles era mau gosto, tagarelice, divagações destinadas aos cidadãos. Os costumes interessam-no sobremaneira. Logo que começa a falar disso, vemo-lo vibrar de maldade. Obcecado pela cidade, pela que quer destruir e pela que quer edificar, dá menos atenção às relações entre o homem e Deus do que às dos homens entre si. Examinemos de perto as famosas Epístolas: não descobriremos um só momento de cansaço e de delicadeza, de recolhimento e de distinção; tudo nelas é furor, ofegar, histeria de má qualidade, incompreensão perante o conhecimento, perante a solidão do conhecimento. Intermediários por todo o lado, laços de parentesco, um espírito de família; Pai, Mãe, Filhos, Anjos, Santos; nem o menor vestígio de intelectualidade, de conceito definido, de alguém que quer compreender. Pecados, recompensas, contabilidade dos vícios e das virtudes. Uma religião sem interrogações: um deboche de antropomorfismo. (...)
A plebe quer ser sufocada por invectivas, ameaças e revelações, por declarações estrondosas: gosta dos faladores. S.Paulo foi um falador - o mais inspirado, o mais dotado, o mais habilidoso da antiguidade. Ainda sentimos os ecos de todo o ruído que fez. Sabia subir ao palco e declamar as suas iras. Não introduziu ele mo mundo greco-romano um tom de feira? Os sábios do seu tempo recomendavam o silêncio, a resignação, o abandono, coisas impraticáveis; mais hábil, S.Paulo trouxe, pelo seu lado, receitas aliciantes: das que salvam a canalha e desmoralizam os espíritos delicados. A sua vingança sobre Atenas foi completa. Se tivesse triunfado na cidade, talvez os seus ódios se tivessem moderado. Nunca um fracasso teve consequências tão pesadas. E se somos pagãos mutilados, fulminados, crucificados, pagãos trespassados por uma vulgaridade profunda, inesquecível, uma vulgaridade de dopis mil anos, é a esse fracasso que o devemos. (...)
Quando já não sei quem destacar, abro as Epístola e em breve me sinto descansado. Ali está o meu homem. Põe-me em transe, faz-me tremer. Para o odiar de perto, como seu contemporâneo, faço tábua rasa de vinte séculos, e sigo-o nas suas digressões; os seus sucessos desencorajam-me, os suplícios que lhe infligem enchem-me de satisfação. Viro contra ele o frenesim que ele me comunica: infelizmente não era assim que o Império agia!
Uma civilização apodrecida pactua com o seu mal, ama o vírus que a corrói, deixa de se respeitar, permite que um S.Paulo circule... Fazendo-o, confessa-se vencida, carunchosa, acabada. O cheiro da carne podre atrai e excita os apóstolos, coveiros cheios de cobiça e loquacidade.(...)
O paganismo tratou-os com ironia, arma inofensiva, demasiado nobre para vencer uma horda insensível às subtilezas. »
59 comentários:
Um dos aspectos mais interessantes da religião católica é o fenómeno da sua longevidade, conservando a essência.
Enquanto acreditarmos em Deus, aceitamos quem se dedica à função de no-LO lembrar, com as limitações próprias de quem procura descobrir, há centenas ou milhares de anos, o caminho directo e mais seguro para O encontrarmos enquanto estamos vivos.
São muitos os que tentam e eu respeito-os a todos, desde que não estejam doidos, porque pouco haverá de mais nobre.
Ainda ontem na tv, apareceu uma reportagem sobre o budismo zen, o ioga e outras formas de ultrapassarmos as limitações do nosso corpo físico.
Parece-me um caminho e haverá outros.
Por mim, só me resta esperar que algum dia possa ver alguma luz.
Estou sempre à espera e à procura em sítios recônditos. Até na banda desenhada!
«. Não introduziu ele mo mundo greco-romano um tom de feira? Os sábios do seu tempo recomendavam o silêncio, a resignação, o abandono, coisas impraticáveis; mais hábil, S.Paulo trouxe, pelo seu lado, receitas aliciantes: das que salvam a canalha e desmoralizam os espíritos delicados. A sua vingança sobre Atenas foi completa.»
estou sem tempo e é pena porque estes textos até me interessam muito.
Apenas deixo aqui um comentário.
O Cioran, como muitos filósofos esquece-se da História. Fala da Igreja e das brutalidades do Antigo Testamento e depois da conspurcação da civilização clássica como se fossem coisas distintas. O que o S. Paulo fez já o prórpio império romano o tinha feito ao desagregar-se, ao misturar-se com todos os paganismos e sincretismos orientais. A própria religião católica teve o seu desenvolvimento no oriente e não na velha Atenas.
De seguida comete o mesmo erro- pega nos textos, interpreta-os à letra e esquece-se de os enquadrar no espaço e no tempo. O que importa é que nunca houve esse salto entre qualquer superior virtude filosófica e uma conspurcação moralista cristã. Nem o paganismo foi destruído nem nunca a Igreja, na sua prática foi pura.
Estou mesmo sem tempo porque o que me apetecia agora era falar da forma como a Igreja Católica assimilou todas essas tradições bem opostas, sem as quais aliás, nem pistas de civilização clássica ou pagá teríamos.
Mas o mal dos filósofos é sempre este. Acham que uma civilização é clássica porque teve um Aristóteles, um Platão e umas estátuas apolíneas. E isto até chegar ás trevas medievais que por sua vez terminaram com outra bela civilização pagã que nunca explicam como era. E por aí fora. Limitam-se a textos mortos como se esses textos mortos alguma vez tivessem tido tradução prática à sua imagem.
«Nunca um fracasso teve consequências tão pesadas. E se somos pagãos mutilados, fulminados, crucificados, pagãos trespassados por uma vulgaridade profunda, inesquecível, uma vulgaridade de dopis mil anos, é a esse fracasso que o devemos. (...)»
esta frass, por exemplo, é um disparate. Dá vontade de pedir para ele contar como seria sem a igreja. O que estava lá no lugar dela? porque ou ele explica o modo como a Católica suplantou todos os cultos sincréticos que apareceram com a desagragação do Império Romano, ou vai para a filosfia e explica o que também lhe aconteceu na altura, ou limita-se ao poder político e mostra quem governava e para onde tinham ido os senadores.
De resto, o exercício feito demasiado de alto é sempre muito difícil e nesse caso prefiro o Nietzsche porque contibuiu para a divulgação da filosfia pré-scrotática. Foi pena que não tivesse procurado o fundo que se manteve um tanto à margem mas que nunca desapareceu.
È aquilo a que às vezes se chama os terrenos vagos, os pequenos depósitos da história e do pensamento que têm o seu curso paralelo. Sem eles não se compreende nada e fazem-se saltos no vazio totalmente inexplicáveis.
Tudo isso vocês vão ter que discutir com o Cioran. Nada como lê-lo. O gajo não me passou procuração para explicação dos seus humores.
Eu apenas acho que, juntamente com o Nietzsche, é o filósofo que melhor escreve.
Convém, todavia, ó Zazie, minha bela, não misturá-lo com essas seitas da Igreja Universal do Ateísmo e afins. Nem de perto nem de longe, servem aqui certas objecções.
Aqui, trata-se simplesmente que o tipo tem uma raiva de estimação ao S.Paulo, o que só lhe fica bem e no que tem todo o meu apoio, bem como do Frederico Nietzsche. É um santo facínora.
De resto, isto não tem intuitos panfletários: faz apenas parte do processo de educação do Timshel (a pedido do próprio). :O))
PS: Ainda um dia me hás-de dizer o que pensas duma coisa que aconteceu à volta de fins do século XI, salvo erro, que ficou conhecida como Dessacralização da Natureza.
pois, Dragão, eu já tinha lido por alto umas coisas do Cioran e o melhor nisto é ler mesmo o autor.
De resto não comparei com qualquer seita panfletária ou folclore do género. Limitei-me a constatar uma questão muito comum: o facto dos filósofos (todos, ia jurar) tenderem a esquecer a história. E quando se metem em balanços históricos do pensamento (ou da arte) isso torna-se um desastre.
E não estou a entrar em combates de capelinhas porque nem tenho nenhuma. Gosto de demasiadas coisas para entrar em tribalismos de estudos.
Quanto à desscralização deves estar a referir-te ao combate ao paganismo por parte dos concílios da igreja antiga. São coisas muito interessantes e sempre que tenho tempo gosto de pegar nessas resoluções e até no Bucardo de Worms.
Simplesmente sabes o que penso: é que o que sempre saiu cá para fora não atesta que o resultado tenha sido a "implementação" dessas proibições. O sentido é inverso: sempre que se saem proibições por parte da ortodoxia quer dizer que na prática o que se está a fazer e vai continuar a fazer é o oposto ":O)))
olha as ordálias, por exmplo! e todas as proibições de considerar a natureza sagrada e o modo como na prática foi a igreja que as assimiou. E até te dizia mais, os maiores continuadores do paganismo foram os sevidores da Igreja ":O)))
os filósofos é que se ficam pelo papel e imaginam sempre tudo dentro de torres de marfim. Esquecem-se da mistura entre a erudição e o popular, entre sagrado e profano, e por aí fora.
Não, nada disso. Trata-se duma questão doutrinária da própria Igreja. E é talvez, quanto a mim, depois do fim da civilização grega, o momento mais marcante da nossa dita civilização ocidental. É quando o "homem" passa de parte da criação a protagonista e destinatário dela e, nessa medida, a natureza, em vez de sagrada porque obra de Deus degenera em profana porque existente para serviço, usufruto e propriedade do "homem".
Estás a ver o alcance disto?...
"Tudo isso vocês vão ter que discutir com o Cioran. Nada como lê-lo. O gajo não me passou procuração para explicação dos seus humores."
o gajo já cá não está
e enquanto por cá andou, andou sempre deprimido o pobre desgraçado, chateado por causa da mãe o ter querido abortar
eu tenho alguma culpa disso? o gajo ao menos que se dedicasse a beber o vinho da igreja, directamente do barril
é o problema dos deprimidos, eternos incompreendidos na indisciplina dos seus prazeres
por isso o incomodava tanto S. Paulo
« quando o "homem" passa de parte da criação a protagonista e destinatário dela e, nessa medida, a natureza, em vez de sagrada porque obra de Deus degenera em profana porque existente para serviço, usufruto e propriedade do "homem".»
mas isso é leitura dele ou estás a referir-te a ortodoxia da igreja ou prática que a comprove?
É que natureza profana nunca houve. Houve, isso sim, "seres e marcas, do que saiu da sua órbitra, da sua ordem conforme criação divina. Por isso o pecado nunca foi autónomo, se o fosse era produto do Diabo e aí tinhamos maniqueísmo. O pecado e a má natureza, é uma contra-natura divina. E serve para muita coisa. Principalmente para mostrar que o vento sopra onde quer e que ao homem nunca foi concedida a chave da Criação. O homem é criatura entre as criaturas e necessita de se bestializar nos pecados para se redimir. Esta era a velha doutrina da igreja, Depois é que aparecem as correntes da Graça. Ou em opisição a das obras.
olha, e o mais curioso é que o sentido de gande natutereza viva e sagrada vai continuar e aparece mais tarde assimiliado até pela Igreja ao mesmo tempo que serve para a magiar dar origem a muitos dos estudos mais modernos. mas isto tudo sempre esteve misturado. Vale a pena pegar nessas coisas. Eu até andava a preparar post sobre o assunto e logo que tiver tempo mando-o. É apenas ao nível da arte (dos bastidores da arte) mas é um bom testemunho.
«. E é talvez, quanto a mim, depois do fim da civilização grega,«
outra coisa que convinha entender: o que foi o fim da civilização grega e que se entende por ela. Na civilização grega costuma meter-se muita coisa dando-lhe o mesmo nome. Não é por acaso que os românicos falavam de classissimo quando se estavam a referir a sincretismo pagáo do helenismo do tempo de Alexandre.
O problema, ia jurar, ainda vem daí. Desse esquematismo que arrumou uma ideia de civilização clássica em coisas nadas clássicas. o que se sabe do clássico veio por terceira via sincrética e historicamente é o perído mais curto.
é isso e a mania de se falar na Grécia como berço da nossa civilização e da filsofia. tudo tretas, ia jurar...
Timshel,
tem piada, por essa ordem de ideias, também podíamos dizer que Paulo de Tarso, frustrado de perseguir e matar cristãos (sem grandes resultados práticos), um dia viu a luz, gritou eureka e descobriu que mais eficaz era matar mesmo o cristianismo. Para sabotar uma coisa, ou desactivá-la, não há como ensaiá-lo a partir de dentro.
Zazie,
A tese não é minha nem do Cioran. É, segundo os especialistas da Idade Média, gajos como o E.Gilson ou o Le Goff, um facto. Eu só perguntei se percebias o alcance.
Quanto à Grécia Antiga (que nada tem a ver com Roma, note-se) foi de facto o ninho-berçário. De um cuco.
Mas se sabes que não é assim, nada como corrigires. Segundo os liberais, por exemplo, a nossa civilização actual teve origem no "Mayflower". Nisso, num certo sentido, até estou inclinado a concordar com eles.
« quando o "homem" passa de parte da criação a protagonista e destinatário dela e, nessa medida, a natureza, em vez de sagrada porque obra de Deus degenera em profana porque existente para serviço, usufruto e propriedade do "homem".»
Eu nao queria ser primario, mas... visto assim, quase diria que o S. Paulo foi o precursor dos neo-coninhas... o que, para quem le o venerado Dragao, sabe bem que cobre o espectro todo: dos barnabes aos barnabus. :))
É preciso um primário para compreender outro, caro MP-S.
Foi exactamente isso, sem tirar nem pôr, que eu disse. O S.Paulo é o precursor de toda esta neo-conice em que vivemos. E o mais caricato é ver malta que brama contra os efeitos, adorando as causas e as origens.
É como aquele obeso mórbido que culpa o merceeiro e o restaurante, ilibando e santificando o seu próprio apetite. :O)
a natureza não é sagrada nem hereje; contém o bem e contém o mal
a idolatria da natureza (tudo o que é natural é bom) é típica do paganismo; a neo-conice é uma variante deste tipo de paganismo especialmente na versão darwinista social dos evangelistas neoconinhas da blogosfera
aliás alguns dos neoconinhas até são bastante coerentes: ateus e adoradores das leis da natureza e do mercado (entendidas estas últimas como simples variantes das leis da natureza) - a lei da selva é a lei dos mercados
a natureza é (também) isso
o que eles mais detestam é a regulação,
ora regulação foi precisamente o que pregou S. Paulo
bom, não vou entrar em conices mas gosto muito de sincretismos. E de tal modo que até acredito que as crenças dão para tudo. Querem ver um exemplo: há quem consiga juntar: ortodoxia católica à Opus Dei com idolatria da Sinagoga por via política e mais egoísmo liberal à Rand por via liberal e se for preciso fundamentar politicamente tudo isto através da coacção do Estado através dos impostos ":O))))
E sem quaisquer problemas ou atribulações de consciência
o le Goff... hummm... o le Goff diz muitas coisas que já eram.
O que te digo é que não existem esses cortes entre civilizações. Como não existe corte entre mundo pagão e mundo cristão e muito menos entre Idade Média e modernidade e ainda menos entre religião, paganismo e ciência.
O que sempre me faz confusão é falar-se dos textos sagrados como se decalcassem o mundo da altura ou o tivessem por sí só virado às avessas. E pior do que isto, imaginar-se que sem eles se estava no paraíso. O melhor exercício que aconselho é explicarem-me como eram essas sociedades, como estava a Europa, por exemplo, antes da cristianização. E quais teriam sido as influências esquemáticas e em matéria moral que teriam transmitido caso tivessem permanecido dominantes.
Quanto ao berço continuo na minha. Há-de ter sido berço muito mais próximo do Oriente que do que geração espontânea lá para as bandas da Grécia ( o que quer que isso fosse e quando)
Se quiser´mos fazer um apanhado é natural que se pegue na herança cultural e nessa translatio cultura, agora o que é errado é imaginá-la decalcada na prática na época. Os balanços são sempre isso, esquemas. Não podemos viver sem eles mas não é aconselhável imaginar que a sua influência no memento tenha sido assim tão simples.
Quanto ao resto dizia-te que a melhor maneira de entender é por via de lutas recíprocas de poder. E poder naquela altura é coisa muito vasta.
mas voltando à Grécia e à Grécia clássica. mesmo só a ela. Que diabo era essa grécia clássica e que é que ainda hoje se imagina dela?
O Nietzsche nisso foi excelente porque pegou na tragédia nos tempos arcaicos e mostrou muita coisa. Mas mesmo aos ditos tempos clássicos ia jurar que os mitos permanecem.
A visão que ainda hoje temos deve-se tanto ao romantismo que nem imagino que se esteja livre dela
mas o próprio Le Goff explica estas coisas muito bem. No que toca à Idade Média e à mistura pagã. Mesmo muito bem.
Quanto ao resto pega no teu Bosch que também é meu, vè bem a data em que aquilo tudo foi feito e o que por lá anda e depois vem-me com as epístolas aos corínteos ":O))
« degenera em profana porque existente para serviço, usufruto e propriedade do "homem".»
«Eu nao queria ser primario, mas... visto assim, quase diria que o S. Paulo foi o precursor dos neo-coninhas... o que, para quem le o venerado Dragao, sabe bem que cobre o espectro todo: dos barnabes aos barnabus»
isso pode ter muito de verdade no que toca ao comunismo e à crença no progresso científico como motor para se chegar ao paraíso mas hoje em dia creio que a história é outra.
Não há qualquer veneração da natureza por parte da doutrina liberal. O que é capaz de existir é uma outra veneração num enome bluff que é totalmente virtual e mais do âmbito lúdico: o casino da banca como motor da história.
E a economia até passa ao lado. Se um dia o casino estourar aposto que vai ser preciso criar-se novo dogma de raiz.
«Como não existe corte entre mundo pagão e mundo cristão e muito menos entre Idade Média e modernidade e ainda menos entre religião, paganismo e ciência.»
Ninguém falou em cortes. Falou-se em episódios, desastres, aberrações que se tornam normalidade. Não me digas que achas que o problema é de agora?...
desastres e aberrações pois, mas o que te pergunto é de onde vieram esses desastres e aberrações.
Por outras palavras, pega lá na frase do Cioran e responde-lhe se fores capaz:
«Ainda sentimos os ecos de todo o ruído que fez. Sabia subir ao palco e declamar as suas iras. Não introduziu ele mo mundo greco-romano um tom de feira? Os sábios do seu tempo recomendavam o silêncio, a resignação, o abandono, coisas impraticáveis; »
quais sábios? quem? que filósofos do seu tempo?
Porque se tu me disseres que é uma mera figura de estilo, assim como o Sócrates do Nietzsche, ok. E ele a partir daí faz literatura. Agora se tomarmos à letra o que é que o desgraçado do S. Paulo fez que tenha mudado a sociedade da época ou posterior ou seja lá o que for?
cá para mim é figura de estilo e eu que tenho a mania de ser básica e fazer perguntas concretas
":O)))
até porque para pegar na frase ele tinha de explicar que tom de feira é que o homem introduziu que fosse novidade. E para falar da moral da virgindade e outras coisas pecaminosas tinha de dizer onde é que isso aconteceu e como.
Moral pecaminosa sempre ela foi. Até os romanos proibiam as festas de carnaval. E a igreja levou a coisa ao paroxismo. Simplesmente os banhos públicos sempre continuaram a castidade nunca foi tão pecaminosa como nesses bons velhos tempos.
O que eu pergunto é como é que teria sido se o catolicismo não tivesse sido poder. Poder político, para começar, poder e civilização. O que é havia no lugar dele?
como estava o mundo tardo-romano antes da cristianização? e a cultura árabe, por exemplo, e todas as outras germânicas?
isto às vezes faz-me lembrar uma leitura da história como chegada ao Brasil. Andava tudo em pelota na maior e chegaram lá os padres e estragaram o paraíso ":O))
já agora, quanto à dessacralização da natureza. Estavas a referir-te ao abandono da adoração às pedras e e sol e outros elementos naturais, e mais as filactérias dentro das árvores e coisas assim, não era?
Isso sim foi combatido pela igreja como paganismo associado à magia. Mas nem acabou nem a Natureza passou a estar nas mãos do homem. Eles todos é que ficaram nas mãos de Deus.
Foi apenas uma mudança da Divindade para um plano mais abstracto em paralelo com o desenvolvimento do saber e dos textos sagrados e de tudo aquilo a que costumamos chamar cultura erudita.
Que também nunca esteve assim fechada em nenhuma torre de marfim e na prática se misturou com a tradição oral e popular.
A dessacralização da natureza não tem nada a ver com paganismo. Quero lá saber do paganismo!... Tem que ver com o surgimento do "antropocentrismo". Do antropocentrismo ao individualismo e à morte de Deus era um passo fatal. A partir do antropocentrismo, acontece que o homem se separa do cosmos. Daí em diante foi só um efeito de dominó. Abriram a caixa de Pandora pela segunda vez. Párem lá com essas fantasias! Mas em que mundo é que vocês vivem?... :O)
Mas isto não se explica em caixas de comentários de blogues. Chega a ser patético eu estar com esta conversa!... :O)
E sim, o Cioran foi aqui trazido sobretudo pelas qualidades literárias.
O que não invalida que não nos estimule a pensar.
mas estavas a falar em século XI e agora falas em antropocentrismo no século XI?
nessa altura e por muito mais tempo do que se imagina o homem era cordeirinho e mais nada ":O)))
já agora, antropocentrismo sempre existiu. Bastava haver saber para haver antropocentrismo. O que foi a civilização clássica que tanto gostas a não ser antropocentrismo?
eu imagino que só não há antrocentrismo assim tão evidente noutras filosofias orientais ou no puro primitivismo.
Mas, nesse caso, ou eramos todos budistas ou ainda estava tudo na pré-história.
não é nada patético, rapaz, está para aqui tudo a palrar sem problemas e a ideia do texto foi excelente! (estás é a lixar-me o trabalho....)
«A partir do antropocentrismo, acontece que o homem se separa do cosmos»
pois é, simplesmente isso aconteceu quando?
nota-se onde? é que estas coisas tém avanços e recuos.
Tu pegas no neoplatonismo e segues-lhe a trajectória e vais dar à Ciência moderna que até parece culpada pelo antropocentrismo. Simplesmente o fundo não o é.
eu percebo a tua ideia. Como percebo a dele. Houve para aí uma altura em que achamos que tinhamos o mundo por nossa conta e vá de lixar o mundo e principalmente o próximo à custa disso.
Agora que se lhe encontre a marca na Igreja Católica é que me parece demasiado temerário.
Até diria o contrário. Enquanto ela teve mão no rebanho o rebanho não deu em achar que tinha tudo por sua conta.
Quando perdeu o medo, está visto que passou a colocar os seus deuses no lugar Dele.
ora imagina-me então isto: o feudalismo como modelo social por excelência. Mas um feudalismo sem fogueiras, sem inferno, sem ninguém a quem prestar contas. Sem Deus. O que pensas que resultaria? o paraíso na terra?
é que essa é que me parece ser a verdadeira crença dos actuais liberais.
«Do antropocentrismo ao individualismo e à morte de Deus era um passo fatal. »
simm, de acordo. Só em desacordo quanto à origem desse antropocentrismo.
Eu nao sei muito disto... mas tenho a ideia que os gregos tinham uma concepcao tragica da vida (feita de situacoes contraditorias, inapelaveis, sem solucao e sem redencao; estou a pensar nas tragedias) e que so' mais tarde vieram as ideias/filosofias teleologicas, e o conceito de redencao, dominar a "nossa" visao do mundo. E' nesse sentido que eu entendo a referencia, mesmo que anacronica, 'a transicao para o antropocentrismo. Sei que, no minimo, estou a simplificar....
Agora tenho de ir andando...
bom, eulimite-me a dizer que entre a tragédia grega e a religião católica houve muito mais coisas pelo meio. E entre elas e o antropocentrismo ainda mais.
Discordei da datação.
Pois, houve o Império Romano. Não é por acaso que a Igreja católica se chama também romana. E isto não é um mero detalhe.
Em todo o caso, da minha parte, a Igreja não é para aqui chamada. Não meto religiões em debates filosóficos. A igreja católica merece o meu respeito, mas não a minha cegueira. A mistura, a amálgama, como diria um grego, é da ordem do caos. Não confundamos as coisas.
Dragão, só uma pergunta: porque é que ele terá necessitado de ir buscar o S. Paulo para caracterizar o mesmo que Nietzsche fez indo directamente ao Sócrates?
(digo o mesmo um tanto de cor, mas pelo menos algo muito semelhante nesta preponderância do logos e do humano como aniquiladores dos instintos e da vida
O gajo embirra com o S.Paulo. Eu também. O Nietzsche também. Não é difícil: um tipo lê os evangelhos e a seguir vai ler as epístolas e se apanhasse o tal Paulo a jeito estrangulava-o sem dó nem piedade.
Por outro lado, o Cioran é bastante influenciado pelo Nietzsche (tal qual o Nietzsche já fora "educado" pelo Shopenhauer, segundo ele próprio diz).
Para o Nietzsche o cristianismo é uma plebeização do platonismo, daí o Sópcrates. E daí o Paulo. Eu transcrevo-te o que o Nietzsche diz dele, do Paulo. Vou só ver se encontro ali no labirinto que tenho espalhado pelas paredes o "anticristão"...
tenho de ler melhor esse S. Paulo. ignorância a minha que nunca me deu para isso.
De qualquer forma também não podia ir buscar tudo ao mestre, né?
";O)
eu gosto do Nietzsche ainda que às vezes esteja como o Borges e me incmode um tanto o tom. O excesso de embirração.
Mas a minha pergunta era mais teórica. Aquela história do antropcentrismo não bate certo. E então as dessacralização da natureza e antropocentrismo no século XI...
Dá ideia que às vezes usamos estas categorias sem pensar muito nelas. Eu própria também digo muitas vezes antropocentrismo sem pensar muito no caso
Escreve Nietzsche:
«Logo a própria expressão "cristianismo" é um mal entendido -, apenas existiu um cristão, e esse morreu na cruz.»
«O "Evangelho" morreu na cruz. Aquilo a que, desde então, se chama "Evangelho", era já o oposto do que ele tinha vivido: uma "má nova", um "Dysangelium".»
«Uma tal vida é, hoje ainda, possível, e para alguns necessária: o cristianismo autêntico, o cristianismo primitivo, será possível em não importa qual época... Não uma crença, mas um fazer, acima de tudo muitas coisas a não fazer, um modo diferente de ser.»
«À boa nova [a de Jesus] sucedeu-se imediatamente a pior de todas: a de Paulo. É em Paulo que incarna o tipo oposto ao "alegre mensageiro", o génio do ódio, numa visão de ódio, na lógica sem piedade de ódio. Que não sacrificou ao ódio este Dysangelista? primeiro que tudo sacrificou o redentor: pregou-o em cima da sua cruz. A vida, o exemplo, o ensinamento, a morte, o sentido e o direito de todo o Evangelho - já nada existia quando este falsário por ódio se apoderou da única coisa que lhe podia servir. Não a realidade, não a verdade histórica!... » E por aí fora, páginas e páginas contundentes denunciado a contrafacção do nosso amigo Paulo. É leres.
Cito apenas mais uma passagem curiosa:
«Qual foi, mais tarde, a única coisa que Maomé pediu de empréstimo ao cristianismo? O achado de paulo, a sua técnica de arrebanhamento: a crença na imortalidade - ou seja, a doutrina do "juízo final"»
Em suma e em rigor, para Nietzsche o cristianismo é uma falsificação perpetrada por um meliante e antes devia chamar-se "Paulismo".
Na verdade, a questão "antropocêntrica" inicia-se no século XI com Santo Anselmo, mas tem o seu fulcro no século XII, com a Escola de Chartres. Os intelectuais, a escolástica, essa praga que nunca mais largou o planeta.
Os teus amigos liberais, como tu própria já verificaste, são a ultima versão da "escolástica". São os alegres "Epimeteus" de todas as eras.
Sabes qual foi o maior escolasta de todos: Descartes. Para esse tenho requintes de malvadez... :O)
Dragão, penso que a confusão vem do sentido em que se está a usar o conceito de antropocentrismo.
O que o Cioran por aqui diz é apenas esta ideia de demasiado humano, demasiada dissecação da alma e dos costumes sem intermediário intelectual pelo meio. E dá ideia que parte daí, como o Nietzsche para o aniquilamento da vontade de vida, da expansão dos instintos.
Não é isso?
Ele diz: "Estranho à sua natureza, sozinho no meio de si próprio, desligado desta terra e do além, não aceita por completo nenhuma realidade: como o faria se não passa de semi-real? Um ser sem existência."
mas refere isto com S. Paulo, ou com o espírito de S. Paulo a atravessar 2 mil anos de história.
Bom, mas nada disso nos pode levar à tal dessacralização da natureza e antropocentrismo de quem tem uma obra que lhe é destinada e daí passa a ter o mundo à sua disposição.
A tal passagem para o Descartes, por exemplo.
Porque se interpretas antropocentrismo no sentido prometeico ou no homem como medida de todas as coisas então vais muito mais para trás ou muito mais para a frente com as mudanças operadas no espírito renascentista.
O que não entendo é que essa ideia de antropocentrismo que, de facto, dá poder ao homem acima da natureza e acima do rebanho de Deus, coincida com o sentido escolástico do privilégio humano na criação e no sentido do dom espiritual da racionalidade.
Em termos religiosos seria até uma heresia considerar-se isso.
De certa a forma o impulso da ciência necessitou do tal caldo cultural em que homem e cosmos se fundem para daí chegar á possibilidade de controlar e entender essas influências- e aí temos os alquimistas, os cientistas e tudo o resto.
Agora a escolástica e a racionalidade são antropocentrismo no privilegiar da razão mas não o são na autonomia do homem sobre a criação.
Desculpa sito estar escrito com os pés. Mas não é assim?
«Em suma e em rigor, para Nietzsche o cristianismo é uma falsificação perpetrada por um meliante e antes devia chamar-se "Paulismo". »
ehehe, espero que o Timshel comente e explique o que Paulo fez que os outro não fizeram ":O)))
O Nietzsche tinha estes ataques intempestivos mas a coisa é muito estilizada.
Cristianismo é doutrina, não é a vida de Cristo.
Por outro lado ia jurar que ele às tantas também dá a volta e acaba por dizer que apesar disso quanto meno perto da possibilidade de verdade melhor.
Ia jurar... os evangélicos vão para a pureza cristã e creio que isso ainda lhe parecia pior que a Instituição tão adulterada desse exemplo primordial
«Os teus amigos liberais, como tu própria já verificaste, são a ultima versão da "escolástica»
ahahah isso eu disse em relação à lógica do JM. Se isso é o liberalismo também não sei.
Mas admito que seja escolástico porque se justifica pelo próprio fundamento.
A Liberdade individual é o dogma, o objectivo, e todo o sistema escapa a qualquer outra justificação sem explicar como se auto-legitima.
Se não é por se considerar o bem comum e a sua optimização, a liberdade é um valor como outro qualquer. nem mais nem menos. Funciona em circulo
Bom, só tenho a agradecer-te este bocadão “:O)))
É muito curioso com as leituras mudam se nos afastamos da filosofia e vamos para outros campos. Até o Descartes muda de tom. Tanto se chega a ele à custa da escolástica como se vai lá ter por via oposta de tradição nada antropocêntrica e muito mais pagã. Estou-me a lembrar das “paixões da alma” dos espíritos animais, do homem máquina.
Estava mesmo com preguiça mental. Podia ter resumido tudo em Babel e Jerusalém Celeste.
O impulso para cima, a torrem prometeu é que são o desafio e levam dominar o mundo. Ser feito à sua imagem e no centro da criação é estar submetido à orbita. É permanecer sob sem o dom do grande arquitecto. Por aí nunca dominaria o mundo ainda que tenha provado o fruto da árvore. O privilégio cristão é muito mais submissão que poder. Foi por sair da órbita que se livrou de Deus e tenta colocar-se no seu lugar.
Resta saber se sem este "antropocentrismo" monoteísta teria lá chegado mais cedo.
Bem, aqui fica o que eu queria dizer com a minha leitura do antropocentrismo distinta da escolástica medível. O tal que leva ao conhecimento e controle do mundo.
http://digilander.libero.it/giannicrovatto/g-vitruv.htm
O "Homem medida de todas as coisas", da sofística e do nosso amigo Protágoras é um primeiro sinal e esboço de antropocentrismo na própria cultura grega. Se leres as "Nuvens", vês um Aristófanes, defensor das tradições, indignado com as modernices. Com um bocado de jeito, até reparas que eu, Dragão, faço um bocado o papel de Aristófanes nestes nossos tempos, eh-eh!... :O) O que prova que há uma civilização. Só que não é a civilização das multidões, mas dos espíritos.
Todavia, quando eu refiro o "antropocentrismo medieval" deve entender-se como "antropocentrismo na criação", isto é, o momento a partir do qual a tese tradicional do homem como acidente da criação, ersatz, passa a essência, sublimado, finalidade da mesma.
Ficando o homem acima do restante, como que entre este e Deus, a natureza deixa de ser sua irmã para ser sua propriedade. Por outras palavras, a natureza deixa de ser propriedade de Deus e é usurpada pelo homem. Daí segue-se a profanação: está aberto o caminho à manipulação, à experimentação, ou seja: À Ciência.
No fundo, a Igreja foi sendo sempre ultrapassada (até porque ela própria tratou de minar as aristocracias com as suas ganas de poder e de império) e nunca controlou grande coisa. Aprendiz de feiticeira, quando foi a ver, a barraca tinha pegado fogo.
Dou-te um exemplo curioso: a Usura.
A usura era pecado morgal e objecto de excomunhão para qualquer cristão que a praticasse. Uma das razões: os usurários vendiam o tempo e o tempo era propriedade de Deus, pelo que o onzeneiro estava a cometer sacrilégio. Pois bem, como os cristãos não podiam fazê-lo, o negócio foi parar às mãos da "raça imunda" da época: os judeus. Párias sociais, estavam fora da alçada religiosa e entregaram-se ao negócio de alma e coração. É claro que isso não os tornou especialmente populares, mas deu-lhes uma ferramenta poderosíssima sobre o poder económico (que, entretanto, não mais parou de crescer) e desde então resultou naquilo que se sabe: pogroms e criptoesquemas plutocratas.
Dragão. Ainda bem que entendeste a ideia. É que se costuma usar muito o termo antropocentrismo num sentido cósmico que me parece bastante errado. Porque se esquece que a não houve civilização mais antropocêntrica que a Grega.
Quanto ao sentido que tu lhe dás na Idade Média continuo na minha, não é por isso que ele vai dar o salto para se julgar dono do mundo.
Sabes onde é que eu vejo a falácia do raciocínio: pensa-se que num pensamento não monoteísta em que até a natureza pode ser sagrada o homem se integra nela e por isso não caminha para a dominar.
E depois faz-se o processo contrário e traça-se uma sequência entre uma criação em que ele é o principal destinatário porque feito à imagem de Deus, para a morte deste e o homem ocupar o seu lugar.
Ora este raciocínio é que vejo errado.
Porque o que eu tentei dizer-te é que quando o homem se sente como parte do cosmos e do mundo, só não o domina por falta de saber.
É o que sucede em todas os povos primitivos e até nas filosofias budistas. Não dominam mas também não saem da cepa torta. Podem ser muito espirituais mas olha-me só para como aquilo ainda hoje por lá está.
No Ocidente o salto para o domínio, para a Ciência - como vocês acentuam- não veio nada em linha directa do estatuto do homem ditado pela Igreja.
Porque vocês acham que é por ser centro submetido a Deus que o mata, e eu digo que se o matou foi por não ser centro e para isso teve de voltar ao velho sentido cósmico.
Nem imagino porque motivo seja obrigatória a relação entre micro-cosmos-macroscosmos participantes de um todo e respeito por esse todo sem o que querer dominar.
Foi mesmo por o mundo ser entendido como um gigantesco corpo vivo ou uma multidão de corpos vivos idênticos ao ser humano e este participando de natureza idêntica à de todas as criaturas- centrando em si o cosmos que se deu o tal salto para a Ciência.
Fiz-me entender agora?
não há relação moralizadora por fazer por ser parte do cosmos. Quanto muito houve, em certas épocas, falta de meios.
Mas há relação moralizadora na ideia de homem e criação bíblica e daí até o travão para a manipulação da natureza. Isso seria imitar o trabalho de Deus e o homem no sentido bíblico foi criado para ser rebanho, nunca para ser demiurgo.
com o segundo exemplo do judeu usurário, que o Gil Vicente tão bem caracterizou, só consegues dar-me razão.
Pois foi assim porque para o catolicismo o tempo era sagrado e tirar mais valia à custa dele um pecado.
Pois e então, não confima isto mais uma vez que não é pela imagem bíblica que se chega onde vocês á força querem chegar?
só uma síntese que eu sou chatinha ":O)))
»isto é, o momento a partir do qual a tese tradicional do homem como acidente da criação, ersatz, passa a essência, sublimado, finalidade da mesma.
Ficando o homem acima do restante, como que entre este e Deus, a natureza deixa de ser sua irmã para ser sua propriedade»
sua irmã o tanas-´a natureza só é irmã se a sociedade é atrasada.
Quando é irmã e ele não tem interdição para não adulterar a coisa a ver se cuida da maninha ahahaha
era isto que queria dizer.
Há por aí um grande mito na irmandade cósmica. E tanto falam dela a propósito dos índios como dos alquimistas, como da civilização grega que até por acaso tinha tudo, incluidno os deuses à imagem do homem.
Desculpa-me ser temerária que até parece que estou a por em causa os grandes teóricos mas é que estou mesmo, porque estes conceitos de antrocentrsimos são moddrnos- não conheço textos coevos a falarem nisso.
são leituras e como leituras valem o que valem.
Se falham na prática é porque até podem ser leituras deturpadas.
Eu prefiro arriscar e dizer asneira a repetir sempre tudo o que se diz.
se for tontice logo se vê
à custa desta mania do bom selvagem depois até se acha que no ano mil, quando apareceram as interdições para os cultos de adoração da natureza nos povos que se estavam a cristianizar a custo, se diz logo que houve uma "dessacralização"
pois, dessacralização do primitivismo, não da cultura greco-latina que transitou para as elites cristãs.
e ainda para terminar:
não vejo que haja sentido negativo só por si em se ter caminhado nessa senda de Prometeu. É o saber. O oposto é a ignorância.
se querem encontrar o tal ele perdido se calhar era melhor procura-lo de onde nunca saiu- do homem
quanto às nuvens do Aristófano coloca questão tão interessantes que é pena não ter tempo...
Discussão de surdos.
eheheh se calhar, eu nem devia andar por aqui porque estou a fazer mil e uma coisa ao mesmo tempo ":O))))
mas tens razão, eu entrei em contradição com essa treta do
" e eu digo que se o matou foi por não ser centro e para isso teve de voltar ao velho sentido cósmico."
porque, e calhar, até nunca deixou de ser centro. Foi-o é de diferentes formas. Mero acidente da criação divina é que não entendi como.
Na cosmogonia grega? mas aí é idêntico- vem das cinzas dos titãs. Na bíblica vem do pecado original
A questão seria encontrar o tal modelo de comunhão de espíritos sem lugar priveligiado no mundo. Seria preciso que a grécia tivesse contiuado clássica, se calhar... ou trágica com a moira a ditar tudo.
Zazie, mulher-vendaval, a tese do homem acidental, remendo na queda angélica, era a tese oficial da Igreja até ao século XI/XII. Não é tese minha.
Essa questão tens que debater com os gajos. Ou com os historiadores. Vê lá se queres que eu te atire com o Stº Agostinho acima!...
ehehe, ok. Andamos a falar em paralelo. Eu não dei muita importância a essa mudança porque a tal relação privilegiada é de ordem espiritual. A razão divina que chega depois ao cogito do Descartes. Tudo bem.
A minha dúvida prendia-se com outra questão que era o tal sentido de dessacralização da natureza.
Sagrada é sempre, e o homem o eleito. De anjo caído a protagonista por excelência devido à razão divina há mudança.
Agora a tal passagem de sem intermediário e depois chegar à Ciência e derrubou Deus é que me parecia demasiada aceleração do processo ":O))
Mas, já que andas por aí, o que pensas dessa alteração de percurso com o retomar do tal universo como matéria viva que o Aristóteles refere mas que até já tinha outros antecedentes míticos?
E que vai continuar até chegar ao Giordano Bruno e ao heliocentrismo, por portas travessas. Ou ao homem máquina, já agora.
A minha dúvida é se isto tudo tem de ser considerado um corte com a doutrina cristã ou se também se integra nela por trocas mútuas.
-isto é só um aparte mas até andava às voltas com a história dos estudos dos fisionomistas, como o Giambatista della Porta que depois chega ao Lavater e pelo meio há o Descartes com as paixões da Alma. E depois tanto assistes à igreja a querer chatear e mandar para o Index, como a aceitar e dar leitura nova. Expressões da alma, por exemplo, em vez de marcas de influências cósmicas idênticas a toda a natureza.
E nesse caso tens razão. Se for da alma passa, se for a par do animal, da árvore ou dos planetas a coisa cheira a magia e heresia é corta-se...
Porque ainda agora postaste o outro texto do Aristóteles e do Platão e dás o salto para a miríade de esquemas. Não foi pelo sentido de fysis como animal vivo que achas que houve problema.
Por aí há saber, há ciência mas mantém-se o todo- as relações de harmonias necessárias. Não é assim?
Vou agora ali sofrer com o meu FCP, e já volto.
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