segunda-feira, outubro 16, 2023

Da Palestina à Panlestina


 

«Matei um homem porque me feriu, e um rapaz porque me pisou. Se Caim foi vingado sete vezes, Lamec sê-lo-á setenta vezes sete.»
                                                      Genesis 4, 23-24


 Mas faz de conta que estou perplexo.
O dogma fundamental em voga nos israelitas é mais ou menos este: temos que brutalizá-los, o mais implacável e ininterruptamente possível, senão eles perdem-nos o respeito, quer dizer, o medo. "Brutalizar", entendam, é um eufemismo, daqueles desmesurados.  Acreditam, assim, que o terror, devidamente ministrado, com meios industriais e panóplia arrasadora, é o melhor antídoto para a monstruosidade empedernida e militante que vislumbram do outro lado. Não vou estar aqui a barafustar que os palestinianos são fofinhos ou merecedores sequer do ar que respiram. Concedamos até que são péssimas criaturas, indígenas inoportunos e empata-países de primeira ordem. Vou mais longe: mesmo a sua inscrição na humanidade é muito discutível, senão caduca, falsificada até (e milhares de pastores evangélico-mediáticos, vulgo jornalixeiros poderão certificá-lo com reconhecimento notarial e selo branco) - na humanidade?!,  onde é que eu tinha a cabeça!, na ordem dos vertebrados do reino animal queria eu dizer, dado que está cada vez mais cientificamente comprovado, por inúmeros estudos e experiências no terreno, que antes se circunscrevem na classe dos insectos, na melhor das hipóteses, e dos micróbios, segundo a maioria dos peritos, especialistas e entendidos. Aliás, cair-me-ia em cima toda a confraria de beatos e energúmenos de Jeovu, que monta guarda feroz ao sacrossanto excremento noticioso do instante fanático a ferver, caso eu, desde logo, não admitisse todos estes artigos de Fé hodiernos, supercatitas e ultra-sofisticados. Ainda mais agora, quando, depois do anillingus ininterruptus à Ucranato, compete  sorver  - com deleite e volúpia imarcescível toda (mas mesmo toda, e ela é desmesurada)  - a cloaca anal de Israel (seja lá, na realidade, o que isso seja, mascare ou represente). Ora, como eu tenho mais amor à minha pele  do que à verdade, aqui fica. E quanto ao essencial estamos conversados. Passemos pois ao acessório. Que, de resto, até recomendo ao leitor incauto que não desperdice tempo a ler, pois de mera ninharia e abaixo de zero se trata.
Tentemos apenas descortinar a lógica. Façam o que fizerem, são brutalizados. Um puto atira uma pedra, a merda do F16 vai lá a casa e escavaca um quarteirão. Um psicopata áspero esfaqueia um psicopata fofinho, outro F16 e menos outro quarteirão. Como método lá terá as suas virtudes, dado que a ideia é varrer aquilo dali para fora, mas também tem um pequeno (pequeníssimo, quase invisível, entenda-se) defeito: às tantas, toda aquela gente  infestação começa a suspeitar, seriamente, que pretendem exterminá-los. E da suspeita à certeza, geralmente, não vai uma grande a distância. Ora, como diz o ditado: perdido por dez, perdido por mil. Criança batida perde o medo; com os insectos é semelhante. De aterrorizados como convém (e a comunidade internacional abençoa)  a terroristas por desespero (e o ódio e a raiva adubam) é um instantinho. No fim da linha, não é difícil adivinhar o balanço: o terrorismo benigno e quiduxo do Estado de Israel transforma, em boa velocidade, uma percentagem cada vez maior de aterrorizados em terroristas. Do lado de cá, entre os instigadores de sofá e rabino-sacristães de pantalha, vocifera-se e taxam-se as emanações de terroristas. Mas do lado de lá, entre os insectos, lamento muito, chama-se legítima defesa. Ou classifica-se ainda, na natureza em geral, último recurso do animal encurralado. Todavia, grunhe-se a bacoreja-se, à bocarra cheia,  tom beato e para quem quiser ouvir: "Ah, mas o Hamas não representa os insectos!" Então representa quem? Ou o quê? Além do diabo de conveniência para os mata-percevejos de atalaia e biqueira pronta... Em bom rigor, colocam a questão como usam a inteligência: de patas para o ar. Não é o Hamas que representa quem quer que seja. Segundo somos elucidados pelo próprio Estado de Israel, ao longo pelo menos dos últimos vinte anos, os palestinianos é que representam o Hamas. Tanto que o Hamas faz e eles, os avulsos, é que as pagam. À bomba, invariavelmente. 

Outra pérola retórica dos necrófagos de plantão (desde a direitalha na bancarrota moral à escumalha instalada por controlo remoto e desvertebração prévia nos desgovernos oxidentais por encomenda, passando por toda a casta de troca-tintas, puxa-sacos e lambe-crias de passerelle): "Ah, Israel tem todo o direito a defender-se!..." Pois sim, mas então porque é que não se defendeu? Porque é que que os tais fulanos hediondos se entretiveram a destruir, desmilitarizar e abater a seu bel-prazer e com toda a calma deste mundo?  Israel, os insectos, a Cochimchina, o reino do Nunca, todos têm o direito - nem sequer é o direito ou dever, mas o instinto básico de sobrevivência - a defender-se. Convém é que o exerçam no devido local e ocasião. Ora, a verdade é que Israel, quando se devia ter defendido, não se defendeu. Quer defender-se agora, segundo estas bestas universais, à posteriori? Já perdeu a boa da oportunidade. Agora, para não variar, com o nariz partido e o rabinho dorido, propõe (e apregoa mesmo aos berros) vingar-se, isso sim. Porém, não se trata, em bom rigor, duma questão de direito, mas de força. E essa, evidentemente, não lhe falta. Nem força nem apoio da "Comunidade Internacional". Pelo menos para trucidar, digo, brutalizar uns milhares de representantes do Hamas. Numa espécie de vooduismo industrial de grande espalhafato. Assim, de repente, até me lembra aquela grande obra da história da filosofia, do pessimista mor da Irmandade: "O Mundo como Vontade e Representação". Ora, a Israel, vontade (de exterminar) é coisa que nunca lhe falta, e representações (bem como representantes) também não.
É legítimo, humano, sequer decoroso? Segundo a gritaria assanhada nos mass-media é sobretudo urgente. Imperativo categórico, no mínimo. Já nem assobiam para o lado, ou fingem que não vêem: incitam, acicatam, ululam... és maricas se não lhe partes já a cara e massacras a família! Descortina-se todavia, entre os azougados israelitas, algum progresso civilizacional: já promovem os insectos a animais e propõem-se abatê-los nessa categoria. Embora fúnebre, sempre é uma promoção.
De resto, segundo o estereotipo mas também a exaustiva comprovação histórica, os judeus são um povo muito devoto da contabilidade. Na última contagem, segundo me apercebi, de judeus indefesos colhidos pela razia, a soma ia nos 1400. Lá está, desgraçados, que não foram defendidos quando se impunha e servem agora de mero pretexto para a chacina ritual e sacramentícia. Setenta vezes sete, já recomenda a receita, no pantagruel lá deles, pelo que, pelas minhas contas, não hão-de frear antes dos 100.000.
Isto é mau? Apenas para o Ucranistão. Matar palestinianos é muito mais excitante do que matar ucranianos russófilos ou mesmo russos inteiros (ou, pelo menos, é uma convocatória muito mais virtuosa, obrigatória e solene), pelo que a malta muda de canal, e claque, em bloco. E mesmo que não mudasse, a verdade é que a programação foi tomada de assalto... em todos os canais; pelo que não lhe restaria alternativa. Mas o fazer de conta, esse, não muda: esta escória necrófila, de mirones da porno-guerra e masturbadores da teclo-belicosidade, faz de conta que são os israelitas a defender-se, coitadinhos e sitiados, como antes fazia de conta que não eram os ucranianos a morrer às carradas. Lá está, mais até que vontade e representação, vontade de representação. Cada qual alivia a excitacinha e esgrime a pilinha escaganifobética, dos valores e da virtude reptiliana, com a teleporcaria que mais lhe quadra e inflama.
Aos representantes do Hamas, outrora palestinianos, sobrecarrega o infortúnio: como se já não bastasse a chusma global que, em festiva romaria, os quer exterminados e tele-linchados, têm ainda que arrostar  com a qualidade daqueles que  alardeiam sofrer e ganir em sua defesa. A esquerdalhada acéfala, na perpétua venda ambulante de t-shirts de contrafacção  e bijuteria ideológica de pechisbeque marado à esquina da História, não ajuda... Apenas polui e inquina. Aliados destes apenas descriminalizam o inimigo. Entre a sonsice peçonhenta dum Daniel Oliveira qualquer e a grunhice compulsiva dum Fernandes, Hiena Matos, ou quaisquer desses uber-pensadores de aluguer, venha o diabo e escolha.
Pessoalmente, não tenho galo nesta luta. É zaragata lá entre entre árabes: espectrais contra pingarelhistas, e vice-versa. Suspeito seriamente que só terminará com o extermínio de uma das partes. Mas não aposto.
Entretanto, os desvalidos civis israelitas que, subitamente, acordaram sob ataque, sequestro e massacre por parte de sujeitos armados particularmente impiedosos e sinistros poderemos alguma vez imaginar  como se terão sentido?... Sim: como autênticos palestinianos. Afinal, ironia ou lei eterna do destino, a Palestina, quando nasce, é mesmo para todos. Já não há árabes nem israelitas, são mesmo todos palestinianos.

PS: Não menos simbólica e significativa é a declaração do estado de guerra por parte do Nataleão de serviço. Israel está de facto em guerra: consigo própria. E não, não é com a sua consciência: é com os resquícios de inibições. Como os esquizofrénicos. Ou os possessos.




6 comentários:

muja disse...

Eis tudo.

muja disse...

Os meus ai-laites:

...péssimas criaturas, indígenas inoportunos e empata-países de primeira ordem.

Um psicopata áspero esfaqueia um psicopata fofinho, outro F16 e menos outro quarteirão.

Do lado de cá, entre os instigadores de sofá e rabino-sacristães de pantalha, vocifera-se e taxam-se as emanações de terroristas.

Em bom rigor, colocam a questão como usam a inteligência: de patas para o ar.

...os palestinianos é que representam o Hamas. Tanto que o Hamas faz e eles, os avulsos, é que as pagam.

...desde a direitalha na bancarrota moral à escumalha instalada por controlo remoto e desvertebração prévia nos desgovernos oxidentais por encomenda

"Ah, Israel tem todo o direito a defender-se!..." Pois sim, mas então porque é que não se defendeu?

A esquerdalhada acéfala, na perpétua venda ambulante de t-shirts de contrafacção e bijuteria ideológica de pechisbeque marado à esquina da História, não ajuda... Apenas polui e inquina.

a grunhice compulsiva dum Fernandes, Hiena Matos

Palestina, quando nasce, é mesmo para todos

passante disse...

πανληστεια ?

(como o outro, tenho pouco latim e menos grego, mas agora os googles ajudam imenso ...)

marina disse...


.
"Olha, é um judeu...
Não! É um hebreu...
Não! É um israelita...
Olha! É um homem de negócios...

Anónimo disse...

Entretanto , há bocadinho , em Bruxelas...

Vivendi disse...

As guerras já foram transformadas no novo "Circo", só falta agora saber como irá haver "Pão" no futuro...