segunda-feira, maio 18, 2015

Prelúdio em forma de Re-visão



Falar da "ditadura cultural da esquerda" tem os seus encantos... e os seus labirintos. Sobretudo em redor do conceito de "cultura". Estamos a falar de que "cultura", efectivamente? 
Porque se levarmos em conta a cultura geral (ou popular) do pré-25 de Abril, damos de caras com o célebre triplo F - Fado, Fátima e Futebol. Certamente, não era sobre esta cultura do povo que a esquerda alimentava pretenções despóticas. A mesma merecia-lhe até o mais solene e arrogante dos desprezos. Traduzia, nos seus termos peraltas, a "alienação das massas",  coitadas, analfabetas e pacóvias. Alienação, essa, de que cumpria libertá-las. O projecto da "esquerda" não era, por conseguinte, nem nunca foi, um projecto popular (embora o poder e a democracia por eles engendrada se mascarasse do termo). Não, tratava-se duma nova-elite, duma vanguarda esclarecida (da classe operária; e otária). Ao triplo F contrapunham o triplo B - Baladas, Balelas e bridge.
Mas antes da dissecação em ordem do assunto, duas pequenas (re)visões de como a aventura, entretanto, decorreu... e vem decorrendo.

O Farol dos Afundadores I 

Dantes, no tempo do faxismo, nas trevas da longa noite, que bem me lembro, vi com estes que a terra há-de comer, ninguém me contou, era o Benfica – o clube do regime, marca de exportação, condição de cidadania, esteio da família, totem dum povo, entusiasmo da horda, embaixadeza da pátria avulso. Agora, e cada vez mais, é o Benfica, o Sporting, o FêCêPê, o Real Madrid, o Barcelona, não já clubes de futebol, mas espécie de seitas mau-mau, futemafias, histerismo troglodita, frenesim ululante. Outrora, por causa do Benfica batiam nas mulheres e na prole menos expedita; agora são capazes de matar ao calhas – bons chefes de família alimentam fantasias de hecatombe e extermínio.
Dantes, no tempo do faxismo, era a Senhora de Fátima, o ópio do povo. Lá continua, que Deus a guarde. Sim, mas reforçada (salvo o devido respeito) pelo pastor Tadeu, pelo bispo-empresário e secretário-geral Edir Macedo, pelo professor Karamba, pelo pequeno rabi e o compadre imã, pelo grande astrólogo Mané e toda uma chusma de videntes, cartomantes, mães-de santo e padres de vão de escada (ateus incluídos) feitos carraças dum povo rafeiro. Quer dizer, ao ópio do povo, adicionou-se o haxixe do povo, a marijuana do povo, o LSD, as anfetaminas, a cocaína, a morfina, o ecstasy e o vinho a martelo do povo. Grande povo, nação valente, que além de fumar, alcançou a ampla conquista, o inalienável direito de também se charrar, injectar, encharcar, tripar, snifar com uma variedade inaudita de droguinha religiosa da boa. Alleluia!...
Dantes, no tempo do faxismo, era o Império Ultramarino e os pretos tadinhos que eram explorados, escravizados, vilipendiados e oprimidos pelo colono infestante e a metrópole sanguessuga. Agora é o Império Intramarino, onde a maioria da população, mentecaptizada por todo o sortido de antolhos, ecrãs, mamãs e arreios de andar à nora, foi despromovida a pretos, enquanto uma minoria endogâmica de luminosos e outros caga-lumes doutores se diverte e recreia a colonizar os restantes, sob a supervisão embevecida dos tutores da estranja. Agora, por conseguinte, é a própria metrópole que, um tanto ou quanto esquizofrenicamente, se divide entre micrometrópole e neocolónia. Ambas dando corpo ao Sacro Império da Mediocridade.
Dantes, no tempo do faxismo, era o fado e a Dona Amália, estátua em vida, garganta do inefável chunga, enlevo das emigrâncias. Agora, além do fado, é o pimba, e o pop, e o hip-hop, e o rap, e a martelada das discotecas. E são chusmas de vedetas, chupetas, marretas, artistas, fadistas, herpetobatas* e palhaços de vida fácil, a chocalhar piada ao quilo e graçola a metro!
Dantes, no tempo do faxismo, era o Salazar, o António que não mudava de botas. Agora são os filhos, enteados, bastardos e netos do Salazar. Todos por inseminação balnear. Eu explico: parece que os espermatozóides libertados pelo feroz ditador, aquando de casuais e solitárias práticas, saíram pela retrete, viajaram pelo esgoto e acabaram, após peripécias várias ao sabor do capricho das correntezas, nas praias do Algarve e sul de Espanha, onde, ainda vigorosos, pujantes e perfunctórios, fertilizaram os úteros em molho incauto das mães dos filhos que nos (des)governam. Só que estes, mais espertalhões e cosmopolitas, mudam de sapatos todos os dias, de carros todos os anos e de casa, ideologia, sexo e, sobretudo, patrono, então, é melhor nem falar.
Dantes, no tempo do faxismo, estavamos orgulhosamente sós. Havia a censura, o lápis azul, o exame prévio. Havia a Pide, a Mocidade e a Legião. Agora estamos vaidosamente totós, de mão estendida, cuzinho em saldo e vaselina a jeito. Há o critério editorial, a mixordice jornalística, a ordem unida da notícia. Há o Tide, detergente mental logocida, em drageia ou supositório; as telenovelas da TVI e a Chusma xenolatra, de grunhofone em riste, a acelerar e telefonar por tudo quanto é estrada, ponte e caminho, e a abrir estradas, portagens e autódromos por tudo quanto é sítio!
Digo com franqueza: nunca tive uma visão idílica do antigamente, ainda menos em termos de política interna. Mas quanto mais anos usufruo das delícias deste admirável regime novo, para grande assombro de todas as minhas células, mais virtuoso e digno o outro me parece. A única monstruosidade aberrante que jamais lhe conseguirei perdoar, foi essa, reptiliana e lorpa, de, em tão má e porca hora, ter defecado um aborto - invertebrado e pífio - destes!...
Para estes pulcros da lábia, imaculados da concepção, era uma vergonha ter colónias que nem colónias eram, mas não é uma vergonha - pelo contrário, é uma gloriosa conquista - ser uma colónia.

Simulacro de gente, país postiço, alminhas de pechisbeque - aviltamento compulsivo de navegadores, ferrabrases e poetas a asnos sublimes, putas eruditas e punheteiros do currículo!...»

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O Farol dos Afundadores II

A América é o farol do mundo. Pena que seja um farol erguido por afundadores. Pena que o mundo seja um barco à deriva.
Hoje, a putativa super-nação, mais a sua super-democracia imaginária, entregam-se a uma fantochada eleitoral, ao nível das Angolas deste mundo, que vem servindo de pretexto a uma série de “americanos” na diáspora para vibrarem pelos seus paladinos. Não votam (por enquanto), mas fazem força. Gemem do lado de fora dos sanitários. Armam coros guinchantes, ao velho estilo do histerismo grouppie. Bradam incentivos para dentro, mensagens entusiásticas: “Coragem! Avante! Tu és o sol da nossa caverna!” Enfim, parturiam à distância. Tele-acolitam o seu favorito. Lançam cavacas ao lume.
Mas o seu maior sonho seria poder estar também lá dentro, assoberbados nos trabalhos, espremendo o esfíncter de vanguarda, super-potente, mirando, finalmente, a obra fumegante, aspirando o odor revigorante, testando a consistência, a uniformidade da cor.
Quais vão ser as peripécias, que complicações e sobressaltos vão surgir – se vão ser necessários fórceps ou apenas clisteres -, aindas ninguém sabe ao certo. Mas adivinha-se.
Quanto aos “nossos americanos”, com as suas bandeirinhas Kerry Clinton e as suas bandeirinhas Bush, dir-se-ia que, como certas cadelas que emprenham fantasmagoricamente, também eles se entregam a gravidezes histéricas, e aguardam, em vigília angustiada, que venha à luz o americanozinho fétido que transportam nos seus miraculados e industriosos ventres.
Rezam para que nasça completo. Já que mongolóide vai ser de certeza. Pelo lado materno.


PS: coisas escritas há mais de dez anos aqui no Dragoscópio continuam plenamente actuais. Parece que ao nível da cultura a sério a "ditadura da esquerda" não é assim tão totalitária. Aliás, posso até adiantar, desde já, a conclusão do postal segundo sobre essa tal "ditadura": entre nós não existe nenhuma "ditadura cultural da esquerda", existe é uma "ditadura geral da estupidez". Também começa por "e", mas tem mais uma letra.

10 comentários:

JSP disse...

Só por distracção se pode considerar a América "farol do mundo".
O sol levanta-se realmente a Oriente - e,não permitindo o Celeste Império putativos "senhores da guerra",não se prevê, por largos, larguíssimos, anos a necessidade de iluminaçôes artificiais...

Euro2cent disse...

> Só por distracção se pode considerar a América "farol do mundo".

Camarada, quando for capaz de cuspir na santinha liberdade - e não ser linchado - venha cá falar.

Entretanto, os artistas que inventaram a frase "a shining city upon a hill" continuaram a trabalhar, e não é em Hong-Kong.

Vivendi disse...

Ontem foi dia de festa do futebol.
Basta olhar atentamente para tudo aquilo que aconteceu para perceber que este é um regime que nos vai atirar a todos para um pardieiro.

Vivendi disse...

Quanto ao farol do mundo...

http://viriatosdaeconomia.blogspot.pt/2015/05/o-farol-do-mundo.html

majoMo disse...

Os Cata-Ventos da História foram sempre muito iluminados - de um lado a América farol do mundo: do outro a Soviética União o "Sol da Terra" (Álvaro Cunhal 'dixit').

As Elites portuguesas ficam sempre muito deslumbradas com os brilhos - porque não são brilhantes. A sua indigência mental leva-os a confundir o Latão com o Ouro. No final nem com o Latão ficam ... [a exemplo dos lusitanos que assassinaram Viriato...]

Donde se segue o observado: "Para estes pulcros da lábia, imaculados da concepção, era uma vergonha ter colónias que nem colónias eram, mas não é uma vergonha - pelo contrário, é uma gloriosa conquista - ser uma colónia."

Porque adoram ser dos outros, para pensarem que têm - detestam Ser eles mesmos. A indigência é sempre indigente - e a das Elites é superlativa.

Vivendi disse...

Verdade. O povo é manhoso mas as elites são um nojo.

marina disse...

e o marx se fosse vivo tinha de mudar para futebol o opio do povo , que as lutas de esquerda param todas quando ha bola :) eh incrivel como admitem , os de esquerda , que pontapes na bola rendam milhoes aos tipos , como fecham os olhos a lavandaria de dinheiro q eh a bola , como assobiam pro lado quando os clubes nao pagam o q devem em impostos e tal. dupla moralidade.

Anónimo disse...

«ditadura geral da estupidez»
Muito bem visto.
Abraço do eao

Anónimo disse...

Ah... comentários, não vale a pena...
Pérolas a porcos, disse o filho de Deus.

Anónimo disse...

tanta azia que para aqui vai. V. vive numa ilusão. O mundo é o que é e não aquilo que imaginamos em sonhos. Cada País real tem as suas virtudes e defeitos. Só nas utopias socialistas se vivia no paraíso farol do homem novo, não é verdade ?