quarta-feira, março 23, 2005

Deixem lá as patas (a esquerda e a direita); falemos antes do que tem dentro da cornadura!...

Como há muito tempo não disparo em "Celinada", aí vai. Refastelem-se!...
Fica, quanto mais não seja, a propósito de "modernices".

«...A máquina é o que há de mais infecto! Derrota suprema! Descaramento! Balela! Nunca a máquina mais pintada libertou ninguém! Embrutece mais cruelmente o homem e nada mais!... Eu fui médico na Ford, sei do que falo. Os Fords são todos parecidos, soviéticos ou não!... Descansar sobre a máquina é mais uma desculpa para continuar nas velhacarias. É fugir ao verdadeiro problema, o único, o íntimo, o supremo, o que está no fundo de todo o homenzinho, na carninha, na cachimónia dele e não noutro sítio qualquer!... O verdadeiro desconhecido de todas as sociedades possíveis ou impossíveis...Disto é que ninguém fala, não é "político"!... É o tabu colossal!... A questão "última" proibida! Mas, em pé, de gatas, deitado, do avesso, o Homem nunca teve, no ar ou na terra, senão um só tirano: ele próprio!... Nunca terá outros... Se calhar é uma pena aliás... Talvez se domesticasse, tornando-se enfim social.
Há séculos que lhe dão graxa, que lhe escondem o verdadeiro problema a ver se logo de seguida o põem a votar... Desde que morreram as religiões, passou ele a ser incensado, empanturrado a todo o instante de pachochadas! É ele a única Igreja! Deixou forçosamente de ver claro! É patego! Acredita em tudo o que lhe impingem! Então, duas raças tão distintas? Os patrões? Os operários? Cem por cento artificial! Uma questão de sorte e de heranças! Tratem de as abolir! Verão que eram tais e quais... Digo tais e quais e só isso... Hão-de ver que são...
A política corrompeu ainda mais profundamente o Homem nestes últimos três séculos do que durante toda a Pré-história. Estávamos na Idade Média mais perto de nos unir do que hoje... estava a tomar forma um espírito comum. A intrujice estava mais bem "montada em poesia", mais íntima. Já se acabou. »

- Céline, "Mea Culpa"

3 comentários:

vs disse...

O Destouches é dos que sabia mais que a Amália..........e não cantava.

Mas as patas (e os patos, claro está) cá andam.
De cabeça para baixo e rabinho para o ar.


nota: a 'petite provocation' no meu blog(ue) sobre a 'refundação' não é para si desta feita ;-), mas sim para os que insistem em andar com o Nietzsche (coitado) dependurado, de pernas p'ró ar, como se fosse um perú já depenado, o que, convenhamos, é uma lástima.

Nelson Buiça

Anónimo disse...

Mas o amigo conhece nosso João Fernando? O da Viagem ao Fim da Noite? Xi, patrão. Pensava que mais ninguém conhecia esse notável fassssista, tirando eu.

dragão disse...

Pode provocar à vontade, ó Nelson. Como os dragões, ao contrário dos cães, não andam em matilha, é raro que nos sintamos visados, como é raro que nos visem. Até porque somos mitológicos e imaginários. E, já agora, vocelência, meu caro, quando eu falar em "liberal" ou "liberalismo" (neo, pos, ou o diabo que os carregue), não lhe tome as dores nem se sinta atingido. Devo dizer-lhe que não o tenho na conta de tal. Poderá até jurá-lo a pé juntos, mas eu já o topei. A mim não me engana. Basta atentar no seu vocabulário.