«Em 1887, surgiu [na Arménia] um Partido Revolucionário Hintchakista, multiplicando as manifestações que tiveram por resposta uma terrível repressão. Além disso, tinha-se constituído na parte russa da Arménia uma federação revolucionária arménia de carácter nihilista, a Daschnakzuthiun. Guerrilhas, emboscadas, repressões, massacres tornaram-se o clima normal de uma boa parte da Arménia. O verdadeiro levantamento acabou por eclodir em 1874 e as potências enviaram delegados para verificarem os massacres de que eram vítimas os arménios refugiados nas montanhas de Sassun. A comissão internacional concluiu, após inquérito, em 28 de Julho de 1895, pela ferocidade dos turcos e dos curdos. Massacrados milhares de arménios sem distinção de idade ou de sexo, perseguidos como animais ferozes, o sultão ganhou tempo, prometendo reformas que não pensava cumprir, mas aplicou de facto o projecto que ele preparava há muito tempo: a liquidação dos arménios. (...) O massacre ia agora propagar-se de província em província. No validato de Trebizonda, a carnificina fez 600 mortos (na cidade), foram destruídas 34 aldeias em redor e 2100 arménios assassinados; em Erzerum o massacre fez mais de 1000 mortos; a lista dos validatos arménios de Bitlis, de Van, de Karput, de Diarbekir, de Sivas, de Alep, de Adana e de Angora é uma litania de massacres, de vítimas degoladas, queimadas vivas, massacres organizados, começando a horas fixas, desenrolando-se em toda aparte onde as potências exigiam reformas, e de modo algum fortuitos, porque muito bem organizados. (...) Mais de 200 000 pessoas pereceram nesses massacres, sem ter em linha de conta as conversões forçadas, as mulheres levadas para os haréns (cerca de 100 000), as 2 500 aldeias destruídas, os milhares de casas incendiadas. Junte-se a tudo isso as epidemias de peste e de cólera e o êxodo de perto de 200 000 arménios para a Transcaucásia, para a Europa e para a América.
As potências combinaram não intervir na Arménia porque, dados os seus interesses económicos no Império Otomano, já não reclamavam a execução das promessas de reformas.(...) A Revolução dos Jovens Turcos, em 1908, levou ao poder um partido violentamente panturco que, depois de perder uma quarta parte do Império nas lutas com os cristãos dos Balcãs, de 1908 a 1914, foi levado pelo vento de demência que então soprava sobre a Turquia humilhada, e que não previa outra solução para as minorias, especialmente a arménia, que não fosse o genocídio.
Em 1909, a Cilícia foi devastada e mais de 20 000 pessoas assasssinadas. A reconquista da sua capital Adana desenrolou-se num horror sem nome (pessoas esfoladas vivas, fuziladas, esventradas, crucificadas, cortadas aos bocados...).
Quando a Primeira Guerra Mundial eclodiu em 1914, o laço voltou a apertar-se para os arménios (...). A tempestade foi desencadeada no mês de Abril de 1915 em três pontos diferentes: Zeitsun, Van e Constantinopla. O massacre foi geral e total, preludiando uma deportação das populações arménias para os quatro cantos do Império, onde a maioria nunca chegaria, massacrada ou morta de fome no deserto da Mesopotâmia ou da Síria. A placa giratória da deportação estava em Alep, de onde partiam as caravanas para os campos da morte. Em 1917 não restavam mais do que 45 000 deportados, os outros desapareceram nas montanhas ou nos desertos. 1 200 000 a 1 500 000 foram vítimasa do genocídio, numa população total de 1 800 000 a 2 100 000. (...(
Se o tumulto dos massacres perturbou os cônsules, mal chegou à porta das embaixadas e, de qualquer maneira, a emoção que provocou esfumou-se perante os interesses superiores dos governos. »
- Guy Richard, "A História Inumana"
Embora se tenha posteriormente naturalizado britânico, Calouste Gulbenkian era arménio de nascimento. Veio ao mundo em Istambul, em 1869, e morreu em Lisboa, no ano de 1955. Legou a Portugal a sua mais importante e meritória Fundação. Felizmente para nós, (e, sobretudo, para ele) não partilhou do destino de tantos dos seus patrícios.
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