terça-feira, maio 31, 2005

Tricofobia para todos


O que é a tricofobia?
Aposto que, ocupados com as fobias da moda, aquelas nefandas que os mixordeiros da propaganda narconazi vos insuflam, a martelo, pela pinha abaixo –a homofobia, a xenofobia, a teofobia, a semitofobia, a melanofobia, etc -, nem tendes tempo para reparar nesta fobia toda catita que por aí anda. Aliás, grassa. Está claro, como pertence à ordem das "fobias bem" não merece reparo. Pelo contrário, merece festejo, romaria, banho de multidão, guarda de honra e fanfarra. Sim, porque também há fobias boas, lindinhas, essenciais ao showbiz e ao autoclismo mental. Não se discute. Só trogloditas ousariam pô-la em causa. Tecer-lhe menoscabo ou desconsideração; nem pensar!...
Mas, do alto desta nossa erudição ribombante, passemos à explicação do que é a "tricofobia"...
Estais preparados? Já tendes o caderninho de apontamentos a jeito? Então registai (mas com cuidado, não se vos parta alguma dessas unhas tão bem tratadas):
Pois significa, nem mais nem menos, "terror dos pêlos". Insere-se no processo de desvirilização em curso e traduz-se, nos homens, pela corrida às depilações, às manicures, aos peidicures e paneleirices congéneres. O ilustríssimo R, com a subtileza elegante que o caracteriza, alertou para a maleita. E eu, com a ferrabraveza militante que me distingue, acorro com a artilharia pesada, em prece ao desmantelamento e ao massacre.
Ocorre-me, para começar, aquele poema do António Botto, esse príncipe dos panascas líricos, que declamava, emocionado, do seguinte jaez:
"Um rapazinho
lavadinho
todo nu
sem pelinhos no cu,
Confesso: até gosto
."
(Da maneira que isto vai, surpreende-me como é que ainda não foram deitar o Botto, nos Jerónimos, ao lado do Pessoa e a fazer olhinhos ao Camões...)
Pois estes gajos modernos, estas florzinhas com pendurezas redundantes, cientes deste capricho dalgumas elites endinheiradas, não se poupam a esforços para cair no goto dum tal mecenas: dos sovacos às orelhas, do nariz à pilinha, dos cascos à peitaça, não dão quartel ao cabelame. Pêlos, cabelos, pintelhos, fora o toutiço, não escapa nenhum: é uma razia, um tricocídio, um massacre! O único local anatómico onde são tolerados é lá no alto, a culminar a mariquice, em forma de trunfa luxuriante, em jeito de popa choupana ou meda de palha. Mesmo as sobrancelhas e as pestanas não escapam incólumes. E se não desatarem a estofar o nalguedo com silicone ou numa devoção pegada à arquitectura de mamas com o mesmo material, já vamos com sorte.
Naturalmente, com os putativos machos a atirarem, assim, com a testosterona borda fora, não surpreende que certa qualidade de fêmeas aproveite e comece a desenvolver músculo, garimpa e voz grossa. Se não montas tu, então monto eu. Ora, para esta nova qualidade de "galos" em ascensão, as opções são óbvias: ou estão ainda em transição mental e, nesse caso, interessam-se por galarós agalinhados; ou convencem-se mesmo que já são galos perfeitos, de crista completa, e avançam sobre galinhas confusas. Da mesma maneira, os galarós agalinhados, consoante o estágio de agalinhamento que tenham alcançado, inclinam-se para galinhas másculas ou galos com tendências. É estranho? Nem por isso: num mundo onde se celebra, com foguetório e algodão doce, a artificialização triunfante, porque não havia de ser artificializado o sexo? De resto, onde se lê "artificialização" pode também ler-se "humanização", isto é, "sofisticação".
Mas não foi o intuito moralista, seja ele qual for, o que aqui me trouxe. Quero que se fodam todos, uns aos outros, se isso os apazigua com a existência! Direi mais: Que fodam muito e se reproduzam cada vez menos, porque, se assim for, é todo um planeta que lucra!...Que abortem, que rebentem, que expludam, é-me indiferente!
Não, a minha jornada é bem menos elevada e bastante mais prosaica. O que vislumbro no meio deste sarrabulho estapafúrdio é, apenas e somente, uma bela oportunidade de negócio. Ainda para mais para um dragão como eu, a quem a natureza - de braço dado com a mitologia- dotou de equipamento a preceito. E se existe procura, tratemos da oferta. Não é esta a lei fundamental da física que rege o mundo actual?
Por conseguinte, estou a pensar abrir um "pelário". Se este galinhedo corre aos solários para se bronzear, e aos ginásios para se encher à bomba ou derreter as banhas, também há-de comparecer no meu "pelário", para eu lhes tratar da penugem. E eu, claro está, trato. Vou lá estar até, pessoalmente, para isso. E a um preço e velocidade imbatíveis, de antemão anuncio. Já estou, inclusivamente, a registar a patente da "fast-depilation". Quanto ao método, não imaginem lasers nem cremes revolucionários. Nada de tratamentos dispendiosos: Vai ser mesmo a maçarico; com labareda firme e constante. Pois não é assim que, ancestralmente, se trata o toucinho?
Com o bónus acrescido e - numa primeira fase promocional - gratuito de, para os mais impacientes, também poderem queimar banhas. Em tempo record. E com a garantia de ficarem pretinhos a rigor. Escarumbas não só por dentro, mas também por fora...já viram que conquista?!
Até podem ir já treinando o vosso hip-hop. Yo!...

segunda-feira, maio 30, 2005

Impressões da Belogosfera

*
Em tempos, eu, sempre disponível para canduras, ainda acreditei que aquilo do "blasfémia" era um blog. Depois, quando aquele turbo-pensador do João Miranda entrou a bordo, convenci-me que não: com efeito, era um fórum, e o pitoniso Miranda, investido de dotes oraculares, o seu pujante moderador.
Afinal, enganei-me de ambas as vezes. Na verdade, é uma barraca daquelas da feira popular, com um funâmbulo metido numa canga, a cuja cara a malta atira tartes, bolos cremosos e outras porcarias. A função do funâmbulo é irritar o passante, largando-lhe invectivas e bojardas. Quanto mais estapafúrdias e irritantes forem, melhor. Mais o transeunte se agarra às munições e desata no sôfrego bombardeamento. É uma estratégia de mercado, dizem. Exerce uma poderosa atracção sobre a potencial clientela. E resulta. Confesso que um tipo tem de apelar aos mais sagrados deveres para se arrancar dali. Eu próprio tive de recorrer a firme austeridade e vontade hercúlea para o efeito. Aquilo vicia.
**
Entretanto, até a minha visão do apocalipse sofreu um abalo profundo e alterou-se drasticamente. Agora, já não estou na espectativa, como profetizado, de um confronto final entre a Luz e as Trevas. Não, palpita-me que é mais uma diálise entre o João Miranda e o Julio Machado Vaz.
Qual vai de trombeta e qual leva na mão a taça de ouro a transbordar, eles que decidam.
***
PS: Também já me disseram que o excelso bloguista extrai os argumentos a partir duma tômbola. Numa hibridação perfeita, ancorada algures entre a lógica totoloto e a poesia Dada (de dadaísmo, entenda-se).
Concedo que, se assim é, não deixa de ser um método fascinante.

domingo, maio 29, 2005

Esperança de vida...ou de morte?

Os dilectos masturbadores de números e amantes extremosos das estatística não têm dúvidas: o Progresso é uma coisa maravilhosa. A ciência e a indústria, -sem nunca esquecer o comércio (ah, o comércio, o comércio...) -, não se cansam de bater recordes e parir milagres. Assistimos, deslumbrados, a uma verdadeira empreitada de prodígios e avanços mirabolantes.
Só para citar um dos exemplos mais imperiais, a esperança de vida (dum modo geral da espécie humana, mas sobretudo nos países mais industrializados) aumentou extraordinariamente. As estatísticas revelam-no. É um argumento contundente. Prostra qualquer um, desarma o mais céptico dos filósofos.
Isto, claro está, se camuflarmos um pequenino detalhe, uma insignificante bagatela:
É que a esperança de vida do planeta também tem diminuído ainda mais extraordinariamente. Numa proporção diametralmente oposta, senão mesmo uniformemente acelerada.
Já não falando, claro está, naqueles engraçadíssimos anexos que têm vindo a reboque da tão proclamada esperança de vida:
- A esperança de contrair cancro
- A esperança de contrair SIDA
- A esperança de ter filhos impotentes (onanistas ou gays)
- A esperança de corrupção
- A esperança de ser obeso
- A esperança de morrer estupidamente na estrada
- A esperança de desemprego
- A esperança de explodir à bomba
- A esperança de depressão
- A esperança de inaugurar uma síndrome de nome esquisitíssimo
- A esperança de ser cada vez mais estúpido
- A esperança de ser uma mix (mais um termo moderno, directamente importado dos disc-jockey, os verdadeiros filósofos da Nova ordem) de robot e formiguinha
- A esperança de abortar
- A esperança de desesperar
- A esperança de ser toxicodepente (álcool, tabaco, drogas, fármacos, televisão, enfim, o leque de escolha é variado)
- A esperança de não ter água potável
- A esperança de respirar dióxido de carbono
Etc, etc, etc

Realmente, a esperança de vida tem aumentado. Convinha é que, em arrepiante paralelo, a qualidade de vida não diminuísse.
Ou dito de outra maneira: quanto mais longe chega o caminho, mais minas e armadilhas disseminam nele.

Afinal, sem as máscaras da propaganda triunfante, o que é que tem mesmo aumentado: a esperança de vida?...Ou a esperança de morte?
Que é feito das máquinas que nos iam libertar? E da ciência que nos daria o Céu?

Tópicos para uso do pessoal doméstico

I

- Porquê o "Sim"?
- Porque sim.
- Porquê o "Não"?
- Porque não.

II

- Porque não a Europa?
- Porque sim a América.
- Porque não a América?
- Porque sim a Europa.

III

- Porquê a Direita?
- Porque odeio a Esquerda!
- Porquê a Esquerda?
- Porque odeio a Direita!

Como vêem, é simples.

sábado, maio 28, 2005

A sangue frio

Filhos da campa-berço
a caminho da masmorra ginásio
Olhos virados do avesso
sistema de rega por naufrágio;
Bar-restaurante de venenos
a dentadura-bisturi
O feto-camisa de Vénus
máquinas de suplício ao Ralenti...

Um açougue-infantário
um antropófago com ténia,
A máquina da Felicidade ao contrário
academia de carrascos em vénia;
Agrilhoado à morgue-escola
um cadáver repetente,
Um oceano de coca-cola
um esgoto presidente...

Três caixões ortopédicos
um suicídio por contrato,
mil conselhos médicos
sobre a autópsia-parto;
Uma retrete-manjedoura
um esqueleto de bikini,
burocratas em salmoura
vermes com pedigree...

Um trono-patíbulo
um cancro benigno,
capelas de prostíbulo
um genocídio por signo;
Um cemitério climatizado
universidades da putrefacção,
um eunuco apaixonado
chatos de elite e estimação...

Uma hóstia-supositório
mumias com nervos em franja,
Férias pagas no purgatório
arsénico com sabor a laranja;
O homem autónomo perfeito
parafusos, cabos e canos
uma bomba eléctrica no peito
a boca fundida ao ânus.

Répteis de sangue quente
A puta que Deus não pariu...
Um deserto de gente
A realidade a sangue frio.

sexta-feira, maio 27, 2005

O último avatar de Homero



«Se fosse cá podia divertir-se, o Proletvich! Ainda por cá temos umas distracçõezitas, umas malandrices clandestinas, uns prazeres, vá lá! Nem o próprio explorado a 600 por 100 dispensa as suas rambóias!... Como ele gosta de se raspar do emprego e com um smoking novo (de aluguer) brincar aos milionários whisky! deliciar-se com um cinema! É burguês até à medula! tem o gosto dos falsos valores. É macaco. É corrupto... É mandrião até à alma... Só gosta do que for caro! ou então o que tiver esse ar! Venera a força! Despreza o fraco! É petulante, é vaidoso! está sempre ao lado da "batota"! Visual acima de tudo, o que interessa é dar nas vistas! Voa para o néon como a mosca. Não resiste. É todo pechisbeque. Pára automaticamente quando chega ao pé do que poderia torná-lo feliz, afável. Sofre, mutila-se, sangra, rebenta e não aprende nada. Falta-lhe o sentido orgânico. Foge-lhe, teme-o, torna a vida cada vez mais amarga. Precipita-se para a morte sob os açoites da matéria, nunca suficientes... O mais maroto, o mais cruel, o que leva a melhor neste jogo consegue quando muito apoderar-se de mais armas para matar ainda mais e se matar. Assim, sem limite, sem fim, estão os dados lançados! O jogo está decidido! está ganho!...(...)
Deixa-se de ser tratante sob a acção de uma catástrofe. Quando tudo torna ao normal, a natureza retorna logo ao que era.»
- Céline, "Mea Culpa"
A 27 de Maio de 1894, nascia aquele que viria a escrever a "Odisseia" do século XX -"Viagem ao Fim da Noite", de seu título: Luis Ferdinand-August Destouches (aliás, Céline).
Escarro potente e bem temperado da Arte no rosto da academia e nos impotentes, rasteiros e eunucos de todas as épocas, é daquelas obras, como o "Quixote", "Os Demónios" ou "Guliver", que valem por uma literatura.
É daqueles momentos em que percebemos que, afinal, e apesar de toda a porcaria em que porfiam de encobri-la, sempre existe no Homem, profundamente impressa, a marca de Deus.

Os otários que paguem a crise. É para isso que eles existem.


Estou de acordo: "Os ricos não devem pagar a crise".
Em primeiro lugar, porque os ricos são o esteio da sociedade e do mundo. Se acabássemos com os ricos, para que farol guia olhariam os pobres, bem como os remediados e os quase nababos? Ficariam às escuras, pois claro, sem saberem para onde se dirigir nem que paradigma imitar. Naufragariam irremediavelmente de encontro aos escolhos, traiçoeiros e pontiagudos, da existência.
Nenhuma sociedade funciona sem um regime, e nenhum regime se aguenta sem paradigmas orientadores. Depois de inúmeras peripécias que seria fastidioso enumerar, o mundo ocidental arfa sob os primores duma plutocracia vigorosa. Não adianta fazer grandes ginásticas mentais à procura de mundos alternativos; é assim. A História, à boa maneira hegeliana, porta-voz do "Espírito", determinou-o.
Por conseguinte, sendo uma plutocracia, tem nos ricos o vértice da pirâmide – tal qual como se fosse uma monarquia, teria no rei; ou, uma teocracia, encontraria em Deus. Ora, se retirarmos o rei à monarquia, ou o Deus à teocracia, lá ruem ambas, a monarquia e a teocracia, sem apelo nem agravo. O mesmo acontece se retirarmos os ricos à plutocracia. Resulta no caos, na anarquia, desatam-se todos a comer uns aos outros. Descamba o carrossel numa depredação intraespecífica sem regras, bestialmente destrutiva e causadora dos piores atropelos e sevícias à ordem pública e não só.
Assim, tal qual vamos, há uma ordem: os ricos comem todos os outros; os pobres são comidos por todos os outros; entre os ricos e os pobres existem uns terceiros que comem e são comidos. Se não é o melhor dos mundos, anda lá próximo. É como na selva: há um equilíbrio natural, racional, que visa a perpetuação do sistema ecológico. Têm que existir poucos ricos e muitos pobres, da mesma forma que devem existir poucos lobos para muitas ovelhas. Se existissem muitos lobos para poucas ovelhas, os lobos exterminariam as ovelhas e, depois, definhariam até à inanição por falta de alimento. A não ser, claro está, que os lobos mais fortes despromovessem os mais fracos a ovelhas e desatassem a pitar neles. Em todo o caso, isso não passaria duma solução de emergência e apenas adiaria o colapso inevitável do sistema.
Portanto, sendo os ricos o que de mais precioso tem o regime, convém preservá-los e protegê-los de todos e quaisquer percalços. Ora, um rico não é rico porque paga crises ou o que quer que seja. Pelo contrário, é rico porque lhe pagam inúmeras coisas: é rico porque recebe. Viaja isento, à borliu.
Também, ao contrário do que se pensa, o rico não é rico porque investe o que quer que seja: é rico porque acumula. Se o rico gastasse o seu precioso dinheiro –a sua essência, e substância inefável do sistema -, em negócios e fabriquetas, corria o risco de ficar pobre. Ora, esse é um risco que nenhum rico que se preze pode correr.
É claro que o pobre, e especialmente o pobre de espírito, cisma que assim é. Isso, porém, não nos deve surpreender: É conveniente ao sistema e ao rico que ele assim pense. Tratam até, ambos, de mimar-lhe essa imbecil convicção, de mantê-lo nessa ilusão mentecapta. Mas, na verdade, o rico apenas se dedica a multiplicar o seu dinheiro, velando, desse modo, pela própria saúde do regime e pelo equilíbrio do ecossistema.
Quer dizer, o rico nunca investe o "seu" dinheiro. Investe, isso sim, o dinheiro que o banco lhe confia para investir. O "seu" dinheiro significa apenas"crédito" junto da banca, funciona como uma espécie de brevet para "piloto de capitais". Porque o rico é essencialmente isso, um piloto de capitais, que se faz pagar a peso de ouro pela crematonáutica que exerce. O "seu" dinheiro é apenas aquilo que antes da operação a garante e que, terminada a mesma, resultará ampliado. A função do rico é tornar-se cada vez mais rico. O ser rico, bem mais que um estatuto, é uma dinâmica: cega, obsessiva, inexorável.
Então, com que dinheiro investe o rico? – Com o dinheiro dos outros, é evidente; precisamente aquele que a banca extrai à grande maioria.
E o que é uma "crise"? – É uma época de desequilíbrio financeiro, em que, por um lado o Estado através de impostos e taxas, e por outro a banca e seus associados, através de "empréstimos" (que mais não são que formas encapotadas de cobrar "taxas" e "impostos" muito acima dos do próprio Estado), deixaram ou ameaçam deixar a grande parte da população na penúria, senão mesmo à beira do colapso enquanto sociedade.
Se o dinheiro deixa de circular com a quantidade necessária a manter um fluxo de oxigenação saudável do sistema, isso só pode significar hemorragia algures.
Quando, em plena crise, a banca apresenta lucros fabulosos, isso significa que esse dinheiro foi sacado à população e entregue nas mãos dos tais "pilotos". O que estes fizeram, obedecendo à sua lógica intrínseca, foi ir investi-lo noutras paragens mais rentáveis. O objectivo do investimento não é criar postos de trabalho: esse é o simples meio. A finalidade é multiplicar o capital inicial. O resto é supérfluo e, em bom rigor, descartável, logo que a finalidade esteja alcançada.
Entretanto, o país de regresso à sua penúria tradicional, do ponto de vista dos ricos e seus acólitos, é positivo: quer dizer que o país, de volta ao terceiro mundo e à realidade, está a transformar-se num país mais competitivo, com mão de obra mais barata e menos esquisita. Para os pobres, os verdadeiros, também não faz grande diferença: abaixo de pobres não passam, e já estão habituados. Concentram-se no futebol, na pinga e lá vão. Os únicos que, de facto, têm motivos para se preocupar seriamente são aquela classe heteróclita e intermediária – daqueles que vivem digladiados entre a angústia de regredirem a pobres e a ilusão de, num golpe de asa, ou por qualquer súbita lotaria do destino, ascenderem a ricos. Esses, temo-o bem, vão ter que sacrificar-se, mais uma vez, pela competitividade do país. É, aliás, urgente que desçam do seu pedestal provisório e se compenetrem dos seus deveres atávicos. São para isso, de resto, que, ciclica e vaporosamente, são criados.
E dado que os pobres não pagam porque não têm com quê, e os ricos também não, por inerência de função e prerrogativa sistémica, resta-lhes a eles, os tais intermédios (ou otários, se preferirem), como lhes compete, chegarem-se à frente. Está na hora de devolverem a sua "riqueza emprestada", o seu "estatuto a prazo"; de se apearem do troleibus da ficção e retomarem o seu lugarzinho na horda chã, em fila de espera para o próximo transporte até à crise seguinte.
Não sei se campeia a justiça neste mundo. Duvido. Mas que reina uma certa ironia, disso não restam dúvidas.

quinta-feira, maio 26, 2005

Debaixo duma pedra há um...



Lá fui, alegremente, contemplar a tal petição que a Lolita, em serviço público, referiu.
Ao chegar à segunda página, já uma bela ideia me começava a titilar os neurónios... Nada mais nada menos que virar-me para a senhora Dragão e comunicar-lhe: "Olha, concorre!, em quantidade de nomes já ganhaste; e com dois "de" na graça, não deve haver quem te bata!..."
Mas depois, a páginas tantas, dei com uma tal Graça Maria do Monte-Pegado de Sa Coutinho de Sousa Pinto, puta que a pariu, e desisti.

É um cabrão dum país, este, atolado em "pergaminhos higiénicos". De folha dupla. Extra suaves. E absorventes.

quarta-feira, maio 25, 2005

Altermanias

Vivemos um tempo de ataque cerrado à auto-estima das pessoas. Se por um lado se lhes insufla o ego de vento, num simulacro de rã em ascensão a boi, por outro, é um gaz deletério e corrosivo que só as emprenha de angústias, dúvidas e hipocondrias existenciais. A máquina da extracção da auto-estima, opera, ao mesmo tempo, na injecção de dependência, de vassalagem cega e desmedida à hetero-estima. As pessoas -categoria cada vez mais obsoleta-, são manipuladas (ou melhor dizendo, pedopuladas) como uva em lagar de mixordeiros, de marteleiros desenfreados. O resultado é uma vasta cadeia de montagem de imbecis, de gentinha débil-emocional, que se arrasta e repta num constante: "por favor gostem de nós". Mimadas até ao vómito, são desossadas de toda e qualquer autonomia, depiladas de genuíno critério ou gosto, esterilizadas e lobotomizadas metodicamente até uma espécie de tetraplegia mental.
Mais que um qualquer modo de afirmação, o seu exibicionismo obsceno - outras vezes simulado, protocolar, mas sempre emulador dum alterpadrão público -, resume-se a uma sórdida súplica, um enerve requerimento de adesão a uma qualquer manada preponderante.
É toda uma imensidão de hiper-egos pardoxalmente junkies dos outros, do número, da manada. É uma espécie de massa levedante, que quanto mais exorbita mais se agrega e empastela. Pastam e, ao mesmo tempo, vigiam-se, controlam-se, perseguem-se. Levantam a cabeça apenas o suficiente para espreitar o grosso da manada, para avaliar do fluxo dominante, das áreas de maior aglomeração. Se é superlotado é bom; se está enxameado de peregrinos, então é por aí certamente o caminho. O lema estrutural resume-se a "sou o que os outros acham", "sou por sufrágio universal", "candidato-me, propagandeio-me, sufrago-me em cada instante", "aconchego-me". No fundo, vão na enxurrada humana, não tanto para onde escolhem, mas para onde a multidão irracional, a chicote de um qualquer inefável piloto, os empurra. E atrai.
Entretanto, esse irresistível vórtice magnético que são os outros tem doravante um nome, um nome que impera sobre todos: Opinião Pública. É a estrela guia e o astro radioso que ilumina.
É a suposta "opinião de todos", a "opinião universal", no mínimo, a "opinião dos outros".
E quem são esses que os teleguiam?
São os mesmos que estipulam aquilo que é gostável e desgostável, aquilo que é estimável ou execrável. Curiosamente, os mesmos que lhes amputam a alma e lhes implantam, em forma de prótese indispensável, género cadeira de rodas espiritual, uma sórdida maquinazinha defecante, palradora, onanogâmica e hetero-dependente.
Convertidas a um quase vegetal merdificante e palrador, incontinente e mirrado, absolutamente submisso ao cuidado e à vigilância alheia, ambulam, quais espantalhos grotescos, à mercê de estímulos e próteses que os transportam e que, providencialmente, sempre providencialmente, como soro através de tubo, ou realidade através de écran, lhes fornecem.

segunda-feira, maio 23, 2005

A Balada da Plebe

É claro que eu não podia deixar de me juntar ao clima festivo que agita a nação Papoila. Ainda para mais sendo dois dos meus melhores amigos -o Caguinchas e o Dinossauro-, Benfiquistas de gema, talibãs luminosos, acólitos da "Catedral".
Dedicado a todas as "papoilas Saltitantes" e a esses meus amigalhaços em particular, aqui fica:

Balada da Plebe

Batem latas, toinamente
Armam basqueiro e chinfrim
Será fauna, será gente
Gente não é certamente
Tem cascos quem zurra assim.

É talvez a chungaria;
Mas ainda há pouco, há poucochinho
Nem um cabrão destes bulia
Na quieta monotonia
De chocar ovos no ninho.

Quem zurra assim, alarvemente
Num tal destempero da glote?
Que mal se ouve, mal se sente
Instaura uma vontade na gente
De regar chusma a zagalote!

Fui ver. Era Vitória, a Prostituta.
E Milhares delas, Deus meu!
Papoilas saltitantes em catadupa,
Não sobrou artéria enxuta
Choveram dum menstruado céu!

Olho-as através da vidraça
Que plantas vis, que focinhos!
Autorizou Deus esta desgraça
Encheu-se de lixo a praça
A gloriar onze aleijadinhos!

Fico olhando esses vegetais
uma palha toda aos pinotes;
Filhos de incógnitos pais
e da Vitória são mais que mais,
entre anões vesgos e alcagotes.

E ceguinhos, de negro vestidos,
Chilreiam ao longe rouxinóis
do apito, pobres vendidos.
E juízes da liga, fiéis amigos
Com bandeirinhas e cachecóis.

Quem já é perdedor
Que sofra tormentos, enfim!
Mas estas papoilas, Senhor...
Porque deferes tamanho horror?
Vão cagar cães neste jardim!

Em terra de tretas, não foi surpresa.
Resta, profunda, a convicção...
Para o ano vai ser uma beleza:
Para as Paraolimpíadas, com certeza,
Já temos o Paracampeão.


Agora digam lá que eu não sou um bom desportista?!...

PS: E com esta, ó Caguinchas, ficamos quites.

domingo, maio 22, 2005

O Sítio do "Foda-se!"


Emocionado com o surto de patriotismo abrupto que grassa na paróquia, dei comigo incendiado de projectos e ideias, cada qual mais deslumbrante que a anterior.
Em primeiro lugar, e assim de chofre, ocorreu-me, vejam lá bem, organizar o "Sítio do Bardamerda!": Bardamerda, o sim! Bardamerda os nãos do BE e do PCP! E bardamerda também o "Não alternativo" (ou será "alternadeiro") do Pacheco arrependido. Bardamerda ainda a Europa, os Estados Unidos, a China e o Burkina Fasso! Bardamerda igualmente as Ilhas Fidgi. Puta que as pariu!...
Mas como as pessoas iriam dizer :"Lá está o ferrabrás do Dragão a incinerar a torto e a direiro, raios o partam!", e como eu me preocupo muito com o que as pessoas pensam, e com o que as pessoas dizem, e com o que as pessoas comentam, decidi, a bem da nação, não organizar um sítio desses. Cruzes credo, valha-nos Deus! Benzamo-nos. Nosso Senhor vos abençoe, Ilhas Fidji!...Que Santa Quitéria te proteja, Burkina Fasso!...
Ultrapassado este inicial e destrambelhado ímpeto, preparei-me para a segunda vaga. Para grande regalo meu, esta não tardou: em menos de nada, dei comigo a congeminar e rusgar patrocínio para o "Sítio do Foda-se!" Rica ideia, pensei: O "Sítio do Foda-se!" deve dar um jeitão do carulho. O "Sítio do Foda-se!"- que consolo para o indígena!- se não é o paraíso, anda lá perto. A malta, com um sítio destes, até vai reconsiderar na mania de torrar divisas na estranja: atraca-se nele, no "Sítio do Foda-se"(abençoadinho!), como numa daquelas roulotes de beira de estrada, e nunca mais de lá sai.
Inebriado com tamanho desarrincanço, entreguei-me ao requinte de imaginar até uma frota de varinas, com giga cor de bandeira à cabeça, a apregoarem, à boa moda antiga, por toda a cidade (Alfama, Graça e Mouraria, entenda-se; que o resto é paisagem):« "Olha o "sítio do Foda-se!" Olha, a fava rica! Olha, o rajá fresquinho! Olha o "Sítio do Foda-se!"»
E as matronas, a mascar tremoço, das janelas, debruçando as abundantes tetas, inquiriam:
-"É fresco, o "Sítio do Foda-se!"?...
-"Se é fresco, freguesa?! – esganiçavam-se as peixeiras. – Mais fresquinho não há, ó santa! Foi acabadinho de pescar ali no Trancão!"
Flanava eu neste admirável idílio e quem é que me entra pela cabeça adentro, vindo lá dos esconsos da memória, a dar de pé-coxinho na trotinete da mesma: o cidadão português, nem mais. O próprio, esse cabrão mesmo. Retinto e escarrado, como não há outro. E em que propósitos bizarramente adicionais se me exibia o tratante? Passo a enumerar:
1.Embasbacado diante do telejornal e da bocarra descomunal da Moura Guedes (a chamada abertura pluribroche), que brama ele? - "Foda-se!", nem mais.
2.Diante do quiosque da jornais, mirando as parangonas, em despique com a pornografia (passe a redundância), que proclamação emite? – "Foda-se!", de novo.
3.Escutanto as habilidades do governo recém-eleito, seja ele qual for, que sumo deita? –"Foda-se!", outra vez.
4.Defronte do filho adolescente, trespassado de ferragens, enfiado num saco de batatas a fazer de calças, curtindo um ruído desfolhante qualquer, que comentário lhe ocorre? – "Foda-se!", ainda e sempre.
Pois é, onde quer que pare, que interrompa momentaneamente o estado de mineral obtuso em que cristaliza, e se entregue, por breve lapso, à contemplação do rilhafoles em que rabia, a sua linguagem, três mil anos de civilização, sintetizam-se, embrulham-se, escoam-se pelo ralo dessa imprecação reflexiva: "Foda-se!" Ou quando muito: "Foda-se e refoda-se!", ou seja, reflexiva e reforçada.
"Foda-se!, não me contive também eu, locupletado de frenesim tribal e brio patriótico, de exclamar. "Este meu "Sítio do Foda-se!" seria uma puta duma redundância! Portugal, diabos o levem, já é um sítio do foda-se de pleno direito e feição. Direi mais: Existisse uma Organização das Nações Unidas do "Foda-se!" e Portugal teria assento permanente no Conselho de Segurança, com prerrogativa exclusiva de veto e presidência vitalícia. Ou por outras palavras: No planeta "Foda-se!", Portugal é a super-potência hegemónica. Somos uma espécie de Estados Unidos do "Foda-se!". E dedicamo-nos, com devoção única, à cruzada benfeitora de, à bomba se necessário for, instaurar o regime do "Foda-se!" em toda a parte. Quer dizer, torna-se cada vez mais patente: consagramo-nos agora à Expansão do "foda-se!", como noutros eras não menos épicas nos devotávamos, segundo dizem, à Expansão da Fé. Penso que temos fé no "Foda-se!". Pois. Mas, entretanto, percebi que não fazia qualquer sentido criar um sítio que já existe.
Com grande pesar meu, derreteu-se-me a cera onírica das asas e despenhei-me vertiginosamente na realidade. De facto, meus irmãos, o "Foda-se!" está por todo o lado e só não se escuta -com a contundente acrimónia que a sua cavernura exige -, nos locais em que, precisamente, infatigavelmente, se trabalha no burilar de motivos para a sua erupção. Isto é: No âmago de todos aqueles que, delicados, não o proferem, porque, na verdade, estão intensamente compenetrados a criar e multiplicar ensejos para a sua proliferação desenfreada.
Diante de tão elementar constatação, lá tive que me dedicar à pesca de outros empreendimentos. O que vale é que me estruge na cachimónia um mar fértil, rico em plâncton e livre de arrastões espanhóis. Num ápice, com um puxão vigoroso, já eu retirava das águas generosas um belo e luzidio exemplar, um projecto todo garboso não menos digno de sponsorização (que bela palavra moderna!): nada mais nada menos que o "Sítio do Sinão". O "sítio do Sinão" é que é. Viva o Sítio do Sinão! Quer dizer, o sítio do Sim e do Não, conforme nos convenha. Ou seja:
Quando é para meter ao bolso, para receber subsídios, para fartar vilanagem, para andar no laró e na galhofa, no bota-abaixo, não tem nada que saber: dizemos sim. Quando é para trabalhar, para assumir responsabilidades, para prestar contas, para cumprir o prometido, não tem nada que enganar: dizemos não.
Eu já sabia, e o povo também, que existiam os pobres e mal agradecidos. Que, afinal, o provérbio também se aplica às putas, estamos todos a descobri-lo agora.

Aproveito para esclarecer que eu era pelo não aquando da adesão. Pobres mas honrados, sempre pensei e continuo a pensar. Portanto, sobre este assunto a minha moral é a de sempre e continua intacta.
Mas agora, aqueles que vestiram a pátria de mini-saia, que a puserem a mascar pastilha à esquina da viela, que rejubilaram com a clientela ricalhaça em romaria, que celebraram a ascensão ao hotel finaço, que embolsaram as notas do pagamento com volúpia, que se congratularam quando ela se despiu e deitou a jeito, agora, pasme-se, quando só falta o corolário e chegou a hora de, enfim, abrir as pernas, desatam com reclamações e esquisitices!...Pior: argumentam que não querem que a puta case. Sorte da rameira ou azar deles? Dá-lhes cabo do negócio?...
Sim, imagine-se, os chulos da pátria tomaram ares de empresários do pudor! Disfarçam-se de cidadãos moralistas, sentinelas do exército da dignidade e bons costumes!...Agora, que a quenga está gasta e a clientela até dá sinais de começar a perder o interesse...
Ai ele é isso? Então, caros leitores, retiro o que disse: Não é ao "Sítio do Sinão" que vou aderir. É mesmo ao do "foda-se!"
Foda-se!!
Pode não ser o cúmulo da originalidade, pode até ser redundante. Mas alivia.

sábado, maio 21, 2005

Aforismo piedoso

Espectáculo deplorável: o de um homem castrado pelas suas próprias e grandiloquentes certezas.

Espancar, espancar...perdidamente.

As últimas gargalhadas que dei (e olhem que é fenómeno raro e difícil) foram à conta deste senhor gajo. Não faço a mínima ideia de quem é a boa pérfida alma. Mas que tem piada, lá isso tem. Ainda por cima, as coisas quando são espontâneas, inesperadas, têm muito mais valor. Topei-o através dum comentário neste blogue (mais uma menina com miolos [ Mulheres -10 Dragão -0]), e sinceramente, ri-me a bom rir. Até porque, finalmente, a lamechice do poema faz, pela primeira vez, sentido.

(Nota: eu até nem desgostava do soneto por aí além, mas depois que aquele coninhas merdoso do Represas se lembrou de cantarolá-lo naquela vozinha de topo-gigio empertigado, tornou-se-me intragável.)

«ESPANCAR!

Eu quero espancar, espancar perdidamente!
Espancar só por espancar: aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Espancar! Espancar! E não espancar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode espancar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma primavera em cada vida:
É preciso matá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra insultar!

E se um dia hei-de ser pó, cocaína e nada
Que seja a minha noite uma chacina,
Que me saiba perder... pra me espancar... »

Olha, ó Pita, ou Pedro Oliveira, ou Napoleão Bonaparte, ou lá quem és: Vê lá se abres um blog. Eu, pelo menos, garanto-te, vou lê-lo com toda a atenção.

Update: Primeira forma; afinal, o gajo até tem um blogue. É aqui.

Azimute Inverso


Ando há que tempos a pensar numa coisa especial, para dizer a uma donzela muito especial que foi uma das principais responsáveis por este blogue não ter encerrado as suas portas aqui há uns meses atrás. Três quartos da blogocoisa já estão a odiá-la neste momento, mas eu não, eu devoto-lhe uma paixão especial, única, inoxidável. Daquelas só possíveis entre irmãos.

Para já, finjo que não li, que não sei, que não aconteceu nada. Se isto não resultar, se ela não voltar entretanto, vou ter que recorrer a grandes remédios. Para grandes males...

sexta-feira, maio 20, 2005

Puericultura com todos

O Dragoscópio e o seu anacoreta residente têm a honra de apresentar, em primeiríssima mão, para todo o blogúrbio e arredores, a "Nova cartilha de João de Deus", futura sebenta das nossas escolas primárias e respectivas instituições prévias.
Atentemos numa breve passagem de tão transcendente obra, para aquilatarmos, em subtil relance, dos suculentos primores e guloseimas espirituais que aguardam os pequerruchos...



«Eugénia, (palpando os testículos de Dolmancé) -Oh!, minha boa amiga, como me irrita a resistência que opões aos meus desejos!...E estas bolas, para que servem, e como lhes chamam?

Senhora de Saint-Ange - O termo técnico é colhões...artísticamente, denominam-se testículos. Estas bolas encerram o reservatório da semente profícua de que te falei, e cuja ejaculação na matriz da mulher produz a espécie humana; mas deter-nos-emos pouco nestes pormenores, Eugénia, mais dependentes da medicina que da libertinagem. Uma rapariga bonita só deve preocupar-se em foder, nunca em engendrar. Deixemos tudo quanto se relaciona com o insípido mecanismo da população, e detenhamo-nos principal e unicamente nas voluptuosidades libertinas, cujo intento não é, de modo algum, povoador.

Eugénia - Mas, querida amiga, quando este membro enorme, que mal cabe na minha mão, penetra, pois que me asseguras que o pode fazer, num buraco tão pequeno como o do teu traseiro, isso deve provocar uma dor muito grande à mulher.

Senhora de Saint-Ange - Faça-se a introdução pela frente, ou por detrás, quando uma mulher ainda não está acostumada, experimenta sempre dor. Quis a natureza que só atingissemos a felicidade através de sofrimentos; mas, uma vez vencida, nada pode dar prazeres mais intensos, e aquilo que se experimenta quando este membro se introduz nos nossos cus é incontestávelmente preferível ao que resulta dessa mesma introdução, pela frente. Além disso, quantos perigos não são, deste modo, evitados à mulher? A sua saúde corre menos riscos e não há o menor perigo de gravidez. Não me alongo acerca desta voluptuosidade; o nosso mestre, Eugénia, analisá-la-á em breve amplamente e, juntando a prática à teoria, convencer-te-á, espero, minha muito querida, de que, de todos os prazeres de gozo, é aquele que deves preferir.

Dolmancé - Peço-vos, senhora, que não tardeis as vossas demonstrações; não posso suportar mais; vir-me-ei, ainda que o não queira, e este membro temível, reduzido a nada, deixará de ter utilidade para as vossas lições. (...)»

- Marquês de Sade, "A Filosofia na Alcova"

Convenhamos: se o desígnio nacional, na formação das novas gerações, é -por atacado- treinar putas e larilas, ou onanistas a duas ou quatro mãos, então, já que é a pornosofia que nos norteia, ao menos sejamos originais, bebamos nas fontes, abandalhemo-nos à grande e à francesa (o que neste caso até se aplica literalmente).
De facto, repito e reforço, se o intuito é perverter e conspurcar as criancinhas, se, pelos vistos, isso deveio imperativo categórico, não percamos tempo com réplicas sonsas e liofilizadas, frangos de aviário da sexologia, como o dengoso e murcho Doutor Vaz. Não; em vez destes palradores de alcova, desses micro-escafandristas do grelo, peregrinemos os verdadeiros "santuários", os baluartes imorredouros da sexopatia. É que, quer queiramos quer não, há toda uma diferença entre a sexopatia e a sexorreia.
Os petizes, não duvidem, hão-de persuadir-se na mesma que dar o cu ou o pito será a coisa mais imperiosa desta vida. Mas ao menos, com o Divino Marquês, aprendem a falar um português (assim a tradução o permita) de eleição. Dessa singular forma, ao menos, não se perde tudo: salva-se a gramática e com ela, se bem que ao preço de cunnilingus, annilingus e felatios em catadupa, também a Língua.

Tudo isto, claro está, nunca esquecendo que, assim como noutros tempos, mais obscuros, a educação tinha por propósito habilitar o juvenil para o mundo e a vida, agora, todos sabemos, compete-lhe pré-lavá-lo e desossá-lo para a televisão. Ou vice-versa.

Aliás, num país com obscenidades tão ubíquas como o futebol e a TV, outras tão nauseabundas como a política, e diversas tão pregnantes como a literatura-light e a música pimba, já era altura dos infantários e jardins de infância se adaptarem aos admiráveis tempos novos. Quem já deu novos mundos ao mundo, pode perfeitamente dar também o cu ou a racha. Somos um povo benemérito.

Quanto à prometida educação visual, o livro de pintar recomendado pelos psicólogos do Ministério, replecto de figurinhas para colorir... falarei no Kama Sutra numa próxima oportunidade.

quarta-feira, maio 18, 2005

Zazie em grande estilo

«E sabem que mais. O grande mal não é uma sociedade de gente com coluna vertebral bem forte e espírito aguerrido. É uma sociedade de frouxos que anseia por uma imagem de poder e de heroísmo que já não conhece. Os ideais torcionários sempre se venderam aos pobres e miseráveis e às massas embrutecidas que desejam a glória colectiva por não serem capazes de se bastar na coragem individual

Esta rapariga, claramente, anda em más companhias... Eu estimo-a muito e folgo ainda mais sempre que a vejo pelejar a esmo. Está visto: Têm que ser as mulheres a pegar em armas. Porque os "homens", ébrios de sensibilidade, andam muito ocupados com a lide da casa: a passar a história a ferro, a tricotar argumentos, a estrelar falácias, ou a fazer o inventário das mercearias. Isto, enquanto não aspiram a economia e limpam o pó às pratas e ao entendimento. Ou correm ao cabeleireiro, a cuidar da trunfa e das unhas. Se bem que em muitos casos, dado o vigor e a exuberância da copa, mais indicado fosse, em vez do coiffeur, um jardineiro - um intrépido e valente podador de sebes, pois claro.

Tem só uma coisa, ó Zazie: a nossa degradação turbo-moderna vai ainda mais fundo que isso. Nem sequer é já uma "sociedade de frouxos que anseia por uma imagem de poder e de heróismo que já não conhece": limita-se a uma récua de gastrópodes espumejantes, de casinha às costas, que se contenta com a gamela, a digestãozinha espiritual fácil, e odeia visceralmente tudo o que lhes cheire -já não digo a heróico - mas a vértebra ou resquício dela. Se há coisa que o pensamento rastejante não suporta é ver ainda alguém de pé.

Tudo isto, vá-se lá saber porquê, traz-me à memória um bêbado lendário e empedernido, freguês habitual e fanatizado lá na tasca do Armindo (o Caguinchas e a malta estão aí e não me deixam mentir). Viciado convicto em vinho a martelo, o tal seca-adegas, nutria uma devoção tal pela mixórdia que, conforme diz o povo, por um copo três até era capaz de dar o cu e oito tostões. Certa ocasião, caí eu na asneira de lhe oferecer um copo de pinga a sério (um "Colares Reserva", se bem me lembro; tinto). À primeira golada do precioso néctar, para minha grande perplexidade, rompe o gajo num tremendo vómito, no seguimento do qual golfa o líquido no chão e brada, indignado: "Foda-se, Dragão, zurrapa desta vai mas é dá-la ao teu pai! Ca ganda merda! Queres-me envenenar, ou quê?!!..."

Aquele cavalheiro que desaconselhou o desperdício de pérolas com porcos era um tipo sábio.

terça-feira, maio 17, 2005

Medidas Draconianas - I. O Deficídio

Passo a expor as medidas draconianas que urgem para este país. Se virdes por aí outras que não estas, berrai, protestai, queixai-vos à DECO: são pechisbeque, fancaria, contrafacção. Estão-vos a vender gato por lebre.



O português actual, verdadeiro calhau com olhos na sua grande maioria, quer lá saber da pátria, da cultura, do futuro, do passado, dos netos e da própria decência. Muito menos do défice. Peçam-lhe sacrifícios pela nação que ele, esfalfado de tanto proxeneta à bica dela, puxa logo dum valente manguito, cospe vários impropérios e desata num basqueiro de varina assanhada que só visto.
Agora, então, que o Benfica está quase campeão e o estio se aproxima, a grandessíssima besta, atarefada com os preparativos para as celebrações do título e as viagens às Caraíbas, Brasil ou Maldivas, está-se bem pouco maribando para o défice. Até porque, repito, já deita o défice, e conversas do défice, e ficções do défice pelos cabelos. E com razão, convenhamos.
Pois bem, se o que querem mesmo é acabar com ele, com essa abominação que não nos larga, com essa hidra medonha, a solução é simples. Atente-se:
Já sabemos que o Estado, dado o estado deplorável a que chegou, não é grande coisa no que toca a esmifrar o cidadão. Na verdade, a relação é complexa: não só o Estado não esmifra como devia o cidadão, ou seja, com alguma justiça, como, para espanto da galáxia, é ele, Estado, que se vê, não raras vezes, despudoradamente espoliado pelo tal cujo. Aliás, por sortilégio democrático, o Estado tem vindo a descambar num mero subterfúgio para uma certa classe de cidadãos viverem às expensas dos outros. Em suma: Tirando uns desgraçados e otários sem amigos na copa, ninguém paga impostos de jeito. Ou melhor dizendo: quanto mais deveriam pagar, menos pagam. O lema cínico do costume devém imperativo e princípio constitucional da república: "os pobres que paguem; são muitos e já estão habituados". Contudo, mesmo os pobres, esses beneméritos, já estão a ficar manhosos e, instruídos no exemplo alheio, começam também a eximir-se aos seus deveres, a desmazelar os seus encargos. Manifestam até má vontade, imagine-se; murmuram, rosnam, interferem com as sondagens. De facto, lá do alto até cá baixo, existe um consenso general: o país que se foda! Primeiro a casa, depois o carro, depois os telemóveis, depois as Caraíbas e depois, depois logo se vê.
Conclusão: com o Estado não vamos lá.
Então vamos como?
Com uma medida draconiana autêntica, genuína, de sucesso garantido, nem mais.
Repare-se: da mesma forma que não se sente minimamente vocacionado ao sacrifício pela pátria, pelo estado, pelo país, enfim, pelo que lhe queiram chamar, o matumbo do português está sempre, em contrapartida, numa ânsia e predisposição permanente, fervorosa, compulsiva de fazer sacrifícios pela Banca. Contra o Estado vocifera, mas contra a Banca nem um lamento. É a sua nova divindade inexorável, a Moira grega recauchutada. Aceita-lhe tudo: a fome, a humilhação, a escravatura e ainda agradece, ainda desfila todo inchado e vaidoso com as coisas que o Banco lhe aluga a preços dignos de pretos alforriados em loja de fazenda.
Portanto, para resolver o défice é muito simples: Liberalizam-se, desembaraçam-se completamente as mandíbulas e garras da banca. Que exerçam a seu bel-prazer. Traduzindo por miúdos: a Banca pode cobrar os juros que quiser e infestar- bem como armadilhar- os contratos com as letrinhas pequeninas todas que lhe der na real gana. Cláusulas omissas e cláusulas secretas, inefáveis, subentendidas, é à descrição. Assim mesmo. À bruta. À maneira da selva. À lagardére.
Acabemos, pois, com o faz que anda mas não anda, faz que cobra mas não cobra. A Banca, vampira queridíssima, ai Jesus dos meninos, que se entenda com os cidadãos, com os clientes, com esta choldra toda. Que lhes saque e sugue até ao tutano. Que os espolie até ao último cêntimo. Que os lobotomize e anestesie com publicidade onírica e paraísos artificias ao domicílio. Mais ainda do que já faz. À canzana! Hão-de pagar e andar felizes e contentes, ronronando e dando marradinhas nas sondagens. Todos ufanos e arruinados. Grávidos de sonho e volúpia consumista.
O Estado, calmamente, lá do alto, só tem que taxar a Banca. 60% sobre os lucros. Na ponta da espingarda, se for preciso. Vai ser um tesouro fabuloso, uma pujança financeira de fazer os luxamburgueses corar de inveja: Paga o défice, paga a horda residente na Função Pública e ainda sobram uns trocados para concluir aquele assuntozinho pendente desde a batalha de Toro.
Duarte de Almeida XX
aliás, Dragão

segunda-feira, maio 16, 2005

Exorcismo às trevas




O Problema de Portugal
não é falta de inteligência:
é, sim, a parvoíce ufana
diplomada, trolha, sacana
albardada de ciência.

O Problema de Portugal
não é a falta de herança:
é, sim, o vácuo promovido
a espírito santo de ouvido
a asno de Sancho Pança!

O problema de Portugal
não é falta de inspiração:
é, sim, a indistinta massa
que imita, bajula, grassa
esgoto d'ova em ovação.

O Problema de Portugal
não é a falta de Talento:
é, sim, a bosta que leveda
fermenta, incha, cega
e quase eclipsa o firmamento.

Repetir três vezes, antes de adormecer, para exorcizar espectros, avantesmas e aleijões mentais que possuem e assombram este país. Esses mesmo que aviltam, que degeneram uma pátria de sonhadores numa Quinta das Celebridades de pesadelo - um chiqueiro orwelliano, onde os comensais refocilantes se geminam e lambuzam: todos diferentes e todos iguais.

O Não-Burguês


O contrário do burguês, nada de confusões, não é o operário, o camponês, o insecto urbano. Esse, nos dias que correm, e nos que já correram também, não passa, na maior parte dos casos, dum burguês embrionário, em gestação, em fila de espera, à cata de boleia ou oportunidade. A sua grande fantasia existencial é que, senão ele, pelo menos os filhos dele se tornem burgueses. Ou os netos, alguém, enfim, que o represente. Não é um desejo de justiça o que o anima, mas de vingança, de desforra. A fome que o tortura, como dizia Pessoa, não é de pão, mas de sobremesa; não é de vida, mas de luxúria macaca e porcina. Tanto quanto odiar o patrão, odeia-se a si mesmo por não ser patrão. Por não refocilar nos recreios e desfrutes do outro.
Não, o contrário do burguês é bípede, na carne e na alma, de postura erecta, vertebrado, dotado de inteligência mais que de razão, omnívoro de corpo mas não de espírito, com os pés na terra e os olhos no horizonte, coragem mais que cálculo, riso, criança, leão, patíbulo, luz, caminho, ponte, deserto, abismo – espelho e tabuleiro onde o divino se vem espiar.
Nietzsche chamou-lhe "ubermensch". Talvez o mesmo que Cristo, quase dois milénios antes, personificara: o Homem Bem-aventurado. E de Boa Vontade.

domingo, maio 15, 2005

O Concurso de Micro-Contos


Através do caro R, no seu digníssimo blogue (dos não muitos que por aí há) , fiquei a saber dum concurso blogohistérico de micro-contos.
Antes de deixar, também eu, aqui, o meu fulgurante contributo (nada de modéstias, sobretudo nada de modéstias!...), cumpre-me proceder a um breve preâmbulo...
Pois bem, acho que são necessários, imprescindíveis mesmo, um micro-talento, uma micro-inteligência e uma macro-toinice para que alguém, na sua perfeita bacoragem, se lembre dum termo tão cretino quanto "micro-contos". Por que não "contos-gotas"? Até era mais poético... Mas não: Micro-contos. Micro-contos? - Liliputices, micro-gaitas, é o que é. Enfim, dá uma ideia de que a literatura se mede pelo número de palavras ou pelo peso do fascículo. Como se houvesse ficção ou prosa a metro ou ao quilo. Como se a puta da mercearia ou talho de fressuras onde o paizinho leccionava os obsidiasse pela vida fora. Como se quisessem bezuntar o Portugal dos Pequeninos com uma Literatura de anõezinhos. Para se ler à lupa ou ao microscópio. Um empreendimento de homúnculos aquartelados em frascos de drogaria.
Agrava a estapafúrdia paspalhice o facto de lhe associarem um nome digno, mas indefeso, de um escritor que nunca escreveu micro-coisa nenhuma, mas sim grandes páginas, fruto dum grande talento, como foi Mário-Henrique Leiria. Faço ideia dos vómitos com que o infeliz se rebolará na sepultura. Se ainda fosse a Margarida Rebelo Pinto, a Rita Ferro, a Helena Sacadura, o Manuel Goucha, o Luís do bigode não sei quantos Sousa, o João Baião, o Conde Castelo Branco, ainda se compreendia. O que não faltam para aí são génios da treta, da tanga, guias espirituais ao nível, dignos de apadrinharem ou amadrinharem tão microbichosa iniciativa. Mas não, a bosta, para não variar, estima de ir agarrada às solas de alguém, gosta de imaginar que viaja, que ascende, que vai longe...
Se não era muito mais bonito -e honesto!- chamar-se "concurso de Micro-contos Teresa Guilherme"!?...

Em todo o caso, o meu contributo:

Intitula-se:
"Para todos vós, micróbios".

Caguei.

Que vos faça bom proveito!...

-----//------

É suficientemente micro?
Agora, se não me atribuírem o primeiro prémio vou ficar chateado.

Twilight Zone


Nem a economia, nem a política, ou tão pouco a sociologia, conseguem explicar o que se passou neste país nos últimos anos. Dizer que entrou em crise, em recessão, em descrédito, em derrapagem, em autofagia, em pouco ou nada contribui para a serenidade e o esclarecimento do inquiridor. Porque, na verdade, onde tudo indica que Portugal entrou mesmo foi na Twilight Zone.
Não sei a que distância fica o Quinto Império. Mas, pelo menos, à Quinta Dimensão, alegrem-se: já chegámos.

sexta-feira, maio 13, 2005

Para uma Blogorreia com Regras

Investido de atributos divinos só ao alcance dos predestinados, decidi auto-nomear-me fiscal de blogues. É preciso -direi mais: é urgente -, torna-se mesmo imperioso acabar com este estado anárquico de coisas, esta ribaldaria em que mergulhou a blogosfera. Cada qual diz o que lhe apetece, não se respeitam as bichas, nem as filas, não se veneram os veneráveis anciãos, apupam-se as estrelas, desdenha-se das vedetas, especula-se, escrevem-se postes sem cobertura, não se obedece à autoridade, não se cumpre o protocolo e a etiqueta, o crédito anda mal parado, desrespeitam-se as castas, alguns vassalos fazem orelhas de mercador ao clamor dos respectivos suseranos, passageiros de terceira querem viajar em segunda, os da segunda irrompem nas retretes da primeira, os da classe VIP tropeçam em escarros nas suas passadeiras vermelhas, todos querem ser maquinistas, o povo salta para o colo dos ministros, afaga as trunfas e a bunda aos eleitos, os jornalistas são ridicularizados por mentirosos mais frenéticos que eles, vocifera-se, derime-se, tagarela-se, imita-se o parlamento, corrige-se Deus e a Natureza, deixam entrar animais, alguns deles chegando ao ponto de serem imaginários, mitológicos e até, calcule-se, extintos, enfim: um não acabar de liberdades e, pior que isso, familiaridades inauditas.
Assim, para devolver a ordem a este caos babélico e restabelecer a legalidade imprescindível a qualquer sociedade humana não-rilhafolesca, mesmo que virtual, passarão a ficar sujeitos a inspecção pela autoridade competente (neste caso, eu próprio, pelas inexoráveis razões em epígrafe) todos os blogues (e também blogs), que emitem para a via pública, devendo os mesmos apresentar, sem procrastinanços nem tergiversações, a seguinte documentação e equipamento obrigatórios:
  1. Alvará municipal
  2. Garantias bancárias
  3. Declaração do encarregado de educação (se for maior, corresponde ao Presidente de Conselho de Administração da TVI, SIC ou RTP)
  4. Carteira de jornalista (efectivo, frustrado ou anelante)
  5. -Licença de uso e porte de nome
  6. Boletim de vacinas em dia (vacinas contra a raiva, a cólera, a homofobia, a xenofobia, a febre anti-semita e a síndrome de imuno independência adquirida)
  7. Declaração veterinária de pedigree
  8. Vistoria dos bombeiros
  9. Declaração de conformidade com os regulamentos de segurança e higiene no blog
  10. Dentes tratados
  11. Cartão de dador/bebedor de sangue
  12. Cartão de incontinente mental crónico
  13. Coleira com o nome gravado a letras fluorescentes
  14. Ficha de inscrição nas seguintes organizações opcionais: Maçonaria, Opus-Dei, Opus Gay, Abraço, Ilga Portugal, APAV, Deficientes das Forças Armadas, Hospital Júlio de Matos, SLB, FCP, SCP, Liga Protectora dos Anormais, CIA, Bucólicos Anónimos, SOS-Invertebrado, Amigos da Bomba, Escuteiros de Portugal
  15. Pulseira de localização
  16. Fiador
  17. Equipamento regulamentar de manobra em perfeito estado de conservação e operação: espelho, escape respeitando os níveis de emissão de gases opinatórios, cinto de segurança e de castidade, camisa de forças, e preservativo em dia. Níveis de inflamação e radiação do ego não poluidores da atmosfera ou contaminantes do meio ambiente.
  18. Desodorizante
  19. Atestado de masturbador compulsivo do "sitemeter"
  20. Açaime e microship ou chocalho (conforme se trate de animal de guarda ou transumancia.
  • Fica também, e desde já, o sério aviso: Este fiscal não é subornável (quando muito, será apenas um pouco sensível aos encantos femininos...)
  • Alerta-se: A não apresentação, pronta, alegre e bonachã, da documentação e equipamentos acima designados determina a selagem inadiável do blog, acompanhada do respectivo auto de embargo, bem como a incineração imediata do condutor. Ou vice-versa, para os que preferirem.
  • Regimes de isenção poderão ser lavrados localmente, ao gosto do fiscal.

  • O presente diploma entra em função desde a presente hora. O sorteio para visita será aleatório.

  • Publique-se.
Júlio de Matos
Inspector Fiscal e Dragão

quinta-feira, maio 12, 2005

Bloga Barbie, bloga!...



Local de corte e costura, a blogosfera assemelha-se muito a uma passerelle onde desfilam, naquele jeito putéfio e escaganifobético, modelos. De virtudes.
No intervalo das variedades.

É o triunfo da mentalidade Barbie.

Moralidade Blogo-esférica II

- "Ó mãe, olha o senhor Asdrúbal está ali co's copos, todo nu a dizer asneiras no meio da rua!..."
- "Então, filho, isso não é decente: não se diz o nome do senhor. Diz-se que "estão c'os copos, nus, a dizer asneiras", mas não se diz quem. Se não ainda te acusam de estares a pessoalizar a questão."
-"Ah..."

quarta-feira, maio 11, 2005

A Razão e a Presunção

Na Igreja da Santíssima Razão e dos Santos dos Últimos Dias, como nas Igrejas em geral, perigosos não são os sacerdotes: são os beatos. E, de entre estes, uma categoria acima de todos: os sonsos.
Todavia, quando descemos ao nível da micro-seita - de umas Testemunhas da Lógica, ou de uma "Igreja Universal" do Reino da Certeza, por exemplo -, tudo se transfigura. Crentes, beatos e sacerdotes não se distinguem. É tudo ao molho e fé no bolso. Movem-se todos num rebanho uniforme, mergulhados numa espécie de êxtase contemplativo da verdadeira Crença, robôs peregrinos e auto-depurados de quaisquer dúvidas, perfeitas máquinas de calcular destituídas de vontade e emoções. É o pensamento automático. O Vending-thinking, mais que o wishful-thinking. Um modelo vanguardista de chafariz: metem-se moedas e saem bicas mal-cheias ou sandes de Locke com presunto. Ou de apóstolos.
Possuem a verdade. Mas não se contentam de possui-la, de emprenhá-la, de viver com ela em santo matrimónio e ter dela meninos. Precisam de ostentá-la, de dar com ela na cara de quem passa, de exibi-la em cinto de ligas e mini-saia. No fundo, sentem-se tanto maiores e mais soberbos quanto mais se confrontarem com a destituição e penúria alheias.
Mas ai de quem não goste do afago, ai de quem lhes diga que aquilo cheira a peixe podre e eles a varinas da ciência, bufarinheiros da objectividade, ciganos de esquina do silogismo!...
Heresia! Sacrilégio! Vilipêndio! Ó deusa, crime de lesa-Fé!...
Não, meus amigos, livrai-vos de criticar a superficialidade, a leviandade, a ignorância! Porque isso, com garantia ISO 9000, é irracionalidade, fujamos! E depois de vos darem com a Verdade inteira e absoluta nas trombas, pespegarem-vos com tamanha desfaçatez no focinho, vão por mim: não é pera doce.
Em resumo: há quem confunda razão com presunção. E presunção e água benta, cada qual toma a que quer.
Por muito que isto custe ao bispo Edir Macedo e aos seus pios emuladores na blogosfera.

terça-feira, maio 10, 2005

Babilónia e a Besta

Em discussões rendilhadas que por aí fora se vão exacerbando, ficamos a saber que uma cornucópia de peritos no nazismo fizeram os trabalhos de casa: leram atentamente as trepidantes aventuras do Major Alvega.
Podemos dormir descansados. Esta gente, capitaneada por um moderador intrépido, cristalizado algures entre Mamselhe X, Alô-Alô e Luís Delgado, velará pela nossa consciência. Depois da máquina de lavar roupa, da máquina de lavar loiça e da trituradora de cozinha, louvemos ao alto este novo engenho mirabolante que, em simultâneo, ao deitar e ao erguer, lava a consciência, lava a história e tritura quaisquer dúvidas. É uma verdadeira papa Milupa para desdentados mentais. Pena é só lavar para um lado, o zingarelho, mas resignemo-nos: não se pode ter tudo. O óptimo é inimigo do bom. E acima da História Boa, há a "História Bem", a história quéque, a história betinha, enfim. Calculam-se as playstations que não exauriram, os videocorders que não extenuaram, para alcançarem tamanha sapiência sobre a guerra e a geopolítica, a táctica e a estratégia. Os panzeres avançaram em 4-4-2 losango, ou em 4-3-3, com duas alas e um ponta-de-lança fixo? Os aliados apostaram no contra-ataque venenoso, ou no despejar de bombas para a grande área adversária? O guarda-redes russo era o Yashin ou o Stalin? Quem tinha melhor banco, o Eixo ou a Aliança? Os alemães descuidaram o jogo aéreo e foram goleados por causa disso? O Conde Drácula reencarnou no Adolfo ou no José Paizinho-dos-Povos, ou nos dois, por turnos? Se não fosse o John Wayne que seria de nós? Questões essenciais como estas, todas as que vos ocorram, perguntem-lhes que eles sabem. São tu-cá-tu-lá com a Wikipedia, as novas Páginas Amarelas da Erudição.
O nível é de tal modo elevado, que dá vertigens. A argumentação é tão profunda, que só de escafandro, ou submarino se alcança. A guerra, tranquilizemo-nos, é pim-pam-pum. Imita na perfeição um filme de bang-bang. Os maus são os que perdem. Vae victis, já diziam os romanos. Na essência, para esta boa gente, é essa a sua –deles, maus- maldade e, simultaneamente, a prova inabalável da mesma. Os bons, no cumprimento duma lógica inoxidável, são os que ganham, os que estão por cima, os que vendem mais; os que fazem as regras e remendam a história. É assim. Sempre foi assim.
Pela amostra de espírito presente, não custa muito adivinhar onde andariam todos estes eruditos da belzebuzição alheia, todos estes beatos remelosos que esmurram o peito imaculado, todos estes carneiros mal mortos, caso os que perderam tivessem ganho:
Com que idêntico afã e volúpia esbirra zanzariam por aí, de braçadeira rutilante em riste, à cata do judeuzinho lá do bairro, do comuna da paróquia, do entrevadinho e do panasca. E com que generosidade, sempre que o seu bem amado lucro e não menos idolatrado património beneficiassem, com que generosidade, digo-vos eu, que cheiro porcaria desta a léguas, não inventariam até judeus, comunas, ou larilas onde muito bem lhes conviesse. São escuteiros do status quo, virgens de lupanar, peritos na caça às bruxas. É uma escola antiga.
Não sei se o nazi é o mal absoluto. Nem sei se há mal absoluto. Sei que ele habita no fundo de todos nós. Emboscado, à espreita, à espera. Sei que se alimenta de medo, de ganância, de estupidez. Desconfio que se fortifica e desmesura com o poder, que galopa à rédea solta o autismo.
Desconheço igualmente as gradações exactas do mal. O que será pior: matar as pessoas ou matar a dignidade e os sonhos das pessoas? Também não sei se estarrecidos e desesperados diante do Péssimo não corremos o risco de acabar por vislumbrar no Mal um bem. Não é essa a vertigem que nos arrasta tantas vezes ao abismo? Vive-se perigosamente neste planeta. Cada vez mais.
Por outro lado, se o nazi é o mal absoluto, então as "democracias" que usam à exaustão os seus métodos de propaganda - que emulam mas cloroformizado, que não matam só lobotomizam, apenas mutilam -, estão longe de ser esse bem absoluto, sacrossanto, que uma mesma mentalidade "nazi" (só que disfarçada a desodorizante anestésico, a tintas e ouropéis de rameira) apregoa.
Não, francamente, não sei se o nazi é o mal absoluto. Sei que o burguês não tem ponta por onde se lhe pegue.

Vós todos que celebrais a Besta que matou deuses, achais que ela se compadece com essa ninharia que são os homens?

Como lidar com a opinorreia



Ocorre-me aquela fábula do "Velho, o rapaz e o burro". Fizessem o que fizessem, dessem por onde dessem –os dois a pé e o burro folgado; os dois a cavalo e o asno derreado; o velho montado e o catraio a penates, ou vice-versa -, havia sempre alguém na populaça que, arvorada de escândalo ou mofa, bramia de sua justiça, discordava ou corrigia.
Dizem que a moral da história se resume a "cada cabeça sua sentença".
Depois de ponderar no assunto, não concordo. Para mim significa algo substancialmente diferente. Ou seja: Que só anda aos palpites da malta, aos caprichos da turba, quem se insere nestas três categorias específicas: ou está gagá, ou é imberbe, ou é burro.

Dragão Felizardo

A Senhora Dragão...
Inteligência, beleza e um grandessíssimo mau feitio. Que mais poderia um Dragão desejar?...
Bem, talvez várias senhoras Dragão.

O Caguinchas e a Mulher Moderna

Contou-me o Caguinchas.

Ele:
-"Vivo num palácio em Sintra; aquele SLK ali fora é o meu; queres vir passar este fim de semana na Riviera?... "
Ela:
-"Querido!... (beijinhos, abraços, perninha aberta, contrato de promessa de casamento, etc...)"
Depois do acto. Ele, saciado, fumando o cigarrito da ordem, entre baforadas:
-"Sabes, afinal não moro num palácio; o meu passe é L1 e quanto ao fim de semana, desculpa lá mas tenho um pocker com uns amigos!..."
Ela:
-"Porco!, violáste-me!!..."

segunda-feira, maio 09, 2005

Moralidade blogo-esférica



- "Ó mãe, olha: o rei vai nu!..."
-"Está calado filho, que ainda te chamam invejoso!..."

O Ágape liberal



Eu, não me custa nada reconhecê-lo, tenho sido assaz injusto na minha síntese acerca de liberais, neoliberais, angloliberais e toda essa horda de metrossexuais do pensamento que para aí pulula, em permanente saldo e algazarra. Na verdade, toda esta gentinha que parece movida a caldos knorr da alminha ou a comprimidos de pensamento efervescente, não obstante a sua idolatria furiosa do Mercado, merece-me este acto caridoso de contrição. Animado desse remorso, reconheço como incorrecto dizer-se que a sua doutrina mirabolante pressupõe uma Humanidade a refastelar-se, alegremente, numa forma sofisticada de canibalismo. Corrija-se: não é canibalismo, é autofagia.
Mas, nada de menosprezos, é uma comezaina com regras, com rígidos preceitos: o catecúmeno-comensal deve iniciar o ágape com a entrada ritual: os testículos ; passar depois a uma sopa não menos protocolar: os olhos; tudo isto enquanto vai bebericando, em anteparo para a coca-cola principal, um batido espirituoso: a mioleira. Liquefeita.

O faranait de novo...

Estimada Lolita,

Eu jamais, em modo ou tempo algum, insultaria uma senhora. Não é debalde que me cognominaram (aquele cabrão do Caguinchas, se quer saber) "Dragão da Triste Figura". De resto, esse requinte -do insulto, do vitupério, do menoscabo -, reservo-o, como já deve ter reparado, aos cavalheiros. Se bem que, nestes cinzentos dias que correm, se torne cada vez mais difícil distingui-los umas dos outros e outros das umas -os cavalheiros e as damas, quero dizer. Acontecem-me mesmo desenlaces surpreendentes, assombrantes: julgo estar a injuriar um masculino, pelo menos é o que a cobertura indicava, e sai-me uma donzela, toda aos arrufos e birras. Doutras vezes, não menos aziagas, alvitro pelo aspecto que é uma dama que lá vem, afasto-me em vénia para ceder passagem e venerar o andor, mas eis que a mafalda vira bernarda e, sem qualquer pudor nem continência, rompe em chorrilhos e guturalidades dignas de carroceiro, ou guinchos ululantes mais próprias de varina ou mulher-a-dias, quando não remoques e piadinhas só ao alcance de bruxa encartada ou sogra de visita! Até as labaredas se me enovelam nas goelas e a bocarra - assaz descomunal e bem serrilhada de dentuças - se me escancara de espanto! O que vale, quando vale, é que Aristóteles atribuiu ao espanto a paternidade da filosofia ("Metafísica", livro Alfa, tenha a bondade de conferir). Nem imagina, vossa senhoria e minha senhora, as filosofias em catadupa, a prole irrequieta de ideias que este meu tremendo espanto tem gerado!...Vivo numa maternidade em sobrelotação permanente. Eu e o meu espanto já não temos tempo para mais nada senão andar de mãos atrás das costas na sala-de-espera. Isso e fumar charutos de empreitada. São uns atrás dos outros. Se não morrermos submersos por tão desarvorada progénie, aguarda-nos certamente, de emboscada, esse inimigo jurado de todas as chaminés humanas: o cancro de pulmão.
Ah, mas perdoe-me esta lastimável facúndia, esta destilaria de infortúnios! Descarrilei da coisa simples e rasa que tinha para lhe dizer: para esse peditório já dei. Encontra aqui a bela figura de parvo que então fiz.
Mas se lhe interessar um upp-grade, determine. Quem faz de parvo uma vez, faz duas ou três. Neste nosso país, também, já pouco mais há para fazer.
Um seu criado,
Dragão

sábado, maio 07, 2005

A Boa Acção do Dragão (Happy Birthday, dear Brutus...)

Bem, parece que houve para aí alguém que fez dois anos. Deve ser criança importante, o aniversariante, porque não se falava de outra coisa.
Para ser franco, vi muito paleio, a sabujice do costume, alguma inveja mal-disfarçada também (do "sitemeter", claro está), mas prendas úteis, como mandava a efeméride, é que não. Gente somítica, esta!...
Para que o infantil não contraia algum trauma à custa de tamanho desmazelo, ou desate nalguma birra de consequências imprevisíveis, acudo eu com a minha proverbial generosidade.

Toma lá, meu filho, e que faças muitos!... É pouco, mas é de boa vontade. E tudo coisas úteis, que tanta falta te fazem!...



O Melhor: Serem absorventes
O Pior: O preço
A meu ver, estas, são sem dúvida, as melhores fraldas. Tenho uma sobrinha com 2 anos e só usa destas fraldas porque são as que absorvem melhor e o material é bom. Já usámos de outras fraldas mas depressa voltámos às dodot porque as outras deixavam passar.



E ainda...



Agora, que estão salvaguardadas as duas extremidades problemáticas, já podes blogar mais à vontade e com bem maior conforto.

Não precisas de agradecer. Nós, os que ainda vamos tendo olfacto, é que te ficamos infinitamente agradecidos. Se doravante usares tão singelas prendas, bem entendido.

Parabéns a você...
(...)


Soneto a vós e ao Camões

Não sei porque me pedis que fale
Que diga, que conte, que encante...
Já basta o peso desta memória d'elefante
-pedi-me antes que me cale!

Não sei que ínvia morbidez vos aguça
ou que ânsia sádica de grotescos despistes.
Pouco me confortam vossos beiços tristes
ainda menos o arreganhar boçal da dentuça.

Não tenho artes de vate nem trovador
nem perícias de cura a debitar sermões.
E se de ratos nem serpentes sou encantador

deixai-me, pois, em paz com a minha dor,
com os meus enganos e frustrações.
Quereis poesia? -Ide chatear o Camões!

sexta-feira, maio 06, 2005

Nada de Confusões

Não tenho nenhuma receita infalível para resgatar ou redimir a humanidade. Tão pouco, para melhorá-la. Nem sei, sequer, se anda, a grande vaca, perdida, se precisa de recauchutagem ou verniz. Não faltam para aí maquilhadores, esteticistas, criadores de moda e cabeleireiras. Esses é que sabem. Pelo menos, mais que eu.
Ignoro o caminho para o paraíso. Não tenho mapa, nem rota, nem conheço, de fonte segura, pilotos e guias infalíveis. Mas eles apregoam-se a cada esquina. Pontapeia-se uma pedra e salta de lá um cabrão desses, de bússula e gps em riste. É escolher.
Tão pouco sei se o paraíso existe. A existir, seria uma calamidade económica: o que faríamos a todos estes funcionários e profissionais do inferno? Todos estes proxenetas da dor e da desgraça alheia, que seria deles, coitados? Todos estes moços de recados do ódio, porteiros e engraxadores da estupidez, comeriam de quê?
Não, nada de confusões: não estou aqui para salvar o mundo. É mesmo só para insultá-lo.

Cortesia e Desagravo



Estimada Lolita,

Vossa senhoria é de uma amabilidade exuberante. Será sempre bem-vinda, bem como o ilustre Besugo, a quem aproveito para felicitar pela magnífica proeza europeia das suas cores. Portugal saíu honrado.

Quanto ao digníssimo senhor Altino Torres, aproveito igualmente esta troca de galhardetes, para desagravá-lo dos impropérios que, claramente sob os efeitos de mau fígado e catadura, lhe lancei. Eram chistes que, não sendo inocentes, alvejavam estritamente as suas bizarrias clubisticas e não a sua mui elevada e preclaríssima pessoa. Não obstante, saíu o desafortunado senhor ofendido, sentindo-se encharcado por um lamaçal inaudito.
Em jeito de reparação, mando lavrar o seguinte:
O Senhor Altino, que assina com o seu próprio nome e não deve estar sujeito a flibusteiros tresloucados como eu, não é "um panhonha", nem "um lampião bacoco", nem um "talibanzinho vermelhusco de pacotilha", nem, tão pouco, um "Leonoro Pinhão dos blogues". Pelo contrário, estou disposto a acreditar e a jurá-lo publica e solenemente: trata-se do mais garboso dos cavalheiros, do mais extremoso dos chefes de família, do mais excelente dos adeptos e, nunca o esqueçam, um analista desportivo incomparável que desfila pelo mundo, em gloriosa mostra, derreado sob o peso duma constelação de virtudes.

Espero que isto constitua indemnização bastante aos danos causados a Vª.Excª. Caso contrário, queira enviar-me as suas testemunhas, de modo a combinarmos hora, local e armas. Acabo de lavar a minha alma e de modo algum quereria impedi-lo de lavar a sua honra.

Dragão

Pirata, Flibusteiro e Confrade da Costa

quarta-feira, maio 04, 2005

Os Grandes Problemas da Humanidade - I.


A fazer fé no meteorismo mediático, que a todas as horas ribomba e nos azucrina as orelhas, os grandes problemas da humanidade para o próximo milénio, pelo menos, resumem-se, se tanto, a meia dúzia. É uma lista pequena mas premente: diariamente, são feitas homilias, telejornais, e o espírito ruminante da manada é atafulhado com essa palha noticiosa. Ou melhor, é uma espécie de pó anabolizante, de engorda rápida, que lhe misturam na ração.
Mas enunciemos esses grandessíssimos e gravíssimos problemas:
1. Interrupção voluntária da gravidez
2. Eutanásia
3. Casamento entre homosexuais
4. Adopção de crianças por casais homossexuais
5. Legalização das drogas moles
6. O sexto é opcional. Uma espécie de sobremesa.
Se é certo que já vivemos no melhor dos mundos, uma vez resolvidos estes tremendos problemas é-nos garantido que passaremos a viver no mais excelente dos paraísos.

Sobre a questão 1., já falei aqui atrás e mantenho integralmente o que então bramei. Sobre a 2., elucubrarei brevemente. Por hoje, atenhamo-nos às duas que, de entre todas estas urgentes, são, sem sombra de dúvida, as mais importantes: a 3. e 4., pois claro.
De facto, não sei o que será da humanidade, do planeta, da civilização, se continuarem a vedar os altares e os nenucos vivos aos gays. É preciso acabar com esse resquício fascista. É, sim senhor! Até porque, atestam-no várias sumidades espertíssimas, pode nascer-se gay como se nasce preto ou branco ou mongolóide ( Trissonomia 21, para pessoas do jet-set).
Pois bem, eu hoje sinto-me liberal. Em conformidade com esse meu singular (e raro) estado de espírito, proclamo que os homossexuais devem poder casar. Mas casar com todas as regras: não só pelo registo civil como também pela Igreja. Especialmente, pela igreja. Já estou mesmo a imaginá-los no dia de Santo António, aos magotes cacarejantes, "elas" de vestido e véu, eles de fraque rosa choque, todos a posarem para a fotografia, os sinos a badalarem em júbilo cristão, e o padre, diáfano, a benzer e a abençoar a panelei..., quer dizer, os novocrentes.
Vão por mim: Deixem-nos casar pela igreja, permitam que se enpanzinem de hóstias e vereis que Deus ressuscita, o ateísmo passa de moda e até o Carlos Esperança corre a peregrinar Fátima. Mais: Até a Santíssimia Inquisição volta e ninguém protesta.
No capítulo do casório, se me permitem, vou ainda mais longe: além do civil e do religioso, também deveriam ter direito ao tradicional, aquele matrimónio típico das áfricas em que o noivo tem que pagar alambamento ao pai da "noiva". Uns cabritos, uns bacalhaus, umas latas de conserva e uns litros de gasolina sempre são alguma compensação para um pai que tenha o azar de lhe nascer um filho bichon..., quer dizer, homossexual. Ao menos, não é só prejuízo.
Quanto à adopção de crianças, logicamente, também estou de acordo. É deixá-los. Devem até ter prioridade em relação aos casais hetero. Basta que se equipem as crianças com (primeiro) fraldas (e depois) cintos de castidade. Pelo menos até atingirem a maioridade. Ou então, reune-se uma comissão de sábios especialistas, daquelas muito iluminadas e peregrinas, que apura, em menos de nada e sem margem para dúvidas, quais as crianças homossexuais e quais as heterossexuais, pois, segundo a novociência, elas já nascem com essas singularidades, coitadinhas. Uma vez determinada essa idiossincrassia inata, os casais homo adoptam crianças homo e os casais hetero adoptam crianças hetero. Já agora, se não é pedir muito, convinha que os americanos aperfeiçoassem a máquina das ecografias de modo a que a bendita prospecção pudesse ser feita logo no útero materno. Por lei constitucional, e em correcção judicial ao erro da natureza, os nascituros gays passariam a ser expropriados aos progenitores naturais e entregues a famílias homo. Poupavam-se, com isso, desgostos à família inicial e burocracias à adoptiva. Tinha ainda outra vantagem: se deixássemos os homos adoptarem bebés, todos, sem excepção, passariam a insurgir-se contra o aborto, e já não se gastava tempo nem dinheiro com refrendos. Em vez de abortarem, as mães preocupadas com o seu futuro nas discotecas e passereles, entregavam os empecilhos para adopção. Donde se depreende, mais uma vez, que resolver os problemas dos gays é resolver, por simpatia, todos os problemas da humanidade.
Todavia, não nos admiremos se daqui por uns tempos, resolvidos estes enormíssimos problemas, irrompam de pronto -e aos gritos - outros, talvez menores, sua prole, mas não menos candentes. Assim, precavendo desde já o iceberg que esta pequena ponta visível anuncia, o melhor mesmo é irmos adiantando serviço. Para o efeito, e acautelando futuras e fatais erupções:
* Autorize-se, desde já, o divórcio entre homossexuais;
* Reservem-se-lhes lugares exclusivos nos parques de estacionamento, como já existe para os deficientes (é justo e obedece à mesma lógica);
* Priorizem-se-lhes assentos nos transportes públicos, como já existe para grávidas, idosos e acompanhantes de crianças de colo;
* Instaure-se uma discriminação positiva na sociedade pró-Apartheid sexual, tal qual se fez na África do Sul no pós-Apartheid racial.
* Decretem-se cotas mínimas gays no parlamento, no governo, nas carreiras judiciais, nas forças de segurança e nas forças armadas. Sem esquecer os bombeiros, os hospitais e todos os serviços que impliquem o uso de farda; sobretudo a Marinha;
* Isentem-se de impostos;
* Obriguem-se as instituições bancárias a abrirem linhas de crédito Homo, como já existem outras como o "Crédito Sénior", ou "júnior", ou "crédito agrícola", etc;
* Criem-se bolsas de estudo para homossexuais;
* Subsidiem-se escolas, infantários, creches, liceus e universidades homossexuais;
* Instituam-se reservas e coutadas homossexuais, sobretudo na cultura e nas artes, isto é, legalize-se o actual comércio informal naquelas áreas; concedam-se alvarás;
* Converta-se a TV2 em canal gay;
* Nos restaurantes, aviões e espaços quejandos, além de áreas para fumadores e não fumadores, estabeleçam-se também áreas para homossexuais e não-homossexuais.
* Consigne-se na lei a homossexualidade como atenuante, senão mesmo alibi, para qualquer tipo de crime, sobretudo económico;
Em resumo, converta-se "homossexualidade" em critério prioritário. Seja daquilo que for.
Com isto, termino. Espero que este meu contributo para a paz social e a descompressão de jornais e televisões não caia em cesto roto. (Que é como quem diz...)

Entretanto, fica desde já a promessa: Numa próxima oportunidade, tenciono debruçar-me sobre os gordos e os feios. Também se nasce gordo ou feio, quanto a isso, então, é que não há mesmo dúvidas, e também se é discriminado negativamente por causa disso.

terça-feira, maio 03, 2005

Sanguessugas...

Dizem as notícias: «Portugal é o país europeu com menos dadores de sangue».

Esqueceram-se de acrescentar que, em contrapartida, é certamente dos países da Europa com mais chupadores de sangue por quilómetro quadrado.
Quer dizer, há pouco quem dê, porque, comprovadamente, há muito quem sugue.
Por isso mesmo, alguém lhes devia explicar, aos cientistas estatísticos, que por estas bandas a função até existe. Só que não se diz "dador": diz-se "hospedeiro".

segunda-feira, maio 02, 2005

Poesia.

Execro poesia efeminada, delicodoce, eunuca! Porcarias do estilo Eugénio de Andrade e quejandos. O defeito é meu, falta-me "sensibilidade", "ternura" pelas palavras pequeninas, chocas. O defeito é meu e eu assumo.
Em contrapartida, estimo a lucidez, a violência, o abismo - a vida, enfim.
Vem tudo isto a propósito dum poema que garimpei numa caixa de comentários algures. Reza da seguinte forma:

O POETA EM LISBOA

«quatro horas da tarde.
o poeta sai de casa com uma aranha nos cabelos.
tem febre, arde.
e a falta de cigarros faz-lhe os olhos mais belos.

segue por esta, por aquela rua
sem pressa de chegar seja onde for.
pára. continua.
e olha a multidão, suavemente, com horror.

entra no café.
abre um livro fantástico, impossível.
mas não lê.
trabalha - numa música secreta, inaudível.

pede um cigarro. fuma.
labaredas loucas saem-lhe da garganta.
da bruma
espreita-o uma mulher nua, branca, branca.

fuma mais. outra vez.
e atira um braço decepado para a mesa.
não pensa no fim do mês.
a noite é a sua única certeza.

sai de novo para o mundo.
fechada à chave a humanidade janta.
livre, vagabundo
dói-lhe um sorriso nos lábios. canta.

sonâmbulo, magnífico
segue de esquina em esquina com um fantasma ao lado.
um luar terrífico
vela o seu passo transtornado.

seis da madrugada.
a luz do dia tenta apunhalá-lo de surpresa.
defende-se à dentada
da vida proletária, aristocrática, burguesa.

febre alta, violenta
e dois olhos terríveis, extraordinários, belos.
fiel, atenta a aranha
leva-o para a cama arrastado pelos cabelos. »

António José Forte

Mais palavras para quê? Isto, meus amigos... isto é poesia.

Agradecimentos ao Blitzkrieg, pela feliz lembrança.

A uma Senhora


O louvor, se bem que injusto por excessivo, provém duma senhora. Tal facto tem as suas implicações: o dever de cavalheirismo, voto sagrado e apanágio desta besta mitológica, é uma das primordiais.
Por conseguinte, minha senhora -(não me pergunte porquê mas imagino-a bela e de sorriso luminoso), quero expressar-lhe sem mais rodeios:
Muito me honra e quero dizer-lhe que também não escreve nada mal e certamente bem melhor que eu. O que torno extensível a esse réptil meu primo e desprovido de asas, esse lagartáceo militante, que, decerto por inefáveis e transcendentes razões, adoptou pseudónimo de peixe.
Já o ter-me associado a outras criaturas no mesmo encómio, não melindra em nada a sua clarividência indubitavelmente superlativa, mas deixa-me um tanto ou quanto baralhado nas emoções...
Quanto ao maradona, ainda vá que não vá: o fedelho tem talento e não é pouco, mas os amiguinhos dele, alguns pelo menos, fedem. Agora o outro que tal, com nome (nem sequer claramente assumido) de palavrão, francamente, ó minha amiga - colocar sequer na mesma frase que este seu criado um panhonha, um lampião bacoco daqueles, um talibanzinho vermelhusco de pacotilha, por amor de Deus, tenha misericórdia!...Com franqueza, excelentíssima senhora: aquilo é um Leonoro Pinhão dos blogues!...
Não me vou desbragar nos impropérios e abominações por reverência a vossa senhoria, srª Dª Drª Lolita, e creia que este não é um tributo de somenos. Mas, em todo o caso, o melhor mesmo é retirar-me de urgência, que estes meus maus fígados não são de confiança.
Retiro-me, pois, mas não sem que antes me curve e lhe oscule, respeitosamente, a nívea e esbelta mãozinha.


PS: E fique tranquila: do que depender de mim, caso os lagartos (que são quem merece) não consigam, voltaremos a ser campeões este ano.
Aquela escumalha cor de mênstruo (perdoe-me a grosseria) é que não!! Irra!!...

domingo, maio 01, 2005

Real Indignação

Reacção indignada de Sua majestade, o nosso primeiro rei, por email, à minha última disposição:

«Ah é assim?
Juntas-te, enfim, à brigada de engenharia de barragens retirando do teu blog acaixa de comentários? O garante da interactividade bloguística é,precisamente, a caixa de comentários. Capas a essência do blog quando ofazes, ó dragão.
Se te aparecer uma aventesma daquelas podes sempre apagar o seu comentário e,com isso, removeres a respectiva catadura.
Criticas Abruptos e quejandos mas estás morto por lhes seguires as passadas.
Daqui a nada também rasgas a faixa de links, não?
Foda-se!Caralho!
As minhas desculpas, os meus cumprimentos,
Afonso Henriques»

Caro Afonso Henriques, majestade,

1. Um blogue não é um fórum. Apesar dessa confusão se ter instalado e de se andar a vender gato por lebre, não é.
2. Sobre a "interactividade bloguística", é simples: quero que se foda!
3. Sobre a meia dúzia de leitores e leitoras que me concederam o privilégio da sua visita, desculpo-lhes a benevolência e estimo-os. Desenvolvi mesmo a seu respeito, com vergonha o reconheço, uma certa amizade. Por isso disponibilizei o email. Atendimento personalizado.
4. Prefiro capar eu o blogue que o blogue capar-me ele a mim.
5. Não censuro comentários nem, consequentemente, os retiro. Até os RIAPA que por aqui se aliviaram, nunca interferi com as respectivas diarreias putativamente engraçadas. Este é um país de engraçados e, por conseguinte, devemos respeitar os indígenas. O problema não são os comentários em letra, julguei que isso tinha ficado claro: o problema, o horror, é que agora passaram a adicionar as fuças. Essa é a tragédia. Daqui a pouco exibem-se de rabinho ao léu ou de pilinha na mão. Já faltou mais. A medida foi, pois, profiláctica. Não é depois da casa invadida que se põem trancas à porta.
6. Quanto aos "abruptos" e quejandos...a observação é, no mínimo, extremamente infeliz. É pôr o mundo de patas para o ar. Passe a imodéstia, é o mesmo que dizer a Mozart que gostava de ser Salieri. Aliás, minto, nem Salieri: Toino Pimba. Um Roberto Leal, um Emanuel dos blogues. Eu tenho vértebras, lembra-se?
7. Não rasgarei os linkes. Até porque me dá imenso gozo ter, como me apontava aqui há tempos um leitor intrigado, uma série de linkes "fassistas", que muito chocam a esquerda bem, a esquerda queque, a esquerda beata. Eu continuo na minha: linko quem me linka. E acho imensa graça ao cuidado que toda a blogosfera instituída, a high society emproada, coloca em fingir que eu não existo. "Quem é que este gajo pensa que é? Hum?"
E o problema até nem é esse, não é o que eu penso que sou: é, outrossim, o que eu sei que eles são.

Portanto, majestade, nada de dramas, escreva sempre. Que eu cá estarei para lê-lo com a maior atenção. Votos de melhoras para o seu reino, agora usurpado por republicanos vigaristas.

Um seu súbdito,

Dragão