quarta-feira, maio 30, 2007

Babelização, ou A escadaria-rolante para o Céu




O progresso e a modernização, primeiro, desertificaram os campos e as aldeias. Depois, paulatinamente, têm vindo a desertificar as grandes cidades. Lisboa, exemplo clamoroso, é uma pungente montra disso mesmo. Aos poucos, vai-se esvaziando de gente e de memória. E tal qual a antiga metrópole dum império devém necrópole de sonhos e ideias, também a sua emblemática capital, de sala de visitas, descamba em sala de embarque zombie. A noite, sobretudo, é esclarecedora: espectros e pré-fantasmas aguardam despejo, apodrecem diante de televisões ou jazem embrulhados em papelão e farrapos, sob abrigo de túneis ou arcadas. Está cada vez mais lúgubre a minha terra. Num tempo em que as pessoas vão petrificando por dentro, resta às pedras que assistem, cá fora, impotentes, chorar.
Há pois uma questão que se torna incontornável: em que consiste realmente essa tal "modernização que canta"? Bem, tudo indica que consiste, fisicamente, em acantonar a população num imenso subúrbio (excepto, naturalmente, a nomenklatura jet-seita reinante, mais a sua insaciável corte de serviçais e bobos de serviço); e, psicologicamente, em terraplenar toda a cultura, justiça ou tradição (ou mera hipótese de qualquer uma delas) a uma pardacenta - e sórdida - mentalidade suburbana.
Para aqueles que tanto gostam de contrapor, triunfalmente, a modernidade ao feudalismo, a "idade das luzes" à "idade das trevas", a ciência à religião, e ufanarem-se da evolução e libertação que foi, fica todo um trajecto épico, toda uma saga maravilhosa que, caso usufruissem dessa faculdade mental, convinha que reflectissem: a da indústria salsicheira celestial que recauchutou os servos da gleba em servos da banca.

7 comentários:

Anónimo disse...

Sim um subúrbio, mas não é só físico é também e essencialmente psíquico e espiritual.
Não se pensa, sente-se e vive-se apenas uma vida virtual e televisiva, pois a verdadeira vida é já bastante penosa, ou pela escravidão de um trabalho cada vez mais exigente precário e mal pago do qual não se pretende que ninguém se liberte, frequentemente num ambiente de intrigas, invejas e graxas. Ou ao invés, para fugir da dura realidade do desemprego e da aparente inutilidade!
Os cargos de poder, esse são dados à canalha que pertence à máfia, os outros (os "burros"), ou seja quem realmente trabalha, esses só servem para executar ordens e fazer tarefas incómodas. E ai deles se falham!

Anónimo disse...

Dragao, tens razao nesse teu disgnostico acerca da tristeza e pobreza de alma desta 'modernizacao'. Estas
enganado nas razoes profundas: tudo isso resulta dos trabalhos de trogloditas sem Ciencia, nem Iluminacao
alguma.

"a da indústria salsicheira celestial que recauchutou os servos da gleba em servos da banca."

O principio ja; tu bem conheces: os servos que sirvam, e' para isso que eles existem e ja' estao habituados.

Anónimo disse...

MP-S,

A ciência enquanto busca de saber tem a dignidade inerente a um ramo da filosofia. E essa dignidade eu não lha tiro. Mas aí andamos ao nível da tese.
O pior é o nível da prática, quando a ciência resvala para mero instrumento do Poder. Aí já não estamos mais na ordem da sabedoria, mas na dimensão mágica. Por cada benesse quase divina, paga-se uma sobrefacturação apresentada pelo Diabo em pessoa.
Desde a revolução industrial, então, a coisa ganhou contornos de vórtice.
Naturalmente, a ciência enquanto mero instrumento é uma distorção da ciência. Mas como, cada vez mais, está sujeita e pré-determinada pela lógica do lucro e da hegemonia que o permita...

Dragão

Anónimo disse...

Bem, o anterior só para especificar que a ciência não é diáfona, inocente nem angélica. Nem a ciência, nem a filosofia nem a religião, porque todas elas foram insrumentalizadas (e continuam a ser) ao longo da História.
Em todo o caso e por via disso mesmo, só a imbecilidade militante e consumptiva pode elaborar as famosas contraposições ciência/religião ou filosofia/ciência. Esse é um discurso, típico e irrecuperável, de seita religiosa, de gangue intelectualóide, de mentecaptocratas profissionais. Mas, infelizmente, é o que mais abunda por aí.

Dragão

Anónimo disse...

E segue para link!
Terraplanar toda a cultura, justiça ou tradição..., grande e justíssimo texto, Dragão!

Anónimo disse...

"Nosso triunfo foi ainda facilitado pelo fato de, nas nossas relações com os homens de quem precisamos, sabermos tocar as cordas mais sensíveis da alma humana : o cálculo, a avidez, a insaciabilidade dos bens materiais, todas essas fraquezas humanas, cada qual capaz de abafar o espírito de iniciativa, pondo a vontade dos homens à disposição de quem compra sua atividade.
A idéia abstrata da liberdade deu a possibilidade de persuadir ás multidões que um governo não passa de gerente do proprietário do país, que é o povo, podendo-se mudá-lo como se muda de camisa.
A removibilidade dos representantes do povo coloca-os à nossa disposição ; els dependem de nossa escolha."


Os Protocolos dos Sábios de Sião

Anónimo disse...

Os Sábios de Sião são panascas