sexta-feira, abril 07, 2006

A patrulha Anti-anti-semita (reposição)




Já agora, não se perde nada em recordar o que eu aqui escrevi, neste blogue, em 27/07/2004 (vai para dois anos, portanto). A actual "chainsaw extravaganza", que muito tem intrigado alguns leitores desta taberna, não é mais que um burilar ad nauseam da tese aqui apresentada (só por causa das intimidações e do histerismo mongo):

Parecem existir patrulhas na blogosfera. Na blogosfera, aliás, como em todo o lado. Ou Brigadas da moral e bons costumes, se preferirem. Uma delas, já pude constatá-lo, é a Patrulha Anti-anti-semita. Vela, de prevenção. E faz bem. Todo o cuidado é pouco. Porque, juntamente com a homofobia, o anti-judaísmo é um dos grandes problemas que assalta a nossa sociedade. É sabido, é do domínio público: na sombra, em tertúlias secretas, conspiram inúmeros torcionários raivosos animados de torpes desígnios, quais sejam o de construírem campos de concentração no Alentejo, onde se procederá à Solução Radical (versão portuguesa da "final" hitleriana). É uma obsessão dos povos em geral e do nosso em particular. Acordar um belo dia e ir matar judeus. Melhor e mais ancestral forma de descomprimir as ideias não se conhece. É verdade que não os massacramos há muito tempo. Os nossos brandos costumes e natural preguiça torpedeiam-nos esse louvável empreendimento. O clima também não ajuda, sobretudo no verão. Mas em pensamento não custa nada, a imaginação é livre. Como não custa nada emitir o apoio e concordância àqueles, mais industriosos, que o fazem. Oramos, em segredo, por holocaustos que se abatam e os banhem condignamente, como eles merecem. Deus não dorme e, desde o início, está escrito que lhes devota uma especial e canina predilecção. Por isso, repito, todo o cuidado é pouco. Mais grave que a crise económica, o desemprego, a corrupção, a deseducação, a incúria e a incompetência dos governantes, o estado de boçalidade e estupidez generalizada da população, a começar nas pseudo-elites e a propagar-se, em cascata, (na verdade, em borrão) por ali abaixo (na realidade, em redor), pois mais grave que isso tudo e que os próprios incêndios que, anual e pontualmente, visitam a pátria, é o anti-semitismo, essa praga endémica, infecto-contagiosa, febril e avassaladora que nos devasta. Resulta, certamente, duma mosca que nos morde, uma tsé-tsé mais formidável que qualquer outra, que nos inocula dum veneno demoníaco, hediondo, labefacto, capaz de transformar pacatos cidadãos em lobisomens sedentos de sangue hebraico. Digo isto porque tenho olhos para ver e reparo à minha volta. Detecto esgares maldosos a cada esquina, soslaios inquietantes em cada janela. Arrepio-me e estremeço com a proximidade da lua-cheia. O barril de pólvora está pronto -aliás, está sempre pronto, ansioso de expandir-se, com fragor, em todas as direcções- e, à mínima fagulha... Por isso, abençoados estes patrulheiros, bombeiros de sentinela ao barril, enfermeiros de esponja molhada e plantão à temperatura, exorcistas, de cruz em riste e esconjuro à besta! Todavia, eu, pessoalmente, lamento informar, não tenho muito tempo para os judeus: obsidiam-me, outrossim, os espanhóis. Concentro nestes a generalidade das minhas tendências e projectos massacrantes -e acrescento que não sou nenhum leigo na matéria. Voto-lhes uma animadversão ancestral, empedernida. Sou anti-castelhano, confesso. Um caso perdido, merecedor, quiçá, de internamento. Aceito que, dadas as actuais circunstâncias europeias, isso não será lá muito curial nem adequado, mas está-me na massa do sangue, é mais forte do que eu. Incendeia-me a imaginação de carnificinas metódicas e desinfestantes. Fora isto, em interlúdios ocasionais, também desconfio dos americanos, esses cabrões; tenho umas velhas contas a ajustar com os ingleses, esses filhos da puta; e ainda não esqueci os sarracenos, esses salafrários. São estas as minhas prioridades. Culturais, sobretudo; psicopatas, talvez. Mas eu sou assim. Confesso que não me sobra tempo nem agenda para os judeus. Acho mesmo que o problema deles é o de terem a mania que são importantes, de cismarem que são predestinados e protagonistas, ainda que, não raramente, pelas piores razões. Pois que tenham, pois que sejam. Estou-me nas tintas. Para mim, interessam-me tanto como os singapúricos, os monegascos, os suiços, ou qualquer desses povozinhos ridículos e anódinos. Conspirar, é natural que conspirem. Todos conspiram, especialmente em se tratando de pilhar os outros. Contaminaram-nos a civilização? Não muito. Uma pocilga não é facilmente contaminável e, de resto, os romanos ( autores da pocilga) contaminaram muito mais e ninguém se queixa. Ah, e a propósito, pensando bem: qual civilização? Há quem não os grame, nem com molho de tomate? Também não deixa de ser natural: eles não gramam ninguém que não eles próprios. Trata-se, pois, duma aversão recíproca e cultivada milenarmente. O anti-semitismo vai de mão dada com o anti-gentilismo. Mas tudo isto, sinceramente, pouco me interessa. Combates na lama só ficam bem a mulheres jovens e pouco vestidas. E não falaria sequer disto, não se desse o caso de, por detrás do fato de homem-aranha dos patrulheiros, tresandar o bedum ancestral dos fariseus e dos cameleiros das arábias. Ora, fariseus, tenho que reconhecê-lo, é a única espécie de gente capaz de me distrair, ainda que momentaneamente, dos espanhóis.


Aproveito para lembrar que fariseus foi* a única escória que até conseguiu tirar do sério o bom Jesus. Ora, eu não possuo nem um infinitésimo milionésimo da bondade, nem da misericórdia Dele.

* - a forma verbal "foi" é mesmo assim: "fariseus" não é plural; é uma única massa amorfa, acéfala, rastejabunda, igual em todos os tempos e em toda a parte.

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