terça-feira, outubro 09, 2012

Naufrago, logo existo



No princípio dos anos oitenta, Portugal tinha acabado de fugir cobardemente de África e, após ensaios estonteantes de paradisíacos lestes, preparava a adesão desesperada à Eurapa. Resultado: bancarrota.
Trinta anos depois, amainada a cornucópia de fundos comunitários e várias orgias de crédito coalescente, Portugal está plenamente integrado na Europa... e novamente na bancarrota. 
Dir-se-ia, assim, que enquanto para os outros povos a bancarrota é uma calamidade, para os portugueses, em contrapartida, é uma mania. Pela via socialista, pela via capitalista, por outra via qualquer, inventada ou por inventar, hão-de lá ir sempre dar. Decorre alías, isto, dum facto muito evidente e fundamental: entre nós a crise não constitui precalço. Bem pelo contrário, constitui vício. Ou estamos nela ou a agenciar diligentemente pretextos para nela retouçarmos ou mergulharmos a pique. Tarda, pois, em se reconhecer o óbvio: ele há povos intrinsecamente masoquistas. Ou então é o que nos resta das Descobertas: a volúpia excitante do naufrágio. Como já não temos mais nada para descobrir, resta-nos naufragar a torto e a direito. Por tudo e mais alguma coisa.
Quiçá, aquilo que aos outros abate, a nós alimenta-nos.

PS: Mesmo a nossa já famosa e lambuzadíssima democracia, não se distingue a avantaja ela sobre todas as outras nesse primado  eloquente de ter por universal não o sufrágio, mas o naufrágio?...

Sem comentários: