Reuniu-se finalmente o Conselho de Estrago.
Vamos à descrição...
"A reunião do Conselho de Estado começou às 17.15, tendo sido ouvido primeiro as explicações do ministro das Finanças, Vítor Gaspar ." Cinco minutos depois, os últimos conselheiros adormeciam profundamente. Apenas Mário Soares cochilava. Jorge Sampaio, após uma breves lágrimas protocolares, rompera num ressonar entorpecente que, adicionado ao ronronar tecno-analgésico do ministro, quebrara as últimas e estóicas resistências. Só Eanes não fechara os olhos, mas apenas porque, no auto-imperativo de homem-estátua, treinava a catalepsia perpétua. Embora no seu espírito indómito tremulasse a eterna dúvida: se à falta de automável, não deveria trepar para cima da mesa.
O primeiro a acordar, talvez porque apenas cochilasse, foi Mário Soares. Apercebendo-se que já não havia ministro e, não querendo perturbar o remanso dos restantes, saiu por volta das 20 ( um pouco antes, em bom rigor, se quisermos fazer fé nos relatos da imprensa). Abandonou a sessão cabisbaixo e um tanto ou quanto assustado com o olhar fixo e perfunctório do homem-estátua (seu ancestral inimigo, recorde-se). Seguiram-se, por ordem alfabética, todos os restantes, a espaços variáveis. Excepto Vitor bento, que continuou anichado debaixo da mesa, em prostração pós-orgástica; e, naturalmente, Cavaco Silva, o único que,em boa verdade, não dormira, porque o limbo zombie onde paira (vazio etéreo entre a vida e a morte, que é como quem diz, entre a vigília passageira e o sono eterno) o imuniza contra esse precalço tanto quanto o dispensa dessa provação.
Passemos agora ao assunto...
O Conselho de Estrago considerou, como que lhe competia, que "Portugal depende muito do exterior para o financiamento do Estado e da sua economia". Financiamento externo do Estado e da economia do Estado, e está na essência tudo dito. O resto é paleio para dourar esta pílula. Ou supositório descomunal, melhor dizendo, se levarmos em conta o orifício de Portugal por onde pretendem admiti-lo. "O Estado e a sua enonomia" representa isso mesmo: esse conglomerado de bancos, construtoras, monopólios energéticos e escritórios de advogados (notários e cozinheiros legais comissionados pelos anteriores) que se servem do Estado quando este se serve da Nação. O financiamento externo é para eles, como os fundos comunitários também foram. O buraco nas contas públicas também é essencialmente obra deles, mas esse vai ser coberto com financiamento interno, por via da rapina de bolsos do cadáver por atropelamento da economia real.
E, por fim, as reacções populares:
«Manifestantes gritaram "gatunos" à saída dos conselheiros»
A lucidez nunca privilegiou as multidões. Tão pouco a justiça. O ápodo "gatuno" para os figurões em questão, embora não absolutamente descabido, parece-me bastante impreciso. Até porque Dias Loureiro e José Sócrates, esses dois promontórios da arte, já não estavam presentes. Qual o termo apropriado, então?
A caverna da reunião em tudo emula a do Ali Babá, mas os hemi-quarenta em congresso - até pelo traje de nojo a servir de moldura ao rosto patibular se reconhece -, compareceram na qualidade de coveiros, cangalheiros e agentes mortuários da nacinha. Essa, de facto, é a sua justa dignitas; o caso de pilharem as sepulturas é so um fenómeno acessório, um expediente lateral para compor o salário.Mas lá está, o povo ressente-se sempre com mais ardor de quem lhe vai ao bolso do que de quem lhe vai à alma. E agora, quando verifica que ladrões de sepulturas lhe roubaram o futuro, de certa forma, tem o que merece: ninguém o manda ter deitado a esperança em urnas!...
4 comentários:
o primeiro parárafo é de mijar a rir
o proletário
"se à falta de automóvel, não deveria trepar par acima da mesa"
AHAHAHAHAHAHA
Ó Dragão, se és tão bom a fazer guitarras eléctricas como a escrever metes a Stratocaster num bolso! hihi
LC
LC,
finalmente um entendido!...
Por acaso tenho uma stratocaster de minha autoria que mete as outras, topo de gama, num bolso.
Aliás, ando a escrever pouco e mal por causa da mania de fazer guitarras eléctricas.
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