sábado, setembro 15, 2012

Palimpsesto do Labirinto






Não sei onde residia o mistério. Num país saturado e atravancado de impostos, crivado de rendas, cripto-corveias e outros neofeudalismos que tais, qualquer aumento no fardo resultaria em colapso da besta de carga, vulgo contribuinte. Se foi por causa do fast-money, através do crédito desenfreado, que o país chegou à situação que chegou, não será certamente através de fast-money, através do saque maluco, que o governo conseguirá extrai-lo dela. Pelo contrário, vai submergi-lo cada vez mais. Vai estrangulá-lo até ao esqueleto.  Está-se assim perante o estéril  reforçado com o indigesto: nem aumenta a receita, nem diminui a despesa. Resume-se então o caravançará ao fruste espalhafato dum bando de facínoras, canalhas e desalmados, a agredir gratuitamente algo que não compreende e, bem no fundo, apenas detesta. Desconfio que até  os macacos do Zoológico já perceberam que não passa tudo dum Neo-Prec. Muitos, os junkies rebarbados e impenitentes do costume, com aquela liberdade de espírito característica que os albarda, já clamam por um novo 25 de Abril. Estão a tê-lo, em dose última e mascarada, e ainda não perceberam isso.   A economia (o que resta dela) está a ser destruída alarve e gratuitamente. Não apenas se perdeu a independência, já de si ténue e enfezada nos últimos séculos, como se penhora freneticamente qualquer hipótese de recuperá-la. O Neo-Prec está a tratar de completar o serviço que o Prec e o Pré-Prec deixara a meio e o pós-Prec não mais deixou de untar na forma com levedura e fermento. Em suma, da decapitação política, passando pelo vácuo pensante, alcança-se finalmente,   a sinarquia dos Espantalhos.
Vão dizer-me que a actual sumidade que preside às Finanças não sabia que o aumento de impostos era basicamente estúpido e conduziria fatalmente à diminuição da receita e à frustração do défice?!... Então, o país tem à frente dos negócios públicos um cromo polidiplomado e sobredotado (presumo) que percebe menos de economia do que eu (que entendo muito pouco)?...
Incompetência grosseira ou crime contumaz e premeditado? Mas o problema eram as importações que faziam disparar o défice? O problema é o Mega-estado a cavalo na Nacinha, já toda a gente sabe isso, mesmo as alforrecas do oceanário, mas é sobretudo a falta de genuíno mercado interno, isto é, de transacções internas - troca e fornecimento de bens, matérias e produtos nacionais para colmatar as necessidades nacionais. Isso é o essencial na economia de qualquer país; porque isso é que consolida o próprio país (como a ausência disso o transporta à dependência, à ruína, à corrupção e, cúmulo de tudo isso, à desagregação social).  Nacional não é nenhum palavrão: significa apenas, para estes efeitos comezinhos, menor exposição à dívida. Se nenhuma empresa funciona de portas abertas, porque raio há-de um país funcionar? E se um país não é o mais digno dos empreendimentos, então é o quê? - Um mero pretexto para contrair dívida e vociferar dislates, asnorreias e taras ideológicas?  Nós não temos que desatar a abastecer freneticamente não sei quem na Patagónia ou no Bangla-Sobe:  temos que começar por ter (ou recuperar) a higiene económica básica de nos abastecermos a nós próprios. Só depois de garantido o necessário é que nos podemos dar ao luxo de vender o supérfluo. A globalização não era apenas uma fatalidade: foi-o de facto e no sentido calamitoso do termo. Mas, no nosso caso, a globalização constituíu apenas o desenlace lógico da internacionalização que a nossa estúpida (e criminosa) entrada para a CEE (e pior ainda, para o Euro) encetou.  Ora, nunca a catástrofe constituiu bom alicerce para morada humana. E isso não se resolve com a destruição do que resta do aparelho produtivo e da rede de serviços indígena, a pretexto dum qualquer delírio tremendista orçamental. nem com a interrupção furiosa e animalesca do fluxo monetário interno. Todavia, os mesmos que davam vivas à globalização e à chinezice planetárias, e que celebravam a liquidação da autonomia com grandes urros tribais e hossanas ao Alá dos Mercados, babam-se agora em volúpia austeritária. Lá está, são os neo-comunas, os novos marchantes-linguareiros, no Neo-Prec. As quintas colunas à solta na destruição da realidade em nome dum qualquer amanhã, já nem chilreante, mas apenas gemebundo. Para eles, hoje e sempre, quanto pior, melhor. O culminar da bebedeira é a ressaca; e das revolucinhas a resignação e a sujeição decuplicada.
Mas voltam os desculpabilistas de plantão, a cavalo na retoricazinha de conveniência: Ah, não foi ele, o Gasparcoiso, não foram eles, coitados, estes montes de palha manhosamente eleitos que nos pastoreiam... Foi a Troika! A Troika é que é a culpada , não são os troika-tintas - os mandarinetes de vão-de-escada!... Então, mas chegam aqui uns tipos e decretam: "quereis drog..., digo, dinheiro, então pegai lá nesta pistola e dai um tiro nos miolos! Ou então tomai lá estes macetes e toca de quebrar as articulações, todinhas, à bela maneira dos suplícios legais do antanho!....Sim, porque o vosso foi um crime de regicídio - de atentado ao Deus Mercado na pessoa do seu representante  na Terra: o Rei-Finança!..."
Isto é aceitável? Pior, não só é aceitável, como devém imperativo categórico, desígnio nacional? Dinheiro a troco do suicídio colectivo!... A última coisa que um povo arruinado precisa é que a agressão estrangeira, sob a capa do resgate, seja, mais ainda que capitaneada, ampliada pela cumplicidade, a conivência e a insídia dos seus governantes. Há um nome muito concreto para isto: alta-traição, e merece justamente pena de morte.  Mas mesmo que um bando de castrados políticos supinamente traidores e placidamente velhacos o aceitasse, como é que todo um povo pode aceitar, resignar-se a ser levado para a nulidade existencial e conduzido, que nem gado bovino, ao matadouro da esperança?  Mas são os quê, estes auto-proclamados portugueses actuais: homens ou larvas?  
Dito com franqueza, nem é a pena deles que me transporta à indignação (e à insurrecção, não tarda muito): é o nojo!... Porque contra a ruína económica não é difícil combater e o trabalho, quando bem direccionado pelo ânimo, até resolve. Agora contra a ruína moral, contra a caquexia de alma e o império dos bandulhos roncantes, sinceramente, por mais que me me esforce, não vislumbro cura - apenas um preço bem mais alto que a estrita insolvência: a dissolvência.
Este beco não tem saída.





6 comentários:

fec disse...

andas pra aqui a bostar en vez de ir pastar para a manif

ganda manholas

Joao disse...

Muito bom.

Anónimo disse...

"In this report, we detail the events of the crisis. But a simple summary, as we see it, is useful at the outset. While the vulnerabilities that created the potential for crisis were years in the making, it was the collapse of the housing bubble—fueled by low interest rates, easy and available credit, scant regulation, and toxic mortgages— that was the spark that ignited a string of events, which led to a full-blown crisis in the fall of 2008. Trillions of dollars in risky mortgages had become embedded
throughout the financial system, as mortgage-related securities were packaged, repackaged, and sold to investors around the world. When the bubble burst, hundreds of billions of dollars in losses in mortgages and mortgage-related securities shook markets as well as financial institutions that had significant exposures to
those mortgages and had borrowed heavily against them. This happened not just in the United States but around the world. The losses were magnified by derivatives such as synthetic securities." in Final Report of the National Commission on the Causes of the Financial and Economic Crisis in the United States, Jan. 2011--- E agora cabem aos povos pelo Mundo fora pagar a crise. E os nossos governantes nem têm a coragem de dizer a causa desses sacrificios exigidos àqueles que nem têm culpa.

lusitânea disse...

Tem saída com uma à balanta:à catanada...

Anónimo disse...

Pré-globalização: tu produzes e compras o que é teu, um pouco podes exportar mas sem exagerar.

Mandamento globalista: enfraquecer os Estados no plano internacional e fortalecê-los no plano interno.
Dito de outro modo: desarmá-los contra seus inimigos e armá-los contra suas próprias populações.

Ser moderno/globalizado: uma minoria detém imensas fortunas em paraísos fiscais e poder de mando sobre o mundo político, judicial e econômico.

dragão disse...

Anónimo,

muito bem dito!...