terça-feira, setembro 18, 2012

Os Burrocratas da Sabedorreia (r)



A propósito duma curiosa pergunta feita por um leitor, e em complemento à resposta na caixa de comentários, faz todo o sentido recordar este postal de 2004. A surpresa está no fim...

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« -Ah, tu vens de Paris?! E não quedará mal perguntar em que é que os senhores estudantes de Paris levam o tempo? 

- Transcruzamos a Sequana ao dilúculo e aos crepúsculo; deambulamos pelas compitas e quadrívias da urbe; despumamos a verbocinação lacial e, como veros amorabundos, captamos a benevolência do omnijuiz, omniforme e omnigénio sexo feminino. Em certas diéculas, vamos aos lupanares e em êxtase venérica, inculcamos as uretras nos penitíssimos recessos vaginais das meretrículas amicabilíssimas. Depois, caponizamo-nos nas tascas meritórias, com espátulas vervecinas, perfumadas com salsis e hortelanus. E se nossas barjuletas carecem de metal ferruginoso, para pagar a conta contorum, deixamos as sebentas e as véstias de penhor, até que nos chegue a mesada dos penates e lares do nosso paternal. 
Arregalaram-se os olhos a Pantagruel:- Que raio de falar é este? És herético, pela certa!...» 
- Rabelais, “Pantagruel”. 

Já vai para quinhentos anos que Rabelais ridicularizou, justa e irremediavelmente, os sorbonículas, ou sejam, todos aqueles que mascaram a maior vulgaridade de espírito sob os rococós do paleio abstruso. E, não obstante, a praga continua, a epidemia não só alastrou como se multiplicou à enésima potência. Quem enche a boca a toda a hora com parangonas como “progresso” e “evolução” bem melhor será que repense a higiene da mesma. 



Oiçamos um jovem assistente universitário, pelo ano da graça de 1981, numa alocução ao “Colóquio Kant”, numa Universidade cá do burgo: 
«O debate em volta da concepção kantiana de história, e particularmente sobre a natureza e latitude do conceito de progresso, progride em uníssono com as próprias brechas causadas nos instrumentos de análise teórica do objecto histórico, pelo desenvolvimento frio e anónimo dos acontecimentos que consubstanciam o presente colectivo nas suas múltiplas dimensões, da economia à situação político-militar. Mas esse vértice de actualidade, com todos os seus convites à fuga para a frente ou à doutrinação da espera e do impasse, não ocupa todo o espaço de motivações capaz de explicar o interesse e a vivacidade polémica sugerida pelo estudo dos textos históricos de Kant.» Bla-bla-bla, e por aí fora. 



Perceberam? Naturalmente, não é para perceber. O estudante sorbonícula de Rabelais ocupava o seu tempo, como diz o povo, em putas e vinho-verde. O jovem estudante cá do burgo, recentemente promovido a assistente pelos idos de 81 (actualmente, está quase catedrático), mais valia que o fizesse, pois nem esse mérito social alcança: limita-se a um onanismo verborreico, malabarismo palavroso perante uma assembleia tribal de saltimbancos académicos. 
Não tenho dúvida que, assim como a religião tem sido estropiada pelos sacerdotes de todas as latitudes, também a filosofia tem sofrido as piores sevícias às garras dos escolastas de ontem, de hoje, e de sempre –universitários de toda a espécie. Lembram pirilampos armados em estrelas, fazem do papagaio o totem sagrado da tribo e praticam uma coscuvilhice de comadres mascarada de erudição rupestre. Colocar a sabedorreia no altar da sabedoria, esgota, de resto, as funções destes burrocratas do conceito. 
Ao fim de um quarto de século de repugnadas e perplexas observações, acho que, finalmente, me aproximei duma definição. 

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Pois bem, querem saber quem é o autor do textículo debitado no tal  Colóquio de Kant? Nem mais: o Viriato Soromenho Marques.

De índole idêntica aos depoimentos sorbonícolas anteriores - rilhafolesca, portanto -, e sempre que neles medito, só me ocorre um outro que guardei na memória desde a minha juventude (e guardarei por muitos anos que viva) . Constitui uma espécie de paradigma imortal. Servi-me até dele aqui há anos, para responder ao camarada Psiquiatra Proletário (um dos mais intrépidos e veneráveis leitores deste blogue, diga-se). Reza assim.
«Em nome do orgasmo, que é o centro secreto da libertação, temos de realizar uma operação específica - temos de destruir os nossos pobres cérebros envenenados, decapitando-nos a nós próprios, o que, finalmente, nos levará de volta a uma vida perdida - e, depois, para a frente.(...)
Temos de descobrir um ideal de orangotangos. (...) O orangotango é uma realidade permanentemente oculta dentro de nós. Temos de lançar para o mundo esse nosso interior oculto, através de um haraquiri existencial - e permanecermos vivos.»
O texto é de David Cooper. O termo "orgasmo" é, claramente, uma benevolência minha. Na realidade, a coisa nunca excede o nível da punheta. A grilos. Cada figurinha daquelas pensa-se, de facto & de jure, um novo Punheteu Agriloado. Ou abriloado, vá lá o diabo distingui-los.


2 comentários:

zazie disse...

Ah! que coisa louca e que grande macacão que me saíste

":O))))))

Eu caladinha que nem um rato, e tu a morderes a cena toda

FMS disse...

césar augusto em grande forma :D