«És tu o assassino que procuras.»
- Sófocles, "Rei Édipo"
Isto dos números tem que se lhe diga. Toda esta rapaziada que passa a vida a tocar pívias a estatísticas, a lambuzar-se de percentagens e défices, ou a salivar caninamente com gráficos, saldos e PIBs, esquece-se, por princípio, dum número muito significativo. Um número que representa o preço para toda essa idolatria deslavada da pseudo-matemática pim-pam-pum e da sacrossantíssima mecânica mercantil. Um número que identifica, no reverso dessa cabalística de merceeiros, as hordas de famintos, despejados e desesperados que esse nihilismo financeiro vem criando a uma escala verdadeiramente global, tanto quanto a uma velocidade uniformemente acelerada.
Acham que esse número é despiciendo? Entendem que esse factor é irrelevante? Fazem mal. Mas isso, convenhamos, não é novidade.
A pólvora acumula-se até ao dia em que encontra o rastilho e a faísca. Depois é quase instantâneo. Depois, o número irrelevante dá cabo de todos os outros números principescos. Os fantasmas sobem ao palácio. O caos vem cobrar direitos de autor.
Os antigos avisaram-nos para forças inexoráveis de equilíbrio cósmico. Deram-lhe até nomes poéticos como Nemésis, Athè ou simplesmente Justiça Divina. Precaveram-nos para realidades eternas como por exemplo que todo o acto tem consequências, e a hubris mais que qualquer outro. Se não vamos a bem, vamos a mal. Se a nossa vontade, em vez de coincidir, contende com a vontade cósmica, não será a nossa a prevalecer, nem risonha a correcção.
O que está a acontecer no Norte de África serve de ilustração. São negras as nuvens no horizonte. Denso o fumo que se levanta. Distingue-os - e avantaja-os - em comparação connosco, muito mais que detalhes de religião, o facto simples e sólido de disporem de hordas de jovens onde nós, cada vez mais, apenas alistamos manadas de velhos mais ou menos junkies da farmácia.
Quanto ao fanatismo deles, integra-se no tal jogo de equilíbrios cósmicos. Existe para compensar a nossa frivolidade, a nossa futilidade e a nossa superficialidade rompantes. Fossemos nós menos bacocos, e seguramente nos apareceriam eles menos fanáticos; fossemos nós menos ímpios e materialistas, e decerto mais amena se nos afiguraria a religião deles; fossemos nós menos pusilânimes menos poltrões e cagarolas, e de certeza que nos atormentariam menos suores frios, histerias frenéticas ou terrores nocturnos. Porque eles serão o nosso adversário cultural, ancestral e quase de estimação, mas não são, de todo, o nosso principal inimigo. Esse vive instalado e acoitado dentro de nós. E o problema é que já não se confina apenas aos intestinos: ascendeu ao cérebro... Barricou-se no cockpit e tomou os comandos.
As civilizações, como os organismos, bem mais que por fora, esboroam-se e aluem por dentro. Desenganem-se os patrulheiros sempreviçosos do bode expiatório. Não são os outros os principais autores da nossa ruína, lenta e anunciada: é a nossa amnésia, o nosso desleixo, a nossa impiedade albardada, à maneira dos fariseus, de tolerância, turismo benemérito e xenolatria dengosa - tudo isso apenas para camuflar uma rapacidade, uma ganância e uma hienossofia sem limites nem escrúpulos de qualquer espécie. Não é mais Aristóteles nem Jesus quem nos guia: são chusmas de sofistas e fariseus, a cavalo em megafones e cegarregas, numa algazarra tal que já clama ao autoclismo da galáxia. O sórdido espectáculo remete para a fórmula de Shakespeare, "vão cegos guiados por doidos perigosos". E nós lá vamos, à maneira dos lemmings, sempre muito cientes, severos e policiantes dos horrores do passado, mas absolutamente sonsos, carinhosos e papalvos para aqueles que nos oprimem e passevitam no presente.
O diagnóstico, pois, não é difícil: Tanto quanto dum veterinário competente, o Ocidente necessita dum exorcista.
E não é preciso ser bruxo, sequer encartado, para perceber que, a este ritmo, o futuro vai ser tudo, tudo e mais alguma coisa... menos pacífico.
As civilizações, como os organismos, bem mais que por fora, esboroam-se e aluem por dentro. Desenganem-se os patrulheiros sempreviçosos do bode expiatório. Não são os outros os principais autores da nossa ruína, lenta e anunciada: é a nossa amnésia, o nosso desleixo, a nossa impiedade albardada, à maneira dos fariseus, de tolerância, turismo benemérito e xenolatria dengosa - tudo isso apenas para camuflar uma rapacidade, uma ganância e uma hienossofia sem limites nem escrúpulos de qualquer espécie. Não é mais Aristóteles nem Jesus quem nos guia: são chusmas de sofistas e fariseus, a cavalo em megafones e cegarregas, numa algazarra tal que já clama ao autoclismo da galáxia. O sórdido espectáculo remete para a fórmula de Shakespeare, "vão cegos guiados por doidos perigosos". E nós lá vamos, à maneira dos lemmings, sempre muito cientes, severos e policiantes dos horrores do passado, mas absolutamente sonsos, carinhosos e papalvos para aqueles que nos oprimem e passevitam no presente.
O diagnóstico, pois, não é difícil: Tanto quanto dum veterinário competente, o Ocidente necessita dum exorcista.
E não é preciso ser bruxo, sequer encartado, para perceber que, a este ritmo, o futuro vai ser tudo, tudo e mais alguma coisa... menos pacífico.
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