quinta-feira, julho 08, 2004
A Brutidão Elitista
Segundo Helena Matos, essa diva dos pasquins, um bruto, ao emigrar, melhora. De bruto, passa a demiurgo, investe-se de poderes e musculaturas capazes de erigir impérios e grandes empresas.
Esta Lei Geral da Brutidão, claro está, assenta no Poder Miraculoso da Riqueza. O processo é simples e universal: o dinheiro funciona como pedra filosofal que, por alquimia esotérica, ao simples toque, transforma a merda original em ouro de trinta quilates. O bolso absorve e propaga-se à alma.
Assim, um bruto com dinheiro é melhor que um bruto sem dinheiro. Quem não estiver bem, mude-se, emigre; porque emigrar é melhorar. A Helena garante-o. De que é que os desempregados estão à espera? Pois...
Sob a má influência da realidade, poderíamos, não obstante, ponderar outra perspectiva: um bruto com dinheiro torna-se apenas pior que um bruto sem dinheiro. O alcance da sua brutidão amplifica-se, os contornos da sua estupidez platinam-se e transfiguram-se. Convence-se que não é bruto; sacode-se de toda a sua boçalidade encardida, escova-se, penteia-se, perfuma-se, até que, finalmente, de Lacoste e Rolex a dourar o sebo luzidio, persuade-se (e à Helena também), com imensa piada, de que é um génio (o único, aliás, ao cimo da terra; detentor duma genialidade exclusiva porque peregrina). O cúmulo dessa brutidão recauchutada é tomar-se de ares, de espaventos e ostentações, e passar a considerar-se superior, melhor que os brutos que não têm dinheiro. Que não lhe imitaram a audácia, que não partiram na odisseia de lavar retretes, ou servir trolhas por esse mundo a fora. Que não andam de Lacoste e Rolex, nem têm casas anedóticas com leões de pedra no frontespício ou piscinas rococós no quintal.
E o mais grave até nem é isso - esse folclore da incontinência materialista, esse arroto gratífico por alma da fome de outrora. Não, o pior é que se reproduzem. Proliferam. Desatam a multiplicar-se em filhos e netos. Até que devêm praga infestante, chusma ubíqua, claustrofóbica. E estes, por fim, para desgraça da paisagem, já não emigram: instalam-se, aboletam-se, usufruem, vão prá Universidade. E até tomam banho. Daí aos jornais, às artes, às literaturas e a todas as passerelles que por aí houver é um pulo. Não custa nada. A Helena sabe disso. Basta vê-la desfilar.
Escusava era de dar tiros no pé. Afinal, na maior parte do tempo, a esta brutidão recauchutada, reciclada e diplomada até chamam elites.
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2 comentários:
Fónix ( ou antes, foda-se)! Esta escrita rebarbativa não tem lugar em jornais. Mas podia ser lida com proveito nas redacções.
Há poucos cronistas que me dão gozo a ler. Um deles, ultimamente, tem sido o JPP. Não pelo estilo que é pobre e simplório, às vezes até com erros ortográficos que se escaparam ao revisor, mas pelo tema.
Ultimamente o tema é a sociologia de pacotilha. A análise do populismo, a análise das tendências políticas da plebe e hoje, um retrato de um casal suburbano.
Vale a pena ler e meditar nas razões pelas quais o JPP não gosta daqueles que foram sempre as bases populares que o foram elegendo para os cargos que tem ocupado.
Só falo nisto porque ninguém dá pontapés em cães mortos...
O JPP, precisamente, é um desses brutos armados ao pingarelho. Tudo nele soa a falso, fariseu, balofo. A figura empanzinada, sapuda e adiposa reflecte a alminha.
Mas não tenho pachorra para ler o que o cromo escreve. Para esse peditório, já dei.
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