Na altura, eu não estava no activo, mas mesmo que estivesse a verdade é que não me apercebi da pérola que se segue, nem, tão pouco, acompanhei a polemicazinha. E é uma coisa de estalo. Que passarei já a explicar porquê...
De Jesus Cristo, por quem nutre um indisfarçável apreço, Nietzsche tem uma curiosa definição: "foi o primeiro e o último cristão." Havemos de concordar que Nietzsche é uma personagem insuspeita, sobretudo de qualquer cumplicidade com a Igreja católica. A sua, algo redutora, tese é conhecida: o Cristianismo não é uma coisa de Jesus, é uma coisa de Paulo. Ora, isto, não sendo totalmente falso, também não é totalmente verdadeiro. Mas é o que é e vale o que vale.
Desçamos agora da estratosfera à esterqueira da esquina. No seu nível inferior, para ser mais preciso. Perguntava, lá pelos outubros idos, o besta-seller José Rodrigues dos Santos acerca de não sei que palúrdice estrepitosa que lhe titilava a fossa entre-orelhas:
«A Igreja nega ou não nega que Jesus era judeu - e, consequentemente, que Cristo não era cristão?»
Há duas coisas (fora a matemática) que no ser humano, nos mais sofisticados exemplares, conseguem raiar o infinito: a estupidez e a ganância. No presente caso não errarei muito se disser que estamos perante um cocktail explosivo de ambas. Isto devia ser afixado e reavivado todos os dias. Deviam esfregar-lhe o focinho neste despejo e ministrar-lhe sovas de rolo de jornal todas as manhãs. A sério. Estou habituado à contemplação heróica dos maiores monumentos da cretinice do nosso tempo. Mas até eu, confesso, quando li isto, deixei cair o queixo. Tinha este personagem na categoria dos montes de merda. Afinal, pequei: por nítida escassez. É uma serra, uma cordilheira alpina, uma austrália completa!
Os da Igreja, com algum humor comiserado, como lhes compete, acusaram-no de estar, com enorme espavento, a tentar arrombar uma porta aberta. Mais rigoroso teria sido acusarem-no de estar a tentar, aos bramidos, engravidar uma nuvem. Sem entender sequer que a sua putativa e putanhosa polémica (questiúncula, melhor dizendo) nem sequer era com a Igreja: era com Nietzsche.
PS: Para os confusos, liberais e incultos dos costume, convém que eu lavre aqui um esclarecimento póstumo: neste postal não existe qualquer ataque ad persona ( a pessoa do Rodrigues dos Santos é uma contradição em termos). Existe, sim, um ataque ad hominem: na medida em que cataloguei o coleóptro Rodrigues dos Santos na espécie humana, injuriei a espécie. Quer dizer, ofendi todos os homens.
Legenda da imagem: "Para o escaravelho-do-estrume, as fezes são o seu sustento, o seu trabalho e o seu ninho."
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