Estou perfeitamente consciente dos tremendos riscos que corro, mas optei por não emigrar apressadamente. Com o Rato Mickey e o Pateta não se brinca, eu sei; pelo que agora, à cautela, falarei a sério. E se um resquício de coragem suicida não bastasse, um assombroso e piramidal evento que não posso deixar incólume compelir-me-ia. Há assomos epopeicos, leitores, que não podem deixar de ser registados, celebrados e proclamados para memória dos vindouros e, sobretudo, das vindouras.
Este, que aqui me convoca, é o que vou narrar já de seguida. Pois bem, já todos sabíamos que o (nas palavras eloquentes duma das suas referências intelectuais, uma tal Ermelinda do Padeiro) doutor economista Arroja, code name Rato Mickey, se arvorava, nas horas vagas, em sociólogo de elevadíssima craveira. Mas agora, num acesso desbordante de erudição polissaturada, tomamos conhecimento que, afinal, também é um ás na sexologia. Terá fundo este poço de sabedorreia? Sinceramente, começo a duvidar dessa contingência. Eu e centenas de milhares de deslumbrados como eu. Neste momento já se organizam excursões e romarias das quatro partes do mundo para virem assistir, in louco, ao prodígio. O caso não é para menos. Acaba de inventar, aquele portentoso sabão, um novo método de medição da virilidade masculina em ambiente doméstico. Este espantoso, engenhoso e revolucionário método, que deixará certamente a espumar de inveja o sexólogo residente da blogosfera (um tal Morcão Vaz), consiste, nem mais nem menos, pasmemos ó conterrâneos, na contagem de palavras emitidas na rede, mais especificamente em blogues. Quanto mais palavras assim derramadas, menos espermatozóides despejados por via de fornicadelas à coelho na legítima. Coelho missionário, naturalmente, nada de fantasias ou acrobacias menos devotas. Ou resfolegantes.
Formidável!, ovacionamos nós; se o sexólogo moviflor (zazie dixit) já era um must, este, então, é um mister! Para o distinguirmos do outro, atenderemos à diferença geográfica e mobiliária do palestrante, pelo que o cognominaremos como sexólogo-de-penico (até porque depenica que se farta). Recapitulando, então, a lei fundamental da sexologia depeniqueira: a fornicação matrimonial é inversamente proporcional ao número de palavras escritas no blogue. Escritas, na terminologia arcaica e doravante cancelada; pois na nova terminologia científica, deve dizer-se "ejaculadas". Afinal, ficamos agora a saber, as pessoas não escrevem em blogues: ejaculam palavras. Freud teve soluços na cova.
Detalhe superlativo em toda esta história, que muito me desvanece: o distinto sexólogo-de-penico honra-me com a glória de cobaia principal no seu devassante estudo. Serei assim, segundo ele e as suas apuradas - embora instantâneas e mediúnicas - esporrometrias, um frouxo na cama, porque, lá está, sou um dilúvio no blogue. Se ejaculo a mais na rede é porque ejaculo a menos no leito conjugal, já não falando no sofá, na banheira e no tapete da sala. Caros amigos, é assim, não há como escapar a tão mosaica legislação.
Bem, por um lado, fico banzado com a perspicácia deste vidente-voyeur. Consegue espreitar do Porto até Lisboa, ida e volta, mais depressa que o futuro TGV. O que não nos deve, afinal de contas, surpreender: ele até conseguiu espreitar através dos séculos, descobrindo Hume em actos menos másculos e larilices clandestinas. Por outro lado, competições de garganta nunca foi o meu forte. Certame de garnizé é coisa de galináceos e pior que léria de puta só mesmo goela de puto. Mas quem sou eu para contradizer a ciência, ainda mais quando esguicha dum sexólogo-de-penico? Nem por sombras. Já não seria pecado: seria blasfémia. Seja, então. Cumpra-se a lei. Superpotente no teclado, erecto-disfuncional no resto - eis-me exposto ao vexame do transeunte galaró.
Só que, entretanto, alguns impertinentes claramente necessitados de pimenta na língua, poderão maldosamente conjecturar que, fazendo fé nos últimos dois anos, período em que é possível uma comparação directa, o doutor economista Arroja despejou na blogosfera, e isto a contar por baixo, cerca de dez vezes mais palavras do que eu. Uma verdadeira torrente ao lado dum regato. O que, segundo a sua metodologia imaculada, fará dele, fatalmente, um gay passivo coroado com ramificações de veado exuberante. Outros meliantes, igualmente dados a analogias venenosas, se bem que mais optimistas, poderiam ainda orçamentar que, embora ele, quantitativamente, tivesse ejaculado dez vezes mais, dado que cada palavra dele, qualitativamente, não alcança um décimo das minhas (acrescido que considerável parte delas até tinha sido ejaculada numa língua canina) então, mais coisa menos coisa, resultava num empate técnico, pelo que o ilustre sábio irmanava comigo na incompetência conjugal e na flacidez reiterada da gaita (apenas com a ressalva que enquanto eu, às mulheres, submergiria de poemas e galanteios literários, ele, em contrapartida, cobriria de queixumes, remoques e lamúrias). Uns terceiros energúmenos, da raça dos anteriores, alavancados por esta relação íntima e necessária entre a produção de postais e a improdutividade de bebés, poderiam também insinuar, soturnamente, que o doutor economista Arroja, code name Mickey Mouse, compensava a mediocridade na escrita com a excelência na queca legal. Aqui, na blogopólis, por conseguinte, era um franguinho mimoso e birrento que fazia beicinho quando lhe puxavam merecidamente as orelhas, mas, em compensação, lá na capoeira doméstica, virava galo doido encartado. Enfim, uma catadupa de assombrações e pântanos colaterais que nunca mais acabariam e eu, por piedade e amor à decência, me contenho de elencar além deste promontório.
É meu dever afastar esses rumores e esclarecer todas essas pessoas propensas ao torpe equívoco e à vil suspeita.
Assim, ó pessoas desabridas, se é um facto que o bom doutor economista sociólogo e sexólogo-de-penico Arroja ejaculou dez vezes mais palavras o que eu, isso não é, em bom rigor, comparável. Nem em bom, nem em mau. Não é, pronto. Muito menos com essa ligeireza.
Em primeiro lugar, porque a cobaia sou eu e o cientista é ele. Logo, usufruímos de prerrogativas diferentes e apanágios opostos. Quem chega primeiro, escolhe. Ele chegou primeiro, repimpou-se na cadeira e ficou com a bata e o laboratório. Não há que barafustar.
Em segundo lugar, sabemos de ciência certa e dogma associado que ele é, sem qualquer dúvida ou direito a ela, um jockey fogoso e exemplar (às vezes até maçador) da esposa por via duma prova irrefutável muito simples: porque ele no-lo diz e, assim, automaticamente, com força de sentença, certifica, autentica e atesta. As suas palavras, como toda a gente sabe, possuem dom mágico e dotes demiúrgicos instantâneos. Basta adicionar água e já está.
Finalmente, e nec plus ultra, porque as ejaculações dele, como é público e notório, se distinguem abissalmente das minhas - quer quanto ao órgão emissor, quer quanto à cor, teor e aroma. Na verdade, as dele, ao contrário das minhas, em nada taxam ou diminuem o caudal inerente à fornicação doméstica, por isso não estão sujeitas à lei funesta. A razão é óbvia e simples (como, de resto, qualquer pessoa minimamente imparcial e atenta pode testemunhar com facilidade): enquanto eu ejaculo pelo pénis (desviando-o e exaurindo-o de outras funções naturais), ele,- como é sobremaneira gritante nestes últimos dias, muito poupadinho e agiota das suas sementes -, ejacula pelo rabo. Ou seja, a mim, a escrita, mana-me dos testículos, obriga-me a testosterona; a ele jorra-lhe dos intestinos, compelem-no as fressuras.
Resumindo, aqui assam-no. Mas lá em casa, nem duvidem: desforra-se e assa ele as vrilhas à pobre da costela.
PS: Parto do princípio que o ilustre doutor não é dado a coprofilias - ou melhor, se à tara de as exibir, às fezadas, não junta a bizarria de as ingerir. O que, a ocorrer, temo bem, arruínaria irremediavelmente este meu terceiro e límpido raciocínio.
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