sábado, fevereiro 10, 2007

Voltas ao bilhar grande

«O Estado deve tomar resolutamente na sua mão os comandos da vida económica para a nortear, para a impulsionar, para a disciplinar. Mas não para a entorpecer. E sabemos como é grande o risco desse entorpecimento quando as estruturas se anquilosam na rigidez do estatuto legal e as funções se cumprem ao ritmo da burocracia.
É por isso que defendo um Estado social - mas não socialista. Social na medida em que coloque o interesse de todos acima dos interesses dos grupos, das classes ou dos indivíduos. Social por fazer prevalecer esse interesse mediante a autoridade que assenta na razão colectiva. Social enquanto procura promover o acesso das camadas deprimidas da população aos benefícios da vida moderna e proteger aqueles que nas relações do trabalho possam considerar-se em situação de fraqueza. Mas não socialista, pois se pretende conservar, dignificar, estimular até a iniciativa privada e animar as empresas a fazer aquilo que o Estado nunca poderia realizar sòzinho.

Creio, meus senhores, que estamos de acordo. Como estamos de acordo em que a administração cultive cada vez mais o espírito de serviço público, isto é, a ideia de que existe para servir o público como instrumento de realização do bem comum.»

- Marcelo Caetano, in "Discurso na Câmara Municipal do Porto, em 21 de Maio de 1969


«Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na sua transformação numa sociedade sem classes.»
- Artigo 1º da Constituição da República Portuguesa, de 1976.
(Este artigo foi aprovado com 132 votos a favor e 80 votos contra -os do grupo parlamentar do PPD).

«A República portuguesa é um estado democrático, baseado na soberania popular, no respeito e na garantia dos direitos e liberdades fundamentais e no pluralismo de expressão e organização poliítica democráticas, que tem por objectivo assegurar a transição para o socialismo mediante a criação de condições para o exercício democrático do poder pelas classes trabalhadoras.»
- Artigo 2º da mesma Constituição (aprovado com 32 abstenções, curiosamente, as do PCP e do CDS).

1 comentário:

Erecteu disse...

Até pensei que estavas a fazer a apologia do soocial-nacionalismo. Não reconheci as palavras do Prof. Dr. Marcelo.

Quanto aos artigos 1º e 2º da constitição de 76:
- 80 parlamentares batiam-se pela sociedade de classes
- 32 e duas abstenções que não coincidiam necessariamente nas razões. Umas seriam a favor da " criação de condições para o exercício 'AUTOCRÁTICO' do poder pelas classes trabalhadoras.»?; os restantes pela negação do poder democrático das classes trabalhadoras?

OU VOTARAM EM CONFORMIDADE COM O §1º "sociedade sem classes"?

Desde cedo que a prática e o discurso tinham a ambiguidade dos que os proferiam, não É?

Já se esqueceram de quem assegurou "a transição para o socialismo" usando uma gaveta?