Considero execrável qualquer tipo de tirania. Exceptuando talvez uma monarquia, tão absoluta quão esclarecida, onde eu próprio desempenhasse o papel de soberano. Não tenho qualquer dúvida que o país –este coio de invertebrados e imbecis que, por artes de licenciatura, se julgam automáticamente metamorfoseados em semi-deuses –, lucraria imenso com isso. O Marquês de Pombal, estou certo, roer-se-ia de inveja lá no Além. Mas, horror incontornável, não me sobraria tempo para escrever este mirabolante blogue. Por isso, tirem o cavalinho da chuva, escusam de vir com falinhas mansas, que eu não aceito o frete. Oprimir-vos como vocês merecem seria fraca consolação para eu renunciar à minha tranquilidade, ao meu dourado eremitério. A abdicar do meu alegre anonimato, antes prefiro abdicar do trono, antes mesmo de me refastelar nele. A não ser que me deixassem governar e tiranizar anonimamente. Bem, aí talvez reconsiderasse. Já me estou até a ver, registado para a História – laureado de tenebrosas iluminuras, pai de vários impérios – como Dragão, o Anónimo. Não vejo onde é que está o espanto ou a bizarria. Se as empresas podem ser Anónimas, e toda a gente aplaude e se ri muito, porque é que os tiranos, ainda para mais esclarecidos, não podem? Deus seria o vosso Pai no Céu e eu seria o vosso rei algures. Um Mundo quase perfeito.
Senão, vejamos: Que importa o talhe das minhas fuças para o bom ou mau governo da nação?Que tendes vós, meus súbditos irrelevantes, a ver com a maneira como eu me visto, com os filhos que faço, as donzelas que frequente ou as praias donde emito as minhas sábias directivas? Porque hei-de servir eu de objecto desgraçado à vossa sórdida e atávica coscuvilhice, ou motivo predilecto da mais nojenta bufaria? E se eu quiser ir às putas? E se me apetecer embebedar-me, andar à porrada, ou armar sarrafuscas? E porque não hei-de eu partir a tromba aos ministros incompetentes ou aos directores corruptos, em paz e sossego, sem jornalistas a azucrinar-me a paciência e a puta da opinião pública armada em sonsa?! Que tendes vós a ver com isso e com tudo? Porque carga de água me competiria aturar o vosso voyeurismo ranhoso? Para que me interessam as vossas opiniõezinhas, essas excrescências babosas do vosso ego, e as projecções que dele fazeis na pessoa dos outros? Quanto aos palácios, limusines e protocolos, mais os salamaleques e mesuras, a mim e a toda a minha família, passamos bem sem eles. Muito bem mesmo. Quando quisermos ver hienas e chacais vamos ao Jardim Zoológico. De resto, a última coisa que me ocorreria era ir capitanear o vosso Jet-Set, essa quintessência da vossa velhacaria e coirice impenitente. Só de me lembrar dessa corja de larvas sociais até consigo pensar no Pol Phot com alguma ternura.
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