domingo, abril 12, 2015

Acromiomancia revisitada - XVI. Puros contra Espúrios




«Mas o governo aqui tem uma culpa gravíssima, uma responsabilidade histórica: a de não ter substituído a tempo o general Vassalo e Silva, reconhecendo que não estava à altura dos seus antepassados, um Albuquerque, um D.João de Castro (...) O ministério do Ultramar devia ter visto isso, e o ministério do Exército devia ter avisado o Ultramar. Com meses de antecedência soubemos que ia Goa ser invadida. Tivemos imenso tempo para substituir aquele homem, e mandar para Goa alguém que soubesse bater-se e morrer se necessário. Assim foi uma desgraça, e o Vassalo e Silva cometeu um crime histórico. Quando mandei o telegrama impondo o sacrifício supremo, pensei que me dirigia a um homem da estirpe dos antigos. Mas não, era um simples, um tipo que gostava de passar a vida a indicar como se faziam telhados.(...) Mas que quer o senhor? A Defesa escolhe os nossos guerreiros pela escala de antiguidade, como se fazer a guerra fosse uma simples actividade burocrática ou académica! Assim nada feito. E eu estou convencido de que se as nossas tropas tivesses resistido oito ou dez dias, ainda hoje tínhamos Goa.»
- A.O. Salazar (a Franco Nogueira, em 13 de Abril de 1968)

A verdade é que Salazar não estava a fazer apenas um diagnóstico para a queda do Ultramar passado, mas a enunciar também um prognóstico para o colapso do Ultramar futuro. O mesmo espírito burocrático, funcioneiro e "académico" haveria de ocasionar o descalabro geral meia dúzia de anos adiante.

Surpeendemo-lo, na sua génese, em pleno outono de 1973...

Após os decretos 353/73 e 409/73, a oficialagem do Quadro Permanente começa a comichar-se.  Do múrmurio, rapidamente passa-se à rosnadela sindicativa, traduzida na emissão de papéis indignados perante as instâncias superiores. Note-se que não se trata de ruído meramente conspirativo, mas de protestos abertos cujo intuito é dar notícia ao Estado-Maior e, sobretudo, ao governo. Em Outubro de 1973, o "Projecto de Refutação da Circular Nº 490/S de 14 de Setembro da Repartição de Oficiais", refere, entre outras pérolas reivindicativas:

«Pague-se aos capitães que arriscam a vida para que sigam para a frente os projectos de Cabora Bassa ou a exploração das minas da Diamang AO MENOS METADE do que ganha um engenheiro dessas obras ou minas (...) utópico é querer galinha gorda por pouco dinheiro...

(...)

O País está a sacrificar os seus militares, mas não os seus advogados, os seus banqueiros, os seus engenheiros, os seus industriais, etc. Porquê e com base em que sistema de moral este sacrifício exclusivo de um grupo profissional de cidadãos?»


Ao ler isto, comecei por embarcar na lógica da coisa. Mas depois, ao tentar ajustar a justiça à lógica, a peça não batia com o molde. Então um militar, ainda mais em tempo de guerra, era um funcionário público equiparável aos outros? Sendo que, para cúmulo, fazia-se até uma equiparação a profissionais que, na grande maioria, nem sequer eram funcionários públicos, mas privados. Bem, se queriam ganhar como os engenheiros, tinham bom remédio: saíam da tropa, matriculavam-se no Técnico e, concluído o curso, candidatavam-se a um emprego mais bem pago. Juntavam o útil ao agradável: ganhavam mais e arriscavam menos.Aliás, ainda hoje é assim que fazem os pilotos da força aérea, quando a gula mercenária os invade: saem da aviação militar e vão trabalhar para a aviação civil.
Subitamente, acode-me até à mente aquela frase perturbadora do sono nas aulas de Ética doutros tempos: "Um homem não é uma puta". E um guerreiro a discutir tarifas, não só emula a rameira, como descamba em mercenário. Há qualquer coisa de obsceno neste tipo de reinvindicação. É como um padre a reclamar à Igreja por não usufruir de esposa e amantes como qualquer gerente comercial...
Entretanto, estes mesmos oficiais dispunham de termos de comparação dentro da sua própria instituição, que, bem vistas as coisas, poderiam queixar-se em relação a eles do mesmo, ou pior, que eles se lastimavam em relação a engenheiros, advogados, financeiros e etc. De facto, os oficiais milicianos, auferiam de muito menos privilégios e arriscavam muito mais, pois a maior parte das acções de combate, como está hoje demonstrado, era desempenhada por eles. 
Ora, isso mesmo, preto no branco, apareceu um belo dia manifesto num documento que circulou nas  fileiras, entre 24 e 28 de Novembro de 1973...

                Camarada Oficial Miliciano

1. Já viste quantos oficiais do Q.P. estão contigo na guerra, mas na guerra de facto: no DURO, nas MATAS, nas PICADAS?
 Conta-os e faz a percentagem em referência aos oficiais milicianos.
Se não tiveres dados pergunta aos teus amigos que por lá se batem.
2. Já pensaste que te são exigidas as mesmas responsabilidades enquanto estás nas fileiras?... Sujeiro ao RDM, Código de Justiça Militar, ect, etc?
3. Já te apercebeste, no entanto, que não tens a totalidade dos direitos dos oficiais do Q.P? Que és considerado, apenas, como um adventício inoportuno mas necessário que é necessário explorar para os outros folgarem mais e treparem?
4. Mas não é tudo camarada miliciano.
Se acaso sentires vocação para continuar nas fileiras e desejares ingresar na Academia Militar, ainda que sejas louvado e condecorado como um oficial extraordinário, sabes qual a reacção de grande parte dos oficiais do QP?
Nós esclarecemos-te, que estamos cá dentro e somos do Q.P. oriundos de milicianos:
  a) O que aprendeste como miliciano não conta. Só serviu para irers para a guerra e colocares-te na alçada do RDM e CJM.
b) O ponto de referência para a tua antiguidade é apenas a data de saída da Academia.
c) Podes já ser capitão, tenente ou alferes com vários anos de serviço. Entras, contudo, na Academia e ficas à esquerda de rapazes que têm apenas o sétimo ano liceal e nem sequer sabem se têm vocação militar.
(...)
6. Sabes que saíram dos Decretos ainda não executados, dos quais um,  ajustando o primeiro, pretende que seja contado como prestdo no Q.P. para efeitos de antiguidade, o tempo de serviço efectivo de miliciano?
7. Sabes que uma parte dos oficiais do Q.P. imediatamente se insurgiu quanto à sua execução ainda que os mesmos venham a ser ajustados, para não haver prejuízos?...
8. Sabes que querem a derrogação total dos mesmos porque pensam que se vieres para a Academia te será contada a antiguidade de miliciano?
9. Sabes que para arranjarem partidários derivaram para motivações que nada têm que a ver com esta parte dos Decretos no que se refere a antiguidades?
Quer referindo que o oficial ganha pouco, que não tem prestígio, que a guerra é para todos, que um novo curso da Academia Militar a ser criado é desprestigiante, etc, etc, o que pretendem, na essência, é que te seja negado agora esse direito de antiguidade de miliciano.
10. Já pensaste que nunca reagiram ao ganhar pouco, ou a outros requisitos importantes, senão quando saiu um Decreto que te reconhece valor como miliciano
11. Sabes o que circula nos bastidores?... Que alguns oficiais do Q.P. oriundos de cadetes pensava engavetar os outros oficiais do Q.P. e milicianos que não pensassem como eles para pressionarem depois o governo com vista a te não ser dado o direito de que falei.
12. Sabes que um comandante pensava, num fim de semana, mandar-te para casa e ficar com outros oficiais para tentar fazer um pronunciamento militar?...
Conquanto tenhamos dúvidas que o conseguisse  porquanto as unidades só quase têm sargentos e oficiais milicianos, vê tu a que ponto vai o maquiavelismo!...»

Os dois trechos acima, estou em crer, são extremamente elucidativos, e o segundo, em boa medida, ajuda a esclarecer o primeiro.
Ressalta, logo à partida, uma circunstância fundamental para o entendimento do que se seguiria: a grande heterogeneidade nas Forças Armada (especialmente no Exército). Esta heterogeneidade constituía um dos grandes perigos (e, em bom rigor, aquele donde germinou a dinâmica do futuro golpe) de fragmentação, convulsão e clima de rixa doméstica nas próprias fileiras. Ora, um exército numa guerra (ainda por cima contra-subversiva, ou seja, uma guerra interna, que se processa dentro das fronteiras do território nacional) que, a certa altura, entre em guerra civil consigo mesmo, resulta, invariavelmente, em desastre. O que, de resto, embora assertivo e verdadeiro, não deixa de ser anedótico por paradoxal:  miliatres que se envolvem em guerra civil.
Por outro lado, a questão da mentalidade dominante entre os militares - precisamente aquela descrita por Salazar na citação em epígrafe... É mais que evidente que estava longe de ser a ideal: O espírito de funcionarite aconchegada sobrepunha-se, despoticamente, ao espírito de missão ou à vocação guerreira. Aliás, para os militares profissionais, produto do aviário académico,  na sua grande maioria, a guerra era uma chatice, uma carga de trabalhos e, se em tempo de paz o ordenado era jeitoso e o ripanço garantido, já em teatro de guerra, não compensava, nem direi tanto o risco, mas o sobressalto familiar e o incómodo das deslocações. Tratando-se, ainda para cúmulo, duma guerra que, por sua natureza, seria sempre uma guerra prolongada, o enfado e o desconforto tornavam-se crescentes, senão mesmo insuportáveis.
Está bem que de tenente para cima, exceptuando as tropas especiais, os oficiais já não padeciam tantas agruras no mato (nas especiais, os capitães também iam, em se tratando de operações do nível de Companhia). Mas, mesmo assim, era muito duro para as esposas, de pele sensível e tremela fogosa.. Havia demasiados mosquitos (algumas chegavam a apanhar malária), baratas exorbitantes e um calor gorduroso, enquanto penavam pasmaceiras tropicais, longe do esplendor  socialite da Lisboa cosmopolita em desabroche pantalhoso . Nada que se comparasse, por exemplo, às comissões de serviço nos Estados Unidos (para afazeres da NATO) ou os adidos militares das capitais europeias (aí sim, que vida!...)
Teria sido possível desarmadilhar estes problemas?
O facto é que o país não dispunha de orçamento que permitisse pagar grandes salários à função pública (o contrário disso vimo-lo depois e gerou três bancarrotas). Apesar de tudo, a classe militar usufruía de alguns privilégios específicos. Os milicianos, por seu turno, funcionaram como ovo de Colombo para garantir uma "guerra barata". Eram uma espécie de precários avant-la-lettre: cumpriam todos os deveres, mas com menos direitos, garantias e encargos  para a Fazenda. Se pensarmos que os oficiais mais condecorados do exército português (e não estou a falar apenas de Cruzes de Guerra de 1ª classe, mas de Torre Espadas) foram, na maior parte, oficiais milicianos, por feitos em combate (o Marcelino da Mata, que é o mais condecorado de todos, além de miliciano, é preto retinto),  teremos que concordar que não foi por falta de eficácia ou carência de mão de obra que desbaratámos o empreendimento
Porém, numa classe de oficiais que se dividia, por sua vez, em três categorias distintas - os do Quadro Permanente, os do Quadro Especial e os do Quadro Complementar -, as tensões estavam sempre lá, latentes. O prolongar da guerra traria sempre desgaste, erosão, tendência para que o latente sobreviesse à superfície. Faltava apenas a ignição, para que o processo combustivo se desencadeasse.  O facto do 25 de Abril ter sido orquestrado, confeccionado e perpetrado na Metrópole, no espaço de menos de uma ano, diz tudo daqueles que o consumaram. Não foram companhias ou batalhões operacionais: foram escolas práticas, de fedelhos que mal sabiam ainda usar as armas, enquadrados por ressabiados corporativos, excitados por  alucinados ideológicos,  - adolescentes inveterados e perpétuos todos eles! -, que vieram, mais como necrófagos oportunistas do que como soldados, ao odor dum governo finado por morte anímica do seu líder principal.
Significa também que a moda da reforma por decreto (que se tornaria posteriormente endémica até aos dias de hoje), iniciava a sua saga trágica. E catastrófica. Sendo, em larga medida, justa, a lei (a tal 353/73) atentava todavia contra a regra instalada. Ora, ao contrário da regra que, por longa sedimentação,  tende a conciliar e amortecer tensões, a lei, pela violência da sua própria imposição súbita,  provoca roturas e desiquilíbrios que, no vertente caso e no fim do dia, acarretaram nenhum bem. Acabando com a guerra, os puros acabaram, providencialmente, com todas as veleidades dos espúrios. Mais concretamente ainda: de modo a desmantelar o espírito guerreiro que ameaçava o seu empório exclusivo e a sua mordomia soberana, o activismo académico/burocrático (na terminologia do próprio Salazar), acabou com a guerra. E descolonizou quase instantaneamente, por via das dúvidas ou remorsos.
Tendo ateado inadvertidamente o fogo, sabendo que a seara estava a arder, porque é que o regime não tomou medidas?
Seriam possíceis medidas eficazes, depois de accionada a engrenagem amotinadeira?
Escutemos um dos oficiais do MFA, desde a primeira hora (embora não-comunista nem socialista), Sanches Osório:
«Dadas estas circunstâncias [depois da Intentona das Caldas], o governo deu ordens para se constituir uma comissão dentro do Estado Maior do Exército a fim de refazer os planos de defesa no caso de uma revolta militar.» (in, O Equívoco do 25 de Abril, pp 36)

Pois, caros leitores, o governo nomeou uma Comissão... Onde é que eu já vi isto? Lembra-vos alguma coisa, tempo, ou regime?  Seria, quiçá, uma Comissão para combater a comichão dos Puros mais exaltados e lexofóbicos. Seria este expediente operativo o mais indicado para resolver certos fenómenos de superlativa gravidade, como seja uma ameaça séria à propria sobrevivência do governo?  Sanches Osório, logo de seguida, não é particularmente animador:
«Pela presença do Ten. Cor. Costa Brás na Comissão e pelo facto de eu e o Major Vitor Alves trabalharmos no Estado Maior, havia perfeito conhecimento dos planos do governo.» (idem)
 E quanto a uma das fórmulas possíveis para contrariar o tal MFA em curso, parece que não requeria qualquer lirismo, esoterismo ou especial carga quixotesca (como julgo que, desde logo, me seria rosnado, caso eu apresentasse alguma ideia, das várias que, tecnicamente e por estudo profissional, conheço). 
«Todas aquelas comissões e reuniões [do MFA] começaram a gastar tempo demais pelo que, a certa altura, um grupo de oficiais no qual eu me incluía começou a insistir para actuarmos rapidamente antes que o Governo desmantelasse o Movimento, o que lhe teria sido extremamente fácil. Um simples problema burocrático de transferências e trocas de oficiais para locais distantes teria desorganizado todos os contactos.» (ibidem, pp29)

Pois, vêem? Tinha sido até simples. Mandá-los por exemplo para os Estados Unidos, tirarem cursos na Nato; ou para adidos na Europa, Austrália ou Cochichina... Mandá-los, enfim, para o estrangeiro, o mais longe possível, já que remetê-los à matriz materna, embora justo, seria impraticável.

Deus teve piedade de Salazar. Poupou-o de assistir ao 25 de Abril. Entendeu, lá no Seu Soberano critério, que um Vassalo e Silva já lhe tinha sido penitência bastante. E, curiosamente, ou nem tanto, Salazar concordava comigo (ou eu aprendi onde ele aprendeu), que, a limite, tudo dependia do homem que estava à frente da coisa. Porque sobretudo diante do mostrengo, que a própria alma teme, manda a vontade que ata ao leme. É que o exemplo vem de Cima.... Não depende todo o universo apenas de Um?..


PS: Aquela expressão de Salazar "a estirpe dos antigos" não faz muito sentido (nenhum, aliás) para certa gente de hoje. Para Salazar fazia. Por uma razão muito simples: era a estirpe dele. 

21 comentários:

Bic Laranja disse...

Estupendo!

Bic Laranja disse...

Tristemente.

Anónimo disse...

É formidável poder ler o que escreve sobre este tema.
Em parte nenhuma se escreve assim. Infelizmente a História recente é proibida aos portugueses. Atira-se com fascismo para cima e é tudo.
A censura é feroz.

josé disse...

Já temos aqui outra variação do sonho do género "i have a dream!"...que é a "estirpe dos antigos" de que Salazar faria supostamente parte...

Esoterismo outra vez. Vamos lá a ver se consigo entender estes "antigos" porque é assunto que me interessa também. Vou estudar.

Salazar era então do grupo restrito " dos antigos", daqueles que se finaram algures no tempo que afinal conta para muito pouco.


Marcello Caetano, coitado, não teve a sorte em dispor dessas vantagens hereditárias da "estirpe dos antigos", pedigree insuflável por via de unção misteriosa e foi por isso que se finou em morte lenta e anímica.

La vou eu procurar mais recortes e dar que fazer ao meu pobre escravo agarrado à usb.

lusitânea disse...

Lamento contrariar mas a primeira vez que ouvi alguém falar em golpe foi mesmo no meio do mato e imagine-se por um diferente do QP.Aliás por minha experiência os diferentes estão sempre dispostos a tudo...
Já agora os da AM oriundos de milicianos ficavam e bem à esquerda dos cadetes e consoante a sua nota.Mas se fossem mesmo bons até eram graduados para além de manterem os seus postos e funções inerentes...
Se os cadetes eram uma merda como se depreende do escrito olhe que nos milicianos a % era muito superior...
ps

O Hitler também queria que o Paulus resistisse em Leninegrado...

lusitânea disse...

O regime tratava muito bem os heróis, queria mesmo muito heróis e os heróis eram considerados por todos independentemente da sua origem ou quadro.Desses diga lá quais os que se sentiram mal tratados...

zazie disse...

Não conhecia estes textos, a achega é bem pertinente.

zazie disse...

Ah, outra coisa- confirma o que o José disse- foi levantamento de rancho.

dragão disse...

caro Lusitânia,

a percentagem era muito maior porque o contingente também era infinitamente maior.

Desse contingente vasto havia os que tinham vocação e jeito para a coisa. E que continuavam depois para lá da comissão obrigatória. Esses é que devia comparar com os académicos.

Quem se sentia mal tratado, depois da 523/73, viu-se bem quem foi. Os mesmos que armaram aquele circo do 25 de Abril...

Havia excelentes oficiais de academia, mas não eram a regra (como, de resto, se patenteou às escâncaras). Porque a corporação militar, na sua mentalidade e na sua formação, era um lixo - muita daquela gente herdava a vocação do papá, do vôvô, do titio e do primo. Havia uma espécie de hereditariedade militaresca... Coisinhas mimadas só podiam borregar como borregaram.

lusitânea disse...

Sou testemunha de como era difícil preencher as vagas da AM e de como os filhos dos ferroviários e de outros de profissão humilde se chegaram à frente que não os filhos das ditas elites que só iam para o SMO se não conseguissem uma doença rara comprada ou depois disso não ficassem refractários e desertores se o destino fosse um dos quentes...
A malta antes do 25 era acusada de querer a guerra porque enriquecia
Para mim a malta estava disposta a que o novo regime tivesse mais um tempinho para resolver a coisa a contento de todos.Os gajos civis do novo regime é que vinham com a ordem de operações das entregas à Lenine.Aí não havia solução escolar nenhuma aplicável senão o que se passou...

lusitânea disse...

É que desde o 28 de Maio a tropa QP reduziu muito, então a partir de 1961...o que havia era mesmo reumático...

dragão disse...

«Sou testemunha de como era difícil preencher as vagas da AM e de como os filhos dos ferroviários e de outros de profissão humilde se chegaram à frente que não os filhos das ditas elites que só iam para o SMO se não conseguissem uma doença rara comprada ou depois disso não ficassem refractários e desertores se o destino fosse um dos quentes...»

Corroboro.

E havia ainda o processo de colocação de certos meninos no ar condicionado.

Em sua opinião, qual é a data a partir da qual todo este cenário se agrava?

lusitânea disse...

A partir de 1967/68...

lusitânea disse...

A partir de 1967/68...

Euro2cent disse...

> "a estirpe dos antigos"

A estirpe for estripada do vocabulário moderno, nem sabem o que significa. A nova geração consegue articular-se bem, mas só com os 800 vocábulos que se usam na TV.

(Para antigos vs. modernos, ver Montesquieu. O "tipping point", como dizem agora.)

zazie disse...

Antigos/Modernos nunca teve um sentido de diferença de carácter.

Foi diatribe erudita com excelente partilha entre os dois lados.

zazie disse...

Na Sublime Society of Beef Steaks encontravam-se dos dois lados e o delicioso Peri Bathous foi escrito pelo
Alexander Pope- um moderno.

zazie disse...

O que o Salazar disser referia-se a algo como a nobreza moral dos "egrégios avós", ou assim.

Anónimo disse...

Olá Dragão!, Desculpe não o ter cumprimentado um dia destes quando deixei aqui um comentário, mas foi por absoluta distracção, convenci-me estar a comentar no Porta da Loja:)..., habituação:)
Parabéns pelo seu regresso, já não era sem tempo.

Bem, perante tão exaltantes quão lúcidas palavras carregadas de portuguesismo e de lusitanidade, permito-me deixar o meu modesto contributo para o debate em questão.

Sabe-se que o Regime anterior tinha defeitos;

Sabe-se que Salazar era um autocrata e na opinião de muitos, um ditador fascista;

Sabe-se que havia restrições à liberdade de expressão e de reunião, mas é um facto que SÓ relativamente a comunistas e socialistas-maçons, como é sobejamente conhecido de todos. E isto era assim porque a vida activa destes resumia-se a conspirar contra a Pátria desde o estrangeiro e a pôr em prática, através de agentes esquerdistas infiltrados no País, actividades subversivas e criminosas;

Sabe-se que Salazar era um Patriota à maneira antiga, isto é, um Governante que colocava no mesmo plano d'importância e acima de todas as coisas tanto a defesa da Pátria na sua imensidão territorial como a do Povo na sua pluralidade rácica e diversidade étnica;

Sabe-se que Salazar, dada a sua educação católica, o ambiente familiar tradicional em que foi criado a que se somou uma formação moral superior, era alguém que abominava tudo o que fosse contrário a estes princípios cívicos e éticos, os mesmos que sempre nortearam a sua conduta política e pessoal, nunca se tendo afastado deles nem por um milímetro durante toda a sua vida;

Ora uma pessoa possuidora destes princípios básicos de cidadania e ainda para mais sendo o Governante máximo do País com as responsabilidades inerentes ao cargo, jamais poderia pactuar com gente apátrida, traidora e falsa. Gente que se proclamava anti-fascista da mais pura água e pugnava pela introdução da 'democracia' no País com o fim de 'libertar' o povo da ditadura em que vivia subjugado, perante um quadro tão deprimente quão falso como este, sàbiamente engendrado e propagandeado à exaustão com o único fito de levar ao engano um povo ingénuo e polìticamente ignorante, perante este vendaval de mentiras grosseiras e cínicas e outras afirmações da mesma índole propositadamente exageradas, Salazar, inteligente como era e conhecendo de ginjeira a massa pútrida de que era feita TODA a oposição comunista e socialista-maçónica, jamais aceitaria pactuar com estas, pois sabia d'antemão que tudo quanto lhes interessava era destruir a economia do País, inverter a ordem estabelecida, introduzir nele a violência, o terror e as redes criminosas e isto tudo numa sociedade a viver até então em paz e em segurança absolutas justamente pela completa ausência daquelas, consequência directa da sua rigorosa e permanente interdição fronteiras adentro.
Maria
(cont.)

Anónimo disse...

Conclusão)

Se é verdade que este Povo quase inteiro havia celebrado com bastante alegria a mudança de regime (como diz o José e com razão, os portugueses estavam um tanto ou quanto cansados das restrições à liberdade de movimento e de expressão, principalmente após a abertura política iniciada por Marcello Caetano, o qual, quer por ingenuidade, crença na rectidão de carácter dos opositores ao regime, por falta de firmeza para combater as manobras políticas sujas, já então em franco desenvolvimento, vindas de quem já lhe era bem conhecido como traidor à Pátria, quer por ter tomado consciência de ter ido longe demais na sua condescendência política face aos seus opositores ou talvez, quem sabe?, por estar farto de tudo e de todos ao verificar ter estado a ser permanentemente traído pelos seus mais próximos (e supostamente fiéis) colaboradores, tanto os políticos como os militares, a que certamente se juntou falta de força anímica e incapacidade de decisão no exacto momento em que estas mais o exigiam, simplesmente deixou cair os baços ante a tragédia que seguramente antevia estar próxima) tratou-se porém de algo passageiro, já que a decepção total começou a desenhar-se perante os olhos dos portugueses dando a alegria inicial lugar a uma revolta crescente em virtude principalmente da contínua degradação social e do desastroso panorama político nacional que se iam agravando dia após dia a passos de gigante, deixando-os atónitos, tendo esta autêntica desgraça tido o seu início pouco tempo depois daquele se ter apoderado do poder e usurpado as funções governativas em seu exclusivo benefício. Perante semelhante tragédia social e política como é que um povo ordeiro, trabalhador, honesto, cumpridor das leis e respeitador da autoridade, podia aceitar de animo leve uma tão grave subversão da ordem estabelecida, intencionalmente introduzida na Sociedade através de um sistema altamente corrupto inacreditàvelmente levado a efeito por aqueles que o tinham criado e, pior, nele mandavam como governantes institucionalmente legalizados?
(cont.)

Anónimo disse...

(Esta parte é que é a conclusiva)

É assim que, com o decorrer dos meses e agravando-se perigosamente o clima político e social, os portugueses começaram a dar-se conta do logro terrível em que haviam caído por meio das trapaças e mentiras monumentais permanentemente bolsadas pelos famigerados democratas que afinal haviam derrubado um regime estável, em paz e econòmicamente sustentável, regime que - contràriamente ao propagandeado pelos gananciosos e invejosos traidores era elogiado pelos governantes de países desenvolvidos e progressistas em todo o mundo - uma vez a ordem, paz social e autoridade destruídas e pràticamente imposto o estado de sítio no País (este passo absolutamente necessário para levar avante, entre outras acções criminosas, a traição subsequente e maior à Pátria) estava criado o momento óptimo para ser introduzida a verdadeira ditadura, a democrática, a mesma que tem tornado este, porque dramàticamente desgovernado, num Povo inseguro, desorientado, triste e infeliz e desesperadamente à procura do seu norte pela mão de dirigentes polìticamente honestos, íntegros e patriotas, desde essa altura até ao momento presente.

Como é que um Povo que tendo sido governado durante décadas por políticos íntegros e defensores intransigentes da Pátria, pode continuar a suportar por mais um dia que seja um bando de malfeitores e corruptos da pior espécie, gente maldita que conseguiu reduzir uma Nação orgulhosa dos seus Heróis ancestrais fautores e preservadores dos seus gloriosos novecentos anos de História, a pouco mais do que nada? É-lhe humanamente impossível, não pode.

Eis porque esta farsa de regime mais os seus satânicos mentores, já têm os dias contados. E qualquer que seja o momento em tal se verifique já será tarde demais.

Se atentarmos no número de falsidades e meias-verdades imputadas ao regime anterior e o compararmos com as deste regime que, como é por demais sabido, são bem reais e incontestáveis, estas sobrepõem-se àquelas - que inexistiam, pelo menos do modo como eram/são maquiavèlicamente fabricadas - numa percentagem francamente imensurável:

- Que havia milhares de espiões e uma lista secreta com os nomes de milhares dos espiados, tudo a soldo do regime salazarista. No actual regime, imagine-se o despautério!, os jornais anunciaram ainda não vão muitos dias que mais de um milhar de políticos e outras tantas personalidades públicas têm vindo a ser espiados pelo excelso sistema democrático vigente...

- Os democratas d'algibeira acusavam o Estado Novo de obrigar milhares de portugueses a abandonar o País para fugir à e da pobreza. Neste regime, os emigrantes já se contam às centenas de milhar que abandonam o País anualmente para fugir ao desemprego e à verdadeira pobreza, esta sim, uma autêntica sangria de mão d'obra e no entanto aqueles grandes pulhas e maiores desavergonhados levaram anos a proclamar tratar-se aquela de um verdadeiro crime público e que, uma vez restituída a democracia ao País, a dita emigração iria ser imediata e automàticamente estancada. Então não ia!, viu-se e continua a ver-se.
Se a desfaçatez e a embustice pagassem imposto...

- No anterior regime não havia desemprego e por mais humilde que fosse o tipo de trabalho, havia-o para toda a gente e quem disser o contrário mente. Neste em que tentamos sobreviver, os desempregados já ultrapassam o milhão e não obstante sobre esta verdadeira calamidade social que se abateu sobre os portugueses, os brilhantes democratas que desgraçadamente nos regem e que já nasceram mentirosos, hipócritas e cínicos, calam-se que nem ratos... Mas vistas bem as coisas, é natural que assim seja.

E esta lista infundada, porque baseada numa deturpação intencional da verdade, nunca mais teria fim. O resto ficará para a próxima.
Maria