segunda-feira, outubro 27, 2008

Celebridade e multidão

«Todo o homem que merece ser célebre sabe que não vale a pena sê-lo. Deixar-se ser célebre é uma fraqueza, uma concessão ao baixo-instinto, feminino ou selvagem, de querer dar nas vistas e nos ouvidos.»
- Fernando Pessoa

«Ao contrário das catástofres, Deus não aprecia multidões.»
- César Augusto Dragão

No grego, o verbo chelew significa seduzir (com o canto ou por qualquer arte), encantar, mas também corromper. Posteriormente, no latim, "celeber" significará "frequentado", "festejado", de que se fala muito", "célebre", "numeroso", "abundante". Dai provirá o nosso "célebre".
O célebre é assim, não custa lobrigá-lo, aquele que seduz a multidão, aquele que a multidão festeja, aclama e frequenta, em suma, o encantador de multidões. O enlevo ou entertainer das massas. O truão da cegada.
Entretanto, a multidão, que os gregos denominavam "ochlos", já repugnava ao bom Jesus. A cada passo vêmo-lo a afastar-se dela, a retirar-se sozinho para os olivais. O número não o seduz nem fascina lá muito. Mesmo o bando de apóstolos, ora pusilânime, ora sonolento, merece-lhe algum cepticismo lúcido. Atravessa a turba e o tumulto como atravessa as águas indiferenciadas e revoltas do lago Tiberíades: caminhando enxuto por sobre aquilo tudo.
Sair daqui enxuto, isto é, não lambuzado pela turba. Acreditem-me: meta de vida mais nobre não conheço.



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