segunda-feira, julho 07, 2008

Acromiomancia - VI. Social, mas não socialista

«Porque agia dentro de uma Constituição que sempre procurei respeitar, e por convicção própria, mantive, portanto, o Estado Corporativo. Mas lancei poucos dias depois de tomar posse do governo, a fórmula do Estado Social a fim de acentuar o conteúdo da política que me propunha seguir.
Esta fórmula é, há bastantes anos, corrente na literatura da ciência política por esse mundo publicada e foi consagrada nalgumas constituições, designadamente na da República Federal Alemã.
O sentido que lhe dei na curta alocução proferida em 10 de Outubro de 1968 ao receber os presidentes das corporações foi o de - "um poder político que insere nos seus fins essenciais o progresso moral, cultural e material da colectividade que, pela valorização dos indivíduos e pela repartição justa das riquezas, encurte distâncias e dignifique o trabalho". E meses depois, por ocasião da apoteótica visita ao Porto, em 21 de maio de 1969, voltava, no discurso proferido da varanda dos Paços do Concelho, a proclamar um Estado Social, mas não socialista.
(...) Está, pois, claro o pensamento que me animava ao preconizar o Estado Social: embora mantendo a propriedade privada e a liberdade de iniciativa em economia de mercado, o Estado deveria intervir fortemente na vida social para corrigir as injustiças da repartição dos rendimentos, directamente através do ajustamento dos salários e indirectamente mediante a concessão de vantagens e oportunidades que permitisse aos trabalhadores e às suas famílias vencer obstáculos à sua promoção e encurtar distâncias sociais.»
- Marcello Caetano, "Depoimento"

Foi, portanto, este, filhinhos, o perigoso fascista que democratas impolutos, hiperactivos e vitalícios, da envergadura e pujança dum Otelo Saraiva de Carvalho, dum Costa Gomes, dum Melro Antunes, dum Álvaro Cunhal, dum Mário Soares e tantos outros, numa bela manhã de Abril, descadeiraram e proscreveram.
"Fascismo nunca mais!", troaram mil papagaios e megafones, na época. Ocasionalmente, ainda nos revisitam os seus ecos serôdios e crocitantes. Só espanta quem não assistiu. E quem não presenciou, entre enauseado e divertido, a modinha subitamente frenética e furibunda daquela romaria à solta. Porque, não duvidem, o slogan descabelado fazia pleno sentido então: é que quem não fosse marxista-leninista, era fascista ou para lá caminhava. Facho, nazi, pide, reaccionário e o que mais houvesse!...
Mas o que era mais fascinante era a autoridade moral, o pedestal seráfico de quem o vociferava, geralmente em enxame querubineiro. Vociferava e, pasme-se, vocifera, ainda hoje, trinta anos passados. Só que agora, em tom mais pastoso, esporádico, sarnento, do alto de sebosa papada, com uma gravata - feita chocalho - a escorrer dela.
Todavia, deixem que vos diga, eu, slogan por slogan, sempre preferi o "putas ao poder, que os filhos já lá estão!" E, já agora, permitam até que o actualize: Os filhos e, entretanto, também os maridos. Pois, tudo indica, desposaram os rebentos as matrizes, ascendeu ao matrimónio a clientela. Afinal, este não é apenas um regime de mentira: é de incesto. Os filhos da república não saem de cima da mãe.

10 comentários:

josé disse...

Ontem, vi e ouvi o Rosas, historieiro de regime e de loas à modernidade que lhe instituiu a prebenda de ser figura grada.

Continua na lenga-lenga do anti-fascismo.

Tem um álibi poderoso, no entanto: a Pide era uma polícia política, havia bufos e gente presa.

Com esta verdade, comem qualquer argumento.

Logo, o que tem de ser descoberto e posto em pantanas, é isso mesmo: tirando os comunistas, alvo da perseguição política ( justa pela lógica do próprio regime e justa até pelos critérios dos mesmos comunistas que outra coisa não fizeram nos regimes onde assentaram praça e depressa o fariam por cá), tirando esses, quem resta de preso político?

Mais: que tipo de prisão sofreram , por quanto tempo e como foram efectivamente julgados e presos?

É preciso curar a mordedura de cão com pelo do mesmo cão...e neste caso, o mito só morre pela desmistificação.

Mário Chainho disse...

O alibi não é lógico mas meramente emocional. A mensagem é clara, trata-se de uma ameça, ou se assina por baixo, de preferência com uma tosca cruz de ignorância, tudo aquilo que eles dizem ou és insultado, fascista, nazi, o que seja.

Não se desmonta um castelo de cartas. Infelizmente ainda se perde muito tempo em discutir ideias com quem não as tem. É dar um crédito desmedido a quem acabou de assaltar o banco.

Anónimo disse...

A única resposta ao nível da ladainha antifascista desses mamíferos vitalícios da democratura, curiosamente, até foi dada por um Almirante primeiro-ministro, por alturas dpo PREC, da varanda de S.Bento:
-"Vão barda-merda!"

zazie disse...

Mais outro post para emoldurar.

Anónimo disse...

Pois, e o Salazar ainda há-de ressuscitar para pôr estes "democratas" na prisa de onde nunca deviam ter saído. Já agora proponho um movimento para a canonização do avôzinho que, coitado, afinal era um santo homem!
E o Marcelo, pá, que escreveu este "Depoimento" depois de ter sido apeado no 25/4. Teria sido para limpar a sua imagem?
Concordo que os detentores do poder pós Abril não são flor que se cheire, mas atacar a merda para se defender o esterco não me parece um processo muito limpo...

Drameille disse...

Dragão, escreves sobre ti para ti. De que vale repetir até ao cansaço a mesma ideia?
Avança!
O período de silêncio, cuja culpa muito cristã atribuiste a multinacionais que vendem funções de onda, pareceu-me uma promessa não cumprida.
Mas o Mágico apareceu e concede-te 1 de 3 desejos:
1.Caga um Índio
2.Mata a tua velhota e faz arroz de puta.
3.Nenhum dos anteriores.

Vive o Dragão no Céu ou na Terra?
Saúde.

Anónimo disse...

Sem esquecer o “Tempo e sua Circunstância”, arrolar num mesmo saco esses cidadãos - e tantos outros…- não me faz sentido.
No 25A. apenas os “militares” descadeiraram e proscreveram Marcelo Caetano, que aliás seguindo o mesmo critério pertencerá aos tais “tantos outros”, …“democratas impolutos, hiperactivos e vitalícios,…”, e etc.-e-tal...
Hoje, aqui e agora, também eu – e tantos outros(?) – sinto o engano, que o ‘Presidente do Conselho de Ministros’ terá certamente sentido em data anterior ao 25A . Não li o Depoimento, e essa data e suas circunstâncias, despertam grande curiosidade, mas é maior o meu respeito por quem da ‘lei da morte’ se libertou.
O Regime é inreversivelmente nefasto, desde a sua origem, mas não me parece relevante só por si.
Um Abraço
takitali

josé disse...

Segundo é voz corrente, há décadas, o principal intelectual do MFA foi Melo Antunes.

Está tudo dito, sobre a intelectualidade desse Movimento.

O que se seguiu, teve sempre em conta o poder político ( e militar) do MFA.

O PCP aproveitou melhor do que ninguém, a embalagem dada pelo MFA e é interessante verificar como em poucos meses se politizaram, indivíduos da estirpe de um Vasco Gonçalves ( que tinha como modelo a Itália e pouco depois, já só jurava pelo Leste dos Urais) e um Otelo ( este nem precisa de detalhes).

Foi assim que desapareceram as elites que aliás, já eram escassas e sem peso político algum.

O que sustentava o regime anterior, nesse nível, era um Pathos, notável, em certa medida, mas que não tinha reflexo nos media que importavam.

Estes, foram sendo avassalados pelas Marias Antónias Pallas e gente assim.

O resultado está à vista: um filho dela´, é uma das pessoas com maior influência no país e no partido- António Costa.

É fácil, verficiar a causa das nossas desgraças, se n os pusermos a ligar um pouco as coisas.

Facílimo, até. A mediocridade que se instalou é tão evidente que até dói.

É também evidente que foi este sistema de partidarite que incentivou estas pessoas ( tipo António Costa) a alcançar o poder político, ´porque nunca teriam lugar em lado algum da sociedade civil que estivesse ao nível do que têm no Estado, manietado por eles mesmos.

Isto é tão claro que só uma revolução no modo de selecção de pessoas permitirá a mudança.

Esta é também, para mim, a razão de funco e provavelmente exlusiva da nossa decadência em todos os níveis, a começar no educativo.

Ninguém dá o que não têm. Quem não tem a noção de excelência verdadeira, nem sequer vislumbra a sombra dessa noção, não pode dar nada de jeito, porque nada tem para dar.

lusitânea disse...

Eu não atribuiria tantas responsabilidades ao MFA, mesmo que alguns dos seus elementos se tenham de facto portado mal no meu ponto de vista e da própria organização onde serviam pois que muitos acabaram afastados.Mas que como vimos o regime continua a ter muita estima pela sua acção ao recontituirem-lhes as carreiras.
Portanto só isso indicia uma "subordinação" a orientações das esquerdas, que na maioria dos casos não havia antes do 25.
O próprio programa do MFA é prova disso.Não tem lá a asneirada feita a seguir.
O império era cobiçado por todo o mundo e todo o mundo contribuiu no PREC para que ele acabasse.Até os americanos, que nessa altura teleguiavam certos extremistas que muito os ajudaram...e que foram e estão aser bem pagos por isso.
Claro que os verdadeiros responsáveis sacodem o mais que podem a água do capote não tendo vergonha de atribuirem culpas próprias aos outros...
A cegueira dos elitores é que sanciona a acção destes gajos das novas oportunidades que eles inauguraram logo no 25 assaltando todos os lugares de mando sem qualificações.E têm-se vindo a reproduzir e siceder em milhentas monarquiazinhas...
Mérito?Quem tem cunha safa-se em grande.Os resultados não interessam.
Desconfia é que não venham a ter problemas com as suas reformas de velhice...

joao de miranda m. disse...

Infelizmente, o Depoimento de Marcelo Caetano não foi escrito a tempo. Se tivesse tido uma data de, pelo menos, dois anos antes do 25A, faria muito sentido chorar agora sobre leite derramado. Assim, não.
Apesar do posicionamento político, (desta vez irremediavelmente escancarado) deste texto, continuo a considerar o autor um dos melhores escritores da Língua Portuguesa.