O Jogo do Nada

 

Mais um ano, mais uma viagem!  E o desgoverno lá continua, na sua saga mirabolante. Quem me conhece sabe que eu insisto na tese que não temos uma problema de governo (é irrelevante quem para lá desça, o buraco não muda, apenas se aprofunda): temos, outrossim, um problema de regime. Só que, actualmente, a adicionar à ausência de governo, temos também a inexistência de regime. De nada adianta, pois, alguém bradar para que se mude uma coisa quando nem sequer há coisa alguma para mudar. Até aqui, havia a indumentária e a máscara, faltava o portador. Agora, suspeito bem, nem país, nem regime, nem governo.  Resta apenas um jogo infantil. Em que dois bandos se entretêm a jogar às escondidas. Dum lado os que fazem de governo (e regime); do outro, os que fazem de jornalistas e procuradores. A brincadeira consiste em aquele que faz de Presidente (do regime) investir os que fazem de governo. Uma vez investidos, estes, correm a esconder-se nas mais diversas tocas, buracos (o buraco da saúde, da educação, da defesa, etc) e esconderijos, para o que dispõem de cerca de 24 horas. Decorrido isso, os outros,  os tais que fazem de jornalistas e procuradores (sendo que, não raro os jornalistas fazem de procuradores e os procuradores fazem de jornalistas), largam esbaforidos e desatam a tentar descobri-los e denunciá-los, com grande alarido, entusiasmo e espalhafato. Aquele que for descoberto vê-se, ruidosa e publicamente, deposto, bem como afastado durante um pequeno período de tempo. Para o seu lugar, o chefe do bando nomeia outro, que o presidente investe. E o jogo lá prossegue. Nos putativos e fugazes intervalos em que o público entretido (e embeiçado) com esta cegada pueril se interrogasse, eventualmente acerca do futuro ou - mais excêntrico ainda - do plano/ideia/mera fezada - para Portugal (não riam, vá; desculpem o palavrão!...), constataria o óbvio ululante: essa é uma ideia que nem sequer lhe ocorre, a ele, público. No que, em absoluta harmonia  e compenetrada solidariedade, se irmana e equivale, com todos aqueles jogadores afanosos a cujas trepidantes peripécias assiste. Todos, refira-se, não apenas por falta de bagagem intelectual, profissional e moral, mas, ainda mais, por completa falta de tempo.

 Ao público, tudo bem pesado, apenas o distingue o facto de ser aquele que tapa os olhos com as mãos e conta... até nunca mais.