Não é de Pessoa o naco de prosa, nem, tão pouco, de Eça. Muito menos de Antero. Na verdade, é de Pinheiro Chagas. No Diário de Notícias de 7 de Fevereiro de 1872. E resultou, precisamente, duma polémica entre Chagas e os autores das "Farpas", em especial Eça de Queiroz. Curioso, não é?
Quem foi Pinheiro Chagas? Actualmente é uma avenida de Lisboa. Há dois séculos atrás, distinguiu-se, entre outras coisas, aquando da chamada Questão Coimbrã, pleitando contra os "realistas" modernizantes e "anti-românticos". À frente destes, pontificavam Teófilo Braga e Antero de Quental. O único ponto alto e digno de registo de tão pífio contencioso ocorreria em Fevereiro de 1866, no local de Jardim da Arca d'Água, no Porto, quando Ramalho e Antero se bateram em duelo de espada. Sobre o mesmo há uma saborosa reportagem de Camilo:
Quem foi Pinheiro Chagas? Actualmente é uma avenida de Lisboa. Há dois séculos atrás, distinguiu-se, entre outras coisas, aquando da chamada Questão Coimbrã, pleitando contra os "realistas" modernizantes e "anti-românticos". À frente destes, pontificavam Teófilo Braga e Antero de Quental. O único ponto alto e digno de registo de tão pífio contencioso ocorreria em Fevereiro de 1866, no local de Jardim da Arca d'Água, no Porto, quando Ramalho e Antero se bateram em duelo de espada. Sobre o mesmo há uma saborosa reportagem de Camilo:
"Em 1866 na belicosa cidade do Porto, defrontaram-se de espada nua dois escritores portugueses de muitas excelências literárias e grande pundonor. Correu algum sangue. Deu-se por entretida a curiosidade pública e satisfeita a honra convencional dos combatentes. Alguns dias volvidos ia eu de passeio na estrada de Braga e levava comigo a honrosa companhia de um cavalheiro que lustra entre os mais grados das províncias do Norte. No sítio da Mãe-de-Água apontei a direcção de um plano encoberto pelos pinhais e disse ao meu companheiro: Foi ali que há dias a «Crítica Portuguesa» esgrimiu com o «Ideal Alemão»"
Consta que o duelo terminou quando o "Ideal Alemão" (Antero) feriu a "Crítica Portuguesa" num braço. Assim, à primeira vista, dir-se-ia que, fazendo jus às respectivas tribos onomásticas, o Ideal compensava com superior desembaraço braçal a evidente inferioridade de aptidão na pena. Mas, na verdade, o que efectivamente se passou, estou eu, século e tanto depois, em condições de revelá-lo pela primeira vez: sucedeu que a Crítica, ainda mais sendo Portuguesa, incorreu no logro costumeiro de quem confronta o Ideal, sobretudo Alemão. Acreditou que toda aquela descomunalidade aérea que tinha à frente era uma cabeça e que, numa estocada rápida e cirúrgica, tudo terminaria, quiçá com um zorrino autógrafo na testa. O problema é que enquanto ele assim, debalde e espada, fustigava o vácuo enxertado no éter, o Atlas de ambos espetava-o de concreto numa asa. E eis aqui o paradoxo que a tantos escapa: aos comandos da Crítica segue muitas vezes o quixote que alveja a quimera fruto da sua própria Imaginação; mas a bordo do Ideal tripula quase sempre o símio faminto de flagelar o concreto. Não há duelo possível.
Um último detalhe assassino: sabem porque é que Antero de Quental se tornou uma espécie de mentor da "geração de 70"? Ele que era o mais tosco mental de todos, imagine-se...? O motivo coincide com as circunstâncias: parece que foi depois de ter viajado pela Europa e pela América. Acontece que por estas bandas, ontem como hoje, a fórmula mágica para a transcendência, que converte qualquer asno de letras numa eminência parva é feito disso: carimbos no passaporte. Andar lá fora é surgir impregnado daqueles super-poderes que só o estrangeiro possui e ao parolo endémico tanto deslumbram e obsidiam.
É por estas e por outras que Pessoa, a transbordar razão e sentido, chama provinciano a Eça. E, por osmose, à geração dele.
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