quarta-feira, janeiro 31, 2007

Porcos a pérolas

O Dragoscópio vai publicar uma série de entrevistas sobre questões fundamentais da existência e do seu impacto na vida dos cágados de bossa e outros quelónios mais ou menos arborícolas.
Adianto desde já as perguntas e, dentro em breve, iniciarei a indigitação dos felizes, eméritos e importantões contemplados. O critério? Simples: ordem alfabética. Ab...


1. Se não fosses a porcaria que és, que outra porcaria gostarias de ser?
2. Normalmente, que porcaria finges ser, para camuflar a porcaria que és?
3. Achas que a porcaria que os outros são alivia ou ameniza a porcaria que tu és?
4. Consideras que a porcaria que és deriva da porcaria que fazes?
5. Entre a porcaria que és e a que achas que devias ser, calculas que haja uma grande diferença?
6. Convences-te facilmente que és a porcaria que fazes?
7. Estás todo vaidoso com a porcaria que fazes e deduzes que, assim sendo, és uma grande porcaria?
8. Pensas que há muita gente com inveja da porcaria que és?
9. És a porcaria que tens ou tens a porcaria que és?
10. As porcarias que cultivas na imaginação compensam-te das porcarias onde te anichas na realidade?
11. És porco porque vives uma vida de porcaria, ou essa porcaria de vida é resultado de existirem porcos como tu?

Desavaganças

«Sócrates quer empresas portuguesas na China».

Convém que desocupem espaço para as empresas espanholas em Portugal.

Mas por mim, ia ainda mais longe : despachava as empresas para a China e os políticos para o Pólo Norte.

Gastropedia acrobática



«Em 1998 votei "não" no referendo do aborto, agora vou votar "sim"».

Pois. É conforme sopra o vento. No próximo, se houver, vai votar "talvez" (ou "sim" nos dias ímpares e "não" nos dias pares). Depende dos caprichos do anticiclone dos Açores.

Um tal portento gastropédico leva-me até à meditação abismada sobre dois hiantes problemas que atormentam este país (e este mundo):
1. A quantidade alarmante de gajos com uma gaja lá dentro, aos comandos;
2. A facilidade com que se classifica de nascimento qualquer aborto de nove meses.

Entrevistas de Nuremberga - III

Ainda Ohlendorf.
Mais adiante, pergunta-lhe o americano:
-"O que pensa das leis raciais?"
Responde o tenente-general das SS:
«- São correctas. Os sionistas pensam o mesmo, que se deve diferenciar o povo alemão do povo judeu. São absolutamente correctas.»

domingo, janeiro 28, 2007

Entrevistas de Nuremberga - II

Otto Ohlendorf foi tenente-general das SS e chefiou os serviços de segurança do Departamento Central de Segurança do Estado. Foi condenado à morte em Abril de 1948 e executado em Junho de 1951.
Segundo contou durante as entrevistas ao psiquiatra americano, em Nuremberga, teria passado um ano -o de 1931 - em Itália, a estudar o fascismo. No âmbito dum programa académico de intercâmbio que existia entre a Alemanha e a Itália.
Concluiu o relato dessa estadia com um comentário deveras surpreendente:
«-Voltei de lá um antifascista fanático.»
Espantado, o interrogador americano questionou:
«Como é que podia estar num partido fascista e ser um antifascista fanático?»
Returquiu calmamente Ohendorf:
« - É lamentável que pense que são a mesma coisa. Existe muita diferença entre os dois. O fascismo é um princípio puramente estatal. Em 1932, Mussolini disse: "Em primeiro lugar está o estado, e do estado derivam os direitos e o destino do povo. Os seres humanos estão em segundo lugar." No nacional-socialismo, passava-se o oposto. O povo e os seres humanos estavam em primeiro lugar, e o estado era secundário.»
-"Acredita mesmo nisso?" - tornou o americano.
« - Acreditava. - Volveu Ohlendorf. - O problema era que Hitler detestava de tal forma o estado que o governo nunca funcionava.»

Baluartes éticos

«A lei deve proteger a mulher de pressões em relação à sua decisão e penalizar qualquer pessoa, inclusive o progenitor, que exerça coacção, interfira de uma forma impositiva ou com chantagem na sua decisão», acrescentaram os «Médicos pela Escolha».

Eticamente, tudo isto é deveras edificante.
Imaginemos agora uma facção igualmente desiquilibrada e alucinada do "lado masculino" da coisa. Um bando deles desata a reclamar, através de lóbis e pedestais na comunicação social, o direito, urgente e inalianável, à IVG - neste caso, "Interrupção Voluntária da Grávida". Quer dizer, no caso da futura mãe desejar ter a criança e eles -por qualquer motivo ou birra - não, a regalia catita de verem assim reconhecido o seu pleno, unilateral e soberano direito a abaterem a grávida a tiro (por exemplo, até às tais dez semanas de gestação). Ou, em sendo esquerdistas modernaços, usufruirem da possibilidade de entregá-la num matadouro municipal, onde - com todas as condições de segurança, burocracia e higiene - possa ser gratuitamente abatida por profissionais competentes.
Um outro bando, não menos assanhado e feroz, mas na vertente oposta (eles desejosos do rebento contra elas decididas ao embriocídio), ei-lo que marcha, com ímpeto fulgurante e desfaçatez ainda mais sublime, à conquista do direito ao DCF -leia-se, Desencarceramento Compulsivo do Feto (seguido de eventual transferência para uma Barriga de Aluguer). Tudo isto, a bem do liberalismo, executado numa Clínica Contra-abortadeira, necessariamente privada e especializada nesse tipo de transfusões. E sujeito, claro está, às inefáveis vicissitudes do Mercado.
Relembro que nas principais ganadarias e coudelarias, os espermatozóides das melhores proveniências são adquiridos a preço de ouro. Ora, se entre as bestas há distinção de sémen, não vejo como entre a actual humanidade se possa contornar tão profícua regra.

sexta-feira, janeiro 26, 2007

Entrevistas de Nuremberga - I.

O livro intitula-se "Entrevistas de Nuremberga ". É uma tradução portuguesa do "The Nuremberg Interviews - An american Psyquiatrist's Conversations with the Defendents and Witness", e saíu este Natal. A ser obra de propaganda, naturalmente será anglo-saxónica.
Não obstante, a certa altura, diz Julius Streicher (um judeófobo lendário, antigo director do Der Stürmer, uma folha de couve particularmente virulenta na propaganda anti-judaica):
«No fundo, sou um sionista.» (E o entrevistador acrescenta, em nota pessoal: "Conhece homens como Chaim Weizman e outros sionistas e comunga das suas opiniões. Os judeus deviam estar no seu próprio país, não deviam poder viver noutros locais")
Mais adiante, interrogado sobre eventuais sentimentos de culpa a propósito do extermínio dos judeus, Streicher, "quase a rir-se", responde:
«Ora, se eu não tive nada a ver com isso! Desde 1940 que fui viver na minha quinta, em Fürth. Hitler deve ter decidido exterminar os judeus em 1941, porque eu não sabia nada disso. É provável que Hitler achasse que "foram eles que causaram a guerra, por isso vamos exterminá-los". Não quero dizer que Hitler tivesse razão. Acho que era uma política errada. Eu defendia que se devia criar um estado judaico independente em Madagáscar, na Palestina, ou noutro local, mas não exterminá-los. Além disso, ao exterminarem quatro milhões de judeus (neste julgamento, estão a falar de cinco ou seis milhões, mas é tudo propaganda; eu tenho a certeza que não eram mais que 4,5 milhões), transformaram-nos a todos em mártires. Por exemplo, por causa do extermínio dos judeus, o anti-semitismo regrediu muitos anos em diversos países estrangeiros onde estava a fazer bons progressos.»

Terapia de choque?...

«Some people tend to believe that concerns over the world’s protests can stop the US. I do not think so. The importance of this factor should not be overstated. In the past, I have spent hours talking to Milosevic, trying to convince him that NATO was preparing to attack Yugoslavia. For a long time, he could not believe this and kept telling me: “Just read the UN Charter. What grounds will they have to do it?”
But they did it. They ignored the international law outrageously and did it. What do we have now? Yes, there was a shock, there was indignation. But the result is exactly what the aggressors wanted – Milosevic is dead, Yugoslavia is partitioned, and Serbia is colonized – NATO officers have set up their headquarters in the country’s ministry of defense.
The same things happened to Iraq. There were a shock and indignation. But what matters to the Americans is not how big the shock is, but how high are the revenues of their military-industrial complex.»
(...)


Entre os protestos da esquerda de confeitaria e os guinchinhos grouppies da direita a soldo, fica tudo em família.

quinta-feira, janeiro 25, 2007

Mais um Frankenstoino



Declara o Doutor Mário de Sousa, "cientista de proa na procriação medicamente assistida":
«Porque a vida da mulher é um todo, com corpo e alma, que tem primazia sobre o feto. Este é "um anexo sem autonomia" até aos cinco meses, altura em que o cérebro começa a funcionar.»

Depois de "coisa descartável", temos um novo marco na definição do embrião, também conhecido por feto: "um anexo sem autonomia".
Do despejo, puro e duro, salta-se assim para a remodelação doméstica, eventualmente o bricolage. -"Tiramos o anexo e fazemos um barbecue".
Mas congratulemo-nos, nem tudo é mau. Ao menos, a mãe já recuperou a alminha, já é um "todo, com corpo e alma".
Resta saber se, por via de tamanho frenesim hedonista, não estará a descambar num corpo cada vez mais desalmado e inóspito para almas à procura de corpo.

terça-feira, janeiro 23, 2007

Obrigações

Diz o humorista Ricardo Araújo Pereira:
«Uma mulher que se vê obrigada a fazer um aborto não é criminosa e não deve ir presa» .

Diz o Caguinchas:
«E uma mulher que se vê obrigada a fazer broches ou punheta de mamas, para além de outros pratos e serviços de lubrificação caralhativa mais dispendiosos, também não é uma criminosa e não deve ir presa (e, ainda menos, prenhe!) Sim, porque não há dois dias, a bófia foi incomodar duas chavalas das minhas relações, estrilhando que estavam a prostituir-se. E o que é que isso tem, hein? Haviam de estar a fazer o quê? - Tapetes de arraiolos? Rendas de bilros? ... Então, o corpo não é delas?...»

E digo eu:
É, sim senhor, ó Caguinchas, Deus as abençoe. Vendem o que é seu, pois então. Ao contrário dos cabrões dos políticos, prostiputas bem mais daninhas e perversas, pois vendem o do alheio, o que é nosso, o país, as ilhas e os mares.
Já por mim, desde que não me obriguem a ver as "espécies de magazines" do engraçadinho, não me tornarei violento nem criminoso, nem, consequentemente, correrei sérios riscos de ser preso.

PS.: Onde, na transcrição Caguinchiana, se lê broches, as almas mais pudibundas ou sensíveis à Língua Portuguesa extra-curricular, podem fazer de conta que está escrito "fellatio". E onde está "punheta de mamas", é favor traduzir por "masto-massagem erótica". Quanto ao "caralhativo", é despiciendo, pois a sufixação atenua, se é que não emoldura, a base.

Batoteiros



O reverendo Ted Haggart, ex-presidente da National Association of Evangelicals, é peremptório:
"Todos os estudos confirmam que os evangelistas têm a melhor vida sexual entre todos os grupos religiosos".
Não me custa admitir que o reverendo tenha razão. Afinal, os protestantes, ao longo dos tempos e sempre com grande dinamismo e espírito empreendedor, vêm-se tornando exímios, mais que em amar o próximo, em fodê-lo de todas as maneiras e feitios. Portanto, não admira.
Mas se pensarmos que o Reverendo Ted se demitiu das suas elevadas funções no ano passado, após ver-se envolvido num escândalo com drogas e prostitutos masculinos, há um protesto desportivo que não podemos deixar de aqui fazer, e nos termos mais enérgicos:
Nesta competição pela "melhor vida sexual", a utilização do próprio cu, ainda por cima sob o efeito de poderosos estimulantes, não devia ser validada. É desleal. Além do recurso vergonhoso ao doping, acrescenta um órgão/canal extra ao concorrente.

Escolas distintas


Os humanos, na sua grande maioria, desligam o cérebro por completo. E assim, sistematicamente, não precisam de pensar. Os golfinhos ainda têm muito que aprender.

segunda-feira, janeiro 22, 2007

Deixa lá o braço da mão!...

Cena verídica passada cá em casa, logo a seguir ao telejornal. O clã dragoniano devastava as vitualhas, quando a doutora jornalista (ou jornalista doutora) Judite de Sousa, no ecrã momentaneamente aceso, teve a infeliz ideia de inquirir o anão Vitorino (somem lá a nanoclastia ao meu vasto leque de incorrecções políticas) acerca do Primeiro ano da presidência Cavaquistona.
Responde, todo lampeiro e feliz da vida, o antigo Meio-ministro da Defesa (devem escolhê-los no Toys'r'Us):
- "Bem, por um lado vou ter que dar o braço a torcer..."
Remoque imediato e espontâneo do Dragão chefe-de-família, sem deixar sequer a bola cair no chão:
- "O pescoço, ó micrómegas... O pescoço é que tu havias de dar a torcer!..."

Atrasados

Uma mulher, um negro e um mórmon estão na corrida para a Casa Branca. Imaginando que qualquer um deles ganha, não vai ser grande a façanha. Mesmo que lá chegue, vai chegar sempre depois dum atrasado mental. Um mentecapto, ainda por cima, bicampeão.

Esquemas e cleptomanias

«Para onde foram os milhões de dólares despejados no Afeganistão?»
- Um artigo deveras instrutivo, que merece ser lido na íntegra.

Apenas algumas passagens mais eloquentes:
- «During the past five years, the United States and many other donor nations pledged billions of dollars to Afghanistan, yet Afghans keep asking: "Where did the money go?" American taxpayers should be asking the same question. »
- «Millions of $ has been given to Afghanistan by donor countries but much of it is being grabbed by warlords, NGOs and UN workers.»
- « Much of the money is thrown away on "overpriced and ineffective technical assistance," such as those hot-shot American experts, the report said.»
- «And big chunks are tied to the donor, which means that the recipient is obliged to use the money to buy products from the donor country, even when -- especially when -- the same goods are available cheaper at home.»
- «Last year, for example, when the president sent his wife to Kabul for a few hours of photo ops, the New York Times reported that her mission was "to promise long-term commitment from the United States to education for women and children." Speaking in Kabul, she pledged that the United States would give an additional $17.7 million to support education in Afghanistan. But that grant had been announced before; and it was not for Afghan education (or women and children) at all but for a new private, for-profit American University of Afghanistan. (How a private university comes to be supported by public tax dollars and the Army Corps of Engineers is another peculiarity of Bush aid.)»

Moral da história, e como resume o próprio artigo:
«Cada vez mais privatizada, a Ajuda Americana tornou-se apenas mais um esquema tortuoso para transferir o dinheiro dos contribuintes para os bolsos dos Americanos ricos.»

domingo, janeiro 21, 2007

Memórias Palramentares



Em 9 de Outubro de 1975, salvo erro, Jerónimo de Sousa arengava na Assembleia Constituinte...

«Jerónimo de Sousa (PCP) - (...) é de lamentar que o Ministério através do Ministro e do seu Secretário não tivesse a ombridade de refutar a justeza dos pontos acordados perante os metalúrgicos, e se sirvam agora dos écrans da televisão para salvar a face acobardada perante o patronato.

(Agitação na Assembleia)

Porque é que... - tenta prosseguir J.S.
Uma voz: - Provocador!
J.S:: - Cala-te, amarelo!

(Burburinho)

Presidente: - pede-se a atenção.
J.S: - Amarelo!
Uma voz: - Está-nos a insultar.
Presidente: - Srs deputados, pede-se atenção.

(Apupos)

... Não há direito nem autorização para interromper o orador. O orador está no uso da palavra.

(As manifestações generalizaram-se a um grande sector do hemiciclo.)

J.S.: - Porque é que o sr. ministro procura atirar os camponeses contra os operários?

(Tumulto. Vozes de apoio de um lado e de desagrado de outro)

Presidente: - Pede-se atenção e pede-se que não haja diálogo, que não é permitido. O sr.deputado está no uso da palavra.

(O burburinho continua. A agitação é grande)

J.S.: Não sabe o sr. ministro...

(Aumenta de intensidade a agitação)

Presidente: - Pede-se atenção, srs deputados. A Mesa exige atenção.
J.S.: - Deixe lá, sr. presidente, a burguesia manifesta-se.
Uma voz: - Burguês és tu!
Outra voz: - Provocador!
Mais outra voz: - Vai trabalhar!
Presidente: - A Mesa exige atenção por razões que são dela e por razões que são do sr. deputado.
J.S.: Não sabe o sr. ministro...

(Burburinho)


Presidente: - Fazem favor de deixar prosseguir.
J.S.: - Não sabe o sr. ministro que nós, metalúrgicos, que estamos a auxiliar os camponeses com brigadas de fim de semana para ir arranjar os tractores, subsídios de 250 contos...

(Apupos e vozes dispersas. Aumenta de intensidade a agitação)

... O sr. ministro e o sr. secretário lembrar-se-ão dos camponeses quando estão a receber o cheque de dezenas de contos de salário? Porque é que o sr. ministro afirma que a portaria é um acto fascista? Porque é que o sr. ministro e o sr. secretário afirmam que é preciso trabalhar mais e ganhar menos? Por que será que o sr.ministro e o sr. secretário afirmam que as empresas estão em dificuldades? Que raio de Ministério de Trabalho é este?

(Gera-se o pandemónio, que se prolonga durante algum tempo. Deputados de pé manifestam atitudes agressivas)

Presidente: - Insisto em pedir atenção.
J.S.: - Então nós não temos dificuldades?
Uma voz: - Está calado, pá, vai trabalhar.
Ainda outra voz: - Tens mesmo cara de ser trabalhador!...

(Pandemónio. De punho erguido deputados do PC e do PS envolvem-se em discussão de sector para sector)

presidente: - Insisto em pedir a atenção. teremos de suspender a sessão, se continuarmos assim.
J.S.: - Posso continuar, sr. presidente? Posso continuar, sr. presidente?
Presidente: - O orador pode, evidentemente, continuar.
J.S.: Então nós não temos dificuldades? (...) É este o Governo de salvação nacional?
Vozes em coro: - É!

(Risos)

J.S.: - É assim que o Governo quer salvar a Revolução?
Vozes: - É!

(Risos)

J.S.: - Tal como no fascismo, nós mostraremos a força da classe operária e não tenhamos ilusões, srs. deputados.
Vozes: - Pois não!
Uma voz: - Vai trabalhar!
Outra voz: - Tu e o Américo Duarte sois a vergonha da nossa classe!»

- in "Cenas Parlamentares -Humor, agitação e ataques na Constituinte", de Victor Silva Lopes

Não, não era o fim da macacada. Era apenas o início.

sábado, janeiro 20, 2007

A serpente do ovo ou o Ódio da serpente- 2ª Parte

«Tudo isto, no entanto, é a luta pela existência. O judeu é o mais forte, o judeu triunfa. O dever do alemão seria exercer o músculo, aguçar o intelecto, esforçar-se, puxar-se para a frente para ser, por seu turno, o mais forte. Não o faz: em lugar disso, volta-se miseravelmente, covardemente,para o Governo, e peticiona, em grandes rolos de papel, que seja expulso o judeu dos direitos civis, porque o judeu é rico, porque o judeu é forte.
O Governo, esse esfrega as mãos, radiante. Os jornais ingleses não compreendem a atitude do senhor Bismark, aprovando tacitamente o movimento anti-judaico. É fácil de perceber; é um rasgo de génio do chanceler. Ou pelo menos uma prova de que lê com proveitoa História da Alemanha. Na Meia Idade, todas as vezes que o excesso de males públicos, a peste ou a fome, desesperava as populações; todas as vezes que o homem escravizado, esmagado e explorado, mostrava sinais de revolta, a Igreja e o príncipeapressavam-se a dizer-lhe: "Bem vemos, tu sofres! Mas a culpa é tua. É que o judeu matou Nosso Senhor, e tu ainda não castigaste suficientemente o judeu". A população então atirava-se aos judeus: degolava, assava, esquartejava, fazia-se uma grande orgia de suplícios; depois, saciada, a turba reentrava na treva da sua miséria, a esperar a recompensa do Senhor.
Isto nunca falhava. Sempre que a Igreja, que a feudalidade, se sentia ameaçada por uma plebe desesperada da canga dolorosa - desviava o golpe de si e dirigia-o contra os judeus.
Quando a besta popular mostrava sede de sangue, - servia-se à canalha sangue israelita.
É justamente o que faz, em proporções civilizadas, o senhor de Bismarck. A Alemanha sofre e murmura: a prolongada crise comercial, as más colheitas, o excesso de impostos, o pesado serviço militar, a decadência industrial, tudo isto traz à classe média irritada. O povo, que sofre mais, tem ao menos a esperança socialista. Mas os conservadores começam a ver que os seus males vêm dos seus ídolos.
Para o acalmar, e ocupar, o que mais serviria ao chanceler seria uma querra, masnem sempre se pode inventar uma guerra, e começa a ser grave encontrar em campo a França preparada, mais forte que nunca,com os seus dois milhões de bons soldados, a sua fabuloza riqueza, eiqueza inconcebível que, como dizia há dias a Saturday Review, é inquietador e difícil de explicar. Portanto, à falta de uma guerra, o príncipe de Bismark distrai a atenção do alemão esfomeado - apontando-lhe o judeu enriquecido. Não alude naturalmente à morte de Nosso Senhor Jesus Cristo. Mas fala nos milhões do judeu e no poder da Sinagoga. E assim se explica a estranha e desastrosa declaração do Governo.»

- Eça de Queiroz, "Cartas de Inglaterra"
[Este texto jornalístico de Eça comenta uma declaração do Governo Bismarck, segunda a qual o Governo Alemão afirmava não estar nas suas perspectivas retirar quaisquer direitos à população judaica.]

Há nisto tudo qualquer coisa que soa esquisito... Sobre a primeira parte do texto (publicada no penúltimo postal aqui da casa), Eça conclui que tudo se resume a "luta pela existência". Depois recomenda que o alemão "use o músculo" e "aguce o intelecto". O problema é que o exercício muscular, muitas vezes, despreza ou obnubila a inteligência. O excesso duma coisa implica geralmente a escassez da outra. Pois bem, os alemães, não tardou muito, seguiram o conselho de Eça e, no cumprimento do seu "dever", trataram de exercitar o músculo. E de que maneira! Segundo Adolph Hitler, estavam também, e apenas, em tudo aquilo, a lutar pela existência.
São determinismos destes que tornam a Idade das Luzes tão superior à Idade das Trevas.

sexta-feira, janeiro 19, 2007

Só por via das dúvidas...



... sempre vos digo Dez portugueses que considero veneráveis:

1. D. Afonso Henriques
2. D. João II
3. Afonso de Albuquerque
4. Fernando Pessoa
5. D. Dinis
6. Luís Vaz de Camões
7. Nuno Álvares Pereira
8. Infante D.Henrique
9. Bartolomeu Dias
10 Gil Vicente

É claro que há muitos mais. Mas, essencialmente, este é um país de reis, marinheiros, guerreiros e poetas. Ou melhor dizendo, foi.

A serpente do ovo ou o Ódio da serpente

«Quase todas as grandes casas bancárias da Alemanha, quase todos os grandes jornais estão na posse do semita. Assim, torna-se inatacável. De modo que não só expulsa o alemão das profissões liberais, o humilha com a sua opulência rutilante e o traz dependente pelo capital; mas, injúria suprema, pela voz dos seus jornais, ordena-lhe o que há-de fazer, o que há-de pensar, como se há-de governar e com que se há-de bater!
Tudo isto ainda seria suportável se o judeu se fundisse com a raça indígena. Mas não. O mundo judeu conserva-se isolado, compacto, inacessível e impenetrável. As muralhas formidáveis do Templo do Salomão, que foram arrasadas, continuam a pôr em torno dele uma obstáculo de cidadelas. Dentro de Berlim há uma verdadeira Jerusalém inexpugnável: aí se refugiam com o seu Deus, o seu livro, os seus costumes, o seu Sabbath, a sua língua, o seu orgulho, a sua secura, gozando o ouro e desprezando o cristão. Invadem a sociedade alemã, querem lá brilhar e dominar, mas não permitem que o alemão meta sequer o bico do sapato dentro da sociedade judaica. Só casam entre si; entre si, ajudam-se regiamente, dando-se uns aos outros milhões - mas não favoreceriam com um troco um alemão esfomeado; e põem um orgulho, um coquetismo insolente, em se diferenciar do resto da nação em tudo, desde a maneira de pensar até à maneira de vestir. Naturalmente, um exclusivismo tão acentuado é interpretado como hostilidade - e pago com ódio.»

- Eça de Queiroz, "Cartas de Inglaterra"

Déjà Vu? Ou, alucinados com os frutos da planta do ódio, esquecemos que quem anda a colhê-los ao longo dos séculos também andou a semeá-los?
Será que há, como agora tanto se quer fazer crer, ódios espontâneos? E será que há vítimas puras?...

PS: Esta é só a Primeira parte do texto de Eça. De seguida, publicarei a segunda, culminada das devidas conclusões.

quinta-feira, janeiro 18, 2007

Os anões e os gigantes



Uma série de portugueses de pacotilha vai defender os "Grandes Portugueses" naquela palhaçada que decorre na Televisão Governamental.
Assim, Jaime Nogueira Pinto enrodilha Salazar.
Leonor Pinhão emporcalha D. Afonso Henriques.
Gonçalo Cadilhe compromete o Infante D. Henrique.
Clara Ferreira Alves miniaturiza Fernando Pessoa.
Paulo Portas põe D. João II aos vómitos na tumba.
Ana Gomes envergonha Vasco da Gama.
Helder Macedo conspurca Camões.
Rosado Fernandes diminui O Marquês de Pombal.
Em resumo, a notícia no Correio da Manhã afirma que eles vão defendê-los, mas o correcto seria dizer que vão ofendê-los. A eles e à memória dum Portugal vertebrado e independente. A nós não. Somos anõezinhos da mesma freguesia.

PS: Álvaro Cunhal e Aristides Sousa Mendes? Sem dúvida, não foram grandes, foram descomunais. Mas não exactamente da portugalidade.
PS 2: A Leonor Pinhão, no essencial, vai persuadir os jurados que D.Afonso Henriques foi o Fundador do S.L. Benfica.

IVF, a solução



Mas... permitam-me apergunta:
Porque é que em vez da "interrupção voluntária da gravidez" (IVG) não reclamam antes a "interrupção voluntária da fertilidade" (IVF)?...
E assim, desse modo auspicioso, legítimo e soberano, em vez de embriões alienígenas causadores de tanta polémica, removiam os próprios ovários e sanavam o problema duma vez por todas. Acabavam-se as controvérsias. Quando se diz que são donas da barriga, não contesto. A barriga efectivamente é delas. Quer dizer, o útero e os ovários são delas. Mas os espermatozóides não. Podem despejá-los se lhes convém? (Do estilo: "aquele gajo despejou-mos aqui, e eu vou despejá-los uma - duas, três, quatro, ene - semanas depois no lixo.") Efectivamente, não vejo como impedi-lo. No fundo, trata-se dum despejo em segunda-mão. Não houve qualquer intuito de constituir família, nenhum especial envolvimento amoroso: o tipo despejou os tomates, a gaja despeja o útero. Ele aliviou-se; ela desembaraça-se. É um problema duplo, de que se persiste em só reparar na última fase.
Mas as chatices inopinadas que se evitavam, se ela propagasse às entranhas o vácuo cintilante que transporta na cachola!... O que é uma histeroctomia para quem vive na maior com uma lobotomia? Tremoços. Aquilo, além dum estorvo, é uma armadilha. Um albergue para vírus invasores, digo espermatozóides indesejados.
A verdade é que entrámos na Idade da Punheta Assistida: do homem-queca e da Mulher-vazadouro. Esfregam-se um no outro, sendo o outro uma mera prótese masturbativa conveniente. Isto, todavia, não apoquenta as nossas feministas de plantão. Só as obceca que o vazadouro seja convertido em aterro-sanitário. A bem da higiene e da paisagem.
Razão tem o Caguinchas quando proclama: "Dragão, eu, putas, não hesito: prefiro as profissionais."

O Top-less

Um dos grandes assuntos da semana é o inenarrável concurso da RTP e o respectivo Top Ten dos "grandes portugueses" por tele-sufrágio.
A primeira coisa que me ocorre é interrogar porque raio não elegemos também assim, desse modo assaz expedito, os governos, os presidentes desta república e os inefáveis autarcas. Dispenso-me de enumerar o opulento leque de vantagens.
A segunda é ainda mais óbvia: não me espanta, não me espanta mesmo nada, a presença do Dr. Álvaro Cunhal, esse enorme coerente e organizador das massas oprimidas, entre os Dez Mais.
Francamente, o que me surpreende -e lamento compungido - é que esteja tão mal acompanhado. O que só se pode interpretar como falseamento, ab initio, ab ovo, dos resultados. A pérfida ciganice dos organizadores é de bradar aos céus. De outra forma, estou mais que certo que, ombreando com o Dr. Cunhal, no panteão dos heróis desta ínclita gente tele-eleitora, figurariam, em garboso pódio, o Conde Andeiro, Cristóvão de Moura, Filipe I, Filipe II, Filipe III, Miguel de Vasconcelos, Lord Beresford, D.Pedro I e Manuel Buiça. O Dr. Mário Soares, até compreendo, porque ainda respira (e a respiração atrapalha um pouco estas ascensões); bem como o gelatinoso Pina Moura, antigo sequaz do camarada Álvaro. Mas aqueloutros nove, é, no mínimo, indesculpável.
Agora, dizem, o povo é soberano, o povo é rei. Pois bem, o rei só não vai nu porque vai em Top-less.

A culinária histórica

Stephen Pelletiere, professor reformado do Army War College e analista da CIA, responde a questões sobre AS famosas "armas de destruição maciça" de Saddam Hussein e o não menos famoso gaseamento dos Kurdos. Num vídeo que vale a pena ver.

segunda-feira, janeiro 15, 2007

Rigor, meus senhores, rigor!...

Em todo o caso, a queixa Israelita ao Tribunal Internacional , sendo justíssima, como não podia deixar de ser, de certa forma branqueia o crime realmente tentado. Sejamos francos: Genocídio acontece quando se chacina monumentalmente seres humanos normais -como ciganos, eslavos, arménios, cambodjanos, índios ou ruandeses. Vem nos canhenhos: o genocídio processa apenas seres humanos descartáveis. Porque, em se tratando de seres humanos especiais, sobredotados, predestinados, o termo a empregar não é "genocídio", mas "holocausto". Por conseguinte, acusar o presidente iraniano de "tentativa de genocídio" peca por escasso, quase uma ninharia, soa até como uma ofensa. Não estamos a falar de minudências, de desperdícios, de migalhices ora essa. É o escol, o zénite, a acrópole que está em causa. O termo correcto, portanto, em bom rigor jurídico, é "tentativa de holocausto". Pois não se trata apenas de "tentativa de crime contra a humanidade" (banalidade que, nos dias que correm, está praticamente despenalizada), mas, isso sim, tentativa de "crime contra a super-humanidade!"
Essa é que é essa.
De tentativa de genocídio contra os nosso filhos e o futuro do nosso país já devíamos era ter ido todos, em passo de corrida, apresentar queixa no Tribunal Internacional contra o José Eduardo Moniz.

O Abominável Dragão das Nets

No blogue-pelourinho, onde o safardana do Timshel me expõe manhosamente à ignomínia pública e à tomatada geral, uma argutíssima e solerte leitora, que se assina Sara Monteiro, carimba-me com a seguinte hortaliça em adiantado estado de putrefacção nas trombas:
«Toda a gente sabe que o Dragão é bom a desancar senhoras».
Assim, nem mais. Ora toma!
Depois de comunista, nazi, fascista, anti-semita, homofóbico, vampiro, lobisomem, xenófobo, racista, gongórico, desonesto, demagógico, etc, eis-me despenhado num novo e ainda mais vil socalco da ignomínia: desanco senhoras. E desanco-as muito bem desancadas, brune a magistrada. Serei mesmo campeão na coisa. Fosse Borges ainda vivo e, seguramente, teria que acrescentar um novo capítulo à sua “História Universal da Infâmia”. Na sua galeria de monstros seria forçado a enxertar um pedestal altaneiro onde eu posaria para a posteridade, aparelhado nos desdouros devidos a um autêntico Zeus da canalhice. Como título desse capítulo culminante, não é difícil vislumbrar, qualquer coisa como: Dragão, o Desanca-senhoras. Ou então, porque os escritores, quase sempre, gostam de condecorar: Dragão, o Estoira-Barbies; Dragão, o Quilha-galinhas; ou, quiçá, Dragão, o Traga-Vulvas. Era conforme tivesse acordado nesse dia. O Borges e eu.
E o pior é que a juntar às desqualificações inerentes à categoria de monstro poltrão, rufia, biltre e pulha, carrego ainda com o handicap da mais completa amnésia: efectivamente, não me lembro de em modo ou tempo algum ter desancado uma senhora, ainda que virtualmente. O mais que me lembro é de, há pouco tempo, ter desancado um axioma que certamente não era obra de uma senhora, mas de um trolha das obras travestido, numa espécie de carnaval antecipado. Talvez exagere, peço desculpa, sou muito dado à hipérbole, talvez fosse apenas um camionista de longo-curso com um mestrado em javardice. Não discuto.
Mas como eu, mal o sol desaparece no horizonte, me transformo num monstro e, nesse tenebroso estado, perpetro selvajarias que não recordo, serei a última pessoa a contradizer a Sô Dona Sara Monteiro. Aliás, a amnésia deve fazer parte tão intrínseca quanto estratégica dessa minha índole hedionda: não guardando memórias, evito remorsos, sou imune a escrúpulos e descarto culpabilidades. Mais que abortadeiro moral, sociopata integral, psicopata unissexo, etnopata tdi, sexopata GT e misógino hard, sou o criminoso perfeito e surpreende-me como ainda não cheguei, pelo menos, a ministro. Portanto, além de planear holocaustos, devo andar aí pelas esquinas da internet, à porta das tascas blogosféricas, a escarrar repenicadamente no chão, vociferando impropérios e, não satisfeito com tamanho arraial de alarvidades, desancando senhoras e meninas. Se acompanhado de violação ou não, a Sô Dona Sara Monteiro não especifica. E é pena. Já agora, juntava o fútil ao desagradável.
Leitores, não vou estar aqui com tergiversações e hipocrisias: uma abominação destas não tem defesa, nem, ainda menos, desculpa. Até Cristo escarraria em mim, se lá lhe aparecesse nestes trajes. Eu próprio escarraria em mim, no lugar de Cristo. Por conseguinte, não ousarei sequer defender-me. Pelo contrário, de modo a evitar cair desde já numa depressão profunda (que nem o camarada psiquiatra-proletário ou o Professor Karamba lograriam debelar), vou, ao invés, tentar ver a coisa pelo lado positivo. Há sempre um lado positivo em todas as coisas. Serei abominável, pois claro que sou, abominável ao quadrado, mas - ensina a experiência, comprova a história, justifica a economia-, haverá sempre, algures, algo ainda mais abominável do que eu. Algo ainda mais baixo, mais vil, mais desprezível, pois claro. Fraca compensação para tamanha chaga, dir-me-eis, mas antes essa que nenhuma. Pesquisemos então...
Sou portanto bom a desancar senhoras. Pior seria se fosse medíocre ou mesmo mau a fazê-lo. Assim, ao menos, as senhoras poderão vangloriar-se: “fomos bem desancadas por aquele grande velhaco! Mas que bem que ele nos desancou! Com que mestria ele o fez!” No caso de terem, por exemplo (se não existe, institua-se) um seguro contra desancamentos, podem reclamar de pronto - e integralmente! - a indemnização, sendo garantido, que se verão ressarcidas num instante. Apresentando-se bem desancadas, nenhum ciganão das seguradoras encontrará pretextos para se furtar ao estipulado. Paga e não bufa. Imaginem agora que se apresentavam mal desancadas ou mediocramente desancadas... É mais que certo que o figurão se poria com depreciações e subterfúgios: “Ah, minha senhora, isso não é nada. Mal se nota. Não passou dum safanãozito mal dado, uma brincadeira de mau gosto, uma diabrura de catraios. Então, então...que exagero!...Vá, o melhor é nem declarar.” E o que se diz em relação à seguradora é válido para o vulgo, para o ajuntamento de basbaques a quem se eventualmente apresentem, na via pública, feitas vítimas, aos brados e clamores, como tendo sido acabadinhas de desancar. Uma senhora bem desancada, é dos manuais, suscita imediatamente uma pena, escândalo e solidariedade que uma senhora mal ou mediocramente desancada jamais alcançará. É que nem por sombras. Direi mais: não aconselho, de todo, uma senhora mal desancada a vir aos gritos para a rua. Ainda se sujeita a que a apostrofem de piegas, histérica, alarmista e outros mimos congéneres.
Por outro lado, pior do que não desancar bem as senhoras, muito pior, acreditem, é ser desancado por elas. E pior que ser desancado por elas, horror que nem concebo, é ser bom a ser desancado por elas. Calculem que a Sô Dona Sara Monteiro, em vez de afixar que “Toda a gente sabe que o Dragão é bom a desancar senhoras”, propalava aos quatro ventos que “toda a gente sabe que o Dragão é bom a ser desancado por senhoras”? O abominável insuflava-se de ridículo e ambos, a todo o gás, ascendiam à estratosfera do vexatório. Nessa mesma hora, convertia-me – de Dragão marialva – em Esfinge transexual e ia atirar-me dum precipício.No primeiro que encontrasse á mão. Em último caso, da Ponte sobre o Tejo abaixo. Aquela mais alta.
Entretanto, ocorre-me outra perplexidade, a qual, por incrível que pareça, irrompe-me desde logo grávida de preocupação: para definição criminal, como haveremos de definir este meu iníquo passatempo? Reparem, se eu desancasse senhoras em minha casa, seria violência doméstica; se as desancasse no trabalho, seria violência laboral; se as desancasse num estádio de futebol, seria violência desportiva (provavelmente agravada de hooliganismo); se as desancasse na televisão, seria reality-show; se as desancasse numa orgia jet-set, seria sexualidade de vanguarda, topo de gama... Que nome se há-de então atribuir a desancar senhoras num blogue?
Não é uma questão de somenos. Não estamos a falar de minudências, que diabo. Para efeitos do código penal, para efeitos de denúncia às autoridades, para efeitos de opróbrio na comunicação social, mas também, e sobretudo, para possibilidade de criação, o quanto antes, duma linha telefónica de emergência, um SOS qualquer, ali, logo na abertura das Páginas Amarelas, onde já pontificam o SOS-Grávida, o SOS-Criança, o SOS-Voz Amiga, a Ilga Portugal, os Alcoólicos Anónimos, onde até já resplandece a linha de aconselhamento e apoio para a Criança Maltratada, mas ainda não há a linha Senhora Desancada na Internet, é imperioso que se crie uma. Até quando poderemos pactuar com uma infâmia destas? Até quando terão que suportar tamanho flagelo, em revoltante silêncio, estas criaturas tão vilmente sovadas? Eu próprio, seu principal algoz, me insurjo: depois de bem desancadas, telefonam a quem? Tenho eu o cuidado de lhes deixar, ao contrário do coiro virtual, o telemóvel nas melhores condições, preocupo-me com todo o posterior escoamento da lamúria, e depois elas não têm para onde vazar!?... Nem eu, por via disso, logro um feedback adequado ao esmeril do meu labor. O salário devido ao meu trabalho... Pois, como devem Vosselências compreender, quanto mais se lamuriar, a vítima, mais bem desancada certifica que está. Ora, isto dum Dragão trabalhar sem feedback – melhor dizendo, sem som de retorno - não se admite. É o mesmo que obrigar um maestro a dirigir com tampões nos ouvidos, ou com a orquestra soterrada na cave do prédio do outro lado da rua. Não há palavras capazes de exprimir a dimensão da minha revolta!...
Registada esta, e já que estamos em maré de perguntas cabeludas, passemos a outra questão chispante cuja escalpelização se me afigura premente.
Porque será que eu, na minha qualidade de rufião impenitente e no exercício de tão primitivos instintos, desanco senhoras?
Ora bem, ao insinuar o paralelismo doméstico, a Sô Dona Sara Monteiro usou de astúcia felina. Assim, extrapolamos facilmente: tal qual o brutamontes caseiro arreia na desvalida esposa, por via da sua maior força física, eu, estoira-vergas blogosférico, desanco as pobres senhoras da internet, por causa da minha superior força intelectual. Elas vão a passar com os seus argumentos esbeltos e sensíveis, mas frágeis, coquetes, inocentes, e surjo eu, de supetão, com os meus silogismos rudes, ogrescos, verrinosos, mas musculosos, calmeirões, pérfidos, e zás, apalpo-as, desanco-as e sabe-se lá mais o quê. Eis a prova acabada da minha cobardia empedernida e da excelência do libelo da Sô Dona Sara Monteiro. Como qualquer poltrão energúmeno, com os Pachecos Pereiras, os Mirandas, os Pereira Coitadinhos e outros valentes que tais não me meto, porque esses, claro está, sovar-me-iam sem dó nem piedade. Não; é só com as senhoras. A desancar nelas é que eu sou bom. Porque, como a digníssima senhora Monteiro estipula, são mais fracas, são presas mais fáceis. Quiçá, mais apoucadinhas, coitadas. Estão à mercê dum intelecto predador como o meu - um Hulk retórico à desfilada numa loja de bibelôs freudo-marchistas de porcelana. O que é facto é que, ao primeiro solavanco, os camionistas dissipam-se e voltam as cinderelas melindrosas. Fungando arrufos. Apelando ao estatuto especial de animal protegido, no defeso. A testosterona injectável cede lugar ao botox. Senhoras de loja de conveniência. Que porco machista que eu sou!...
Porém, como a cobardia não tem limites e, uma vez engrenado o vício, cada degrau é sempre mais abjecto que o anterior, não tenciono ficar por aqui. Desengane-se quem assim pensa. Uma vez abominável, nenhuma abominação será bastante. Isto de desancar senhoras é só o preâmbulo, o aquecimento, a prancha de saltos. Na verdade, estou só a treinar para a abjecção seguinte. Que será desancar crianças. E depois bebés recém-nascidos. A seguir, já bem adestrado, atirar-me-ei aos fetos quase nascituros. Após esse estágio, passarei aos fetos de três meses - aqui, naturalmente, já em apoteose pública da esquerda barbie. E finalmente, no zénite deste meu mergulho encarpado, com pirueta e parafuso, deste afundamento palúdico na sordidez e na imundície, desancarei embriões. Ainda chego a presidente da União Europeia.

sábado, janeiro 13, 2007

Enquanto esperam...

Pelo próximo postal. Vão rilhando presunto e escutando os Doors. Um prelúdio apropriado.

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Fosga-se!...

Tenho a dizer que já ordenei ao Youtube, duas vezes, que pespegasse aqui com um vídeo musical, de assaz bom gosto como é meu timbre, mas a porcaria da gingajoga americanóide, ou o Blogger, ou o pénis que os fecunde a ambos, fazem ouvidos de mercador. Eu a querer amenizar-vos a espera, a tentar suavizar-vos o stress pré-traumático, a esforçar-me por poupar-vos as unhas, e eles, os grandessíssimos filhos de uma grande meretriz, nestas relutâncias e encanzinamentos!...
Às vezes apetece-me desatar aos tiros nesta substância de teor fétido e excrementício!...

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Constelações virtuais

A blogosfera portuguesa, à semelhança do vasto cosmos, está organizada em constelações. Cada constelação, como manda a lei, tem as suas estrelas, planetas, cometas, satélites e um ror de calhaus heteróclitos a vadiar pelo espaço, às manadas. Luas, quasares, pulsares e buracos negros também não faltam. E até o demiurgo desastrado, ventoso e trapalhão de que nos falam as fantasias gnósticas por lá anda, qual galhudo estéril a arder em vaidades progenitoras. Bem, ele e uma série de Supremos-Trolhas a armar ao Arquitecto.
Posto isto, memorizem e vamos ao que interessa.
O Timshel tem o triste e deplorável hábito de linkar postais meus. Chega ao cúmulo de garimpar-me até a caixa de comentários na demanda sabe-se lá de que bugigangas e porcarias. Não contente com isso, ainda mantém um link permanente para este corpo celeste mal frequentado – isto, note-se bem, quando grande parte da constelação a que pertence já teve o cuidado de me deslinkar, banir da raça humana e persigna-se de alto a baixo só de ouvir falar no meu nome. Para juntar o escarro ao insulto, o Timshel concede-se ainda o desplante de fazer acompanhar os linkes peçonhentos com comentários infelizes, e tantas vezes torpes, como: “grande Post!”, “post genial!”, “do melhor que li" (na retrete, presumo), etc, etc.
A única explicação que encontro para tamanha bizarria, a única que sinceramente me ocorre é que o Timshel, manhoso ou etilizado de seu regular, faz isto para me humilhar. Ao mesmo tempo que se cobre de opróbrio aos olhos dos seus constelares, submerge-me a mim em monumental ridículo. É evidente que está a usar –não direi fina, porque posta tradicionalmente grosso - mas espessa ironia. Nos seus mais tresloucados devaneios de S. Jorge Nulo, imagino eu, deve urdir e alinhavar o seguinte cálculo: “lisonjeio a besta, ganho-lhe a confiança, adormeço-o na cantiga, infiltro-me no antro e zás!, decapito-o dum só golpe.”
Por outro lado, o opróbrio dá-lhe imenso jeito, propicia-lhe inauditos benefícios, pensa ele. Sonha (ou delira) ver-se cuspido e vilipendiado, de madeiro às costas, por um qualquer Calvário acima, numa neo-Paixão peregrina. E o certo é que, paulatinamente, lá vai levando a água ao seu moinho (a água e o vinho, a água-pé em suma, uma mixórdia inenarrável enfim). Inebriado nela, galga infâmia atrás de infâmia e despenca-me de vexame em vexame, cada este mais sórdido que aquele. O último degrau nesta ignóbil cascata surgiu a propósito do penúltimo postal desta casa, que o caviloso fulano se lembrou mais uma vez de linkar capciosamente lá no genuflexório respectivo. A reacção não se fez esperar. Uma porta–voz da constelação onde o Timshel orbita veio, de tábuas em riste, em solene e severa embaixada, esconjurar-me a mim e censurá-lo a ele. Com aspereza, diga-se, pouco tranquilizadora e anunciadora de sanções futuras ao nível, no mínimo, do Conselho de Segurança. Estou aqui desfeito e com o coração nas mãos...
Para encerrar este primeiro capítulo, gostaria apenas de deixar bem claro o seguinte: Constelares do Timshel, tendes toda e absoluta razão. É inadmissível, além de contumaz, o comportamento desse psicopato. Mas se me permitis o conselho, dir-vos-ia que o seu caso clínico já não vai lá com simples censura. Aliás, nem simples, nem complexa. Tão pouco com um gulaguezito ultra-lights, a leite e soja. Agora, um energúmeno desarvorado desses, já só mesmo com um exorcismo. E dos valentes.

PS: No próximo capítulo analisarei, com a devida atenção, as sentenças da ilustre censora. Estou só a reunir os meus cacos. Não é fácil teclar feito neles.

quarta-feira, janeiro 10, 2007

Formidável Mundo Novo



Os Americanos, no exercício da sua idiossincrasia básica, começaram a bombardear a Somália. O pretexto é o do costume: enxames de terroristas islâmicos reclamam tratamento urgente.
Não sei se há, não sei se não há. O que sei, disse-mo um passarinho, é que as Forças Americanas estão equipadas, todas elas, com munições mágicas. Munições mágicas e armas inteligentes, argutas, preclaríssimas. Uma bala, uma granada, uma bomba americana que atinja um qualquer muçulmano, automaticamente, instantaneamente, transforma-o num terrorista islâmico. Desmascara-o sem margem para dúvidas. Actualiza essa íntima potencialidade maligna que palpita nele desde embriãozinho descartável e tendencialmente excessivo. Mesmo que ele não faleça ou gema prontamente ferido, mesmo que fique apenas atordoado e caia prisioneiro das hostes benignas, não tardará a revelar-se. É só o tempo da aplicação dos instrumentos e técnicas de tortura americanas, também elas mágicas e altamente aruspicientes. Infinitamente superiores a qualquer professor Karamba, taróloga Maia ou Pacheco Pereira da nossa praça.
E todo esta panóplia inefável funciona apenas com muçulmanos ou árabes? Nem por sombras. Fraca tecnologia seria então. Bem pelo contrário, funciona com qualquer pessoa, em qualquer parte do mundo, a qualquer hora, mês ou estação. Congratulemo-nos portanto, pois não apenas é capaz duma metamorfose simples, como, acima disso, milagre tecnológico de pasmar, consegue na perfeição a complexíssima metamorfose dupla. Ou seja, não apenas transforma instantaneamente um muçulmano avulso num terrorista encartado, como converte um chinês, um europeu, um papua, um esquimó, ou quem quer que seja num muçulmano e, no mesmo instante, com sortilégio ímpar, o muçulmano num perigoso e diplomado terrorista da Al-Qaeda.
A verdade é que uma bala americana funciona simultaneamente como detector-conversor. Mais que admirável, é já todo um Formidável Mundo Novo.

Portanto, caros leitores, confiemos nesta boa gente. A ciência mais avançada e o armamento derivado conferem-lhes dotes de infalibilidade. Para quem queira acompanhar mais esta campanha benemérita da Somália, abundam por aí as notícias. Todas elas suavizantes, perfumadas, adeptas da barbie-war.
Sem querer ser desmancha-prazeres, eu deixo-vos apenas com esta:

A Tirania das Vísceras

Era preciso estar morto para resistir a uma pérola destas:
«Um embrião é uma coisa descartável, tendencialmente excessiva, que eventualmente nidifica nas entranhas de uma pessoa fértil.»

Não deixa de ser enternecedor um tal axioma. Todavia, se o que a gentil menina pretende é definir o “embrião”, lastimo alertá-la, mas falha redondamente. Nem sequer o distingue de uma lombriga.
E ainda ficamos a interrogar-nos se não estará a confundir o “embrião” com o “amante”.
Mas não menos curioso –e problemático – é o facto desta fórmula apresentar algumas funcionalidades inquietantes. Das inúmeras, cito apenas três, por piedade e economia...
Primeiro exemplo: basta substituir “embrião” por “trabalhador” e “pessoa” por “empresa” e o axioma funciona às mil maravilhas, tendo-se então “um trabalhador é uma coisa descartável, tendencialmente excessiva, que eventualmente nidifica nas entranhas de uma empresa fértil”. O que, como sabemos, já é quase um dogma do nosso tempo. (Ou, se preferir, em vez de "trabalhador" escreva "funcionário" e em vez de "empresa" grafe "ministério" ou "instituto público").
Segundo exemplo: é só comutar “embrião” por “pessoa” e “pessoa” por “planeta”, e lá continua ele, o axioma, todo prático - tendo-se então “Uma pessoa é uma coisa descartável, tendencialmente excessiva, que eventualmente nidifica nas entranhas dum planeta fértil.” O que, estamos fartos de saber, reflecte bem o panorama da globalização aos molhos.
Terceiro exemplo: reveza-se “embrião” por “habitante” e “pessoa” por “região”, e o axioma persiste sem pestanejar – passando nesse caso a ter-se “Um habitante é uma coisa descartável, tendencialmente excessiva, que nidifica nas entranhas duma região fértil”. O que, ninguém duvida, corresponde na perfeição a um dos pilares sagrados da Religião do Lucro.
Conclusão: se falha clamorosamente na definição do embrião, o axioma supracitado é, em contrapartida, deveras perspícuo na definição de outras coisas. A mais irónica delas é que a nossa esquerda moderna - a nossa esquerda urbana, feminina, sensível, idólatra das minorias, dos estrangeiros e dos aleijadinhos -, professa, apregoa e defende com unhas e dentes o neo-liberalismo das entranhas. Quer dizer, é toda solidária e social por fora e toda egoísta e selvático-capitalista por dentro.
Por uma questão de coerência, devia bater-se, com o pundonor característico, por uma alteração imediata na terminologia da pergunta a referendar: em vez de "interrupção voluntária da gravidez" devia figurar "deslocalização do útero" ou "despejo de excedentário".


PS: Antes de, com cindereliquice trolha, instituírem ou exercerem desabridamente a "tirania sobre as vísceras", as candidatas deveriam certificar-se que não são as vísceras que lhes tiranizam os pensamentos. Ou melhor dizendo, que não estão a ser vítimas colaterais do tradicional conflito de interesses entre o grelo e o útero.

terça-feira, janeiro 09, 2007

A Idade da Cegueira



«"Jesus, lembra-te de mim, quando estiveres no teu Reino". Ele respondeu-lhe:" Em verdade te digo, hoje estarás comigo no Paraíso."»
- Lucas, 23, 42-43


«Por fim, ainda mais frequentemente, quase pode dizer-se ininterruptamente, havia as execuções. A cruel excitação e a rude compaixão suscitadas por uma execução constituíam uma importante base do alimento espiritual do povo. Eram espectáculos nos quais se continha uma moral. Para os crimes horríveis a lei inventava punições atrozes. Em Bruxelas, um jovem incendiário e assassino foi colocado dentro de um círculo de feixes de lenha a arder e atado a uma corrente que girava em torno dum eixo. Ele dirigia aos espectadores apelos comoventes "e de tal modo enterneceu os corações que todos desataram a chorar e a sua morte foi considerada como a mais bela que jamais se viu". Durante o terror borgonhês em Paris, em 1411, uma das vítimas, o senhor Mansart du Bois, tendo-lhe o carrasco pedido perdão, segundo o costume, não só lho concede de todo o coração, mas ainda lhe diz que o abrace. "Havia sempre grande multidão de povo e quase todos derramavam comovidas lágrimas".
Quando os criminosos eram grandes senhores os homens do povo tinham a satisfação de ver aplicado o rigor da justiça e ao mesmo tempo verificar a inconstância da fortuna exemplificada por forma mais impressionante do que num sermão ou numa pintura. O magistrado punha todo o cuidado em que nada faltasse para "efeito do espectáculo": o condenado era conduzido ao cadafalso vestido com o garbo devido à sua elevada condição. Jean de Montaigu, grão-mestre do palácio do rei, vítima de João Sem Medo, é colocado numa carreta precedida por dois trompeteiros. Leva as suas vestes de gala, gorro, capa, as meias metade vermelhas metade brancas e as esporas de ouro. Estas são deixadas nos pés do corpo degolado, suspenso da trave. Por ordem especial de Luís XI a cabeça de Mestre Ouidart de Bussy, que recusara um lugar no Parlamento, foi desenterrada e exposta na praça de Heslin, coberta com um gorro escarlate forrado de peles "selon da mode des conseillers du Parlament" e com versos explicativos.»

- Johan Huizinga, "O Declínio da Idade Média"


O grande "espectáculo" medieval -a execução pública - está mais próximo da tragédia grega que do circo romano. Desperta sentimentos mais nas imediações do terror e da piedade que do gáudio violento e animalesco. É mais catarse que entretenimento. Os espectadores educam-se, aprendem uma profunda lição. Suspeitam que ao lado de cada condenado, no patíbulo derradeiro, na agonia final, vela ainda Cristo pregado à sua cruz, entre criminosos.
Chamamos à Idade Média a Idade das Trevas. Foi preciso esperar pelo Iluminismo da guilhotina, pelas harpias tricotadeiras da praça da Revolução, para que a execução fosse entregue a uma máquina e a morte ganhasse contornos de indústria e dignidades de burocracia. A chacina toma carácter de empreitada. O povo não aprende: vinga-se. Refastela-se nos seus mais baixos e primitivos instintos. A morte, enfim, banaliza-se. Já nada de trágico, ético ou profundo encerra. Mata-se um homem como se mata uma galinha. Pois a principal diferença entre ambos, a bem da Razão e da Liberdade, foi abolida.
Se chamamos Idade das Trevas à Idade Média e Idade das Luzes à Idade Moderna, então forçosamente, temos que chamar à nossa a Idade da Cegueira. Tanta luz cegou-nos. Tanta liberdade escraviza-nos.

segunda-feira, janeiro 08, 2007

O Saque-mate


Relembrem-me só: quem engendrou as sanções, quem moveu a guerra e quem, com tudo isso, ocasionou a debandada dos quadros?
É impressão minha, ou são os mesmos que agora vão agenciar lucros fabulosos com a nova lei?
Outra coisa: onde se lê Companhias Ocidentais, entenda-se "Companhias anglo-americanas", essencialmente.

Quanto à moral da história, é extremamente imoral e salda-se numa frase:
A democracia é a pele de cordeiro da Cleptarquia.

Mais uma Linha Directa ao Além

Mehmet Ali Agca, ex-magnicida frustrado, é agora profeta único e concessionário exclusivo da verdade eterna para este planeta e arredores. Como prova disso, acaba de escrever a Bíblia Perfeita. O Altíssimo, já ninguém duvida, reune-se com ele, semanalmente, na cela de alta-segurança do claustro onde, por voto de eremitério involuntário, se encontra arrecadado em profunda meditação. Calcula-se que foi durante tais concílios que, por desígnios inescrutáveis, o adestrou nas eméritas funções aruspicientes e abasteceu dos plenos-saberes veracípetos indispensáveis à redacção, sem qualquer erro gramatical, das Autênticas porque Perfeitas Escrituras. Finalmente, ficamos a saber o nosso futuro. O apocalipse, por exemplo, já não tarda muito. No vosso caso, pensava seriamente nisto e arrepiava caminho. Não sei se vale a pena andar uma vida inteira a pagar a casa, para depois vê-la toda feita em cacos por razões escatológicas inadiáveis. Como investimento, não me parece de todo prudente.
Mas que fique bem claro: serei a última pessoa da paróquia a contradizer uma clarividência desta envergadura. Aflige-me apenas uma pequena curiosidade: o que dirão o Bispo Edir e o outrora Pastor mas agora Apóstolo Tadeu da erupção meteórica dum rival destes?...

Édipo lá ao fundo



«És tu próprio o assassino que procuras.»
- Sófocles, "Rei Édipo"

«Não julgueis, para não serdes julgados; pois conforme o juízo com que julgardes, assim sereis julgados; e com a medida com que medirdes, assim sereis medidos.»
- Mateus, 7, 1-2

«Triunfas sobre o monstro que tiranizava a cidade e não vês aquele que, de soberba e vanglória, trazes em ti. Assim como agora o serves cegamente, assim um dia serás juiz e carrasco de ti próprio.»
- Dragão

O Presente é a coutada onde o Destino monta as suas armadilhas.

domingo, janeiro 07, 2007

A pena da Morte

«Bem-aventurados os que se compadecem, porque alcançarão misericórdia.»
-Mateus, 5, 7

Em rigor, somos todos condenados à morte. Desde o dia em que nascemos. Desde o instante em que fomos concebidos.
Há um poder que de facto não temos nem nos pertence: dar ou tirar a vida. Mesmo quando o exercemos por usurpação, tudo não passa de fátua ilusão de fantoche, vã fantasia de bonifrate. A Vida, do pouco que sabemos dela, já cá estava antes de nós e continuará depois de termos acabado, quer enquanto indivíduos, quer enquanto espécie. No misterioso processo, somos meros passageiros, estafetas, peregrinos. E usurários. Vivemos a crédito, morremos a prazo. A nossa vida é simultaneamente a nossa morte. O tempo que demoramos a viver é exactamente igual ao tempo que demoramos a morrer. A biografia equivale ao obituário. O berço é já o prelúdio da sepultura. Que durante o percurso nos esmeremos em infernizar a existência uns aos outros, isso já é outra conversa e apenas atesta duma certa tendência rilhafolesca que, entretanto, de predominante, se vem pomovendo a obsessiva. Mas executados, mais dia menos dia, seremos todos: santos e pecadores, psicopatas e boa gente, pobretanas e banqueiros, humildes e pomposos, génios e mentecaptos, tiranos ferozes e democratas mansos, todos. Sem excepção. Por decreto superior, eterno e inexorável. Imune a subornos, bajulações, compras e súplicas. É todo um cadafalso em forma de esfera a boiar no espaço. Nem os Deuses escapam.
Não faz pois qualquer sentido falar em "pena de morte" como se fosse invenção nossa. Quando, na mais arrotante e bufa das hipóteses, não passamos de carrascos de pechisbeque, verdugos de pacotilha, torcionariozinhos de fancaria. Todavia, com que pompa e circunstância as marionetes macaqueiam as parcas ou os guinchantes títeres se travestem de eríneas!... Com que folclore histriónico os piratas e flibusteiros brincam aos juízos capitais!...
Os condenados gostam de armar ao magistrado. Encarcerados para a vida, sem direito a perdão nem condicional, fatalmente prometidos ao patíbulo, entretêm-se a martirizar-se uns aos outros. De todas as maneiras e feitios. Qual ensaio geral para o inferno. Desencantados com deuses surdos e ausentes, sabujam agora a própria Morte. Para desforra do Deus-que-já-não-está-no-Céu, devotam-se à Negra Ceifeira-que-está-na-Terra. Sacrificam-lhe de empreitada. Erguem-lhe indústrias. Preparam-lhe banquetes. Esforçam-se por agradar-lhe com hecatombes. Estendem-lhe babetes e aperitivos. Mimam-na. Acreditam talvez que matar rejuvenesce, que faz bem à pele, que hidrata os tecidos e revigora as células. Que estando do lado da Morte, talvez ela os agracie, os gratifique como a qualquer lacaio devoto ou acólito sebento... lhes conceda, vá lá, um adiamentozito, uma suavização no suplício final, quiçá, melhor dos mundos, uma anestesia geral, moral. Sobretudo, moral. Com toda a força. Aliás, é já nisso que se adestram, a fundo, a criar músculo, calo, crosta, concha, chifre: na insensibilidade à sua própria morte através da insensibilidade à morte dos outros. Perfeita ataraxia reptiliana. Gelatinosa. E lá porfiam por antecipar a dos outros, tentando assim ganhar tempo para a sua.
Não é grande custo - e ainda menos grande proeza ou mérito - matar alguém. Enfim, abreviar-lhe ou apressar-lhe a sentença. Recordo, para ilustração disso mesmo, uma daquelas lendas acerca de Diógenes, que nem a Morte, nem os esbirros dela conseguiram ainda apagar. Consta que Perdicas, general de Alexandre, armado da pesporrência e arbitrariedade dos tiranetes, terá um dia convocado o filósofo à sua presença, nos seguintes e algo rudes termos: "ou compareces imediatamente, ou mato-te". Diógenes retorquiu com o despreendimento, o desprezo e o humor característicos e devidos: "Não vejo nada de extraordinário nisso; um escorpião ou uma tarântula podiam fazer o mesmo."
E, de facto, não é a matar que um homem se distingue de qualquer insecto venenoso e rastejante. Tal qual como se define não só diante da sua morte, que é a sua vida, como perante a morte do seu semelhante. Sendo cristão, se crê verdadeiramente em Cristo, compadece-se; sendo apenas um homem, guarda o silêncio devido à tragédia. Regozijar-se com cadáveres alheios não é digno nem dum cristão, nem dum homem: é digno de uma hiena. Dum chacal. Ou de qualquer necrófago avulso. Uma criatura destas nem digna sequer é da pena de morte que sobre si impende. É, tão sòmente, digna de pena.

Triste de quem não percebe que o Livro da Vida é escrito com a pena da Morte.

sábado, janeiro 06, 2007

Especialmente para o Flávio

Um ex-Mossad explica sucintamente essa técnica do "labelling".

quinta-feira, janeiro 04, 2007

Previsão de 2007 para os meus leitores politicamente correctos, sionistas furtivos, americanólatras menstruados e demais patrulheiros ocasionais:

Caros,

Eu sou vosso treinador. Nada mais que isso. Digamos que o contrato é esse e está bem delimitado. A minha obrigação é fazer-vos amarinhar às paredes. E, que diabo, modéstia à parte, temos que ser honestos: vós outros trepais já com louvável desembaraço e afoiteza admirável. Mas atenção, nada de megalomanias. Não vamos agora exigir milagres. A minha área é a metodologia do treino, não é a metafísica energumenizante. Quer dizer, sou treinador, não sou Deus. Tenho os meus limites, os quais, por acaso, até imbricam nos vossos. Capacitemo-nos: o facto de eu, não raras vezes com paciência de Cristo e perseverança de Hércules, vos conseguir pôr a trepar às paredes em tempo record é uma coisa. Que daí se possa deduzir que vos posso transformar no Homem-Aranha, ah, vamos com calma, sim? No mínimo, vamos dar tempo ao tempo.
Uma coisa é certa: ainda não será em 2007.

quarta-feira, janeiro 03, 2007

O Império do Caos


O linchamento de Saddam Hussein, na data e circunstâncias peculiares em que decorreu, constitui, senão prova, pelo menos indício gritante de dois fenómenos cada vez mais óbvios:
1. Esgotado o mercado para o "american way of life", parece que os cowboys estão agora a especializar-se na exportação do "american way of death";
2. Ao contrário do que tanto se propagandeia (e o pacóvio militante desde logo -sem sequer mastigar - engole, arrota e regurgita), não é a instauração de uma Nova Ordem Mundial aquilo que, tanto e tão freneticamente, ocupa os músculos dos Estados Ungidos mais o seu Vírus Mental. Pelo contrário, é apenas a prossecução duma Permanente Desordem Global. Pois aquilo que implantam onde quer que a pata os reboque é, em bom rigor, um completo, premeditado e refinado caos.
De resto, que interesse poderia ter numa qualquer Ordem o Presidente e Proxeneta Principal da Desordem?
Sejamos realistas: não se trata da instauração de nenhum tipo de Ordem, muito menos Nova, mas apenas do reforço no controlo e administração do Caos.

Droga Loucura Morte



A propósito ainda do postal anterior, lembrou-me uns cartazes que, em finais da Primavera Marcelista, começaram a ser afixados pelos liceus e árvores da cidade. Arvoravam a seguinte mensagem:
Droga, Loucura, Morte.
Agora, trinta anos depois, em pleno ocaso Abrileiro, já se justificava uma campanha de cartazes (agora chamados outdoors) da mesma índole, mas com uma ligeira alteração:
Telenovela, Loucura, Morte.

Evolução, se virmos bem, não houve. Foi apenas a droga que mudou de nome. E o espaço para ingerir a xaropada, que diminuiu consideravelmente.

Síndromes típicas

Fiquei a saber que existe a SDA, acrónimo de Síndrome de Dependência de Álcool, e a SAA, ou Síndrome de Abuso do Álcool. Da primeira estima-se que padeçam cerca de 580 mil portugueses; do segundo, à volta de 746 mil. A percentagem de mulheres copofónicas tem vindo a aumentar galopantemente.
Tudo isto é deveras preocupante. Mas não tão alarmante, apesar de tudo, como a SDT ou a SAT, respectivamente Síndrome de Dependência de Telenovela e Síndrome de Abuso de Telenovela. Destas, devem padecer, numa estimativa optimista, cerca de nove milhões e meio de portugueses. Não só mulheres com fartura, mas, sobretudo, criancinhas, agarradas ao ecrã desde a mais tenra idade. E cada vez mais homens, pelo menos na aparência.
Outras Síndromes consumptivas que devastam o rectângulo:
A SDF (Síndrome de Dependência do Futebol) e SAF (Síndrome de Abuso de Futebol);
A SDEP (Síndrome de Dependência do Erário Público) e a SAEP (Síndrome de Abuso do Erário Público);
Finalmente, e sem querer ser exaustivo (já que me ocuparia aqui o resto do dia), a SDEP (Síndrome de Dependência da Estupidez Popular); a SDOA (Síndrome de Dependência da Opinião Alheia) e, uma que me incomoda a mim muito particularmente, a SANP (a Síndrome de Abuso da Nossa Paciência).
É que tenho um pavio inversamente proporcional à gaita: curtíssimo.

terça-feira, janeiro 02, 2007

Conselhos gratuitos para 2007

Vejam menos filmes (ou televisão) e façam mais ioga.

Crocodilos de esgoto

É sempre instrutivo verificar que aqueles répteis anfíbios de grande porte e pele escamosa que mais lágrimas vertem pelos massacres do passado, são aqueles que mais hermeticamente fecham os olhinhos, enquanto vão palitando a dentuça, às chacinas do presente.

O Dogma gay

"Homophobia spies in the classroom":
«As escolas que não manifestem suficiente entusiasmo em eliminar preconceitos contra homossexuais, devem ser denunciadas à polícia por alunos e pais, recomendou ontem um relatório do Ministério do Interior (Home Office).
O mesmo documento apela aos pais e crianças para que identifiquem escolas que ignorem linguagem "homofóbica" no recreio e professores que produzam lições "homofóbicas".
E apela aos directores das escolas para que promovam lições acerca da "homofobia" durante o horário escolar e empenhem os alunos em "semanas de consciencialização" gay.
A recomendação dos funcionários do Ministério de John Reid, chega numa altura de grande preocupação entre as igrejas por causa das novas leis sobre direitos gays, a serem introduzidas na próxima primavera, as quais poderão conduzir ao abandono da moral sexual tradicional nas escolas, forçando-as a incluir em seu lugar, nas aulas, o dogma dos direitos gays.»

Não percam a leitura completa do artigo. É simulteamente hilariante e inquietante. Mas, por outro lado, também nos tranquiliza. Finalmente, começamos a perceber a utilidade das escolas no futuro. Até aqui vinhamos constatando, com alguma perplexidade, que já não serviam para ensinar matérias obsoletas e contraproducentes, como, por exemplo, (no nosso caso) português, matemática, história, ciências, um mínimo de civismo, etc. Pois bem, uma vez extinta essa péssima tradição, devidamente filtrados e saneados os agentes problemáticos, é-nos cada vez mais permitido vislumbrar, com certo grau de clareza, toda a moderníssima engenharia que será implantada em seu lugar: dogmas. Dogmas históricos, políticos, sociais, sexuais, tribais, banais, enfim, toda uma engenharia dogmática. As escolas, louvado seja o Senhor, vão derivar em Neo-Madrassas - madrassas fast, cool, big, pink, western style, bem entendido.
Aleluia! As ciências sociais e humanas vão tornar-se finalmente exactas. Até que enfim. A história com o rigor da matemática! A sociologia com a certeza da aritmética! Os Tribunais entregues a computadores!...

A ovelha rosa da família

Cientistas abelhudos da Oregon State University, em Corvallis, e da Oregon Health and Science University, em Portland, estão a causar furor, escândalo e indignação entre a Comunidade Gay Americana (e, já de seguida, Global). Por enquanto, o berbicacho decorre, ainda e apenas, ao nível das ovelhas, mas teme-se -temem eles, os gays, avisados -, que alastre logo a seguir aos humanos. O facto é que, através dum qualquer tratamento hormonoficiente, os cientistas estão a corrigir as ovelhas gays do seu desvio comportamental. E a terapia parece que resulta: os carneiros voltam a preferir ovelhas, e estas a preferir o carneiro ou, algumas mais excêntricas, o próprio pastor. Ora, isso «abre perspectivas de, num futuro próximo, poder vir a ser disponibilizado um tratamento às mulheres grávidas que reduza ou elimine o risco dos seus rebentos provirem homossexuais. Os especialistas afirmam que, em teoria, a coisa pode mesmo vir a ser tão simples como um complemento hormonal que as futuras mães tomam, via cutânea, ao jeito daqueles pensos de nicotina anti-tabágicos» .
Naturalmente, esta perspectiva não agrada aos homossexuais adultos em exercício. Não agrada mesmo nada. Desagrada até profundamente. Pela voz de Martina Navratilova, insurgem-se contra estas frankensteinices e proclamam o "direito das ovelhas a serem gays". Já o direito das mesmas a não serem chacinadas no matadouro mais próximo não parece preocupá-los tanto, se é que os preocupa alguma coisa. Aliás, pela lógica da seita, uma reinvindicação plausível a breve trecho será a implementação municipal de "matadouros gay", onde serão apenas processados animais gays, para alimento exclusivo da Comunidade Gay (que, dessa forma "koscher"-quer dizer, altamente higiénica - verá revigoradas e reforçadas as suas virtuosas inclinações e respectivos baluartes genéticos). Mas a antiga campeã tenista, para dar corpo à repulsa que grassa na confraria, abisma-se ainda mais. Nas suas próprias palavras: "Como é possível que em pleno ano de 2006, uma importante universidade abrigue tão cruéis e homofóbicas experiências?"
Realmente, que despautério inqualificável!...
Pensar que uma mãe pode cercear -ou até banir - as tendências gays do seu embrião é inadmissível! Ainda mais nestes tempos modernos e progressistas. Lá que a dita senhora o despeje na sanita mais conveniente, pronto, a barriga é dela, é um direito que lhe assiste. Agora que interfira com a sua livre expressão sexual, isso é que não! Nem por sombras! Chamem a polícia!...
Em sendo gay, nem que seja por mera hipótese, o embrião torna-se de imediato um cidadão de pleno direito.