Lembro-me de em tempos ter lido este incontornável esboço lírico no "Terra da Alegria":
«- Gostava de viver uma igreja sem celibato.
- Gostava de viver uma igreja com as mulheres também no altar a celebrar como presbíteras.
- Gostava de viver uma igreja em que o sexo não é crime ou pecado.
- Gostava de viver uma igreja em que a secularização não é inimiga.
- Gostava de viver uma igreja em que todos são iguais perante Deus, independentemente de género, raça ou orientação sexual.
- Gostava de viver uma igreja que pega no megafone para protestar contra salários de miséria ou a pobreza das arcadas e que não abra a boca só porque um crucifixo caiu da parede ou a barriga é de todos.
- Gostava de viver uma igreja que rejeita o abuso sexual de menores, mas não tem medo de entregar os que prevaricam ou pecam, sem confundir com a homossexualidade, que é de outro reino.
- Gostava de viver uma igreja que é deste mundo, sem medo de se parecer demasiado com este mundo.
- Gostava de viver uma igreja que é de homens e mulheres.
- Gostava de viver uma igreja que não expulsa os que rezam de modo diferente ou que afasta quem não caminha na procissão das velas.
- Gostava de viver uma igreja que fosse Igreja»
Assina um crente -pelos vistos - devastado de angústias que dá pelo nome, de registo e baptismo (suponho), de Miguel Marujo.
«- Gostava de viver uma igreja sem celibato.
- Gostava de viver uma igreja com as mulheres também no altar a celebrar como presbíteras.
- Gostava de viver uma igreja em que o sexo não é crime ou pecado.
- Gostava de viver uma igreja em que a secularização não é inimiga.
- Gostava de viver uma igreja em que todos são iguais perante Deus, independentemente de género, raça ou orientação sexual.
- Gostava de viver uma igreja que pega no megafone para protestar contra salários de miséria ou a pobreza das arcadas e que não abra a boca só porque um crucifixo caiu da parede ou a barriga é de todos.
- Gostava de viver uma igreja que rejeita o abuso sexual de menores, mas não tem medo de entregar os que prevaricam ou pecam, sem confundir com a homossexualidade, que é de outro reino.
- Gostava de viver uma igreja que é deste mundo, sem medo de se parecer demasiado com este mundo.
- Gostava de viver uma igreja que é de homens e mulheres.
- Gostava de viver uma igreja que não expulsa os que rezam de modo diferente ou que afasta quem não caminha na procissão das velas.
- Gostava de viver uma igreja que fosse Igreja»
Assina um crente -pelos vistos - devastado de angústias que dá pelo nome, de registo e baptismo (suponho), de Miguel Marujo.
Ora, como vale mais tarde que nunca, é no meu estrito avatar mefistofélico que lhe acudo. Não tanto por piedade, que é virtude que não ginastico (só de pensar disso até me dão vómitos), mas mais por fastio, que já estou pelos cabelos, digo cornos, com tamanhas lamúrias. E nem sequer lhe venho propor nenhum negócio obscuro que envolva rubrica com o próprio sangue, sossegue. Por muito que lhe custe entender, o demónio também tem princípios deontológicos. Um deles, basilar, tem a ver com um rigoroso método de selecção: só me interessam, em termos aquisitivos, almas grandiosas, a fervilhar de grandes paixões sublimes ou projectos mirabolantes - almas raras , enfim. Poder-se-ia mesmo dizer que nós, demónios, prospectamos almas com a mesma gulodice com que os humanos garimpam diamantes e outras jóias. Santos, artistas, pontifices, príncipes, filósofos congregam todo o nosso interesse. Desviar um portento desses, conquistar um tal baluarte, aí sim, aí é que nos realizamos. Ora, o que o caro senhor pede e invoca é bem irrisório. Ordinário até, desculpe que lhe diga. Se quer uma igreja igual ao mundo, para que precisa da igreja? Esse seu balido de ovelha descontente, reivindicadora, significa exactamente o quê? - que o pastor devia largar o cajado e por-se de quatro, a trotar e a tasquinhar tenros e verdejantes prados ao lado do rebanho? Que em vez, por conseguinte, de lhe ministrar firme bordoada e pedrada certeira, de modo a guiá-lo num qualquer caminho, passasse a segui-lo, em babélica pandilha, para onde, à carneirada lampeira, lhe desse na real bolha?...
Enfim, dir-se-ia que o terráqueo Marujo, não contente de ter o rebanho infestado de lobos com pele de cordeiro, urde por pastores nos mesmos e bizarros propósitos!... Raios!, como se em vez duma doutrina religiosa o obsidiasse um sistema de futebol, do estilo "tudo ao molho e fé em Deus!" Além do mais, é certo e sabido que no dia em que o pastor vestisse a pele do cordeiro, logo as sonsas das ovelhas e carneirada afim tratariam de ir, a correr, crucificá-lo, como sempre fazem ao pastor que condescenda nesses propósitos.
Co'a breca, serafins me despenhem, se vocês humanos não superam as minhas melhores expectativas!... E também as piores. Por este andar, acabo no desemprego. Trato de apresentar a minha demissão ao Todo Poderoso: com matéria prima deste quilate como é que Ele quer que um diabo da minha categoria trabalhe? Vou desviar ou tentar quem? Se andam já todos aos Deus dará, ao sabor de caprichos e apetites que nem a mim me lembram, mais tresmalhados que um ovino doido, chupado das canetas, vou subverter o quê?!... Vou para contaminar uma Criação, um belo edifício, e dou de trombas com um Cancro, um prédio em ruínas a cair de podre! E que diferença faz levá-los depois para o inferno lá em baixo, se eles fabricaram e todos os dias aperfeiçoam e burilam, com artes de filigrana, um inferno cá em cima?... Ora bolas! Ora merda! Ora um íncubo dos avantajados que os noctambulize a todos!...
Co'a breca, serafins me despenhem, se vocês humanos não superam as minhas melhores expectativas!... E também as piores. Por este andar, acabo no desemprego. Trato de apresentar a minha demissão ao Todo Poderoso: com matéria prima deste quilate como é que Ele quer que um diabo da minha categoria trabalhe? Vou desviar ou tentar quem? Se andam já todos aos Deus dará, ao sabor de caprichos e apetites que nem a mim me lembram, mais tresmalhados que um ovino doido, chupado das canetas, vou subverter o quê?!... Vou para contaminar uma Criação, um belo edifício, e dou de trombas com um Cancro, um prédio em ruínas a cair de podre! E que diferença faz levá-los depois para o inferno lá em baixo, se eles fabricaram e todos os dias aperfeiçoam e burilam, com artes de filigrana, um inferno cá em cima?... Ora bolas! Ora merda! Ora um íncubo dos avantajados que os noctambulize a todos!...
Mas o que mais me irrita e desmoraliza, mais ainda que a falta de alma, é a falta de respeito. Não contentes de fazerem da maldade uma banalidade, quererem fazer dela uma (até me custa a soletrar o palavrão!)... virtude.
Deus me acuda, que já não consigo distinguir nada nesta salgalhada toda! Nem católicos de protestantes, nem protestantes de judeus, nem, o que é mais perturbante, os acólitos Dele dos meus!... O que sei é que onde dantes havia uma alma digna de ser roubada, um troféu apetitoso, agora deparo-me invariavelmente com um desmesurado umbigo, uma psicoprótese do tamanho da terra e do céu, promovida com o seguinte cartaz: ALUGA-SE!
Isto enfurece-me. Só não os mando enfiar a psicoprótese no olho do cu porque detesto interromper o pensamento das pessoas. Ainda mais com redundâncias.
E vossência, ó Marujo, estilhaço de asno, veja lá se percebe o elementar: este mundo tem graça enquanto o bordel e a igreja forem locais distintos.
Irra!...