sábado, fevereiro 28, 2009

Impressões digitais

Há mais de dois anos que eu próprio, e não sou economista, vinha anunciando a actual crise. E nem era preciso ter lido as inúmeras vozes de alerta actuais que o vinham diagnosticando: bastava ter lido as tragédias gregas, bastava perceber o significado de "hubris". Crise mais anunciada e previsível, a não ser para o nosso (des)governo da nacinha, seria difícil. Era como olhar para o céu a encher-se de nuvens escuras e não adivinhar chuva; ou perceber uma sala a encher-se de varejeiras e não calcular excremento ou cadáver, passe o pleonasmo, a qualquer canto da habitação.
Mas a actual crise não é apenas lógica: é também, e desconheço em que dimensões, artificial. Algo em tudo isto é forjado, premeditado, planeado. É, muito provavelmente , uma catástrofe; mas uma catástrofe pilotada. Ou teleguiada. Eventualmente, os efeitos poderão ultrapassar os desígnios do piloto, mas isso já é outra conversa.
Porém, embora desconhecendo honestamente os contornos exactos da marosca, sei, com a certeza que a convergência do estudo e dos indícios solidificam, donde emanam alguns cordelinhos: JP Morgan.
Esta notícia é só mais um sintoma disso mesmo:
«JPMorgan Chase faces lawsuits after pulling cash from Madoff».

Note-se, a crise seria mais ou menos fatal, quer dizer, natural; a transformação da crise numa catástrofe é que já requer dedo humano. (Leia-se: "desumano"). É como aproveitar o barulho dos trovões para dinamitar a caixa-forte do banco.

quinta-feira, fevereiro 26, 2009

O Império do Cuspo

O problema de Portugal já é mais grave, mais perigoso e mais profundo que a simples epiderme política e respectivas maquilhagens. A questão já ultrapassa a política: é ontológica. É o próprio ser ou não-ser de Portugal que está em causa. Agravado dum fenómeno sobretodos inquietante: abundam os que se prontificam a dar litros de saliva pela pátria, mas não se vislumbra vivalma disposta a dar uma gota de sangue que seja.
E é nisso que se resume o panorama circundante e o programa geral estabelecido: cuspo. Para onde quer que olhe, pequenas máquinas palradoras emitem as suas onfalorreias irrisórias: monarquias de cuspo, nacinhalismos de cuspo, liberalismos de cuspo, socialismos de cuspo, repúblicas de cuspo, e mil e uma outras gafanhotices de estalo.
Dir-se-ia toda uma gente que nem duma ejaculação germinou, mas dum escarro. Se bem que igualmente precoce.
Naufragou o último dos impérios europeus... num mar de cuspo.



Que medo!...

Parece que me atacaram. Dão-me cá uns abalos.

Involuções

«Monkeys and apes know right from wrong, scientists say»

Há algo de intrigante e bizarro nesta notícia. Passo a explicitar: como é que uma espécie - a espécie cientista - que não possui quaisquer noções de moralidade pode avaliar a capacidade moral de outra - a dos macacos seus ancestrais e parentes? Por outras palavras, como é que tipos que não conseguem distinguir o mal do bem, nem o certo do errado (fora das meras aritméticas e contabilidadezinhas), se permitem formular juízos sobre tal faculdade nos outros?

De qualquer modo, a ser verdade, só comprova aquilo que eu venho defendendo há muitos anos: o cientista não evoluiu do macaco. Pelo contrário, degenerou.

Isto também demonstra como até eu me posso enganar. Assim, aqui há uma pretéritas luas, quando, no exercício das competências que me estão atribuídas, cataloguei o tal Quim de macaco do Arroja, estava, claramente, a exagerar nas capacidades do espécime. Com efeito, não é o macaco: é o cientista. Fica agora reposta a verdade, com um natural pedido de desculpas.

segunda-feira, fevereiro 16, 2009

O Triunfo do Labirinto - 5. As ironias do destino

«[Isaac] Babel had said in his speech at the First Congress of Soviet Writers in 1934:
"In our day, bad taste is counter-revolution... As writers, we must contribute to the victory of a new, bolshevik taste in our country. It will not be an insignificant political victory because, fortunately for us, we do not have victories that are not political... The style of the Bolshevik epoch is calm, strenght and self-control; it is full of fire, passion, power, and joy. Who should we model ourselves on?... Just look at the way Stalin forges his speechs, how chiseled his spare words are, how full of muscular strenght."
Babel was executed for bad taste - for not mastering the style, not being able to forge himself like Stalin.»
- The Jewish Century", pp.271

«Once, when after another arrest, I asked: "what is going on? Why? What for?" Your father [i.e., her husband, an agent of the Main Intelligence Directorate] replied calmly: "Why are you so upset? When I told you how the white officers were being shot in the Crimeia you weren't upset, were you? When the bourgeousie and the kulacks were being exterminated, you used to justify it, didn't you? But now that it's your turn, you ask: "How? Why?" This is the way it's been from the very beginning.»
- Ibidem

Podemos agora fazer um paralelismo com aquele célebre comentário do pastor na Alemanha Nazi -
"Um dia vieram e levaram o meu vizinho que era judeu.Como não sou judeu, não me incomodei.
No dia seguinte, vieram e levaram o meu outro vizinho que era comunista. Como não sou comunista, não me incomodei .
No terceiro dia vieram e levaram o meu vizinho católico.Como não sou católico, não me incomodei.
No quarto dia, vieram e levaram-me. Já não havia mais ninguém para reclamar..."

Dá qualquer coisa como:

Primeiro mataram os oficiais czaristas e acharam bem.
Depois mataram os burgueses e consideraram melhor ainda.
A seguir exterminaram os kulacks e pareceu-lhes sublime.
Quando chegou a vez dos judeus, já não havia ninguém para protestar: os judeus, operadores destacados da máquina, tinham-nos chacinado a todos.

domingo, fevereiro 15, 2009

Intervalo económico - The Inconvenient Debt!

Up, up, and away!...
Supermoney is going to save us!...

sábado, fevereiro 14, 2009

O Triunfo do Labirinto - 4. A Língua da Serpente




«Of the three great Jewish destinations of the first quarter of the twentieth century, one was an actually existing Promised Land. America was a compromise an the promise of a fulfilled Mercurianism; the Jewish state in Palestine was a dream of a handful of idealists; but Soviet Russia was a dream come true, whitch offered hope and a second home to young American Jews and inspiration (and a possible alternative destination) to Zionist pioneers. In Soviet Russia, young Jews had, in fact, grabbed the "rings attached to heaven and earth" and pulled heaven down to earth (as [Isaac] Babel put it).
(...)
Of the three Jewish utopias, one was in power. Many Jews who did not go to Moscow wished they had. Most young Jews who did go to Moscow pitied ou despised those who had not. Roziner's father came back from Palestine and named his son Feliks (after the founder of the Soviet Secret Police). Agursky's father came back from America and named his son Melib (Marx-Engels-Liebknecht). Mikhail Baitalvsky moved from Odessa to Moscow and named his son Vil (Vladimir Ilich Lenin). My great-aunt Bella arrived from Poland and named her son Marlen (Marx-Lenin). The mothers of two of my closest friends (second-generation Muscovites of "Jewish nacionality") are named Lenina and Ninel ("Lenin" read backward). Such was the Hebrew of the international proletariat - the true language of paradise.»
- "The Jewish Century", pp.215-216

Era um paraíso terral, um jardim de idílios e delícias. Uma diferença radical, todavia, o separava do originário: no Génesis hebraico, era o Ihavé prepotente, vingativo e caprichoso que fabricava o éden; no neo-Génesis soviético-judaico, é o paraíso que se entrega, de corpo e alma, ao fabrico dum novo Iahvé - um Iahvé, diga-se, ainda mais prepotente, severo e caprichoso. O que, não obstante, é compensado por uma integral convergência operativa: tanto na versão moderna quanto na ancestral, o paraíso representa um local fechado, um parque infantil que serve de pretexto a uma tripla actividade compulsiva: vigilância, purga e expulsão.
Outro paralelismo interessante prende-se com o método demiúrgico: no caso ancestral, é a língua do deus Iahvé que cria o paraíso e o seu humano inquilino; no episódio moderno é a língua da serpente que engendra o novo-deus. O deus-Joseph. Ambos, porém, o humano inaugural e o deus-humano se irmanam numa idêntica vertigem: a ingratidão para com os respectivos criadores.
Nem só de pão vive o homem, e, pela boca, como se viria exaustivamente a comprovar, não morre apenas o peixe.

quinta-feira, fevereiro 12, 2009

O Triunfo do Labirinto - 3. O Espelho do Vampiro

«From the inception of the soviet regime, the unique combination of exceptionally hight literacy rates anda a remarkable degree of political loyalty ("consciousness") had made Jews the backbone of the new soviety bureaucracy. The Party considered old tsarists officials - and indeed all non-Bolsheviks educated before the revolution - to be irredeemably untrustworthy. They had to be used (as "bourgeois experts") for as long as they remained irrepleaceble; they were to be purged (as "socially alien elements") as soon as they became expendable. The best candidates for replacing them (while the proletarians were "mastering knowledge" were Jews - the only members of the literate classes not compromised by service to the tsarist state (since it had been forbidden them). As Lenin put it, "the fact that there were many Jewish intelligentzia members in the Russian cities was of great importance to the revolution. They put an end to the general sabotage that we were confronted with after the October Revolution. The jewish elements were mobilized and thus saved the revolution at a difficult time. It was only thanks to this pool of a rational and literate labor force that we succeeded in taking the state apparatus.»
(...)
«Indeed, the Soviet Secret Police - the regime sacred center, know after 1934 as the NKVD - was one of the most Jewish of all Soviet Institutions. In January 1937, on the eye of the Great Terror, the 111 top NKVD officials included 42 Jews, 35 Russians, 8 Latvians and 26 others. Out of twenty NKVD directorates, twelve (60%, including State Security, Police, Labor Camps and Resettlement [deportations]) were headed by officers who identified themselves as ethnic Jews. The most exclusive and sensitive of all NKVD agencies, The Main Directorate for State Security, consisted of ten departments: seven of them (Protection of Governement officials, Counterintelligence, Secret-Political, Special [surveillance in the Army], Foreign Intelligence, Records, and Prisons) were run by immigrants from the former Pale of Settlement. Foreign Office was an almost exclusively Jewish speciality (as was spying for the Soviet Union in Western Europe and especially in the United Staates). The Gulag, a Main Labor Camp Administration, was headed by ethnic Jews, from 1930, when it was formed until 1938, when the Great Terror was mostly over.»
- "The Jewish Century", pp. 255

Milhões de mortos (na Ucrânia, especialmente, e nas áreas rurais em geral) - à fome, a tiro, sob tortura -, milhões de deportados - povos inteiros (Tártaros da Crimeia, Alemães do Volga, etc),- a maior, mais prolongada e mais impune acção genocida do século Vinte. Um orgia carniceira sobre o maior país do mundo, a maior nação cristã e sobre um dos mais insignes povos e culturas da Europa. O extermínio frio, metódico e desenfreado de classes inteiras da sociedade (burgueses e kulacks/camponeses cristãos) . O internamento em campos de concentração de toda a espécie de dissidentes, críticos ou meros estorvos à enxurrada arrivista, reais mas sobretudo imaginários.
Qual é a diferença disto para o III Reich? É apenas que foi feito um maior escala, em maior tranquilidade, durante mais tempo e com total impunidade. A outra diferença significativa é que as principais vítimas num (nazismo) foram os principais algozes no outro (comunismo).
Quando as organizações judaicas actuais, no exercício da sua virtude principal - a chutzpah, que tanto gozo lhes dá e a parolice alheia consente e premeia -, em altos brados indignados, perguntam, por exemplo, à Igreja Católica, onde estava o Papa quando os judeus estavam a ser massacrados pelo Nazismo, convinha que, antes disso, respondessem a uma questão tão legítima quanto análoga: onde estavam os Judeus quando os cristãos estavam a ser chacinados pelo Comunismo?
A Igreja poderia então responder que estivera em silêncio, e esse silêncio lhe pesava na consciência. Mas os Judeus teriam que responder que, em contrapartida, não tinham estado em silêncio: tinham estado em acção. Na dinâmica qualidade de torcionários maiores do açougue.
Os alemães têm que se sentir eternamente culpados, pagar eternas indemnizações e pedir eternas desculpas. Por Hitler e a sua camarilha de alucinados, assassinos e corruptos. E os Judeus quando é que indemnizam e pedem desculpa por Lenine, Trotsky, Marx, Kaganovitsch, Yagoda, etc, etc?
Claro, os nazis exterminavam com a pior das intenções, enquanto os comunistas, ainda para mais judeus, genocidavam com as melhores. Certamente, foi por isso que aqueles, demoníacos, encheram o céu, e estes, angélicos, quase fizeram transbordar o inferno.

terça-feira, fevereiro 10, 2009

O Triunfo do Labirinto - 2. Duas das cabeças de Cerbero

«Both Marxism and Freudianism were organized religions, with their own churches and sacred texts, and both Marx and Freud were true messiahs insofar as they stood outside time and could not be justified in terms of their own teachings. Marx knew history before History could know itself, and Freud - Buddha-like - was the only human to have achieved spontaneous self-knowledge (trought a heroic act of self-healing that made all future healing possible). Both Marxism and Freudianism adressed the modern predicament by dealing with eternity; both combined the language of science with a promise of deliverance; and both spawned coherent all-purpose ideologies that claimed access to the hidden springs of human behavior. One foresaw and welcomed the violent suicide of universal Mercurianism; the other taught how to adjust to it (because there was nothing else one could do). Neither one survived in Central Europe, where they were born: one went east to become the official religion of a cosmopolitan state that replaced the most obstinate ancien régime in Europe; the other moved to the United States to reinforce democratic citizenship with a much-needed new prop.
(...)
In Marxism, the original sin is in the historical division of labor, which leads to the alienation of labor, the enslavement of human beings by their own creations, and the fall of man into false consciousness, injustice and degradation. The fall itself ensures salvation, however, for History, in its inexorable unfolding, creates a social class that, by virtue of its utter dehumanization and existencial loneliness, is destined to redeem humanity by arriving at full self-realization. Proletarian free will and historical predestination (liberty and necessity) will merge in the act of an apocalyptic revolt against History in order to produce communism, a state in which there is no alienation of labor and thus no "contradictions", no injustice and no Time. This is colective salvation, in that the reconciliation with the world is achieved by the whole of humanity on Judgment Day, but it is also strickingly moder because it results from technological progress and has been prophetesied scientifically. The omnivorous monster of modernety releases his victims by devouring itself.
Freudianism locates the original sin within the individual by postulating a demonic, elusive, self-generating and inextinguishable "unconscious". Salvation, or making the world whole again, amounts to individual self-knowledge, or the overcoming of the alienation between ego and libido and the achievement of inner peace ("mental unity"). This cannot be accomplished by "maladjusted" people themselves, because they are, by definition, possessed by the demon of the unconscious. Only professionally trained experts in touch with their own selves can tame (not exorcise!) the unruly unconscious, and only willing patients ready to open their hearts to their analysts can be healed. The séance itself combines features of both Christian confession and medical intervention but differs from them radically (posdsibly in the direction of greater efficacy) in that the sinner/patient is assumed to possess neither free will nor reason. "The modern malaise is just that - a sickness that can be treated. Indeed, both the sickness and the treatment are perfect icons of the modern condition: the afflicted party is a lone individual, and the healer is a licensed professional hired by the sufferer (in what is the only certifiably rational act on his part). The result is individual, market-regulated, this-worldly redemption.»

- "The Jewish Century", pp.80-81

Duas das principais consequências do Marxismo e do Freudianismo para a concepção europeia (ou seja, greco-cristã) de Homem, traduzem-se, respectivamente, em conceitos muito simples: colectivização do corpo e colectivização da mente. O que isto augura será exaustivamente experimentado no século seguinte e prossegue, sob outras roupagens suavizadas apenas na aparência, nos dias actuais. Sintetiza-se em dois primados: "o teu corpo pertence ao Estado", e a "tua mente pertence à ciência". A Tarefa essencial? Libertar a espécie dos indivíduos. Consciencializar a massa, normalizar o indivíduo. Homogeneização, em suma (pasteurizada, claro está). Na verdade, tanto a sociedade quanto a sua célula base - a família, - (na sua tradição patriarcal) saem estilhaçados. A sociedade está contaminada e o indivíduo doente. Em ambos, há um passado maligno que urge filtrar, através da consciência, e depurar, através da terapia. Sob o fermento da vanguarda partidária e dos psico-exorcistas, resultarão, em devido e abençoado tempo, numa papa automática e liquefeita, mental e fisicamente dócil aos devaneios dos novos demiurgos iluminados. Essa é a realidade, que a cada dia que passa, mais se comprova. Porém, a ficção que serve de cobertura é outra: em nome duma pacificação futura, curam-se os males contraídos no passado, através da conflitualidade no presente. A zaragata de classes para acabar com as classes; a zaragata aos fantasmas e taras para compreendê-los e sublimá-los em formas produtivas úteis ao colectivo. Se o homem antigo, homérico, entendia a guerra como forma de defesa ou afirmação duma comunidade de indivíduos livres, decerto ficaria estarrecido diante deste seu sucedâneo freudo-marxizado: um tipo em guerra com a sua própria comunidade, em guerra com a sua própria família e, ao mesmo tempo, violador e polícia de si próprio, às turras consigo mesmo.
Como explicar o sucesso de tamanhas aberrações? Lembro que os Marxistas 3G, como Marcuse, por exemplo, já se dizem freudo-marxistas. Com delambidelas voluptuosas em Hegel. O Maio de 69 é todo um freudo-marxismo pegado.

Entretanto, poderiam estas novas-torahs germinar de outro húmus mental que não o judaico, onde, por milenar compulsão obsessiva, o primado existencial se submete ao imperativo da "salvação colectiva"? A resposta do autor, não necessariamente a minha, é assertiva: o Marxismo e o Freudismo são produtos tipicamente judeus. Eu talvez dissesse que não é por acaso que os fundadores dessas duas seitas são judeus, como também não será irrelevante a época em que surgiram. Ambos seriam impensáveis, creio, fora da estufa histórico-cultural onde germinaram: a sociedade capitalista do século XIX e a Alemanha do pós-Hegelianismo.

Curiosamente, será um judeu, daqueles de raro e real talento, que fará a melhor descrição do fenómeno: Kafka. Na Metamorfose, abisma isso mesmo, esse pesadelo que alastra à realidade e dela escorre: o amanhecer do novo-homem prometido à engrenagem burocrática. O homem que acorda, toma consciência e descobre que se transformou (ou o transformaram), subitamente... num insecto.

O sujeito da história homérica está reduzido e lamelizado a mero objecto de análise e dissecação - social e mental. Ulisses no microscópio de entomologistas.

segunda-feira, fevereiro 09, 2009

O Triunfo do Labirinto - 1. Puritanism without pork


O livro intitula-se "The Jewish Century", é da autoria de Yuri Slezkine e foi premiado com o National Jewish Book Award, pelo Jewish Book Council.
Eu já o tinha notado aqui. No entanto, por peripécias várias, só agora entrei em posse dele e acabei de lê-lo. Segue-se uma segunda leitura, mais pausada (manias que eu cá tenho: os livros são como as mulheres, convém degustá-los repetidas vezes), mas posso já adiantar, sem margem de grande erro, um juízo: é dos melhores livros de História que tenho lido nos últimos dez anos. Façam um favor a vós próprios: leiam-no. Entre tanto lixo que diariamente se publica, de vez em quanto lá surge um pérola.
Por outro lado, é uma obra insuspeita, a quem dificilmente os raivosos querubineiros do costume poderão assacar o seu labéu manhoso do "anti-semitismo". A clareza, a lucidez e a imparcialidade da obra chegam a ser um bálsamo para a alma de quem aprecia esses requintes tão raros nos dias que correm. Não estamos, de todo, diante de mais um balde de farelos de sórdida propaganda. Por isso mesmo, servirá -"The Jewinsh Century" - como manancial para uma viagem que aqui agora principia e que, na medida das minhas parcas possibilidades de tempo e talento, iremos encetar pelo "Século judeu" - que é como quem diz, o "Século Vinte".
Dito isto, caros leitores, segurem-se, coloquem os cintos, que aqui vamos nós...

«Sombart's book "the Jews and Modern capitalism" was a response to Max Weber, and most of his argument was intirely -if imperfectly - weberian. Capitalism is inconceivable without the Protestant ethic; judaism is much more Protestant (older, tougher, and purer) than Protestantism; Judaism is the progenitor of Capitalism. "The whole religios system is in reality nothing but a contract between Jehovah and his chosen people, a contract with all its consequences anda all its duties". Every Jew as an account in heaven, anda every Jew's purpose in life is to balance it by following written rules. To follow the rules, one has to know them; hence "the very study itself is made a means of rendering life holy". Relentless study and obedience impel one "to think about one's actions and to accomplish them in harmony with the dictates of reason". Ultimatly, religion as law aims "at the subjugation of the merely animal instincts i n man, at the bridling of his desires and inclinations and at the replacing of impulses by thoughful action; in short, at the "ethical tempering of man". The result is wordly ascetism rewarded by earthly possessions, or Puritanism without pork.»

- Yuri Slezkine, "The Jewish Century" (pp.54)

Assim de relance, e só para terminar o aperitivo, isto lembra-me a definição Freudiana de religião como "neurose obsessiva". Na realidade, o Sigmundo estava decerto a pensar - e, inerentemente, a utilizar como material de laboratório - na religião que mais intimamente conhecia: a judaica. Tal qual quando fantasiou todo aquele labirinto de taras com um Inconsciente-Minotauro lá ao fundo, outra coisa não ensaiava senão confundir consigo próprio todos os outros e, por projecção e amálgama procustiana, o "Homem" enquanto espécie.
Ora, nesses estritos limites, do judaísmo e do indivíduo Freud, a psicanálise não faz apenas imenso sentido: esgota-o todo aí. Aliás, reforçado por esta inquietante sensação de os doidos de vária ordem -psicopatas, esquizofrénicos e paranóicos -, terem tomado de assalto o cockpit e de, em tão alucinante nave tripulada por um tal escol, vagarmos num planeta cada vez menos distinto do manicómio. De resto, bem à imagem da profecia de Shakespeare: cegos guiados por loucos.
Como é que se sai dum pesadelo destes? Comecemos primeiro por tentar perceber como é que se para lá entrou.

domingo, fevereiro 08, 2009

Outro dilema


(Imagem da "Bus-stop" via Verdade ou Consequência, tomo III)

O grande dilema do crente moderno: acreditar em Deus ou no autocarro?


O Pinóquio ou a Bruxa?





Eu sei que a memória é uma coisa chata, obsoleta e merecedora de público repúdio. Mas eu sou antiquado, desculpem lá.
Então, se bem me lembro, e corrijam-me se estiver enganado, este desastre que agora temos no (des)governo da nacinha, alcançou a maioria absoluta (a primeira em 30 anos de nhanhocracia) por obra e desgraça da catástrofe (supostamente de direita) precedente, onde, sublinhe-se e negrite-se, pontificavam, como cabeças de cartaz, Durão Barroso & Manuela Ferreira Leite (com o célebre discurso da tanga), Santana Lopes & Paulo Portas. Foi graças à excelente governação desta quadriga, em revezamento amblíope, que o Jota Sócrates ascendeu ao Olimpo.
Pois bem, nos próximos circos eleiçoeiros, quem são os adversários do Jota: Manuela Ferreira Leite e Paulo Portas (Durão não pode, porque está ocupado neste momento) para o executivo; Santana Lopes para a autarquia principal. Isto é fazer oposição? De modo algum. Isto, pura e simplesmente, é fazer de conta. Pior: é fazer de garantia à longevidade da actual administracinha da nação e administração da nacinha.
O cidadão comum, aquele que ainda se dá à penitência de despejar o papelinho na urna, acaba a deparar-se, necessariamente, com o seguinte - e arrepiante - dilema:
-Qual é preferível, um Primeiro-Ministro corrupto ou a Manuela Ferreira Leite a Primeiro-Ministro?
Entre o Pinóquio e a Bruxa, entre o bonifrate e a megera, não é muito difícil adivinhar para que lado se inclinará a balança. Deve ser muito gratificante - senão mesmo altamente moralizador- para o desastre nacional: ter como adversário a calamidade pública.
Sinceramente, isto já não é um país, é uma anedota.

Na Senda do progresso




«IMF Says Advanced Economies Already in Depression».

O FMI diz que os da frente já estão a mergulhar na depressão. Felizmente que nós somos os mais atrasados dos avançados. Mas daqui a pouco já vamos ver o tamanho da depressão: se é fossa, falésia ou abismo.

sábado, fevereiro 07, 2009

Da fatalidade, ou o Regime da Pescadinha de rabo na boca

Não raramente, aprende-se mais com as críticas do que com as apologias.


«É lastimável que V.M. herdasse um throno a cahir, mas a verdade é esta: elle está a cahir.
V.M. é muito novo, mas para o mundo que veio encontrar é velhíssimo. Tem dezanove annos e tem séculos. Veio tarde. Alguns annos, quinze, ou vinte mais cedo, a sua mocidade seria talvez a mocidade dos princípios. Os princípios envelheceram e não ha homem novo que salve princípios velhos. O legitimismo tem ao seu serviço verdadeiras primaveras e está morto. V.M. é uma primavera ao serviço do inverno liberal. A decrépita monarchia portugueza só invoca a seu favor a mocidade de V.M. É pouco. É nada.
Em virtude de que phenomenos sociaes e politicos se deu o lamentavel sucesso que estou verificando?
Vou dizê-lo a V.M.
A monarchia liberal, meu príncipe, morreu ao nascer. Foi muito festejada porque abriu as portas de algumas prisões e deslaçou o nó de algumas cordas de enforcado, além de que deu satisfação a alguns theoricos de má morte. Mais nada. Apenas entrou em funções, os portugueses voltaram-se contra ella e declararam-lhe uma guerra que só terminou vinte anos depois. Pela victoria? Não! Pela derrota. V.M. deve saber isto. A avó de V.M., a senhora D. Maria da Glória, só conseguiu obter a paz em Portugal, com o auxilio de armas estrangeiras.
Uma nação pacificada pela força das armas estrangeiras é uma nação morta. Não há a esperar d’ella senão os fructos da humilhação: o desanimo e o abatimento n’uns, o servilismo e a corrupção noutros. Foi o que nos succedeu. Na ocasião em que Portugal expirava viu-se de um lado Herculano chorando e do outro Rodrigo da Fonseca, rindo. O futuro é dos cynicos e por cynicos passou Portugal a ser governado até hoje. Cadáver abandonado é pertença de milhafres. Portugal foi esse cadáver abandonado. Os milhafres foram os seus governos.
Terminara o drama: começou a comedia: a comedia dos principios, mortos, a comedia dos partidos que já não tinham razão de ser, a comedia das luctas simuladas, a comedia das paixões fingidas. Essa comedia se representou durante os dois reinados do senhor D.Luiz e do senhor D.Carlos. Falsificou-se um Estado – caso novo na história – e falsificou-se tudo o que lhe dizia respeito. Falsificou-se uma opinião que não havia, falsificou-se uma imprensa e uma tribuna de governo e de oposição attribuindo-lhes antagonismos que não tinham, justificou-se a justiça com uma magistratura de compadres, falsificou-se a contabilidade pública, falsificaram-se orçamentos, falsificou-se a moeda.
Tudo foi simulado, tudo foi fingido. Uma só coisa era real – a ruina.
(...) Esta obra, entretanto, não produzia effeitos sobre um organismo extinto. O povo, é sempre o mesmo e é sempre outro. Constantemente se renova. Constantemente renasce. O Portugal da senhora D. Maria da Glória morreu; morreu com Herculano, com os Passos, com José Estevam e os Ribeira de Sabrosa, mas outro nasceu, filho d’esse, que, herdando as suas decepções, começou por fazer d’ellas o scepticismo bonacheirão que deu o Zé Povinho e acabou por as levar ao estado congestivo de revolta que deu o Buiça. Do Zé Povinho ao Buiça que longa estrada! O Zé Povinho era o chamado - povo indifferente, povo apathico, povo morto. Na realidade era o – Desprezo. Eram as urnas desertas, eram os cidadãos de mãos nos bolsos, encolhendo os ombros e dizendo que “tão bons eram uns como os outros”. Na realidade, era a nação recusando-se a collaborar na comedia. A ficção não era já uma ficção: era um escandalo cada vez mais clamoroso. A falsificação fazia-se a escancaras. Porque não? Porventura alguem a impedia? O povo ria. Dividia-se o paiz como piratas dividem o produto de um saque – bulhando. Os politicos tratavam-se reciprocamente de ladrões. O avô de V.M., o senhor D.Luiz, era accusado de os cubrir com o seu manto, accusação injusta porque o manto era pequeno e os ladrões eram muitos. Nada se salvava, nem as apparencias, e para quê? O povo ria, ria com as mãos nas ilhargas. Os políticos gabavam-n’o: Bom povo! Não ha melhor povo! E, com efeito, não havia. O povo não sabia o que era protestar e dava tudo o que lhe pediam: contribuições, soldados, victimas á Assistência Nacional aos Tuberculosos. Albarda, real senhor! Clamavam os pamphletarios. O povo deixava-se albardar. Era um jumento bom.
(...)
N’estes termos, a ditadura de João Franco não era já delle. Era aquella dictadura a que Victor Hugo chamava – do desconhecido. Na sua frente o que estava? Elle. Não sendo elle, o quê? A Republica? A Republica era o que estava para vir, porque João Franco, elle proprio, pozera este dilema ao paiz: Elle, ou Ella. Quer dizer, o paiz ou o seu arbitrio. O paiz tinha mais força.
V.M. dolorosamente sabe o que veio. Veio o Buiça.
Quem foi o Buiça?
O Buiça, meu príncipe, foi – a Fatalidade. Roubou-lhe um pae, roubou-lhe um irmão, e não lhe deu um throno – e eis-me aqui chegado ao ponto essencial d’esta carta.»

- João Chagas, “Cartas Políticas”



Quando um regime aceita falsificar-se, fatalmente acaba por aceitar ser remodelado: o sucedâneo preambula o substituto. Em tandem operativo, e por geminada fatalidade, quando um regime não se regenera naturalmente, promove e faculta a que o regenerem artificialmente.

O 5 de Outubro de 1910 e o 25 de Abril de 1974 representam isso mesmo: mais que uma mudança, o mero corolário duma decadência, o produto final duma falsificação. A monarquia liberal, como a Primavera Marcelista são já, em larga medida, seminários dos carnavais subsequentes, sendo que o próprio Caetano constitui, ad ovo, a “regeneração artificial” do salazarismo crepuscular. Isto, de resto, tem sido a sina de Portugal nos últimos duzentos anos: o ser palco de regimes estéreis, frouxos, baços, que, não raramente, se esgotam em onanismos autocráticos, donde germinam, raquíticas e por laboratorial obra e graça, turvocracias proveta, prometidas à ruína e ao descalabro. Por um lado, esta quase compulsão resulta duma vulnerabilidade nunca sanada à infecção externa, mas, por outro, radica na cedência arreigada ao parasitismo intestino, isto é, à debulha concertada das pseudo-elites de fachada e dos balconistas, amanuenses e moços de frete a armar ao escol. Dito em palavras simples: uma joint-venture pimpona entre a virose estrangeira e o lombriguismo nacinhal.

Donde me é permitido inferir que uma monarquia que acredita salvar-se degenerando numa "monarquia laica" é uma monarquia que não tem salvação. Não tem nem merece. E o país, por arrasto, também não. Se não restaurarmos as nossas raízes, acabaremos, se tanto, como lenha inerte a putrefazer-se, ou condenados ao triste e outonal destino de folhas dispersas e sopradas pelo vento... da história. Que é como quem diz, do fundilho dorsal das hegemonias ou impérios da moda. Exactamente o mesmo orifício estrepitante que os sacerdotes e acólitos oficiantes desta anti-civilização, por ritual esotérico, devoção sectária e peregrinação frenética, não se cansam de oscular.

sexta-feira, fevereiro 06, 2009

Junkiezinhos

O mais recente político nacinhal que ouvi a proclamar a sua acrisolada fé na capacidade dos portugueses vencerem a crise foi o Presidente da República. Já é para aí o milionésimo.
A mim, devo confessá-lo, deixam-me imensamente perplexo todas estas manifestações de propugnáculo galvanizante. Como querem que vença as crises um povo que está viciado nelas?
Vamos todos, em conjunto, demandar uma saída? Sim, sim... vamos mas é procurar a próxima dose.

quinta-feira, fevereiro 05, 2009

Testemunho de Harry Markopolos sobre o mega-esquema Madoff

Prestem atenção à primeira resposta de Harry Markopolos.

quarta-feira, fevereiro 04, 2009

Esquemática da Ração Pura (r & r)



«O estado de uma sociedade não depende das suas instituições políticas, mas da coesão entre os governantes e os governados. Quando essa coesão existe, isto é, quando a opinião pública, a opinião instintiva da nação é geral, individida, os próprios governantes partilham dela, dela participam. Basta-lhe, portanto, para governar, interpretarem o que está dentro de si próprios.
Nas sociedades desnacionalizadas, nas sociedades estragadas pelas ideias estéreis do humanitarismo, do pacifismo, e da fraternidade humana; nas sociedades que perderam as virtudes guerreiras e para quem o estrangeiro não é, como para as sociedades sãs, essencialmente o Inimigo - nessas sociedades os governantes perderam o contacto instintivo com a massa do povo, e não podem portanto interpretar o que não sentem. Podem ser homens pessoalmente honestos e bem intencionados; em geral não o são; mas não se pode interpretar os instintos dos outros.
Como há-de um governante interpretar um instinto de que não participa? Os governantes não nascem Shakespeares, com a arte de interpretar os sentimentos dos outros; só têm, querendo os deuses, o poder de interpretar os próprios.
A democracia é um sistema político que só aparece nas decadências.»

-Fernando Pessoa, "Páginas de Sociologia Política"


Como sempre, em Pessoa, há coisas com as quais concordo e outras nem tanto. Mas não é isso que vem agora ao caso.
Peguemos nesta sua intuição e transportemo-la à situação portuguesa actual. É nítido que nem os governantes compreendem os governados, nem estes devotam qualquer estima àqueles. Aliás, estão todos eles bem mais próximos dum ódio mútuo e inoxidável, que duma coesão orgânica minimamente decorosa. Em rigor, os governantes desprezam olimpicamente os governados, a quem consideram uma choldra infestante, recalcitrante, caprichosa e indigna (indigna sobretudo deles, sábios e preclaros ministros); e os governados reagem em conformidade, usando a choldra governante como vazadouro nocturno para todas as suas frustrações, insucessos, incapacidades, vícios, insuficiências e orfandades. Resulta mais que evidente que tanto uns como outros padecem, em fase terminal e galopante, da - chamemos-lhe assim - "Síndrome de Escandinávia". Que se traduz no seguinte: os governantes gostariam muito que os seus governados fossem escandinavos; e os governados, com não menos ênfase, adorariam ter a governá-los nórdicos governantes. O sincronismo que disto tudo decorre é deveras eloquente: às tantas, em vez de governarem os seus compatriotas, os governantes estão a tentar transformá-los em escandinavos, ou a legislar como se o fossem; e os infelizes governados estão, por regra e princípio, a lamuriar-se de não se transformarem em escandinavos os compatriotas seus que os governam. No fundo, esta curiosa síndrome funciona como pretexto régio: a uns para não governarem (o país não os merece); a outros para não se deixarem governar (eles não merecem um tal desgoverno). O que culmina no actual lema nacional: "ninguém governa ninguém; cada qual governa-se." A parte perdeu toda e qualquer noção do Todo.
Enfim, é todo um psico-país, estilhaçado, fragmentário, esquisóide, a padecer de dupla personalidade. E a detestar-se diante do espelho.
Mas dizer que a democracia é "um sistema político que só aparece nas decadências" parece-me um duplo exagero. Pelo menos, a fazer fé naquela que conheço e tenho experimentado na pele. Em primeiro lugar, porque ainda não consegui apurar se é a democracia que aparece na decadência, se é a decadência que aparece na democracia. E, em segundo, porque não é "um sistema político", mas, comprovadamente, uma "ausência e oclusão de qualquer sistema -político, social, filosófico, musical, ou o que seja. Chamar sistema a um mero "aglomerado heteróclito e concorrente de esquemas" afigura-se-me um equívoco grosseiro e extremamente infeliz.
É o mesmo que chamar corpo ao amontoado completo de membros e postas dum indivíduo depois de esquartejado.

Toda a espontaneidade será reprimida!

Welcome to paranoia country:

«Children who throw snowballs in public places could be arrested or fined under measures to cut down on anti-social behaviour.»


Note-se o paradoxo: as crianças que atirem bolas de neve são reprimidas a pretexto de comportamento anti-social; os gangues de toda a espécie de escumalha teen organizada, em compensação, são tolerados a apaparicados sob a auréola de actividade cultural ou ATL espontâneo.

PS: Em todo o caso, vejo-me forçado a conceder: se os gangues de adultos ainda mais perniciosos (vulgo sociedades secretas) são autorizados (para mais em regime de transfusão directa do erário público), não vejo como ilegalizar os seus emuladores juvenis de bairro. Afinal, a cleprocracia também tem os seus degraus de aprendizagem... a sua, como lhe haveremos de chamar... Escola?...

Manual das Invejas (rep)



Até já os desgraçados em estado de coma nos hospitais se devem ter apercebido do invejoso que eu sou, tão gritante e desarvorada a minha inveja clama e fermenta.
Mas, para falar com franqueza, eu não sou apenas invejoso: sou duplamente invejoso! Isso mesmo, tal-e-qualmente. Dilaceram-me, afligem-me e atormentam-me duas espécies diversas e concorrentes de inveja: a pequena e a grande. Mas, salvaguarde-se, uma não tem nada que ver com a outra.
Porque há os que vivem a expensas do erário público – e são muitos, imensos, ávidos, ubíquos -, mas também existem aqueles que vivem à mama-e-pala do funerário público – e não são poucos, nem menos gulosos ou infestantes. São os que vivem do cemitério das consciências, da sepultura do juízo, do caixão do espírito. São os vermes que tomam de assalto carcaças e mioleiras em decomposição, que se locupletam de finados e putrefacções, que tiram a barriga de misérias da indigência e da miséria mental em que o país –e o mundo -, decoctam em podre lento.
É sobre esses que se debruça a minha pequena inveja, ínfima mas virulenta, geralmente em forma de bengala ou escarro. Não obstante, gostava de ser capaz de tamanho repasto, de ter acesso a tão sossegado festim, de colibrizar com tanta delicadeza pelas morgues e necrotérios, extraindo néctares e ambrósias tão fáceis. Um livre-trânsito como o deles, para tais bufetes, o jeito que não me dava! Um lugarzinho à mesa - melhor dizendo, à sepultura – o gratificante que não seria!... Pagarem-me a mediocridade, a ninharia, a frioleira a preço de ouro! Ser um príncipe da inânias, um barão das patacoadas, um cardeal-rei das parlapatices! Em suma, um todo inteiro e completo luze-cu da sabedoria investido e arvorado em farol das humanidades!
Por um microcagagésimo de segundo que seja, como não roer-me de inveja - uma invejazinha pequenina e torpe, daquelas instantâneas e efervescentes - dum vidão destes?... Uma tão pegada mordomia... Um relambório catita de criar papo e conta aberta na manicure!...
Eu, porém, parvalhão de merda, por mais que tente, não consigo. Há sempre uma réstia de escrúpulos, uma repugnância natural, quiçá congénita, quase sempre empecilhante. Anacrónica como o diabo. Obsoleta até dizer chega. Um cabrão dum nariz empinado e sensível a torpedear-me. Uma puta duma coluna pouco elástica a obstruir-me. O caralho duma mioleira pouco prática a desqualificar-me. Nem passo dos psico-técnicos!...
No resto do tempo, quase todo o dia, entrego-me à outra inveja - a grande, a gigantesca a descomunal inveja que me há-de consumir até à sepultura. Mesmo sabendo-a inútil, insensata, absurda. Contraditória das minhas próprias teses (puta que as pariu, que valem tanto como meio tostão furado!) Mas é mais forte que eu. Flagela-me e desentranha-me. Tenho inveja, sim senhor! Estoiro de inveja de Homero, de Sófocles, de Aristóteles, de Swift, de Mozart, de Bach, de Rabelais, de Cervantes e de todos esses poucos em quem vale a pena gastar toda a inveja deste mundo.
E se rebentar, como o batráquio que sonhava ascender a mamífero, pois que seja por loucura, aspirando às estrelas. E nunca, mas nunca por bulimia escatófaga, à candeia de pirilampos, cevado e empapuçado de tanto depenicar na bosta.

domingo, fevereiro 01, 2009

O Gourmet da Porcalhota, ou o Porky Pinky




Diz o gourmet da Porcalhota:
«Nos blogues, pode-se lamber o rabo a Salazar, Hassan Nasrallah e Joseph Fritzl. Há sempre um coro de adictos a louvar-se na independência. Escrever e reflectir sobre o actual governo (e, em particular, sobre Sócrates), sem ser ao pontapé, é que é motivo de anátema. E se fossem dar uma volta ao jardim da Celeste?»

Bem, talvez eu possa dar uma ajuda ao queixoso. Claramente delira e inverte.
Assim, é público e notório que não se pode lamber o rabo a Salazar porque está sepultado, nem a Hassan Nasrallah porque está longe. Já Joseph Fritzl não sei quem é e não me apetece ir ao Google neste momento (mas, pelo nome, também não parece que zanze por estas lusas latitudes). Em contrapartida, lamber o rabo e a cloaca ao actual governo (e, em particular, a Sócrates), é, seguramente, bem mais praticável, sofisticado, plausível e, a fazer fé no frenesim quotidiano deste ascarídeo militante, ultra-recompensador - quanto mais não seja, porque estão próximos, receptíveis e carentes. Além disso, a avidez, a volúpia e o desembaraço com que se desempenha do encargo, não são motivo de anátema, ou sequer de chacota, mas da natural e compreensível repugnância de quem passa. É que não apenas lambe e depenica: sorve, fuça, chafurda. Mais que a suja refeição, é o ruído sôfrego que incomoda - o arrulhar de gruim nas sete quintas. O problema principal, convinha que percebesse, não reside pois na carícia, mas no banquete. E nem é tanto a obscenidade, mas o estardalhaço. Porque acompanhar com flatos e arrotos, ainda vá que não vá, nem se distinguiria de tantos outros (singónicos e antagónicos). Agora simular orgasmos...