quarta-feira, maio 31, 2006

Porque hoje é quarta-feira...

«-Raios te partam! - rugiu Turandot que, depois de ter retomado o seu equilíbrio no meio da rua, à custa dos freios de alguns carros nocturnos, especialmente matinais, entrava de novo na cervejaria, manifestando um fervente desejo de luta.
Surgiram, então, de todos os lados, rebanhos de criados. Não se poderia supor que havia tantos. Saíam das cozinhas, das caves, das despensas, da adega. A sua massa compacta envolveu Gridoux e depois Turandot. Não conseguiram, contudo, apoderar-se facilmente de Gabriel. Tal como o coleóptero atacado por uma coluna mirmidónica, tal o boi assaltado por um bando de sanguessugas, Gabriel sacudia-se, multiplicava-se, debatia-se, atirando, em direcções variadas, projécteis humanos, que iam partir mesas e cadeiras ou rolar aos pés dos clientes.
O barulho desta controvérsia acabou por despertar Zazie. Ao ver o tio preso da matilha cafeteira, gritou-lhe."Coragem, tio!" Apoderou-se duma garrafa e atirou-a, ao acaso, para o monte. É assim grande o espírito militar entre as raparigas de França. A viúva Mouaque seguiu esse exemplo e distribuiu cinzeiros à sua volta. O espírito de imitação pode levar a fazer coisas não muito recomendáveis. Ouviu-se, então, um barulho considerável. Gabriel acabava de cair no meio da louça para lavar, arrastando para os cacos sete criados desenfreados, cinco clientes que tinham tomado partido por eles e um epiléptico.
Zazie e a viúva Mouaque levantaram-se, com o mesmo movimento, e aproximaram-se daquela magma humana, que se agitava no meio da serradura e dos cacos de louça. Algumas marretadas, bem aplicadas, com o sifão, eliminaram da competição certas pessoas de crânio frágil. Graças a isso, Gabriel pôde erguer e rasgar, se assim se pode dizer,a cortina dos seus adversários e, ao mesmo tempo, levantar os corpos desfalecidos de Gridoux e Turandot, estendidos no solo. Alguns jactos de água gasosa, dirigidos para as trombas destes, pelo elemento feminino e maqueiro, fizeram com que se reanimassem. A partir de então, o resultado já não oferecia dúvidas.
Enquanto os clientes, tíbios ou indiferentes, se eclipsavam, à socapa, os teimosos e os criados, já sem forças, rendiam-se, ante o murro severo de Gabriel, o punho de Gridoux e o pé violento de Turandot. »

- Raymond Queneau, "Zazie dans le Metro"

O meu recolhimento eremitérico não me permite grandes efusões. Mas para boa entendedora...

Anelídeos e gastrópodes

«Mas quando se aprende a curvar a espinha e a baixar a cabeça diante do "poder da história", acaba-se por aprovar com a cabeça, como um bonzo chinês, qualquer poder, quer seja do governo ou da opinião pública ou da maioria do número, e por agitar os membros em obediência estrita a quem tem nas mãos os fios. Se qualquer sucesso é devido a uma necessidade racional, se qualquer acontecimento é uma vitória da lógica ou da "Ideia", então ponhamo-nos de joelhos perante toda a espécie de sucessos. Quê? Desapareceram as mitologias soberanas? Estarão as religiões a agonizar? Olhai uns instantes para a religião do poder da história. Observai os sacerdotes da mitologia das ideias e os seus joelhos esfolados. As próprias virtudes, não marcham todas elas atrás desta nova crença? Ou não será abnegação quando o homem histórico se deixa humilhar até ao estado de espelho objectivo? Não será magnimidade renunciar a todos os poderes do céu e da terra porque em todos estes poderes se adora o poder em si? Não será justiça ter permanentemente nas mãos a balança das forças e examinar minuciosamente qual é a mais forte e mais pesada? E que escola de conveniências é este modo de encarar a história! Julgar objectivamente tudo, não se irritar com nada, não amar nada, tudo compreender, suaviza e torna maleável. (...)
Qualquer que seja a virtude de que se fala - justiça, generosidade, bravura, sabedoria, piedade para com os humanos - o homem só é virtuoso quando se revolta contra a força cega dos factos, contra a tirania do real e quando se sujeita a leis que não são as que regem situações históricas dadas. Nada sempre contra a corrente da história, quer lutando contra as suas paixões, que são para ele a realidade mais próxima e estúpida, quer submetendo-se à honestidade, no momento em que a mentira tece à volta dele as suas teias cintilantes.»

- Nietzsche, "Da Utilidade e dos Inconvenientes da História para a Vida"

O culto rastejante da História é, invariavelmente, um sinal inequívoco de espíritos invertebrados. Na carcaça de Hegel fuçam duas hostes: à esquerda, anelídeos; à direita, gastrópodes. Respectivamente: sintetizadores do esterco e babosos de capelinha às costas.

terça-feira, maio 30, 2006

A Irmandade das Demolições



Mencken, entretanto, prossegue, ao ritmo das grandes demolições. Eu, recolhido em profunda meditação, deleito-me. Acabo de descobrir uma alma gémea!...

«Em nenhum outro lugar do mundo é a superioridade tão facilmente alcançada ou mais prontamente reconhecida. A principal ocupação da nação, enquanto tal, é a produção de heróis, sobretudo falsos. A nação admirava o estilo literário do falecido Woodrow, respeita a paixão teológica de Bryan, venera John Pierpont Morgan, leva o Congresso a sério; a nação ficaria chocada e sem palavras se lhe dissessem (apresentando as respectivas provas) que os seus juízes, em grande medida, são completos ignorantes, e que uma respeitável minoria não passa de uma corja de malfeitores. O fabrico artificial de altezas reais e até de deuses prossegue a ritmo alucinante; a vontade de venerar mostra-se inquebrantável. Dez ferreiros reúnem-se nas traseiras de um bar, criam uma loja da Nobre e Mística Ordem dos Rosa-cruzistas americanos e elegem um mecânico de carroças para Coisa e Tal Supremo. Um mês depois, mandam um anúncio para o jornal local dando conta da grande honra que constituiu a visita desse Coisa e Tal e que planeiam oferecer-lhe uma corrente ornamentada para o seu relógio de bolso. Os principais heróis nacionais - Lincoln, Lee, e por aí fora - não podem ficar confinados ao estatuto de meros seres humanos. O misticismo do campesinato medieval insinua-se na visão comunitária destas personagens, às quais começam rapidamente a nascer asas e halos. Como já afirmei, nenhum mérito intrínseco -proporcional, pelo menos, ao julgamento das massas - é necessário para aceder ao estatuto destas augustas dignidades. Tudo o que é americano tem um toque de amadorismo e de infantilidade, mesmo os deuses nacionais. (...)
Tudo o que acabo de dizer resume-se ao seguinte: os Estados Unidos são essencialmente uma comunidade de gente de terceira categoria; esta é uma distinção fácil de fazer devido ao baixíssimo nível de cultura, de informação, de gosto, de capacidade crítica e de competência. nenhuma pessoa em seu perfeito juízo, ao chamar um canalizador americano para reparar uma fuga, espera que ele o faça à primeira tentativa; do mesmo modo, não esperará mais do que um desempenho mediano de um secretário de Estado americano em negociações com ingleses ou japoneses. Está claro que gente de terceira categoria existe em todos os oaíses, mas só aqui lhes é confiado o leme do Estado e, ao mesmo tempo, a guarda dos valores nacionais. O país foi povoado não por esforçados e lendários aventureiros, mas muito simplesmente por incompetentes que nunca saíram da cepa torta na terra natal. A natureza pródiga que aqui vieram encontrar e a facilidade com que podiam ganhar a vida apenas confirmaram e aumentaram a sua incompetência natural. Mesmo nos piores momentos das guerras índias, nenhum colono americano teve de enfrentar as provações por que passaram os camponeses da Europa durante a Guerra dos Cem Anos, ou mesmo aquelas que oprimiram as classes baixas imnglesas no século que precedeu a reforma eleitoral de 1832. De facto, na maioria das colónias, raramente um colono se cruzou com um índio: a única coisa que lhe fazia a vida difícil era a sua cretinice congénita. A conquista do Oeste, vastamente celebrada em obras de estilo grandiloquente, custou menos vidas do que a batalha de Tannenberg, e a vitória foi muito mais fácil e segura. os imigrantes que foram chegando desde esses primitivos tempos têm revelado, quanto mais não seja, ainda menos qualidade que os seus antecessores. O mito de que os Estados Unidos foram povoados pelos descendentes de minorias corajosas, que se haviam revoltado contra a injustiça, o sectarismo e o obscurantismo dominantes nos países de origem, está rapidamente a desmoronar-se perante os resultados surpreendentes da análise que tem sido feita sobre a imigração destes últimos anos. A verdade é que a maioria dos imigrantes não anglo-saxões desde a Revolução, assim como a maioria dos imigrantes anglo-saxões antes da Revolução, não é ou não foi constituída pelos melhores dos respectivos países, mas sim pelos falhados e pelos inadaptados: irlandeses a morrerem de fome na Irlanda, alemães incapazes de resistir ao Sturm and Drang da reorganização pós-napoleónica, italianos enlutados num solo esgotado, escandinavos só pele e osso e sem cérebro, judeus demasiado incompetentes até para enrolar os bárbaros camponeses russos, polacos ou romenos. De tempos a tempos, bem entendido, lá se encontra um bravo, ou até um super-homem por entre os imigrantes -por exemplo, os antepassados de Volstead, Ponzi, Jack Dempsey, Schwab, Daugherty, Debs ou Pershing - mas o recém-chegado é, e sempre foi, má rês.»

- Henry Louis Mencken, "On Being an American on prejudices" (trad. port. da Antígona)

domingo, maio 28, 2006

Os Caldos Imperiais

«Ao que tudo indica, alguns começam a achar a tarefa desagradável, ou melhor, impossível. A sua infelicidade enche as páginas dos semanários liberais, e todos os navios que saem de Nova Iorque transportam uma carga gemebunda com destino a Paris, Londres, Munique, Roma e locais ainda mais longínquos. Qualquer destino serve para escaparem às grandes maldições e atrocidades que lhes infernizam a vida na terra natal. Deixem-me desde já afirmar que pouco tenho a objectar às suas principais queixas. De facto, em mais do que um aspecto, vou talvez muito mais longe do que os Jovens Intelectuais. Por exemplo, uma das minhas mais firmes e sagradas crenças, resultado de mais de vinte anos de estudo e apoiada em oração e meditação constantes, é que o governo dos Estados Unidos, tanto no ramo legislativo como no executivo, é ignorante, incompetente, corrupto e repulsivo, e não isento deste julgamento mais do que vinte legisladores no activo e outros tantos agentes do poder executivo. Não deixo também de acreditar piamente que a administração da justiça no seio da República é estúpida, desonesta, contrária a toda a razão e equidade, e não isento deste julgamento mais do que trinta juizes, incluindo dois com assento no Supremo Tribunal dos Estados Unidos. Estou igualmente convencido de que a política externa dos Estados Unidos –o seu modo usual de lidar com outras nações, amigas ou inimigas – é hipócrita, dissimulada, desonesta e desonrosa, e deste julgamento não admito quaisquer excepções, recentes ou remotas. É minha quarta (e última, para evitar um balanço demasiado deprimente) convicção que o povo americano, grosso modo, constitui a mais timorata, choramingas, pusilânime e ignominiosa multidão de servos e praticantes de ordem unida que alguma vez se juntou sob a mesma bandeira em toda a Cristandade desde o fim da Idade Média, ficando mais timorata, mais choramingas, mais pusilânime e mais ignominiosa cada dia que passa.
Por isso, tudo somado, estou com os fugitivos Jovens Intelectuais - mesmo para além das Terras Más. Estes são, em suma, os artigos cardeais da minha fé política, fervorosamente professados desde a minha admissão à cidadania, e deles estou cada vez mais convicto à medida que me vou desintegrando no carbono, oxigénio, hidrogénio, fósforo, cálcio, sódio, nitrogénio e ferro de que sou constituído. É nisto que acredito e é isto que prego, in nomine Domini, ámen. E no entanto, quando zarpam os Jovens Intelectuais, quedo-me no cais, embrulhado na bandeira. E no entanto, aqui permaneço, sem vacilar e sem desesperar, um Americano leal e devotado, pagando os impostos sem queixumes, obedecendo a todas as leis a que fisiologicamente se pode obedecer, aceitando sem protestar os deveres e as responsabilidades fundamentais da cidadania, investindo os parcos usufrutos da minha ingrata labuta em títulos da dívida pública, evitando qualquer convivência com homens empenhados em derrubar o governo, dando a minha modesta contribuição para a glória das artes e ciências nacionais, adornando e enriquecendo a língua nativa, rejeitando todos os engodos (e mesmo todos os convites) para ir para fora e por lá ficar: eis-me, um solteiro desafogado, quarenta e dois anos, sem dívidas ou preocupações que me constranjam, livre de ir aonde me apetecer e de ficar o tempo que me apetecer; eis-me, prazenteiro, ufano até, ao abrigo da bandeira nacional, melhor cidadão, atrevo-me a dizê-lo, e de certeza menos queixinhas e menos exigente, do que milhares que põem Sua Exc.ª Warren Gamaliel Harding ao lado de Frederico Barbaruiva e Carlos Magno, que defendem ser o Supremo Tribunal directamente inspirado pelo Espírito Santo, que são membros fervorosos de tudo o que é clube Rotário, Ku Klux Klan e Liga Anti-Saloon, que sufocam de emoção quando a filarmónica executa "The Star-Spangled Banner" e que acreditam, à maneira das criancinhas, que um dos Nossos Rapazes, escolhido ao acaso, é capaz de arrumar, numa luta justa, dez ingleses, vinte alemães, trinta franciús, quarenta italianos, cinquenta japonocas ou cem bolcheviques.
Assim sendo, por que continuo aqui? Por que sou tão complacente (ao ponto, talvez, de ser ofensivo), tão pouco bilioso, tão pouco tomado de cuidados e de indignação, tão intrigantemente feliz? Por que me limitei a responder com uns poucos "Muito bem" académicos quando Henry James, Ezra Pound, Harold Stearns e os emigrés do Greenwitch Village lançaram os seus apelos sucessivos à intelligentsia bem nutrida para que abandonasse a choldra, rumando a terras mais justas, livrando-se da maldição para sempre? A resposta, obviamente, deve ser procurada na natureza da felicidade, o que predispõe à metafísica. Mas vou manter-me com os pés assentes no chão. Para mim (e posso apenas seguir o meu próprio faro), a felicidade apresenta-se como um todo, pelo menos, tripartido. Par ser feliz (reduzindo tudo ao essencial) preciso de estar:
a) Bem alimentado, livre de preocupações mesquinhas, à vontade na mãe pátria;
b) Repleto de um reconfortante sentimento de superioridade em relação à grande massa dos meus compatriotas;
c) Permanentemente divertido, com finura de espírito e de acordo com o meu gosto.
É minha opinião que, caso esta definição seja aceite, não existe país à face da terra onde um homem com uma maneira de ser parecida com a minha - um homem com as minhas fraquezas e vaidades, os meus apetites, preconceitos e aversões - possa ser tão feliz, ou mesmo feliz pela metade, como aqui, nestes estados livres e independentes. Vou mais longe postulando que é fisicamente impossível para um homem como eu viver Nestes Estados e não ser feliz. É isto tão impossível como vermos um rapazinho chorar por descobrir incendiada a sua escola. Quem disser que não é feliz aqui, ou mente ou é louco. Aqui, arranjar um modo de vida, especialmente desde que a guerra trouxe o saque de topda a Europa para os cofres nacionais, é incomparavelmente mais fácil, de facto, que, para fracassar, qualquer pessoa culta e com capacidades tem de desenvolver esforços deliberados nesse sentido. Aqui, a média geral de inteligência, de conhecimento, de competência, de integridade, de respeito próprio e de honra é tão baixa que qualquer homem conhecedor do seu ofício, que não receie fantasmas, que haja lido cinquenta bons livros e pratique os bons costumes, dá tanto nas vistas como uma verruga na cabeça de um careca e é atirado, quer queira, quer não, para o seio de uma limitada e exclusiva aristocracia. E aqui, mais do que em qualquer outro lugar que conheça ou de que tenha ouvido falar, o panorama da vida quotidiana, da estupidez pública e privada -o desfile interminável de extorsões e fraudes governamentais, de bandidos e comerciantes sem escrúpulos, de palhaçadas teológicas, de brejeirices estéticas, de vigarices e aleivosias legais, de uma miscelânea de imoralidades, torpezas, imbecilidades, fenómenos grotescos e luxuosidades - é tão extraordinariamente alarve e ridículo, de tal modo elevado à mais alta voltagem, tão regularmente enriquecido com uma audácia e uma originalidade, quase para além dos limites da imaginação, que é preciso termos nascido com o diafragma petrificado para não adormecermos todas as noites contorcidos de riso, e não acordarmos todas as manhãs com a ânsia pueril de um catequista que faz o circuito dos peep-shows de Paris.»
- Henry Louis Mencken, "On Being an American in Prejudices" (trad. port. da Antígona)

Uma obra, aproveito para informar, que foi escrita -muito bem escrita, aliás - nos anos Vinte do século homónimo.
A nós, deixa-nos entregues a uma singular ginástica mental: a de imaginar tudo isto elevado, não apenas à quarta potência, o que já seria assombroso, mas à "Super-Potência", o que é ainda mais hilariante.
Não obstante, se foi dum caldo destes - e tudo indica que sim - que evoluiu o Grande Império dos nossos dias, o Tal, o enlevo de bimbos e saloios globais, às mancheias -, então animemo-nos: dado o estado em tudo semelhante deste nosso rincão, por esta altura do campeonato (até andámos a sacar à Europa, não esqueçam), é bem provável que, o mais tardar, em cinquenta anos, estaremos ao leme do planeta.
Haja, pois, esperança. Que imbecilidade, palhaçada, torpeza, aleivosia e a desmesurada audácia que tudo isso promove, aqui, como lá naquela época embrionária, também não faltam. É mesmo uma farturinha que augura -em repicar de sinos! - os maiores cometimentos e as mais mirabolantes façanhas. Uma nova saga épica, de certeza absoluta.

sexta-feira, maio 26, 2006

Pirilampos trágicos e doutas gambosinices

É triste mas é assim. Não sei quantos milénios suplementares serão precisos, mas não se avista saída breve para fora disto. Dir-se-ia até que, em cada dia que passa, piora a olhos vistos. Sou testemunha viva de acusação e hei-de declará-lo aos vermes, quando me vierem limpar os ossos:
Não há pensador humano, de vão de escada rolante ou poço de elevador celeste, que não parta do tesouro das suas conclusões e dos seus preconceitos para se lançar no tricoteio dos seus argumentos. Melhor dizendo: logo que os seus preconceitos se sedimentam e cristalizam no montículo sólido das suas conclusões, ei-lo que se encafua nas profundezas duma masmorra mental, qualquer uma serve, onde, com requintes de verdugo e ganas de inquisidor, se entrega à tortura metódica da realidade, a fim de que esta, heresiarca relapsa e contumaz, lhe forneça as premissas convenientes à apoteose do seu raciocínio. E a todo este ignóbil, sebento e refalsado processo chama ele “filosofia”.
Esta, uma vez extorquida após tão cruéis sevícias, ou há-de servir de fralda da Religião, de babete da Ciência, ou de vaselina para a Ideologia.
A verdade - na irrisória porção que lhes compete, a estes pirilampos da sabedoria -, é que traficam filosofobia por filosofia.

Ser cão do próprio cão

O Mal, se assim lhe podemos chamar, sempre existiu. É o mais fiel companheiro do Homem. O Mal e o Medo, seu coadjutor principal. A nossa época, significativamente, apenas difere das anteriores numa coisa: nunca o Mal teve uns amplificadores tão potentes. Ferramentas tão sofisticadas. E um húmus tão fértil.

quarta-feira, maio 24, 2006

O fado é que induca, o vinho é que instrói!

«Pelo menos 10 furacões vão formar-se este Verão no Atlântico»
‘Da-se!, que mundo este! Quando até já os furacões vão para a universidade. O meu velho é que tinha razão, especialmente quando estava c’os copos:
«O fado é que induca, o vinho é que instrói!”
Graças a ele, não me mandaram para a escola. Fui engraxar sapatos para a estação do Cais Sodré. Dali às meninas era um instantinho. Um homem faz-se a trincar cona desde a mais tenra idade. Ou pelo menos a cheirar. Não há melhor vitamina ou adubo neste universo.
As universidades, acreditem, é que fodem esta merda toda. Acabem com as universidades e vão ver que o mundo melhora. Pouco, mas melhora. E antes pouco que nada. Caso contrário, é vê-lo piorar todos os dias!
"O que é que se aprende numa universidade?", perguntei eu, um dia destes, ao Labaredas, que foi gajo para andar metido naqueles quintais. “Não digo tu, ó moinante (tive que esmiúdar), que já sabemos que só lá andaste para arranjar pito à borla e foder o juízo aos prófes... Refiro-me, anota bem, àqueles totós que lá andaram contigo, mais as feiozas, os estafermos e toda aquela ganadaria imprópria para consumo que acabam vestidos de corvo a queimar não sei o quê, benzidos pelo abade!...” (tem que se explicar tudo bem explicadinho ao Dragaredas, senão desata numa letra que até nos dá dores de cabeça, larga a metralhar-nos de adjectinos, metafodas e alegrunhias, que até dá vertigens).
Assim, bem instruído, açaimado, estrangulado, como convém, o Caga-Lume lá me respondeu:
-“Caguinchas, irmão de putaria, basicamente, nas universidades cá do burgo, os totós aprendem a dar graxa, a lamber-cus e a cheirar-rabos. Em suma: adestram-se para toda uma carreira na política e nas artes.”
Juro que foi isto que o gajo me disse. Sem tirar nem pôr. E o gajo sabe. Fala não sei quantas línguas, conhece o Plantão de ginjeira, é tu-cá-tu-lá com o Aristosto-lhos e - já vi eu, com estes que a terra há-de comer e vomitar logo a seguir – lê o Hei Edgar que nem uma cigana lê a pata dum otário! Mesmo assim, por via das dúvidas, ainda lhe arregalei os olhos e espremi:
-“Olha lá, isso é mesmo assim, não me estás a mintir?!...”
O papa-princesas garantiu-me a dica. Que era a mais pura das verdades. Ele morresse já ali ceguinho e de gaita mirrada se aquilo era milonga. Etcétera e tal , por alma da avózinha que terá morrido virgem. E até jurou pelo Madjer...
-“Jura já aí, a pés juntos e sem figas, pelo Pinto da Costa!...” Exigi-lhe, à queima-roupa. E o gajo, sem hesitar, jurou.
Portanto é verdade. Tão certo como o céu ser azul e branco quando não chove.
Agora digam lá se não tenho razão para me orgulhar do meu velho. Não distinguia uma letra dum tamanho dum boi, arriava-nos forte e feio sempre que o Glorioso perdia, bebeu este mundo e o outro... Mas era um sábio. Pôs-me logo a engraxar sapatos com sete anos. Constatem e mordam-se de inveja, ó totós: ainda os outros andavam na primária, no bê-a-bá, e já eu estava na universidade. Menininho, chavalito, já eu engraxava a preceito e cheirava cona da gorda. E estes marmanjões retardados de agora, bajolos do caralho, com idade para já serem homenzinhos e saberem o que é a vida, ainda andam a cheirar-cus e a aprenderem os rudimentos do gamanço. No meu tempo, com a idade deles, já eu tinha a Mimi, a Filó e a Madalena do Broche por conta, e sociedade com o Manolo Cigano na venda de eléctricos e monumentos aos parolos e saloios das berças que vinham à cidade em excursões. Tínhamos escritório ali à rua da Palma, que saudade!... Era simultaneamente escritório e marisqueira. Não andávamos ali para enganar ninguém! Não é como estes políticos da agora, filhos da universidade, que é bem pior que ser filho da puta, quer-me cá parecer, pois não enganam o parolo uma só vez: enganam-no toda a vida. 'Tá bem que o parolo não serve para outra coisa, nasceu para isso. Mas acho mal os filhos vigarizarem os pais.
Sim, eu sei, o Dragão também me disse: de vez em quando, no dia de São Nunca à Tarde, a universidade lá produz um génio. Também acontece, estilo excepção à regra, admito.
Mas eu pergunto-vos:«Neste cabrão de mundo, para que serve um génio?”
Basta acompanhar as notícias:
«Pesquisadores encontram gene causador de tipo de leucemia»
«Decifrado gene causador da epilepsia hereditária»
«O primeiro gene causador da obesidade humana, que recebeu o nome de beta-3»

Estão a ver? Ele é leucemia, ele é epilepsia, ele é obesidade e aposto que até diabetes! É nisto que dão os génios. Que ninguém se engane: os génios são os piores!

E os filhos da puta dos jornalistas, outros chouriços de universidade, só dão erros de ortogradia. Até mete nojo tanta ingnorância!...

terça-feira, maio 23, 2006

A linguagem secreta da gaja



Pirateado, mais uma vez, daqui.

(This comic is copyright © Neil Swaab 2006. All rights reserved. Rehabilitating Mr. Wiggles is supported through book purchases. If you like it, please buy a book and help him to keep making these. You can contact him at mail@neilswaab.com. If you want to see more comics, please visit his website at neilswaab.com. )

segunda-feira, maio 22, 2006

Paintbull-fighting

«Não compreendo como é que alguém consegue gostar de um "espectáculo" que nos mostra imagens destas», queixa-se, amargamente, o JCD.
A imagem é a que se segue:


Eu, para ser franco, além dessas tais (que, por regra, não vejo), também não compreendo como é que alguém consegue gostar de um "espectáculo" que nos mostra imagens destoutras ( às quais igualmente, com fervor ainda mais religioso, não assisto):





Provavelmente, nestas, o digníssimo JCD garantirá que não há mistério nenhum. Que é apenas o Mercado a funcionar. Eu é que tenho a mania que sou elitista e não respeito os gostos do vulgo. Milhares, milhões de vulgo. E, além disso, não tem qualquer comparação: a tortura sanguinária e brutal do pobre cornúpeto e a exibição destes programas verdadeiramente educativos para as massas. De resto, são touradas modernas. Não são touradas obsoletas, anacrónicas, tradicionaleiras. E tudo o que é moderno é bom. Ou, pelo menos, não é mau, não é cruel, não é horrível. Não andam a espetar farpas nos lombos dum pobre bovino gladiador. E ainda têm o patrocínio do BES ou da Coca-Cola. É verdade. De facto, apenas toureiam os nossos filhos; apenas torturam a nossa própria espécie; apenas estupidificam e ajavardam os nossos vizinhos e semelhantes. No entanto, dado que se trata duma tortura psicológica, não conta. É subjectivo. E as vítimas até gostam, juram que sim, pelam-se por cada novo episódio. Vociferariam se lhes retirassem a dose. Não, compenetremo-nos: A tortura física, a espirrar sangue, é que é. O touro sangra, muge de dor (e raiva, presumo); os alarves só dão gargalhadas, casquinam como macacos ou ululam em manada. A tortura física magoa a besta; a psicológica apenas bestializa o humano. Não se fala mais nisso.
O touro, portanto, coitadinho... Chacinam-no, aqueles grandessíssimos sádicos, e a TV, não raras vezes, ainda transmite em directo. E o pior, não sei se o caro senhor reparou, é que neste último sarau torcionário, a lotação estava esgotada. Esgotadíssima. Ora, isto é terrível. Quer dizer que há público, que há clientela, que pululam, salivam e reclamam consumidores. Alguns até, conforme sugere no seu pungente postal, amigos seus, gente usualmente meiga e de bom coração. Que -estimo - esquiam consigo pela Serra Nevada abaixo. Ou o acompanham, de cachecol e buzina, às tragédias da Alvaláxia. Mas que uma vez abivacados no redondel sinistro, basbaques daquela barbárie arcaica, desatam aos olés, a atirar flores, chapéus e algumas, sobrexcitadas, segundo me contou um amigo meu que foi forcado, até as cuequinhas.
Mas público é público. Consumidor é consumidor. Estamos, como deve calcular, a entrar em território santo; largamos o profano e embrenhamo-nos destemidamente no sagrado. É o Mercado a funcionar, pois claro. Um catecúmeno da sua categoria não precisa, com certeza, que eu, um ignóbil herege, lhe faça o croquis da coisa, ou, ainda menos, lhe recapitule a cartilha, pois não? Seria bonito!... Em todo o caso, mesmo que o devaste amnésia súbita, estou certo que o seu confrade João Miranda saberá socorrê-lo a rigor.
Aqui há tempos a cantadeira Ágata brindava a nação com o seguinte desabafo: "Sou pimba, mas tenho um Mercedes". "Esta gaja é uma puta duma liberal, caralhos a fodam!", fumeguei eu para com os meus botões, mas isso agora não vem ao caso. O que importa é reconhecer que os torturadores-de-bois, que tanto o desgostam, em fogozo tandem com a flausina, podem dizer o mesmo: "Somos cruéis, mas temos público". O que resulta que também têm quintas, casas nas quintas, Mercedes, BMWs, Volvos, Jipes, em suma: são pessoas de sucesso, cidadãos eméritos, vedetas do showbiz, cometas do jet-set, estrelas da "Caras", da "Lux", comendadores condecorados e, não tenha dúvidas, se abrissem um blogue, davam-lhe dez a zero com uma perna às costas e um braço ao peito. Pronto, não são americanos, não falam inglês, não massacram árabes por esse mundo fora, ou torturam comunas na américa latina, mas não se pode ter sempre tudo, não é?
E tem outra coisa, estimado JCD: chacinar o infeliz ruminante cria riqueza, gera emprego, promove turismo. Não me diga que quer torpedear o melhor dos mundos com essa erupção destrambelhada de escrúpulos morais?! Não me diga que os valores cristãos -tais como a compaixão- são péssimos para as pessoas, mas indispensáveis para os bovinos!... Ainda para mais quando milita num blogue cujo lema emblemático é "acabar com a bovinidade". Lamento, mas a coerência cobra tributo. Ou devia cobrar. Não gosta de ver, tapa os olhos. Faz como eu, não compra bilhete, não assiste. O touro em causa, porventura, é propriedade sua? Se o matam à missionário, no açougue municipal, ou com preliminares e requintes, na arena, em que é que isso são contabilidades do seu rosário? É o seu direito à indignação? Sem dúvida, Deus, digo, o Mercado lho guarde. Permita até que me indigne consigo. Indignemo-nos juntos! Podemos também indignar-nos por causa daqueles míudos nos teares paquistaneses, indonésios et al, que produzem aquele belo calçado Reebok com que fazemos jogging (bem, eu não, eu é mais putedo, mas também se percorrem grandes distâncias, verdadeiras maratonas atrás das putas, ou em cima delas, tanto faz, o Caguinchas é testemunha)?... Não? Porque isso é indústria, não é "espectáculo", ou seja, não se vê, está escondido, longe da vista, longe do coração?... Ah, pois, que cabeça a minha. Sim e não são animais do primeiro mundo, são apenas pessoas -ainda por cima monhés, chinocas ou escarumbas - do terceiro, cujo dever essencial é trabalhar e sacrificar-se para que nós, abençoadinhos, predestinados, liberdadeiros, consumamos produtos cada vez mais baratos. Poderá parecer uma tortura, mas não é. Ou melhor: não é uma tortura gratuita, frívola, com lentejoulas. Pelo contrário, é uma tortura útil, fundamental, filantrópica e necessária. Um sacrifício que uns fazem pela felicidade dos outros. Puro amor ao próximo, se bem que longínquo, convenhamos. Cristianismo aplicado, há que reconhecê-lo (no calvário deles repousa a nossa salvação). Por isso mesmo nem se lhe chama tortura: chama-se-lhe trabalho. Há lá coisa melhor que o trabalho deles e o nosso emprego e respectivas férias?! E de pequenino é que se torce o destino. Além disso, entre estarem ali bem arrecadadinhos e concentrados horas a fio, a treinarem e adestrarem-se para o desemprego, ganhando o seu dinheirinho, se bem que diminuto, ou andarem a prostituir-se a pedófilos, a serem esquartejados para tráfico de órgãos, ou a darem tiros como aprendizes numa qualquer milícia de bandidos muçulmanos ou animistas, só temos que agradecer à globalização que permite estes notáveis progressos. Verdadeiros milagres, sou forçado a concordar.
Isto, todavia, transporta-me a uma segunda suspeita. A saber: temo bem que a sua sensível pessoa também não considere tortura aquilo que se passa nos aviários industriais, sobretudo norte-americanos (aí, Jesus, nem pensar), bem como nas explorações pecuárias intensivas de bovinos, suínos e outros hinos. Lá está: é indústria. Acontece todos os dias, todas as horas, aos milhões, mas é para nosso bem. E, pormenor crucial, não se vê. Não é forma de espectáculo e entretenimento. Bem, para ser franco, até se vê, como o caro senhor poderá comprovar neste vídeo à solta na Net. Mas, claramente, deve tratar-se duma fabricação, dum activismo de mau gosto (não como o seu, que é de extremo bom gosto), manigância de gente retrógrada, hipócrita, liberais americanos (que como todos sabemos são a única coisa que os Estados Unidos têm de mau) ou vegetarianos. Do que esta gente é capaz para denegrir o melhor dos mundos! Basta atentar neste site vegetariano para orçarmos do rol inaudito de despautérios e calúnias. As coisas que eles inventam!... Como se os nossos suculentos bifes e churrascos não fossem provenientes de hotéis de cinco estrelas, onde os gentis animaizinhos dadores aguardam, confortavelmente, a sua vez. Dos nutritivos hamburgueres Mcdonald's ou dos estaladiços fritos KFC, então, é melhor nem falarmos. São bichinhos que experimentam inexcedíveis mordomias e apaparicanços prévios.
Não nos extraviemos, pois, com minudências e coisas que, de tão óbvias, até se tornam obtusas.
A tourada, maldita seja, ou não fosse ela portuguesa, é que é digna do nosso horror. Ao menos que convertessem aquilo em "rodeo", mas não, cismam de martirizar freneticamente o desvalido cornúpeto. Repare-se no contra-senso: já não se pode fumar em locais públicos, mas ainda se pode farpejar bois. Isto é claramente um sintoma de país subdesenvolvido. O progresso ainda não chegou às touradas à portuguesa.
Aposto que o JCD, que não é comuna nenhum e muito menos um activista desencabrestado, não defende que se acabe com a tourada. Estimaria apenas que se acabasse com a selvajaria e a barbárie na tourada, estou em crer. E eu, note bem, não o critico por isso, nem discordo sequer. Digo-lhe até como o outro dizia ao tal: "Vá em frente, JCD! estou consigo." Sim, já é mais que tempo de se fazer a "tourada-light". Aliás, os espanhóis, um caralho os foda, já acusam a nossa tourada de ser "light", porque não matamos o touro na arena, à espadeirada, como convém (dizem eles, os cabranaços). Pelo que o mais correcto é cognominar-se a "tourada como o JCD gostaria" como "tourada ultra-light". Não só não o matamos, ao bovídeo, como não lhe fazemos paliteiro dos lombos. Elucubremos, então, sobre as putativas reformas que se imporiam (com carácter de urgência):
Para começar, arrelvava-se a arena. Aquilo assim faz muito pó e o pó, como é bem sabido, constitui um veículo temível de germes. Depois, retiravam-se as esporas ao cavaleiro, para não magoar os flancos sensíveis da sua nobre montada. Finalmente, em vez dos ferros nefastos e dilaceradores, o ginete, todo galhardo, galopava armado duma arma de paintball, com a qual alvejava o touro (tendo este, naturalmente, as vistas devidamente protegidas com óculos adequados). Aliás, esta "tourada ultra-light", para efeitos de marketing internacional, até podia ter um nome mais apelativo, modernaço, em suma: anglofónico. Para tão vantajoso efeito, passava a chamar-se ao desporto tauromáquico, à festa doravante mansa, Paintbull!
Que tal lhe parece, caro JCD? Catita, não ?!... E a cores.

Que género de blogador és tu?



Pirateado daqui.

(This comic is copyright © Neil Swaab 2006. All rights reserved. Rehabilitating Mr. Wiggles is supported through book purchases. If you like it, please buy a book and help me to keep making these. You can contact him at mail@neilswaab.com. If you want to see more comics, please visit his website at neilswaab.com. )

domingo, maio 21, 2006

Olivença é nossa!

(Reposição de um postal de o2 de Junho do ano passado. E, talvez, o postal que mais gozo me deu escrever em toda a história do Dragoscópio...)


Pronto, temos o caldo entornado! Li por aí, algures, qualquer coisa sobre a Olivença mártir, ocupada pelo castelhano ímpio. Está tudo estragado. Eis que um manto vermelho me tolda as vistas e ímpetos tigrinos me revolvem a figadeira. Esta, má de sua usual natureza, está agora péssima, segregando uma bílis capaz sabe-se lá de que homéricas façanhas e belicosas audácias. Um vulcão de rompantes homicidas envinagra-me os azeites e trepa-me à mioleira. Não, não me deviam ter falado numa coisa dessas. Agora aturem-me!...
Fez ontem quantos anos? Duzentos e quatro?!! E ainda tendes o descaro de me dizer uma coisa dessas?!! São duzentas e quatro punhaladas no meu coração!, são duzentas e quatro marretadas na minha cabeça!, são duzentos e quatro coices nos meus digníssimos testículos!
Mas somos homens ou larvas rastejantes?! Somos varões ou galinholas?! Estamos à espera de quê? Hem?!
Para Olivença e em força! Já! Imediatamente! A todo o vapor! E, de caminho, a título de juros de mora, tomamos também Badajoz. Aproveitamos e enfardamos caramelos –ou seja, em linguagem técnica, reabastecemos -, e aí vamos nós, direitos a Sevilha, a Algeciras, a Ayamonte se os cabrões dos espanhóis não ajoelharem prontamente, em rogo de misericórdia e juras cegas de vassalagem perpétua. Em se prostrando, os biltres, os cães, agarrados às mulheres e aos filhos, lavados em lágrimas, ainda vá que não vá: cobramos tributo, pagam uma choruda indemnização, (a fórmula será défice x 2 + total de anos de usurpação x Pi) e vamos comprar casacos de cabedal a Ceuta. Caso contrário, se armarem em esquisitos, se se puserem com procrastinanços, não me telefonem nos próximos doze meses: vou andar extremamente ocupado em razias pela Estremadura, a pôr a ferro e fogo a Andaluzia, a desertificar a Serra Nevada (sobretudo de turistas, para lhes arruinar o turismo parolo) e, nec plus ultra, a violar chicas ali prós lados da Meseta. Hei-de flagelá-los com tal rigor, que, diabos me levem, se, em menos de dois meses, não hão-de andar de joelhos, aos gritos, a implorar a Deus por tsunamis e dilúvios alternativos. (Nota: não esquecer de passar por Andorra para ver a que preço estão os Hi-Fis).
Entretanto, caso os olivenses (ou olivenceses, ou olivedosos, ou lá o que são) actuais, segundo malsinam certas línguas escamosas, não nos receberem com a aclamação e fanfarra devidas, e, pelo contrário, escandalosamente, nos presentearem com umas lúgubres trombas cravejadas de olhos de carneiro mal morto absolutamente remelosos, fazemos como os primeiros cruzados na Santa Jerusalém libertada: passamo-los de mal-mortos a bem-mortos. Em três tempos. É esse, aliás, um costume típico destas romarias, um procedimento que fica sempre bem em qualquer festividade, e como "ética" quer dizer "segundo o costume" tratamos de fazer "segundo a ética". Sobretudo, para que depois não apareçam aqueles estrábicos torcicolados da ONU, que só vêem para um lado, filhos da puta, com conversas parvas de crimes contra a humanidade e queixinhas palermas de famílias pulverizadas sem mandato internacional ou valas comuns desrespeitadoras do PDM. Que pandilha! Julgam eles que quando um herói está com a mão na massa, assoberbado num alto empreendimento, tem tempo e disponibilidade para minudências?!...Irra, paladinos do ar condicionado, é o que eles são. Ordenhadores do palanfrório! Burocratas de merda, sempre com a mania dos alvarás, das resoluções, das assembleias gerais. Beija-cus dos americonas, um pénis os fecunde!
Creiam-me: nunca as circunstâncias, cá e lá, e em toda a parte, foram tão propícias. Basta reparar, com olhos de ver, nos astros e respectivas confluências. Perguntem ao Delgado, à Helena Matos, ao Almôndega Prado Coelho, ao João Miranda (a pedido da Zazie, não digam nada ao VPV). Ide mais longe, se a certeza científica vos apoquenta: matai um galo preto e espreitai-lhe as vísceras; depois um galo branco; depois, uma galinha careca e, finalmente, por via das dúvidas, uma carpa dourada. Mesmo as fezes dos recém-nascidos, emulando Picasso, ultrapassando Miró, não falam doutra coisa. Multiplicam-se os prodígios.
É a hora! Às armas!
Tanto desempregado que anda para aí ao alto, a coçar a micose; mais outros tantos funcionários públicos, do quadro, inamovíveis, sedimentários, obesos, a precisarem de exercício; e igual hoste de gays e ateus suicidas, habituados aos rigores da campanha e ao trabalho de sapa; para já não falar nos políticos ociosos, nos jornalistas sanguinários e nos - sobretodos ferozes, impiedosos, carniceiros - bloguistas liberais (incluindo-se neste termo geral todas as diversas e incontáveis seitas, estirpes e castas: neoliberais, anarcoliberais, conoliberais, pimboliberais, liberais gays, liberais ML, liberais TDI, liberias DDT, 605 Forte, SOS-prostituta, cartel de Medelin, "A Mão Invisível", "O Pé Invisível", esquisoliberais, Testemunhas de Bush, Igreja Universal do Reino do Tio Patinhas, Fãs do Capitão América, etc, etc, etc). Basta mobilizar toda esta gente, que diabo, municiá-los dum objectivo, documentá-los da peregrina táctica e inseri-los numa estratégia mirabolante, mas vencedora. Dai-me uma ideia fixa, que eu dou-vos uma alavanca capaz de jogar bilhar com planetas!...
Dir-me-ão, os cépticos bananas do costume, que eles, os Castelhudos, têm a Divisão Não Sei Quantos, mais o Batalhão Fulano de Tal e ainda um Porta-Aviões todo equipado, pintado de novo e com muitas bandeirinhas, enquanto nós nem submarinos decentes e modernos temos: os que submergem não emergem, e o que submerge e emerge não navega.
Realmente os submarinos davam jeito, um jeito do caraças...certamente para irmos Tejo acima e atacarmos Toledo. Depois, criada a testa de ponte, retrocedíamos até Alcantara (em Espanha, não confundir com aquela zona de discotecas em Lisboa) e fazíamos um desembarque anfíbio, precedido do desfile da Banda da GNR, para dar mais colorido à cena. Aposto que seria este o plano do Loureiro dos Santos, se alguém caridoso não o amordaçasse e acorrentasse a um poste de electricidade qualquer, de modo a poupar-lhe figuras tristes, mas compulsivas, diante das câmaras duma qualquer televisão. Francamente, e depois queixam-se estes gajos que são os rabejadores da Europa!... Mas alguém precisa de submarinos, tanques, bombardeiros, mísseis, porta-aviões ou sequer porta-chaves daqueles tipo 007, capazes de tudo e mais alguma coisa, quando dispõe de "políticos de destruição maciça", várias Brigadas deles; "gays e ateus suicidas", um leque completo de Batalhões de Choque, capaz de se fazerem enrabar ou cobrir de infâmia em qualquer ponto do globo; e, verdadeiro suprassumo bélico, arsenal único no mundo, "uma Mão e um Pé invisíveis" susceptíveis de todas as assimetrias e chacinas mais retumbantes?!... Tenham juízo.
Basta atentar na nossa Ordem de Batalha para perceber como estamos condenados a uma hegemonia, para já, ibérica, logo de seguida europeia e, finalmente, mundial. Considerem, fora as tropas convencionais que são despiciendas e podem ficar de piquete aos incêndios, considerem, dizia eu:

  • 5 Brigadas de Políticos de Destruição Maciça
  • 4 Batalhões de Choque Suicidas (o 1º -Gay Homos; o 2º-Gay Lesbos; o 3º -Ateus Furiosos; o 4º - Logística, simpatizantes e acólitos)
  • 1 Corpo de exército de Jornalistas nosferatus e Necrófagos
  • 1 regimento de bombeiros pirómanos
  • 1 Escola Prática de Infantaria Metrossexual
  • 1 Escola Prática de Cavalaria e Pingarelho
  • 3 esquadrões aéreos, com destaque para os F.Abaixo-de-zero, o famoso "Esquadrão de acrobacia aérea "Os Patos Bravos""
  • 1 Task Force de bloguistas Liberabundos (constituída por Gabinete de Agiprop; D.I.T.A -Departamento de Intoxicação e Técnicas de Automutilação; Brigada de Lorpas Paraquedistas e Comandos Peregrinos; Grupo Especial de Fogueteiros Pirotécnicos, etc)
  • 1 Agrupamento Zootécnico, formado por um regimento de papagaios louros; quarenta pelotões de macacos de imitação; duas companhias de varejeiras jet-set e um batalhão de insectos tele-rastejantes )
  • Arsenal Top-Secret das armas estratégicas de persuasão: os já lendários "Mão e Pé invisíveis".( Depois da dissuasão, eis que Portugal retoma a liderança global através do conceito de persuasão, congratulemo-nos!...)


Estais estarrecidos, não é?... O caso não é para menos. Nunca tal arsenal bélico, tal potência destrutiva, se reuniu e congregou sob o auspícios e as fronteiras duma mesma nação. São o sonho de qualquer marechal de campo em tirocínio para Deus. Mas serenai: não estarrecereis sozinhos. Em breve, todo o mundo, a começar nos Castelhudos, se estarrecerá também. Depois do polícia global americano, esse bandalho inoxidável, chegou a hora do GNR global português, esse enigma biodegradável. E onde os badamecos anglonóicos falharam na instauração forçada de democracias (ou seja, convenientes badernas na casa alheia), nós triunfaremos na sementeira de Alentejos (inexcedíveis parques de gastrópodes assimilados) até à Taprobana.
Quanto ao plano de operações para esta epopeia inaugural –o resgate de Olivença mártir, não esqueçam -, é matéria de elementar estratégia.
Em primeiro lugar, enviamos as quintas colunas infiltradas, que vão minar a vontade e a organização inimiga, já de si, segundo rezam as notícias, deveras debilitadas e previsivelmente claudicantes. Os espanhóis masculinos estão ocupadíssimos defronte do lavaloiças, a pilotar fogões ou aspiradores; enquanto os femininos fumam cigarros, mimam a carreira e vão ao psicanalista. Todos eles dormem religiosamente a sesta. Depois de almoço é todo um país prostrado no leito, a ressonar. Óptima ocasião para as nossas manobras hostis.
Para não fatigar o leitor pouco familiarizado com o léxico militar, passo a resumir o programa de festividades.

  1. Infiltração do Grupo Especial de Fogueteiros Pirotécnicos, disfarçado de contrabandistas de tabaco ou cabedais. Associam-se às feiras religiosas locais, sempre abundantes em honra deste ou daquele santo, e, sincronizadamente, à hora H, de dentro dos arraiais, lançam os seus engenhos infernais e pegam fogo às matas.
  2. A pretexto de ajuda, o Regimento de Bombeiros Pirómanos entra no país vizinho e ajuda a alastrar os incêndios, de modo a que estes irrompam alegremente pelas aldeias e vilórias.
  3. Entretanto, o 1º e o 2º Sub-Batalhões de Choque Suicidas (Gay-Homos e gay-lésbicas), numa ofensiva motorizada, assediam e seduzem as forças de segurança espanholas, em especial a Guardia Civil. Os Homos fazem-se enrabar heroicamente por tudo quanto é berma, gerando o pandemónio nas estradas; e as lésbicas chafurdam e lambuzam-se com não menos valentia, até à morte, de roda das chicas fardadas e das oficialas, arruinando de vez com a disciplina nas fileiras. Ao mesmo tempo, o 3ºBatalhão Suicida, o dos Ateus furiosos, imobiliza e transtorna, infernizando com argumentos absolutamente imbecis, o poderoso clero espanhol. Desamparada dos seus presbíteros, barricados e cercados nas suas sacristias, a população espanhola cairá num completo desnorte, logo seguido dum pânico generalizado, que lançará o caos nas comunicações inimigas, mergulhadas, é mais que certo, numa overdose de notícias contraditórias.
  4. Largada das Brigadas de Políticos de Destruição Maciça nas principais cidades espanholas. Rapidamente reforçados pelos políticos e aspirantes a políticos locais, devorarão recursos e energias, desviarão fundos e receitas, inventarão desculpas e subterfúgios, desmoralizarão à esquerda e à direita. Os sindicatos organizarão marchas e greves, os partidos farão comícios, o parlamento apelará ao Rei que, em desespero, chamará Julio Iglésias em socorro da pátria. No entanto, Julio Iglesias, conforme previsto, estará retido por uma brigada de Jornalistas Nosferatus, reforçada a uma companhia aérea de Varejeiras Jet-set e dois batalhões motorizados de insectos tele-rastejantes. Finalmente, de modo a impedir definitivamente que o colosso cante, o que seria catastrófico, senão mesmo mortífero, para as NT (Nossas Tropas), em especial para os F.Abaixo-de-Zero "Patos Bravos" e o Agrupamento Zootécnico, forças mistas da Brigada de Lorpas Paraquedistas e Comandos Peregrinos silenciarão a mais perigosa arma inimiga, através do lançamento de Misses teleguiadas que o neutralizarão sem dó nem piedade, castrando-o. O timbre vocal ficará irremediavelmente arruinado, excepto para trinados maricas, mas inofensivos, estilo "Ala dos Namorados".
  5. Por esta altura, já só o poderoso Estado Maior General Espanhol ainda resistirá. O general chefe estará reunido com os seus oficiais, tentando accionar o plano de emergência que movimentará as tropas e o porta-aviões que, em seu néscio entender, irão devolver a ordem e a soberania ao país. O risco da emergência dum novo Franco é por demais evidente. Momento crucial da nossa estratégia, este: o derrube do baluarte derradeiro da resistência inimiga. Terrível hora, essa, em que, com a inexorabilidade dum super-poder, faremos avançar a "Mão Invisível". (Benzamo-nos e afastai de fronte do monitor as crianças e os idosos mais sensíveis a certas cenas!...) Mas eis que a tremenda arma avança. Lá vai ela, sem que ninguém a veja... O general castelhudo debruça-se sobre mapas, traça azimutes, apascenta blindados e fragatas, orienta raides e bombardeamentos devastadores. Os outros bebem-lhe, reverentes, a peroração tonitruante; estremecem aos murros na mesa, aplaudem as retaliações arrasadoras. Lisboa não perde pela demora. A Mão, porém, invisível, já entrou descontraidamente na sala. Horror!, aproxima-se do General-Chefe e, mais inteligente que qualquer bomba inteligente, que qualquer míssil catedrático, e até mesmo que José Pacheco Pereira, não hesita e apalpa o cu ao grande estratego. Sacrílega, profana-lhe, sem remissão, o templo da dignidade máscula. Talvez seja melhor não descrever o caos subsequente; o escândalo que, primeiro, a murro e, depois, a tiros de pistola, o emérito cabo de guerra, furibundíssimo, tentará aliviar. Certo é que cinco minutos mais e com cinco coronéis a menos, o mesmo cavalheiro, na mesma zona superiormente determinada, é, podemos estar certos, de novo alvejado. Em cheio. O sistema de pontaria da "Mão" é infalível. Aí, se já tinha passado das palavras aos actos, agora, com a lógica própria da corrida aos armamentos, passa da pistola à granada. À medida que o Estado-maior, por artes auto-redutoras, vai descambando em Estado-Menor e, por fim, Estado-Mini, a "Mão Invisível", pré-programada, prossegue a sua missão aniquiladora. Já só resta o General-em-Chefe, arquejante, espumado, de olhos esbugalhados e a retaguarda dorida. Entre a caliça e o fumo levantados pela última explosão, fita, alucinado, em redor... "Puercos! Maricóns! Sodomitas!", urra, descabelado. A "Mão", ainda e sempre, "invisível", inexorável, vai aplicar o cheque-mate. Insinua-se, por baixo, entre os joelhos, sibilina, e sobe...lentamente, letal, como uma tenaz impiedosa. A vítima continua aos urros, ignorando o fatal desenlace que a espera. A "Mão Invisível", esqueci-me de dizer, tem dedos de aço invisível, é inodora mas não é molengona nenhuma. Pelo contrário, possui uma força descomunal, é mão de Hércules, com força de prensa e ganas de alicate. O efeito dominó está prestes a consumar-se. A última peça tomba no preciso instante em que a "Mão" se fecha, invisível como sempre, mas tendo com reféns (bem espremidos) os mui dignos –e notáveis à vista desarmada - tomates do bravo General. Rendição incondicional, como é evidente.
  6. Decapitados os exércitos, restará o Rei. Como no xadrez, não é detalhe despiciendo. Uma palavra sua pode ainda ressuscitar um país; uma interjeição sentida pode ainda reacender a resistência (o que para nós, há que reconhecê-lo, como forças invasoras, não é nada conveniente). É a torre de menagem da alma dum povo, o monarca. Pois bem, o rei não é tão poltrão como o pintam. Mais que a pátria, sente o trono em perigo. Teme pelas mordomias, tanto quanto pelos vândalos abrutalhados que aí vêm. Ouviu falar das desumanidades mentais de que os Bloguistas Liberabundos são capazes. Teme o Gulag psicológico, a deportação para o Limbo. Suspeita que, em comparação, Hitler, se calhar, até merecia o Nobel da paz. A multidão imensa, consternada, suspensa, lacrimejante, aguarda defronte do palácio. Toda a praça geme, suspira, reza. Até que o rei, num brio que foi pescar às estranhas, assoma à varanda... Clamores, gritos, delíquios... O povo, em delírio, aclama, pressente o milagre. A Espanha, firme e orgulhosa, não ajoelhará diante do invasor. No limiar da História, fitando a eternidade, o rei emociona-se. Ao fervor tumultuoso do povo, responde com uma vénia emocionada, debruça-se do parapeito para recolher as flores rubras, os olés apoteóticos, para prestar homenagem à fé inabalável das simples almas...
    Sem saber que, secreto e letal, como a "Mão", bem atrás de si, se embosca, armado e catapultante, o "Pé Invisível"... (Tumph!...)


    Que ninguém duvide: Olivença é nossa!

sábado, maio 20, 2006

Uma questão controversa




É uma questão que me ocorre, pelo menos, todas as semanas e que Steve Sailer, no seu blogue não raras vezes sagaz, aprimora com usual argúcia. Uma passagem merece especial destaque:
«Como o correspondente Alan Riding, do New York Times, escreveu, no seu best-seller, "Vizinhos distantes: Um retrato dos Mexicanos", no México, a Vida pública pode ser definida como o abuso de poder para aquisição de riqueza, e o abuso da riqueza para aquisição do Poder.»
É esta brilhante definição que me interessa e que, certamente, nos deveria convocar - a mim e a vós, ó génios que daí me decifrais - não só ao riso mas, sobremaneira, à reflexão.

Confesso que acho deslumbrante: "O abuso do Poder para aquisição de riqueza, e o abuso da riqueza para aquisição de Poder"... Até apetece sair pelas ruas a pintar nos muros e a carimbar nos autocarros.

Mas...(não consigo suster esta perplexidade), acuda-me daí uma alma caridosa que me esclareça: Não é esse o lema do "Ocidente" desde o Império Romano paradigmático?... Não tem sido esse o "Abre-te Sésamo"dos Impérios e magnas Potências?...

De tal modo vício já virou tique: Andamos sempre a armar em virgens impolutas. E, com igual constância, a descarregar a própria infâmia em cima dos costados alheios.

sexta-feira, maio 19, 2006

O Mercado explicado aos otários



«Antes de 1980, o Afeganistão produzia 0% do ópio mundial. Até que a CIA entrou em campo, e em 1986 já produziam 40% do fornecimento mundial de heroína. Em 1999, já processavam industrialmente 3.200 toneladas de heroína/ano, ou seja, cerca de 80% do abastecimento de todo o mercado. Só que então algo de inesperado aconteceu: os talibãs chegaram ao poder e, em 2000, tinham destruído quase todas as plantações de ópio. A produção caiu de mais de 3.000 toneladas para apenas 185 toneladas, uma redução de 94%! Esta enorme queda de receita causou danos não apenas nos projectos de Orçamento Coberto da CIA, mas também no fluxo de dinheiro [livre de taxas e impostos] “lavado” nos Bancos Controladores.»

Entendamos o seguinte: o Tráfico Ilícito de Estupefacientes, recorrendo à terminologia da moda, tão do agrado dos nossos mercantileiros desinsofridos, produz tanta riqueza como a indústria do petróleo. Basicamente, o produto final das colheitas traduz-se em dólares – narco-dólares. Narco-dólares, esses, que, depois de lavados em Wall Street e noutras instituições filantrópicas da mesma e fina estirpe, servem, na sua componente menos pornográfica, para financiar digníssimas empresas, casinhotas para o burguês (ou candidato a burguês) ocidental, automóveis a prestações e viagens pelos trópicos. É claro que durante o processo há uns infelizes que se quilham, às vezes os próprios filhos do putativo candidato, mas isso, enfim, são danos colaterais e, afinal, conforme nos explicam os entendidos, ninguém os obriga. Vivemos numa sociedade livre, de indivíduos magnificamente equipados com turbo-livre-arbítrio, os quais, nunca duvidemos, são plena e exclusivamente responsáveis pelos seus actos. Sobretudo, quando estes actos são auto-destrutivos ou irracionais.
Acresce que o Tráfico de Drogas Ilegais serve também, e de que maneira, como ferramenta de ingerência e manipulação geopolítica. A descrição adequada do processo não parece andar muito longe disto:
"The CIA functionally gains influence and control in governments corrupted by criminal narco-trafficking. Politically, the CIA exerts influence by leveraging narco-militarists and corrupted politicians... This is really NEO-narco-colonialism, whereby local criminal proxies do the bidding of the patron government seeking expanded influence. But because of the quid-pro-quo of protecting the criminal proxies' illicit pipelines, the result is still a functional narco-colonialism, involving a narcotics commodity in the actual practical execution of policy, with the very different twist of covert action.”

Claro que tudo isto são conjecturas, delírios pré-estivais. Conversas com as paredes.
Atenhamo-nos aos factos:
1. «A produção de ópio no Afeganistão bateu recorde em 2003, segundo informações divulgadas neste domingo em conferência em Cabul. A produção de ópio não pára de crescer desde a queda do regime extremista islâmico Taleban, em 2001.»
2. «Segundo o relatório, no Afeganistão, a produção ilegal de drogas chegou a um nível recorde em 2004 e está comprometendo a estabilidade do país»
Curiosamente, a produção de cocaína na Colômbia, principal produtor mundial de tão valiosa especiaria e país onde a presença americana -quer no combate ao tráfico através de forças e cooperação militares, quer no controlo remoto do governo aborígene - ainda é avassaladora, também não tem diminuído nos últimos anos.
A produção manteve-se inalterada, apesar dos denodados, heróicos -e certamente dispendiosos para o contribuinte - programas de erradicação levados a cabo pela Administração da Superpotência. Talvez por isso mesmo, a subsecretária Patterson considerou o "Plano" um "sucesso maior do que o previsto".
A função da "erradicação", tudo o indica, na Colômbia como no Afeganistão, é manter a produção a níveis óptimos. Quer dizer, superlativamente lucrativos. Nem pondo em risco o free-flow for cash laundry através duma diminuição abrupta, nem ameaçando o bom preço através dum excesso descontrolado de produção e, consequentemente, de oferta.
Afinal de contas, há que zelar pelo Mercado. Nem só de petróleo vive o "homem". Muito menos o Império.
Cada qual tem a Civilização que merece. Ou dito melhor: retouça na pocilga que melhor lhe quadra.

quinta-feira, maio 18, 2006

Crédito Inquilino

«Inquilinos vão poder comprar os prédios onde habitam».
Pois, basta pedirem um empréstimo ao Banco. Aliás, já deve estar na rampa de lançamento - o "Crédito Inquilino".

Viva a Argentina!...

E agora, a propósito duma tal selecção dum tal Scolari, eis que o pagode, em festa, desata num nacionalismo bacoco e num patrioteirismo assanhado!... Agora, a pretexto duns quaisquer rapazolas de aluguer, cuja perícia maior é assestar pontapés numa bola e exibir penteados inverosímeis e tatuagens exóticas, eis que a portuguesice saloia já pode vibrar à desfilada e ninguém se ofende nem escandaliza com desfiles de bandeiras, marchas ululantes e automutilados mentais aos urros. É o chamado nacionalismo benigno, light, com preservativo. Sem perigo de infecção nem gravidez. É o patriotismo dos castrados, dos impotentes, dos onaneiros e, cumulativamente, dos basbaques. Tudo a bem não já da nação mas do negócio.
Por alturas fétidas destas, sinto que desperta em mim um internacionalismo feroz. Tão inesperado quão devastador! Ocorre-me, em síntese, um curial desabafo: Para patrioteirices ovelhabundas destas não dou, não estou, caguei! Sinceramente: Quero que se fodam, com o devido patrocínio dos hipermercados Continente e da cerveja Sagres!
É como vos digo: se esta cambada vai desatar agora aos guinchos por Portugal, se é agora que vão descobrir a sua súbita e fugaz paixão pela terra que os viu nascer, então, se português é ser isto, não direi como o Almada acerca do Dantas -que preferia ser espanhol (porque isso nem para efeito de retórica se diz) - mas assevero - juro a pés juntos! - que, nos próximos dois meses, quero ser argentino. Mais: vou ser argentino dos quatro costados.

Viva a Argentina!...

Argentina Allez!

Até porque as cores são mais portuguesas que esta fralda verde-rubra, de borrados e imberbes, a imitar Marrocos!...



quarta-feira, maio 17, 2006

Bad news e Altermanias (rep)

Amanhã volto. Ou então não.

Entretanto, para irdes marinando e amaciando os lombos, aqui fica algo que tive oportunidade de pronunciar há precisamente um ano atrás. Continua plenamente actual, pelo que me dispenso de repetir...

Vivemos um tempo de ataque cerrado à auto-estima das pessoas. Se por um lado se lhes insufla o ego de vento, num simulacro de rã em ascensão a boi, por outro, é um gás deletério e corrosivo que só as emprenha de angústias, dúvidas e hipocondrias existenciais. A máquina da extracção da auto-estima, opera, ao mesmo tempo, na injecção de dependência, de vassalagem cega e desmedida à hetero-estima. As pessoas -categoria cada vez mais obsoleta-, são manipuladas (ou melhor dizendo, pedopuladas) como uva em lagar de mixordeiros, de marteleiros desenfreados. O resultado é uma vasta cadeia de montagem de imbecis, de gentinha débil-emocional, que se arrasta e repta num constante: "por favor gostem de nós". Mimadas até ao vómito, são desossadas de toda e qualquer autonomia, depiladas de genuíno critério ou gosto, esterilizadas e lobotomizadas metodicamente até uma espécie de tetraplegia mental.
Mais que um qualquer modo de afirmação, o seu exibicionismo obsceno - outras vezes simulado, protocolar, mas sempre emulador dum alterpadrão público -, resume-se a uma sórdida súplica, um enerve requerimento de adesão a uma qualquer manada preponderante.
É toda uma imensidão de hiper-egos paradoxalmente junkies dos outros, do número, da manada. É uma espécie de massa levedante, que quanto mais exorbita mais se agrega e empastela. Pastam e, ao mesmo tempo, vigiam-se, controlam-se, perseguem-se. Levantam a cabeça apenas o suficiente para espreitar o grosso da manada, para avaliar do fluxo dominante, das áreas de maior aglomeração. Se é superlotado é bom; se está enxameado de peregrinos, então é por aí certamente o caminho. O lema estrutural resume-se a "sou o que os outros acham", "sou por sufrágio universal", "candidato-me, propagandeio-me, sufrago-me em cada instante", "aconchego-me". No fundo, vão na enxurrada humana, não tanto para onde escolhem, mas para onde a multidão irracional, a chicote de um qualquer inefável piloto, os empurra. E atrai.
Entretanto, esse irresistível vórtice magnético que são os outros tem doravante um nome, um nome que impera sobre todos: Opinião Pública. É a estrela guia e o astro radioso que ilumina.
É a suposta "opinião de todos", a "opinião universal", no mínimo, a "opinião dos outros".
E quem são esses que os teleguiam?
São os mesmos que estipulam aquilo que é gostável e desgostável, aquilo que é estimável ou execrável. Curiosamente, os mesmos que lhes amputam a alma e lhes implantam, em forma de prótese indispensável, género cadeira de rodas espiritual, uma sórdida maquinazinha defecante, palradora, onanogâmica e hetero-dependente.
Convertidas a um quase vegetal merdificante e palrador, incontinente e mirrado, absolutamente submisso ao cuidado e à vigilância alheia, ambulam, quais espantalhos grotescos, à mercê de estímulos e próteses que os transportam e que, providencialmente, sempre providencialmente, como soro através de tubo, ou realidade através de ecrã, lhes fornecem.

domingo, maio 14, 2006

Objecções à Democracia

«Os demagogos prosperam pela mesma razão que o fazem os cavalheiros de indústria - porque têm jeito para tagarelar, um encanto, um conhecimento intuitivo da natureza humana, porque a sua personalidade é magnética e o seu modo aberto é afável. Os homens e as mulheres são tão sugestionáveis, tão facilmente burlados, que um trapaceiro talentoso pode estar sempre certo de levar uma vida regalada. Quanto mais certo do êxito não está o demagogo! Porque os demagogos não pedem às suas vítimas que lhes dêem um maço de notas de banco; apenas pedem votos. Podem comprar-se coisas com notas de banco, os papéis de voto não valem nada. Toda a gente está disposta a ser generosa com o seu voto. (...)
Os demagogos não são os únicos nem mesmo os mais eficientes exploradores da sugestionabilidade humana. Os proprietários dos jornais levaram a arte dos cavalheiros de indústria a um grau ainda mais alto. O alargamento da educação elementar foi acompanhado por um grande aumento da influência da imprensa. Quem lê pode correr - na mesma direcção em que corre o seu jornal. Isto é um facto do qual os ricos não foram lentos em tirar vantagem. Praticamente falando, toda a imprensa inglesa está agora nas mãos de quatro ou cinco homens ricos. Oligarcas plutocráticos, aspiram a governar sob a capa das instituições democráticas, impessoalmente e sem responsabilidade. Explorar a democracia, viram eles, é mais fácil e mais rendoso do que opor-se a ela. Deixem que os muitos votem, mas conforme lhe disserem os poucos opulentos que são donos dos jornais. (...)
A terceira objecção principal à democracia política é a de que fomenta a corrupção. A prova da corrupção democrática está tão largamente descrita na história americana e europeia recentes, que se torna desnecessário para mim inventariar casos específicos. (...) Tem havido corrupção sob todo o sistema de governo. A corrupção sob o sistema democrático não é pior, nos casos individuais, do que a corrupção sob autocracia. Há meramente mais, pela simples razão de que onde o governo é popular, mais gente tem oportunidade para agir corruptamente à custa do Estado do que nos países onde o governo é autocrático. (...) A experiência demonstrou que o governo democrático é geralmente muito mais dispendioso do que o governo por poucos. (...)»

- Aldous Huxley, "Proper Studies"

Em resumo, as três principais objecções à democracia, segundo Huxley: 1. Demagogia; 2. Manipulação plutocrática; 3. Corrupção.
É difícil não concordar com este gajo. Não obstante, duas breves notas, que o tempo e o local não dão para mais:
a) Se o governo democrático é mais dispendioso que o governo autocrático (e parece que, quanto a isso, não restam dúvidas), então os nossos "liberais" de serviço deveriam repensar as suas teses e converter-se o quanto antes à autocracia;
b) Não está provado, penso eu, que poucos roubem menos que muitos. Depende da quantidade que cada qual pilhe. Aliás, socorro-me de dois casos lapidares para melhor documentar esta minha tese: O presidente Mobutu (cuja fortuna pesssoal era exactamente gémea da dívida externa do Zaire, azarada região do globo que era suposto ele governar); e o presidente José Eduardo dos Santos, cujas proezas espoliadoras me dispenso de reproduzir, pois acredito que são do conhecimento universal.
De resto, assim de chofre, e às pressas, parece-me que, mais que a oportunidade, é a impunidade que funciona como catalizador-mor do gamanço. Quer dizer, se além da ocasião, ao ladrão, lhe proporcionarem o trono imperial e o ceptro celeste...
Ou seja, ao contrário dos micro-tiranetes -governamentais, autarcas, etc -, os macro-tiranos não precisam de fazer a coisa às escondidas.

segunda-feira, maio 08, 2006

Da Autocracia e da Xenocracia

(Prodigiosamente, dado o local onde me encontro, estou a conseguir postar. As dificuldades são, todavia, imensas, pelo que não se admirem se nestes próximos dias a tasca estiver ao Deus dará.)

«A autocracia e o governo por estrangeiros são frequentemente (embora de modo nenhum invariavelmente) ineficientes, cruéis e corruptos. Grandes massas dos súbditos de déspotas ou estrangeiros sentem os seus interesses afectados adversamente pelas actividades dos seus governantes. Desejam modificar a forma de governo, de modo que se torne mais favorável em particular aos seus interesses nacionais ou de classe. Mas os descontentes nunca estão satisfeitos com o simples descontentamento e desejo de mudança. Gostam, como já apontei, de justificar o seu descontentamento, de procurar desculpas exaltadas e filosóficas para os seus desejos, de sentir que o estado de coisas mais conveniente para eles próprios é também o estado de coisas mais agradável à Razão Pura, à Natureza e à Divindade.»

- Aldous Huxley, "Proper Studies"

Ocorre-nos, de imediato, uma questão interessante:
- Qual será pior: uma autocracia dum autóctone ou um governo de estrangeiros por interpostos aborígenes?
Não é uma questão nada retórica. Pelo contrário, pode traduzir-se na realidade portuguesa dos últimos cem anos.

Hoje em dia, há pessoas que começam a interrogar-se se ser governado - indirectamente - pelas actuais agremiações partidárias ou directamente por espanhóis, alemães, ingleses ou americanos faria muita diferença. Pelo menos, a empatia entre governantes e governados não divergiria muito, se é que divergia em alguma coisa. O desprezo e a aversão recíproca seriam idênticos.

O pior é que espanhóis, alemães, ingleses ou americanos também já não sabem muito bem quem é que os governa. O "quem" é uma benevolência da minha parte. Mais justo seria dizer o "aquilo".

Mas concentrem-se na questão proposta e entretenham-se com ela até ao meu regresso. Ou então ide bugiar ou ler blogues de referência, passe a redundância.

domingo, maio 07, 2006

A Crise como subterfúgio

«Os defeitos da democracia política como sistema de governo são tão óbvios, e têm sido tantas vezes catalogados, que não preciso mais do que resumi-los aqui. A democracia política foi criticada porque conduz à ineficiência e fraqueza de direcção, porque permite aos homens menos desejáveis obter o poder, porque fomenta a corrupção. A ineficiência e fraqueza da democracia política tornam-se mais aparentes nos momentos de crise, quando é preciso tomar e cumprir decisões rapidamente. Averiguar e registar os desejos de muitos milhões de eleitores em poucas horas é uma impossibilidade física. Segue-se, portanto, que, numa crise, uma de duas coisas tem de acontecer: ou os governantes decidem apresentar o facto consumado da sua decisão aos eleitores - em cujo caso todo o princípio da democracia política terá sido tratado com o desprezo que em circunstâncias críticas ela merece; ou então o povo é consultado e perde-se tempo, frequentemente, com consequências fatais. Durante a guerra todos os beligerantes adoptaram o primeiro caminho. A democracia política foi em toda a parte temporariamente abolida. Um sistema de governo que necessita ser abolido todas as vezes que surge um perigo, dificilmente se pode descrever como um sistema perfeito.»

- Aldous Huxley, "Proper Studies"

Huxley, além de lúcido, foi profético em muitas coisas. É curioso verificar o frenesim com que nos nossos dias a (des)governação americana inventa crises e inimigos demoníacos a cada esquina, precisamente para invocar, em tons cada vez mais inquietantes, a "suspensão da democracia". A pretexto, por exemplo, do "estado de guerra" (maior crise que a guerra é difícil, convenhamos).
Por outro lado, se atentarmos no historial da própria "democracia portuguesa" pós 25 de Abril, constatamos como a mesma aparece também, quase sempre, submersa em tons de crise, oscilando entre regimes de aflição (o Prec, a Dívida Externa/FMI, os "critérios de Adesão", "o acesso aos Fundos") e compulsões de urgência (o famigerado e sempre-viçoso Défice).
Entre a (des)governação portuguesa e a (des)governação americana existem, de facto, alguns paralelismos ambientais. Só que, enquanto no caso da grande potência, muito providencialmente para os mandantes, a ameaça tem origem externa, no caso português, ou da enorme impotência, o problema reside nas suas próprias entranhas: há todo um povo renitente, atrasado e ineficiente que conspira, perverte e sabota as excelentes medidas - todas elas com carácter de emergência, de primeiro-socorro, de tentativa desesperada de salvação dum moribundo - dos (des)governantes.
Entretidos com uma série de bibelôs, berlindes e roquinhas, Vosselências, porventura, não reparasteis, mas, a Portugal, estão a tentar reanimá-lo desde 25 de Abril de 1974. A burilar noite e dia, de bisturi e serrote, por resgatá-lo às garras venenosas da gangrena. Debalde. Os competentes cirurgiões, em desespero mas estóicos, já tiveram que lhe amputar quase tudo -braços, pernas, rins, pulmões, os testículos... Mas o colapso não regride. Resta uma cabeça de velho tarado, gaiteiro, entrevadinho, dada a mitos e sonhos megalómanos, que uma lobotomiazinha a frio mantém num vítreo e baboso estado larvar.
Visivelmente dispostos a medidas extremas, heróicos, briosos, os mestres retalhadores já demandam na plástica reconstrutiva, na prótese de importação e, sobretudo, na clonagem transexual a solução derradeira.
Ah, beneméritos cientistas!...

Provérbios...

«Um grande guerra deixa um país com três exércitos - um exército de aleijados, um exército de enlutados e um exército de ladrões.»
- Provérbio alemão

Women Liberation...

Concentrem-se, se fazem o favor, nas três fotografias que se seguem:





Pois bem, as primeiras duas mostram «estudantes iraquianas em 1963-1964; a terceira é de estudantes iraquianas em 2006!! Por outras palavras, mulheres iraquianas antes e depois da "libertação"...»

As imagens e a denúncia foram pirateados daqui. Um blogue duma iraquiana. Recomendo uma visita.


Resta-nos cantar, com Frank Zappa:
«Women liberation
Came creepin’ across the nation
I tell you people I was not ready
When I fucked this dyke by the name of freddie
She made a little speech then,
Aw, she tried to make me say when
She had my balls in a vice, but she left the dick
I guess it’s still hooked on, but now it shoots too quick
Oh God I am the american dream
But now I smell like vaseline
An’ I’m a miserable sonofabitch..."

Sonofabitch ou sonofabush, tanto faz.

quinta-feira, maio 04, 2006

Iberismo à Portuguesa

Sim, sim, no fundo, lá bem no fundo, e o fundo é que comanda a vida, todos os portugueses são iberistas. Está-nos na massa do sangue. Porquê negá-lo? E eu mais que todos! Eu, aliás, à frente, a capitanear, como desde pequenino tenho a mania. Ainda hoje choro quando me lembro da Batalha de Toro. É algo inacabado, que nos assombra, que nos torpedeia, atormenta e obnubila. Enquanto não o concluirmos, nunca teremos paz. Há qualquer coisa de artificial, de contra-natura naquela fronteira. E aquela bandeirola em tons amarelos e vermelhos? Uma anedota. E uma afronta às regras mais elementares da natureza, sempre vos digo. Uma aberração, ninguém duvide.
É mais que evidente -brada ao escândalo! - : a península Ibérica deveria ser um único país. Portugueses e espanhóis são, bem vistas as coisas, um único povo, uma solidária e mesma gente. Temos todas as condições para nos entendermos às mil maravilhas, olá se temos: nós, bem entendido, a dirigir, a almoçar, a viajar, enfim, a tratar dos gastos (que é aquilo para que Deus nosso Senhor nos predestinou) e eles a trabalhar, a produzir, a esfalfarem-se todos pimpões, quer dizer, a suprir as despesas (e, vá lá , a ressonar umas sestazitas pelo meio) - que é aquilo para que servem e foram criados. É imperiosa esta clara divisão de tarefas. As boas divisões fazem os bons amigos.
A bem ou a mal, isto acabará por se cumprir. As eríneas constranger-nos-ão. Uma série impiedosa de catástrofes e desgraças ortopédicas -que, de resto, já vai longa - há-de reendireitar-nos a cerviz e reequipar-nos de testículos. Está superiormente prescrito. Nas noites limpas, pode ser claramente lido nas estrelas, para quem não for analfabeto ou ceguinho. A bem ou a mal, compenetrem-se. É forçoso. Metam isso nas vossas cabecinhas de alho chocho.
A mim, acreditem, dava-me mais gozo que fosse a mal.

quarta-feira, maio 03, 2006

Às armas!...Contra os cabrões, marchar, marchar!



A propósito das recentes atoardas do Ministro iberalho, enquanto preparo maiores artilharias, repito o que já aqui tinha dito (e não me canso de repetir):

Eu, Dragão, sou partidário de atacarmos Espanha. A pretexto de Olivença, a pretexto de Ceuta, a pretexto da Galiza, tanto faz. Qualquer pretexto é um bom pretexto. O essencial é que os ataquemos. O essencial é que nós, portugueses, larguemos o sofá e o telemóvel, peguemos em armas, qualquer uma serve, e marchemos a bater-nos, a bater-lhes, a desentorpecer os músculos e a desopilar os maus fígados. Chega de cóleras intestinas, de odiozinhos para consumo interno, de invejazinhas fratricidas. Está na altura de exportarmos o que de pior temos. Até aqui mandámos o melhor para fora, para os outros, e ficámos com a surrapa, a côdea, o que não presta. Chega! Também somos gente! Porque é que os culpados temos que ser forçosamente nós -ou porque fomos salazaristas, ou porque fomos comunistas, ou porque fomos simplesmente distraídos, azarados ou preguiçosos, hein?! Que sejam eles os culpados - os espanhóis, os castelhanos, melhor dizendo. Eles que paguem a nossa crise! Se estão montados na massa, não deve ter sido com trabalho honesto. Ninguém monta na massa dessa maneira. Mas se montaram, melhor para nós: eles que desmontem agora para nós montarmos! Onde é que está a dúvida? Porque é que havemos de teimar nesta auto-destruição obsessiva e fanatizada, como se outra ocupação não nos mobilizasse senão dar com a própria casa em pantanas? Ainda pra mais, a nossa já está toda escaqueirada - são séculos de negligência e vandalismo doméstico; enquanto a deles, de restaurada, até apetece. Está mesmo a pedi-las. Estamos à espera de quê? Vamos ficar aqui o resto da vida a chafurdar no entulho, a demolir ruínas? Se estão aqui mesmo à mão de semear, também devem estar à mão de colher. Ou de partir, de escavacar. Quanto mais não seja, pelo gozo. Portanto, passemos à colheita, à razia. Enquanto eles, chicos espertos, se entretêm a comprar-nos o país, nós, inteligentes, cínicos maquiavélicos, americanos perfeitos, roubamo-lhes o deles.
Isso não se faz? É ilegal? Irra!,mas em que cabrão de mundo é que vocês vivem? Como é que julgam que se constroem as superpotências, hem? Querem ser uma superpotência, ou não? Ou preferem ficar p'r'aí, eternamente, a cantar o fado, nessa super-impotência?
Tomem Viagra, comam amendoins, deitem pólvora na vinhaça, bebam chá de Cabinda, mas levantem-se, porra - vamos a eles!!...
E se a ONU vier com perguntas parvas, respondemos-lhe que andamos à procura do Bin Laden. É infalível. Aquilo está cheio de árabes. Ou então que vamos libertar a Andaluzia, a Catalunha, a Galiza, as Baleares, o País Basco!...
Carago, não basta gostar dos americanos. Há que imitá-los!...Carago não, Eureka!...

Um Admirável Outsourcing Novo


Privatizar prisões e torturas, pois claro. Excelente ideia! Depois do outsourcing da guerra, através das PMCs (Private military companies), temos agora o outsourcing do torcionarismo expedito, através dos PDTCs (Private detention & torture centers, digo eu).
Impossível não nos maravilharmos com este cada vez mais admirável mundo novo da iniciativa privada. É um neoliberalismo de comer e chorar por mais. Calculo os ganhos em produtividade e a poupança em salários e regalias supérfluas. Torturam mais, torturam melhor e torturam mais barato. Só vantagens. Oba!...
E é mais um triunfo e atestado eloquente do progresso planetário que em cada dia nos deslumbra e glorifica: enquanto uns retomam nacionalizações selvagens, outros ripostam com privatizações ainda mais selvagens. Aleluia!...

LSD

Diz um tal Vasco Graça Moura - que, pelos vistos, nos intervalos de tradutor e nas pausas de ser poeta, é também um perito voraz de geopolítica:
«Sem contar que o radicalismo fundamentalista dota a política iraniana de uma coesão alucinada que falta ao Ocidente.»

Falta, por conseguinte (com imenso pesar deste pensador fulgurante, presume-se), uma "coesão alucinada" ao Ocidente. Eis a panaceia, senhores: equipado com uma "coesão alucinada", o Ocidente, enfim, para grande alívio destas tias histéricas a descabelarem-se aos gritos diante dum ratinho, triunfará. De outro modo, céus!, é melhor nem pensar... Cavemos bunkers, corramos aos abrigos: será certamente o caos, a tragédia, o apocalipse em figura de gente.
Em todo o caso, alucinados não faltam, lá como cá. É só questão destes nossos (os Vascos, Pachecos et al) se compactarem mais. Se bem que já escrevam, mujam e pensem em manada, falta-lhes apenas a coerência de assinarem com uma única e comum chancela. Que tal LSD?...
A coesão alucinada do Ocidente tem que principiar por algum lado. Nada como os teóricos começarem por dar o exemplo. Senão, o que vai ser de nós?...

Entretanto, algumas imagens da "coesão alucinada" que tanta falta faz, segundo estes gurus, ao Ocidente (entenda-se Europa):

segunda-feira, maio 01, 2006

Analfabrutismo com Todos

Se querem que vos diga, o ensino que eu até mais estimava que funcionasse em Portugal era o primário: ao menos as pessoas aprendiam a ler, a escrever e a contar. Seria muito útil. Ainda mais se pensarmos que actualmente se brota das universidades (e as privadas um pouco pior que as públicas, Católica incluída) sem saber ler nem escrever.
É tal qual como vos digo: a minha filha, por exemplo, tivemos que ensiná-la, eu e a mãe, porque a srª profª tinha outras prioridades (o "meio social", chamam-lhe as luminárias da nova pedagogia). Até se propunha, a avantesma docente, fazer uma viagem de fim de curso pela estranja - que os totós dos pais gentilmente financiariam – na Quarta classe!! Quer dizer, na imaginação megalómana destes mestres-escola altamente perfunctórios, os fedelhos, ao fim de míseros quatro anos de escolaridade mínima, já se alcandoram ao estatuto de "finalistas" - quiçá com queima - em vez de fitas - de fraldas e chuchas. E as visitas de estudo aos cabarés culturais mais inverosímeis? -Infinitas! E as efemérides do calendário mais os treinos para as efemérides? - Um circo! E o festival de encerramento do ano lectivo, com as criancinhas a bancarem as vedetas da canção e os papás que nem focas a baterem palmas às mongoloidices adestradas dos rebentos? - Uma americanorreia de dar vómitos! Os Simpsons ao vivo! Um tipo gasta duas horas a interrogar-se se a escola serve para ensinar alguma coisa de útil aos filhos, ou para estupidificá-los desde a mais tenra idade, bem como justificar uma série de parasitas catrafilados, que nem sanguessugas, nos úberes do erário. Não digo público, porque sei de amigos que vão depositar os filhos em colégios particulares, pagam balúrdios, e o folclore é o mesmo. O que, de resto, só atesta da superior otariedade destes adeptos do "atendimento personalizado": a merda é a mesma, só que os papalvos, por pagarem mais, desenvolvem a muito parola fantasia de ficar mais bem servidos. Chega a ser anedótico: além de pagarem o colégio, ainda pagam depois um exército de explicadores e trituradores de dúvidas a esmo, senão os querubins não frutificam. Limitam-se a patinar na tronchice herdada dos pais.
(Agora vou ser herético e causar grande celeuma à esquerda) Vejam lá bem, que o ensino primário antes do 25 de Abril ensinava as pessoas a ler, a escrever e a contar. Eu, além disso, até aprendi as linhas de caminho de ferro de Angola e outros mistérios de igual gabarito. E reparem que o ensino, nessa época de trevas, também era público. Não me vão agora dizer que os srs. Oliveira Salazar ou Marcelo Caetano eram perigosos comunistas...
Por conseguinte, não é por ser público ou privado que funciona ou deixa de funcionar. Há certamente outras razões.
Mas devo dizer-vos, suponho que para vosso grande espanto, que até nem considero os professores os principais culpados do estado calamitoso a que chegou a educação em Portugal. Elejo, talvez ex aequo, os pais.
É que as p**** das criancinhas não fazem mais senão ir decalcar na escola os paradigmas eloquentes que são as bestas dos pais. Queiram desculpar-me, Vosselências, a rudeza, mas não vislumbro melhor descrição.
Antigamente, ia-se de bata, vejam lá bem. Agora vão de Chevignon, Armani e telemóvel em riste. Com trolley-bags, de pega telescópica e rodinhas, que mais parecem turistas a caminho do check in aeroportuário. Já nem são crianças, mas micro-adultos. Chouriços na rampa de lançamento para futebolista, modelo ou actor de "Morangadas". Em vez de aprenderem a ler e a escrever, aprendem a armar ao pingarelho, a dar opiniões, a macaquear os gurus da TVI. Não tarda muito, estão a abrir blogues na Net e a vociferar contra qualquer mosquito ignóbil que lhes complique a existência (suspeito que já o fazem).
Agora imagine-se quando arribam à faculdade... O horror, a tragédia, pois é.
Mas alguém ainda julga que são os filhos de gente humilde os piores? Desengane-se. É aquela classe de patos-bravos e aprendizes de patos-bravos que infesta o país. Micro-empreiteiros e nano-cabeleireiras. É um país inteiro sem tempo para aprender a ler e a escrever, e muito menos a pensar, porque está muito ocupado a dar opiniões, a palrar no telemóvel e a armar ao pingarelho. Desde girino.
É, resumindo e concluindo, o Analfabrutismo galopante. Elevado à quinta casa e enxofrado à bomba. Pelo vácuo das alminhas abaixo.
Puta que pariu esta gentinha, que já nem filhos faz, nem daqueles que faz quer saber!...

Pontes

Um país que se tornou perito -e viciado - em pontes. Esperemos que um dia destes não acabe a morar lá debaixo.