I
Ultimamente, aqui, na tasca -aliás, Ciber-tasca-, andam a contecer coisas estranhas; fenómenos deveras bizarros. O mais recente fez-se transportar na pessoa do Caguinchas, que, todo apessoado e decidido a uma pernoita excitante, me abordou com a seguinte trignometria:
-"Ó Dragão, estou aqui um bocado hesitante...Preciso da tua opinião!... Confesso que já não percebo nada destes anúncios!..."
Os anúncios em questão referiam-se àquelas páginas eróticas, onde hordas de gente voluntariosa se disponibiliza a todo o género de serviços corporais e prazeres de aluguer.
-"Pois, pá - continuou ele-, antigamente um gajo não tinha que tirar um curso superior pra perceber o que uma puta dizia, mas agora...foda-se!, é com cada equação do terceiro degrau!..."
Abreviando; em que consistia o problema do Caguinchas? Debatia-se, nada mais nada menos, que com uma série de termos esotéricos que lhe torpedeavam a avaliação das candidatas. Dizia uma:
"Sozinha...Trintona! Oral explosivo!! Rapadinha..."E o Caguinchas interrogava-se, perplexo: "ouve lá, isto do oral explosivo quer dizer que a gaja é árabe, ou quê?! E a raspadinha, quer dizer que no fim temos direito a um cartão da lotaria popular?!..."
Como podem ver, no fundo o que Caguinchas requeria era um tradutor de putaguês para português. Como domino o idioma, não vi inconveniente em fazer de intérprete.
-"Nada disso, ó Caguinchas. - Acalmei-o. - Eu traduzo: "oral explosivo", quer dizer que a gaja é especialista em broches; e (rapadinha) que não tem pintelhos na cona!..."
-"Não tem pintelhos na cona?!! - Alarmou-se o Caguinchas. -"então tem-nos aonde: Debaixo dos sovacos?!...
-"Não pá. -esclareci-o. -Significa que rapou a pintelheira! Enfim, americanices!..."
-"Rapou a pintelheira?!! - Continuou a alarmar-se o Caguinchas. - Mas também há barbearias de conas?!...E agora, como é qu'um gajo distingue o buraco da cona do buraco do cu?..."
Enigma transcendental, de facto. O Caguinchas achava tudo aquilo muito suspeito. O caso não era para menos. Chumbou a candidata e passámos à seguinte, que arauteava desta maneira:
"Promoção Inverno. Lisboa...marisa...Loiraça, insaciável...Corpinho violão...beijinhos...natural...BotaozinhoRosa...Bumbum furacão...Oral natural...Alucinante!! Sem borrachinha...3ª oportunidade! Até rebentar!!"O Caguinchas, pasmado, estava convertido num autêntico boi a olhar pra um palácio; e até eu, putanheiro moderno e encartado, com pós-graduações várias e cursos de actualização permanentes, dei comigo às aranhas para interpretar tal palimpsesto. Entretanto, enquanto eu relia o aforismo abstruso, o Caguinchas, como é seu estilo, disparava comentários a torto e a direito, cada qual mais brilhante que o anterior:
-"Loiraça insaciável?, isso quer dizer que a gaja deve ser uma alarve! mas se julga que eu lhe pago o jantar..."
-"Não, ó Caguinchas. - Meteu-se na conversa, o Dinossauro - Isso quer dizer é que a gaja te come todo!..."
-"Foda-se! - Trovejou o Caguinchas, visivelmente indignado. - Mas que merda vem a ser esta? Atão um gajo é que paga e a puta é que come?...Mas que putas vêm a ser estas?...Eu quero comer uma puta, caralho!... Um puta normal, com cona e pintelhos à volta da cona!...Como, limpo a piça, e pago! É assim. Foi assim que o meu pai me ensinou!...Isso de putas insaciáveis devem ser mas é putas canibais!..."
Mas o pior ainda estava pra vir. Uma aragem de sacanice começou a insinuar-se pela sala e tanto eu como o Dinossauro trocámos olhares furtivos de conluio avacalhador.
-"Pois, -intervi eu, disposto a conduzir o Caguinchas a novos abismos de desespero -, e não sei se estás a ver o que é isto do "BotaozinhoRosa"..."
-"Rosas?! - exclamou, o Caguinchas. - Não me digas que agora também temos que oferecer flores às putas, ou então que a gaja é socialista!...Foda-se, eu só quero mudar o óleo, não lhe quero pedir namoro, nem discutir política!..."
-"Nada disso. - Volvi, munido de toda a sacanice de que era capaz e antegozando já o efeito do que se seguiria. - Isto significa que a gaja te lambe o olho do cu e te enraba com a língua e tudo!..."
A cara que o Caguinchas fez, só vista. Parecia que os olhos lhe iam saltar pelo nariz abaixo, como nos bonecos de desenhos animados.
"Como?!!! Foda-se!, mas isso é puta pra homens ou pra panascas?!! - Bramou, escandalizado e ofendido.
-"Mas pensa nas contrapartidas... -Manobrou, o Dinossauro, pela outra banda. - "Bumbum furacão, oral natural, alucinante, sem borrachinha, ãh, um luxo!..."
- "Sim, -reforcei eu, - não te esqueças que se trata duma promoção de inverno!..."
Mas o Caguinchas estava-se pouco marimbando prás promoções, saldos ou rebaixas todas que houvessem. Aquilo cheirava-lhe mas era, a léguas, a uma liquidação geral: a dele.
-"Bumbum furacão"? - Arrepiou-se todo, antevendo já horrores atrás de horrores. - Isso, quase que aposto que quer dizer que a gaja dá peidos ciclónicos, não?!..."
-"Não. -Tranquilizei-o. - Isso apenas quer dizer que lhe podes papar a bilha. E mais: até te faz broches sem camisa!..."
-"Mas vocês julgam que eu sou maluco e analfabeto, ou quê?! - Atroou, qual Krakatoa, num arremedo altivo, de macho brioso. - Ainda sei ler, cum caralho!... Insaciável, furacão, alucinante, oral natural, até rebentar...foda-se, 'tá bem de ver que a gaja é mas é uma puta antropófaga, devoradora de otários!... e qual camisa qual carapuça!...Foda-se, eu, é que nem dentro duma armadura lhe confiava a piça!...E sabem que mais? É diante de putas destas, que um gajo proclama: "abençoada a punheta!"...
E não disse mais nada. Bazou porta fora, furibundo, à procura duma revista pornográfica, presumimos.
Ficámos, eu e o Dinossauro, a olhar um pró outro, meditabundos. Em tudo aquilo, havia um detalhe que nos intrigava:
"3ª oportunidade!!" Que raio significaria aquilo?
Um verdadeiro mistério...Mistério que até à data não conseguimos decifrar.
II
O Caguinchas, com esta erudição toda das putas, mais as americanices adstritas, anda a ficar inconsolável. O alívio manual, decididamente, já não o satisfaz. Mas, por outro lado, a verdadeira fobia que desenvolveu em relação às novas modalidades de putaria, continua aguda. Como há vícios que só se podem combater com outros vícios ainda piores, refugiou-se no jogo. Não há tugúrio de batota clandestina que não peregrine, nem casino manhoso que não frequente. O problema é que está a ficar sem crédito em quase todos eles. "Sem crédito", é forma de dizer: na verdade, parece que tem mesmo é a cabeça a prémio.
Enfim, deve ter sido por causa dessas complicações todas que ontem chegou ao pé de mim, cheio de ares furtivos e solertes, reclamando paternidade para o seguinte projecto:
-"Olha-me só esta mina, ó Dragão!..."
Em simultâneo, ia-me mostrando a página de anúncios dum matutino nacional, onde rezava:
"Mãe de santo brasileira, joga-se cartas e búzios...telef:...."E ainda mal eu tinha acabado de ler e avaliar a tal mina, já ele rematava:
-" Pá, búzios deve ser assim uma espécie de dados... Tratas tu deles, que eu trato das cartas!...Depenamos aqueles patos, que é um ver se te avias! E no fim, com um bocado de sorte, juntamos o útil ao agradável e ainda papamos a brasileira!...Ãh?! que é que me dizes: ideia do carulho, não?!..."
E como eu tardasse a sair da estupefacção em que a sua arquitectura temerária me mergulhara, o Caguinchas, todo pintas, reforçou a dose:
-"Oh pá, o filho é santo, quer dizer que deve ser um g'anda anjinjo que até nos agradece por lhe comermos a mãe!... A não ser que não gostes delas maduras!?..."
-"Não, ó Caguinchas: gosto, gosto." - Reagi, finalmente.
E é verdade. Por isso lá fomos os dois, depenar os patos e comer a mãe ao santo. Sempre me ensinaram que nunca se deve contradizer um doido.
III
Acabámos por não comer a mãe ao santo. Isto, porque o Caguinchas, um raios o partam, pelo caminho, teve um momento de hesitação, expresso na seguinte dúvida existencial:
-"Ó Dragão, mas a brasileira mãe do santo não é daquelas que barbeia a cona, pois não?!..."
Aí, eu, diabos me levem, não resisti. E proclamei-lhe o seguinte:
-"Não, ó Caguinchas, fica tranquilo: não é dessas. Até porque, sendo mãe de santidade, para ela a cona é sagrada, portal beatificado! Só se lhe pode ir ao cu!...
"O Caguinchas começou logo a ficar desconfiado. Mesmo assim ousou uma segunda tentativa:
-"Mas fazem mamada, ou não?!..."
-"Sim, sim... - Acudi-lhe, pressuroso. - Fazem broches celestiais. Mas convém ficares-lhe atento aos olhos..."
-"Aos olhos?!!...- Espantou-se, o Caguinchas.
-"Mas porquê: hipnotiza-me?!..."
-"Não. - Retorqui, com o ar mais angélico deste mundo. - É para topares quando ela os começa a revirar..."
-"Chiça, não me digas que ela se vem a chupar!..." - Precipitou-se, incrédulo, o Caguinhas.
-"Nada disso. -Corrigi-o. - Quando os olhos começam a revirar-se não significa que está a ter um orgasmo: significa é que está a ter um ataque epiléptico!..."
-"Foda-se!!..." - Arrepiou-se todo, o Caguinchas. Que até os tomates (jurou ele no dia seguinte, quando lhe voltei a pôr a vista em cima) se lhe encarquilharam.
Por causa disso, claro está, já não fomos. Que querem, a sacanice é mais forte do que eu.