terça-feira, abril 25, 2017

Partidofagias e Contos do Vigário (r)



Podia lá eu faltar a uma efemérdia festiva destas...


Mas alguma vez os partidos, em Portugal, se guiaram coisa que se visse por ideologia, doutrina, receita (culinária, que fosse), programa de partido ou sequer de governo? Mal se apanham no poleiro, passam por isso tudo com o maior desembaraço, velocidade e amnésia súbita. Mesmo os comunistas (dos vários credos e alambiques) quando, no pós-25 de Abril, se entretiveram a desmantelar a nação à boleia da peregrinice zoina dos moderados (como já tinha sido em Outubro de 1917, na Rússia), mesmo esses, nunca deixaram, no essencial, de acautelar a vidinha e o futuro sem sobressaltos na "democracia burguesa" pós-Novembro. Nos restantes quarenta anos, os partidos têm sido nada mais que agências de emprego, feiras de contactos e influências, trampolins sociais e trambicódromos para safardanas, sicofantas e arranjistas das mais diversas estirpes, cores e proveniências. E quanto mais instalados ou com acesso ao Poder, pior. A não ser no folclore da treta, não há socialistas nem não socialistas, sociais-democratas ou populares, esquerdistas ou direitistas, conservadores ou liberais: é tudo devoristas, trepadoristas  e empalmadores. A máquina partidária encarrega-se de produzir, em regra, enchidos desses. Mesmo indivíduos honestos e genuinamente bem intencionados que, por algum milagre da santa, escapassem à filtragem interna, acabariam rapidamente submersos e varridos pela marabunta infestante.
Fora tudo isso, as únicas agendas que cumprem vêm de fora e fazem parte do kit/alvará comercial. Ou do estojo de emergência, por dictatum ainda e sempre externo. Resume-se o fenómeno inteiro num aforismo simples: sacrifica-se o pagode para salvação dos eleitos.

Os partidos são o cancro. Está provado e servido, à náusea e à exaustão, desde a cegada de 1820. E também já vimos a cura, pelo que não requer descobertas da pólvora ou da roda dentada. Não há metásteses boas nem metástases más: há metástases que se tornam particularmente nefastas e malfazejas logo que abocanham o Poder. A diferença no malefício é directamente proporcional à quantidade de poder nas unhas da quadrilha e à duração da mamada. A dinâmica da mediocridade, da chicana, da safadeza e da filha-da-putice que reina no interior das cloacas partidárias (dos quais o modelo universal e perpétuo é o do próprio Partido Comunista - cada Secretário-geral converte-se num tótem tribal a prazo, e, uma vez no Poder, degenera num Kim-Kong-ill à solta, a arder em frémitos de eternidade) alastra ao país e instaura a dispersão, o oportunismo, a velhacagem e a zaragata permanente. Acangotada na Administração Pública, numa cascata de alvéolos, casulos e bolsas marsupiais, esmera-se, afana-se e desunha-se, a um ritmo cada vez mais frenético, em extorquir e brutalizar, sem dó nem piedade (e toda a burrocracia de que é capaz), o contribuinte e o desamparado em geral.  Desamparado, entenda-se como todo aquele que não pertence ou é patrocinado por qualquer uma das camarilhas em exercício: dos partidos à maçonaria,  das Ordens às Opus, dos Clubes  às seitas (excepto naquele caso emblemático em que o clube e a seita se confundem), passando por todas as mancebias e manjedouras a jusante, cujo elenco me dispenso de explicitar por economia de espaço e nojo. O certo é que é toda uma escumalha - que não vale a ponta dum corno nem serve para nada de útil à nação - a armar ao importante, ao fino e, sobretudo, ao caro. Mainates que se fazem pagar como arquiduques.

Os partidos, entretanto, foram todos socialistas no pós-25 de Abril; foram todos democráticos no pós-25 de Novembro; e serão todos o que for preciso para garantir o estipêndio dos seus comensais (devidamente hierarquizados à boa moda feudal, pois claro, que isto da democracia é só mesmo para inglês ver e otário aplaudir). Acreditar na reforma deste esquema, ou, ainda pior, na sua cura milagrosa, é o mesmo que acreditar na redistribuição da riqueza. Os mesmos que não impedem os ladrões de roubar e, ainda por cima, os ajudam a sacar a seu bel-prazer, apregoam  depois projectar persuadi-los a devolver o que quer que seja? Os mesmos que facilitam são depois os mesmos que moralizam? No menos mau dos casos, é o mesmo que pretender educar um filho na idade adulta, depois de deixá-lo adquirir todos os vícios, taras e más tendências. Uma nódoa, parafraseando o Eça, não se reforma: remove-se.
Mas pior ainda é tentar camuflar o surro duns debaixo do tapete do lixo dos outros. Quem o faz não o realiza por amor genuíno à higiene, mas por  frete escuso ou interesse escaninho numa das imundícies. Repito: Não é devoção à limpeza: é propaganda eleitoral. E das rascas.
Ou então não, dir-me-ão as almas mais caridosas; que é mero fruto da ingenuidade, de boa fé, com boa intenção. Pois, contra bem intencionados desses já fiquei eu  vacinado (e pena não ter também ficado o país) no 25 de Abril. Já sei qual vai ser o resultado da "boa intenção"... Que, diz o provérbio, povoa os infernos.

PS: consta que as "câmaras corporativas"  rosas e laranjas que infestam a blogosfera (quem a viu e quem a vê!...) são, em larga percentagem, tripuladas por funcionários públicos. Faz todo o sentido. Em pleno mundo às avessas, numa sociedade em putrefacção acelerada, o parasita ascende a guardião da moral pública.

13 comentários:

  1. Andava preocupado consigo. Tanto tempo sem uma escrita. Estava quase para o maçar via email.
    Está em forma!
    Duro de roer, ou não fosse o Dragão.

    Continuaremos à espera...

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  2. Andava preocupado consigo. Tanto tempo sem uma escrita. Estava quase para o maçar via email.
    Está em forma!
    Duro de roer, ou não fosse o Dragão.

    Continuaremos à espera...

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  3. Lol , o tamanho fedor a podre que emana todos os anos nesta data acorda qualquer dragão. Mesmo em hibernacao.

    Os gajos , os tais democrateiros que gastam tudo em vinho e putas, pelam-se de medo e' dos "populistas": pois e' , com os ditos acabava-se-lhes a pandega e tinham de ir trabalhar.

    De tanto que deram e dao o cu, a tal da divida ja devia estar mais que paga.

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  4. Ah puta que pariu o 25 de Abril e ao circo ambulante da democracia.

    Já as boas putas essas continuam a ter que ser importadas. Nem putedo do bom abril soube parir. Não é assim engenheiro Ildefonso?


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  5. E já agora Dragão, aquilo nos states também já vai uma abrilada do caralho.

    http://o-tradicionalista.blogspot.pt/2017/04/era-uma-vez-na-america.html

    Algum comentário a fazer?



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  6. «Algum comentário a fazer?»

    É só desentorpecer as asinhas e já lá vou.

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  7. Que saudades eu tinha destas labaredas :)
    .
    Mas nós agora temos o alterne democrático...
    Carlos

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  8. bem , digamos que o 25 de abril sempre serviu para alguma coisa :) aleluia !

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  9. Puxa, vida! Já não era sem tempo! E que férias... foram pra cima de um temporão:) Faz cá falta, como sabe.

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  10. Comparável ao artigo, já clássico, de António José Saraiva, publicado no D.N em Janeiro de 79.
    Cpmts.

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  11. Esqueci-me d'acrescentar (algo imperdoável da minha parte). Eis um texto brilhante, pra não fugir à regra. Nota-se que veio de férias inspirado:)

    Os seus fiéis leitores aguardam por mais destes... ou quaisquer outros que se lhe equiparem. Todos serão bem-vindos.

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