segunda-feira, agosto 31, 2009

Liberdade, a quanto escravizas...

«Têm a ciência, mas uma ciência submetida aos sentidos. Quanto ao mundo espiritual, a metade superior do ser humano repele-o alegremente, para não dizer com ódio. Proclamaram a liberdade, sobretudo nestes últimos anos, mas que representa semelhante liberdade? Apenas escravidão e suicídio. Porque o mundo declara: "se tens necessidades, satisfá-las; possuis os mesmos direitos que os grandes e ricos. E, visto poderes satisfazê-las, aumenta-as , se quiseres..." Eis o que ensinam actualmente. E que resulta daí? Nos ricos, o suicídio espiritual; nos pobres, a inveja e o homicídio, pois conferiram direitos mas ainda não indicaram meios de se proverem do que precisam. Afirma-se que o mundo, abreviando as distâncias, transmitindo o pensamento pelos ares, se unirá mais e reinará a fraternidade. Desgraçadamente, não acredito nessa união dos homens. Idealizando a liberdade como um aumento de necessidades e sua pronta satisfação, alteram a sua natureza, pois fazem que neles surja uma porção de desejos insensatos, de hábitos e fantasias absurdas. Vivem só para se invejarem mutuamente, para a sensualidade e ostentação. Oferecer jantares, viajar, possuir belas carruagens, títulos, lacaios, tudo isso passa por uma necessidade, à qual se sacrifica a própria vida, a honra, o amor ao semelhante; quem não puder satisfazê-la será capaz de se matar. E o mesmo acontece aos que não são ricos. Os pobres, por enquanto, afogam no vinho a inveja e a insatisfação das necessidades. Mas não tardará que, em vez de vinho, se embriaguem com sangue: é esse o fim para onde os conduzem. Dizei-me se tais homens são livres.»

- Dostoievski, "Os Irmãos Karamazov"

Foi ou não foi profético?
E, pior que isso, é ou não é absoluta e abissalmente actual?

Lúgubre e triste papel de Cassandras o que uma humanidade - atávica e sofregamente - porcina reserva aos seus raros génios.


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