Ora bem, no decurso da rude abordagem e subsequente rol de patifarias, violências e deborda-forações aqui recentemente perpetradas, um dos passageiros do infausto galeão maltratado decidiu insurgir-se contra a qualidade do serviço. Em voz indignada, num escândalo incontido, bradou:
«O Eça andou a comer à conta da mesa do orçamento do estado e da mulher e assim, bem podia pregar o que quisesse, sempre de barriga cheia.»Vamos lá a ver, ó caro senhor: de barriga vazia, nem o Eça nem ninguém, consegue pregar coisa que se veja. A maior parte do tempo, terá que andar à cata de côdea para lá meter; a sujeitar-se a sabe Deus o quê para angariar sustento; e a delapidar o melhor das ideias com essa opressão solene do sórdido come-e-caga.
Por conseguinte, se o orçamento do Estado e o orçamento da esposa serviram para encher a barriga ao Eça, abençoados orçamentos que para alguma coisa de jeito serviram. Bendita ilha num oceano de delapidações frívolas e inúteis! Acredite pois: não só não vejo nenhum inconveniente nisso, nenhum deslustre moral, como não me parece, sequer, que existam. Ignóbil, vil e pocilgabundo, considero, isso sim, quando o orçamento do estado serve para sustentar catervas de medíocres, exércitos de incompetentes, chusmas de ineptos e enxames de puros filhos da puta, como é hoje, em regime de soltura, o caso. Ou seja, que o dinheiro do estado sustente ou ampare tipos talentosos, gente que engrandece o país, não vislumbro nenhum mal e, pelo contrário, classifico da mais elementar justiça. Agora, que o erário público sirva de mama vitalícia a anõezinhos, parasitas, pilha-comissões, respectivas famílias, amigos, compadres, vizinhos e outros badamecos coalescentes que só diminuem esta nação, a reduzem à mendicidade económica, à indigência moral e, de arrasto, a transportam à cova escura, aí, sem a menor dúvida, reconheço, além duma infâmia sem nome, uma hecatombe geral.
De resto, o problema actual do Estado e respectivo orçamento é precisamente o estar convertido no tabernáculo da mediocridade e da safadeza, já para não falar da mais vil traição e proxenetismo. Há quem diga que há cem anos também já era semelhante. Pois, mas há cem anos ainda pagava ao Eça, ao Oliveira Martins, enquanto agora só empanturra e locupleta micróbios e percevejos. Quanto mais não fosse, aí teríamos uma prova eloquente da vantagem da monarquia do Sr. Dom Carlos em relação a esta nhanhocracia de três vinténs. E isto apesar da monarquia do Sr. Dom Carlos, como ele próprio amargamente constatava, estar tudo menos de boa saúde.
Mas pior ainda que tudo isso, por incrível que pareça, é o facto e o caso do actual Estado e respectivas famílias aboletadas se constituírem como mecanismo exterminador, desmobilizador e terraplenante de toda e qualquer manifestação ou eclosão de real talento neste país. Mais, nesse capítulo, Estado e policiativa privada dão as mãos e esmagam em conjunto. Trituram e liquefazem. São vasos de merda comunicantes; e são vasos de guerra unidos contra o futuro e a sanidade mental, já de si exausta e exígua, deste povo e deste resquício de país. O que qualquer aprendiz deserdado de artista explica - quase instintivamente - a outro é que "ou desposas, sabujas ou chafurdas com um deles, ou não vais a lado nenhum!"
Por outro lado, e por todo este zoológico que já naquele tempo abundava, sendo rico por parte da mulher só beneficiava e fortalecia o Eça, não só no património e na tranquilidade necessária à concentração e elevação criadoras, como, sobretudo, na insubserviência ao Estado e aos seus mandarins do dia. Permitiu-lhe, enquanto escritor, não ser um bivalve apaniguado, um papagaio de carroça, um mero lacaiozito a soldo da burrocracia -ontem como hoje - instaurada. Que o Eça não partilhasse das minhas ideias e humores políticos, nem a mim me incomoda nem a ele o despromove. Que ele tenha auferido de luxo e eu de pobreza, melhor para ele, pior para mim. Que poderia ele ter feito melhor, não direi na política por respeito a quem de mim discorda, mas na obra literária, quero crer que sim, que tinha talento para bem mais. Eventualmente, para lá do português do seu tempo, devia ter alvejado o Homem de todos os tempos. Tolheu-o, quiçá, por ironia do destino, o provincianismo atávico e o luso-umbigismo endémico.
Mas com todas as suas virtudes e defeitos, ao Eça -como ao Ramalho, ao Oliveira Martins, ao Camilo, ao Herculano, ao Bocage, ao Cesário, ao Camões, ao Pessoa, ao Vieira, ao Gil, ao Almada e a todos os grandes das letras deste país -, o que tenho para lhes dizer, do fundo da alma e do coração, hoje e sempre, dê lá por onde der, tussa a vaca, muja o boi, é um "MUITO OBRIGADO, CAVALHEIROS!" Possa eu chegar-vos algum dia aos calcanhares e já não irei mal, nem corará a pátria mãe de todos nós.
Tão pouco seria digno dum homem, quanto mais dum Dragão, andar a aliviar-me das digestões pelos toutiços das estátuas: mais pareceria um pombo empapuçado, anilhado e arrulhejante.
Portanto, ó senhor sicofanta da barriga do Eça, antes de enviá-lo borda-fora, quero que saiba e se compenetre do seguinte: é mil vezes preferível um orçamento que sirva também para atestar a barriga ao Eça do que um Orçamento que serve apenas para encher o cu a todas estas antas e bacilos ambulantes. E agora, se quer discutir pentelhuras e naniquices, discuta com os tubarões! Tenho dito.
De política não sei. Mas que o Dragão escreve melhor que o Eça disso não tenho grandes dúvidas. Se o Eça escrevesse assim, eu leria a obra completa, que a tenho em papel, encadernada à papillon, toda cheia de pins nos cromados, em vez de vir aqui todos os dias estragar a vista num monitor de 75 herz.
ResponderEliminarDragão, magnífico manifesto. É intemporal e hoje oportuníssimo no Portugal dos Piolhos e das Pulgas, dos Papagaiso Falantes, dos Engenheiros Canoros Telepontísticos.
ResponderEliminarDevia ser lido no Parlamento Nacional, discurso complementar ao que hoje mesmo o MCB escreve sobre a mutação imbecilizante e desdemocrática das Democracias 'Modernas'.
Subscrevo-o INTEIRAMENTE! Tenho aliás a secreta impressão de que esse mesmo Estado começa a estar em grande e grave dívida comigo, como está contigo e com outros quebradores da Merda Seca Vigente.
PALAVROSSAVRVS REX
"...o facto e o caso do actual Estado e respectivas famílias aboletadas se constituírem como mecanismo exterminador, desmobilizador e terraplenante de toda e qualquer manifestação ou eclosão de real talento neste país."
ResponderEliminarSempre que temos alguém providencial à frente dos destinos do país, ficamos assim: nulidades castradoras e cinzentas.
oh dragão
ResponderEliminareu a ti só me ocorre dizer-te o que dizeste aí atrás a uma das tuas vitimas
"Sobra-lhe em brilho o que carece em densidade"
mas o problema até nem é bem esse
compensa o bem que sabe a luminária pelo mal que faz a mousse
o problema para mim é outro
este blogue está graficamente uma merda
não é que eu esteja a virar para o paneleirote só a pensar na estética - é que me custa ler esta merda com este fundo nebuloso e com as letras formigas
isto é discriminação, é fazer pouco dos séniores e da sua vista cansada
eu escrevi "dizeste"?
ResponderEliminarbem tu percebes que é a vista cansada
queria dizer "disseste"
O Eça, velhote mas encostado àquele monumento,certamente que ainda se levantava...
ResponderEliminarAndam a tentar descortinar a origem dos males que tradicionalmente e ciclicamente os inteligentes procuram como causas da nossa pobreza?Meus caros letras a mais e ciência a menos... afinal as récitas paroquiais continuaram nos juristas que os substituiram...
ResponderEliminarO nosso engenho para a ciência e a transformação da matéria nunca foi famoso desde 500 quando ainda se faziam os canhões e as espingardas.Agora nada.Só rolhas de cortiça.E nem acredito que venhamos a fazer.Existem parasitas a mais
Sem palavras...
ResponderEliminar2Bs
thanks pá
ResponderEliminarsem querer abusar, melhor agora só com as letras um pouco menos anoréxicas
as letras devem ser como as gajas e as gajas devem ser entremeadas como o toucinho e encorpadas como o vinho
Algo está mal na Dragolândia.
ResponderEliminarUm Judeu, Joshua, a elogiar o Dragão!
Um dia deste ainda vemos o Dragão a entrar na Sinagoga…
O mal desta merda tambem e os gajos que teem muita prosa mas passam o dia com o cu sentado no banquinho a falar mal de tudo e de todos, olha como o Eca, que tanto criticava a sociedade Portuguesa mas que por ela fez tanto como estas postas por aqui escarradas cheias de figuras de estilo e de sintaxe adornada...
ResponderEliminarOu alguem ainda e cego ou inocente ao acreditar que e com este tipo de merda que de repente o portugues vai abrir a pestana...
O Portugues vai ser sempre a mesma merda porque so a ve em todo lado, tudo esta podre, tudo esta infecto, nao ha solucao!
Nem tu dragao nem o Eca escapam a esta fatal logica.
Mas o que permite a gajos como eu e o Eça, ó caro anónimo, estarmos sentados num banquinho a escarrar estas sintaxes adornadas´e a não fazer pevas pela pátria é precisamente saber que existem gajos como tu, de pé, incansáveis, destemidos, buliçosos a tratarem freneticamente da salvação dela. É graças a bombeiros voluntários tão beneméritos, em combate tão permanente que nós nos podemos dar a estes luxos e ociosidades.
ResponderEliminarPortanto, em meu nome e do Eça, obrigadinho pá! E não desperdices tempo com comentários a dizer mal de nós. Vai lá, depressa, não percas tempo. Vai lá acudir à desgraça. Que para dizer mal, estou cá eu.
Man, I loved reading this!
ResponderEliminarAcho que era o suficiente para o Eça ressuscitar. Claro que depois via o estado calamitoso do país e aviava as malas outra vez. Morreria novamente longe da pátria que nada evoluiu nesta centúria em que ele esteve ausente. Reavivam-se-lhe aquelas complicações gástricas crónicas (duvido se incutidas pelas abundâncias do salário consular e da medíocre renda da mulher, mas enfim há quem pense assim) e lá iria desta para outra melhor.
Brilhante texto!
ResponderEliminarMas a Zazie também não é o Dragão?
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