quinta-feira, novembro 15, 2007

Peritos e depressões

No JN, informam-nos que a "maioria das depressões não é tratada por peritos". É claro que não, até porque, em Portugal, praticamente, não existem peritos para tratar de depressões. O que existe, em barda, em catadupa, em viveiro permanente, são peritos em criar depressões: economistas, políticos, jornalistas, politólogos, comentaristas pantófagos e humoristas, entre outros. E fora os meteorologistas.
Quando apontam os psiquiatras como peritos estão claramente a mangar connosco. Os psiquiatras não são peritos, são especialistas. Não no tratamento, mas no desenvolvimento e rentabilização das depressões. Compete-lhes zelar para que cresçam saudáveis e viçosas. Supervisionam a sua nutrição e cultivo.
Resulta disto que os deprimidos mais lúcidos mas menos abonados recorram, geralmente, à auto-medicação, tentando, entre outras panaceias, a taberna mais próxima. Já os mais abonados recolhem-se, por costume, a uma casa de alterne que não exija sufrágio universal, nem filiação partidária.
Alternativa vantajosa ao psiquiatra, para o jet-set, é a bruxa. É igualmente charlatã, mas imensamente mais pitoresca. E o paciente não paga para ainda ter que ser ele a contar a história. Com a nigromante, arrota, mas, ao menos, escuta um monte de histórias. Cada fita mais fabulosa que a anterior. E não é só ele que arrota: ela também. Arrota, ronca, gargafunga. Imita vozes cavernosas. Cavaqueia com os espíritos e convoca congressos de defuntos. Em suma: uma one-woman show. "Belo circo!", congratula-se o paciente à saída. "Dei-lhe mais vinte euros e ainda me ordenhou", gabou-se o Engenheiro Ildefonso, um dia destes, no rescaldo satisfeito duma dessas visitas. -"Mãozinhas milagreiras!" Terapia obscena? Mas, estou em crer, plenamente eficaz. Ele não me pareceu nada deprimido. É certo que também não estava antes, mas podia muito bem tê-lo ficado depois. Como, aliás, e amiúde, acontece. Basta imaginar-mos um desbraçado qualquer diante daquela fronha olheirabunda do Dr. Daniel Sampaio... Até o Conde Drácula, quase garanto, seria mais animador. Pelo menos de papo cheio não teria aquele aspecto macilento dum onanista zombi. Meia hora nas imediações dum psica-veterinário de tal envergadura e fica o assunto arrumado. Ou seja, um gajo entra deprimido e, à falta de eutanásia portátil ou duma janela aberta, sai directo à ponte ou passagem de nível mais próxima. Macacos me mordam se o figurão não tem uma avença choruda com a Servilusa.
Bem, mas perguntar-me-ão, "agora a sério, ó Dragão, então não existem mesmo genuínos peritos no tratamento de depressões em Portugal?". Existem, claro que existem. Mas são cada vez mais raros. E caríssimos! Balurdiosos! Um bom ponta-de-lança, por estes dias, custa uma fortuna. E nunca se sabe se não vai estranhar o clima. Ou a alimentação.

20 comentários:

  1. “Uma convicção baseada no facto de 70% dos que colocaram fim à vida, em média, terem procurado o médico de família seis semanas antes desse acto.”
    Fôsca-se. Ainda dizem para irmos ao médico de família...
    Carlos

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  2. Eis um post verdadeiramente anti-depressivo.

    Um leitor assíduo

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  3. vai-te foder ó anónimo

    já tinha saudades destes posts do dragão

    (quando não anda atormentado com os fantasmas dos judeus, este gajo escreve os textos mais humorísticos da blogosfera)

    mijei-me a rir

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  4. Impõe-se uma correcção nada despicienda, ó Glutão das Hóstias: não sou eu que ando atormentado com o fantasma dos pedantes (judeus, ateus, europeus, tugueus e matateus); acho que é mais o contrário.
    A Hidra da Pedantícia supremacionista tem muitas cabeças, mas há uma que, talvez por ser a primogénita, é particularmente sensível.
    Já tive oportunidade de explicar aqui uma regra sagrada do kung-fu: acertar sempre onde dói mais. Não tenho culpa se tinhas ido ao confessionário e não ouviste a lição.

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  5. Caro Dragão, só não concordo nada é em juntar os matateus, aos outros 'eus'... Mais respeitinho ao Matateu sff :)

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  6. Eram matateus com "m" minúsculo e não maiúsculo, naturalmente. :O)

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  7. Não tinha dúvidas quanto à diferença, caro Dragão. Mas só porque este é um espaço de grande frequência (e fazem bem os visitantes), fico assim mais descançado... :O)

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  8. Seja qual for o assunto, o dragão faz sempre postas absolutamente hilariantes, excepto quando quer falar a sério.

    Eu, pelo menos, farto-me de rir.

    A propósito, o "cospem. Lhe." deixou-me às gargalhadas. É o meu reflexo condicionado a funcionar, também... só tenho pena de ter que me comedir um bocadinho, agora. Mas vou lá chegar, aos poucos.

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  9. Caro Dragão.Faça saber ao engenheiro Ildefonso que mamada é muito melhor que ordenha.Principalmente com a avançar da idade...

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  10. Fabuloso. Chega como comentário, mas ainda assim, uma perguntita:

    Esses significados rebuscados, vêm de um petit dictionaire de sinónimos ou
    é só do Houaiss?

    Que a observação não desmereça, porque o texto é dos melhores que tenho lido.

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  11. O que me chateia, é ler tanta canalha que nada tem para escrever de jeito, nos jornais diários, quando seria bem preferível abrir um Público, ou um outro pasquim legível e apanhar com uma dose de escrita, bem humorada, como estas.

    Anda um tipo a folhear os jornais, para apanhar com textículos resumidos e raquíticos, quando poderia ler-se a incandescência da habilidade na escrita.

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  12. A secção anti-psquiatria do Proletário Vermelho tem a honra de convidar o Exmo. Dragão a inscrever-se n'O Proletário vermelho (secção anti-psiquiatria).

    Com efeito, a denúncia do camarada Dragão trouxe uma grande contribuição teórica para a luta da classe operária (ver a este propósito a já clássica obra cinematográfica "A Classe Operária Vai ao Paraíso", em que a dimensão e a utilidade da luta anti-psiquiátrica no quadro da revolução popular em curso ficou bem demonstrada).

    Com efeito, graças ao contributo intelectual de importantes teóricos (aos quais se junta agora, em boa hora, o camarada Dragão) tem-se tornado evidente que a travadinha é o resultado da intensa luta de classes em curso.

    Como ficou demonstrado pelo camarada Franco Basaglia (e pelos camaradas Laing, Cooper e Szasz) a maluqueira é o resultado da opressão da classe dominante e a revolução passa necessariamente por pôr todos os loucos furiosos na rua. A burguesia que cuide dos doentes que fabrica: "Quem fabrica os seus loucos que cuide deles."

    Caro o camarada Dragão assim o deseje também pode militar na secção dos loucos furiosos da secção anti-psquiatria do Proletário Vermelho. Com efeito, os camaradas intelectuais acima indicados refrenciam que, dado que os loucos são a classe mais oprimida pela cultura burguesa, devem também ser eles a vanguarda revolucionária, os educadores do povo. A título pessoal, teria aliás imensa honra em conceder-lhe o título de Grande Educador Dos Que Ainda Não São Loucos Mas Para Lá Caminham.

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  13. Caro Anónimo das 4.03,
    julgo que nessa matéria, nem Vosselência nem eu tenhamos algo para ensinar ao Engenheiro Ildefonso. Acontece que a profissional do Além em causa era senhora de rigorosas tabelas e o dinheiro que ele tinha dava para mais que o manuseamente voluptuoso das mamas, mas não chegava para o felatio simples. Ele, porém, galifão impenitente, garantiu-me que, em duas ou três novas investidas, ainda lhe há-de (na terminologia dele, sublinho) "papar a bilha". À borliu! Suponho que, com isso, quer significar que lhe vai subtrair o gás. Capaz disso é ele. E de muito mais.

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  14. Pois é mesmo fabuloso e um autêntico desperdício não vir nos jornais.

    - dizia-me ontém o meu irmão ao telefone. O desgraçado também é leitor diário, aqui da casa e eu nem sabia.

    eheheh

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  15. Caro José,

    No vertente caso, nem uma coisa nem outra. Foi directo da tola. Não quer dizer que essas ferramentas não se devam usar, ou desmereçam quem as use -excepto, naturalmente, os junkies patológicos como a Agustina -, mas isso requer tempo. Luxo que eu cada vez tenho menos.
    Em todo o caso, fica a curiosidade: há umas décadas atrás, um dos livros que eu li de fio a pavio, pausadamente, foi o Dicionário da Língua Portuguesa. É uma ginástica que recomendo.

    PS: Conhecimentos de grego clássico também ajudam.

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  16. "O que me chateia, é ler tanta canalha que nada tem para escrever de jeito, nos jornais diários, quando seria bem preferível abrir um Público, ou um outro pasquim legível e apanhar com uma dose de escrita, bem humorada, como estas.

    Anda um tipo a folhear os jornais, para apanhar com textículos resumidos e raquíticos, quando poderia ler-se a incandescência da habilidade na escrita."

    assino por baixo

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  17. LLoooooooooooooooooooooooolllll!!!!

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  18. Apelidei-os (psiquiatras e afins) de pedófilos da mente, não sei se vai ao teu encontro...

    Gostei do(s) texto(s)

    Elypse

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  19. "Pedófilos da mente" não está mal apanhado. Se bem que "pedófagos" também não ande longe da realidade.

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  20. Isso já remete para os intelectuais - os tais analfabetos que resultam do excesso de cultura ;)

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