quarta-feira, novembro 17, 2004

O Padre Borga

Estremunhado, a caminho do café matinal, deparou-se-me um quadro horripilante. Em trinados convulsivos, de dentro dum caixote televisivo, um gordo esguedelhado com distinta pinta de açougueiro frustrado martirizava sadicamente um piano e zurzia os éteres com uma melopeia descabelante onde reincidia, a esmifrar-se, num refrão do seguinte teor:
-“Onde está o meu pastor? Onde está o meu pastor?...”
E repetia aquilo desesperadamente, em pregão ao domicílio.
Pude aperceber-me que se tratava dum programa familiar onde assenta praça um tal padre Borga.
Por breves segundos, estaquei, assombrado. Tive pena. Tive pena, sobretudo, de não estar lá, no estúdio, ao alcance da voz, para lhe poder ministrar a resposta justiceira que tudo aquilo merecia e, de goelas à solta, reclamava:
«Eu não sei onde está o teu pastor, ó filho da puta. Ignoro-o completamente. Mas, em contrapartida, sei dum prado viçoso, replecto de erva tenra, onde bem melhor farias se pastasses. Tu e esse padreca de merda, esse tele-chulo aí plantado a bezuntar audiências, grandes cabrões!...”
Aliás, rosnei-o mesmo ao caixote, alto o suficiente, para até a senhora Dragão – lá na cozinha, de presidência à torradeira – ouvir.
-“Então agora insultas o televisor? – Admirou-se ela. – A quem injurias tu desta vez?...”
-“É o padre Borga, o padre canoro! – Rugi. – E aquele pianista seboso, badocha! Tu já me viste tamanha parelha de cavalgaduras?...”
- “As torradas estão a arrefecer...” –Tentou ela também arrefecer-me a mim, temendo pela integridade do electrodoméstico.
-“E não haver um sacana dum bispo neste país, um bispo à antiga, com eles no sítio, para pôr um cabrão destes na ordem!” – Despedi-me eu do aparelho, atirando chispas malevolentes aos muares chilreantes.
Já sentado à mesa, ainda resmoneei:-”Por este andar, a seguir ao padre Borga não deve tardar aí o padre Putedo!... Irra!, se a Igreja quer dar uma de modernaça, então que ponha freiras em cinto de ligas...Sempre é mais telegénico!...”
-“Senhor Dragão!... –Escandalizou-se a cara metade, arregalando os olhos. –“Francamente!...”

Um dia destes espatifo a televisão. Juro. Olhar pr’àquilo é como assistir em directo e a cores ao intestino grosso do regime.

5 comentários:

  1. Loooll o badocha “:O)))) com estas palhaçadas o que me espanta é ainda haver crença que já assisti a espectáculos idênticos em plena missa “:O)))

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  2. Hehehehe
    Tem toda a razão o Sr. Dragão.
    Aquilo é mesmo tele-lixo. As criaturas metem nojo!
    ;)

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  3. Cambada de ignorantes....
    Vê-se logo que não vao ter futuro...
    è uma pena...
    Coitaditos
    ----
    Pedro Domingues

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  4. O seu texto é deveras interessante. Tens bastante eloqüência. Se me permitir eu o postarei em meu blog.
    Bom dia!
    Contato: brunoteenager@gmail.com

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  5. Citarei a fonte e o escritor.
    De novo, parabéns!

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