domingo, setembro 13, 2015

A normalidade denunciada, ou a Máquina dos Chouriços




«Some of those CENTCOM analysts described the sizeable cadre of protesting analysts as a “revolt” by intelligence professionals who are paid to give their honest assessment, based on facts, and not to be influenced by national-level policy. The analysts have accused senior-level leaders, including the director of intelligence and his deputy in CENTCOM, of changing their analyses to be more in line with the Obama administration’s public contention that the fight against ISIS and al Qaeda is making progress. The analysts take a more pessimistic view about how military efforts to destroy the groups are going.»

Era Nietzsche que dizia  que "não há factos, apenas interpretações". Na realidade não é bem assim, a não ser, obviamente, para efeitos de propaganda. Ora, o que se passa é que os tipos da pesquisa/análise  (de Informação) procuram recolher e apurar os factos (com o maior índice de realidade possível). Depois, acima deles, o processo segue os seus trâmites: As interpretações ajustam-se e submetem-se às necessidades da propaganda (sendo que esta, de algum modo, procura cumprir uma estratégia). Não há nada de bizarro nem sequer peregrino no que os tais "analistas" denunciam. Ainda mais em se tratando do caso duma Super-potência. Os primeiros a saber isso deviam ser os tais "funcionários" da, como gostam de proclamar pomposamente os anglocoisos, Intelligence.
Então o que é que isto significa?
Notem bem: que categoria de "funcionários da Intelligence" são estes que desatam a denuncar a perfeita normalidade do expediente? É o mesmo que um tipo ser contratado para porteiro dum bordel (ou barman, ou segurança, ou arrumador de quartos) e depois insurgir-se, com grande escândalo, que aquelas meninas não são virgens nem mestrandas em lavores femininos..
Ocorrem-me várias explicações plausíveis para tamanha chouriçada. As mais complexas deixo-as à imaginação do leitor. Fico-me apenas por uma, das mais simples e prosaicas. E resume-se a uma dedução lógica (transbordantemente atestada pela realidade): Já repararam na qualidade e categoria das pessoas que chegam ao cargo de Presidente dos Estados Unidos (ou de presidente da República, 1º Ministro de Portugal, ou Comissário Europeu, etc, só para estender todo o critério ao mundo ocidental)?

Ora, ainda na primeira metade do século passado, H.L:Mencken já expunha o diagnóstico:
«À medida que a democracia é aperfeiçoada, o cargo de Presidente representa, cada vez mais, a alma íntima do povo. Num grande e glorioso dia destes, os vulgares tipos desta terra alcançarão finalmente o seu mais profundo anseio e a Casa Branca será então adornada com um completo retardado mental.»
Ninguém me convence do contrário: a mesma maquinaria avariada e merdificante que acabará -aliás, acabou - a segregar e alcandorar retardados mentais ao mais alto cargo dos Estados, pela mesma e fatal ordem de razões, acabará (e acabou) a preencher com perfeitas abóboras acéfalas a restante cascata de alvéolos na colmeia da função pública. Nos Estados Unidos como em Portugal, ou onde quer que a fábrica de enchidos funcione e derrame o produto das sua mediocratização gordurosa.

É por isso que eu acho imensa piada aos que passam a vida a chibar, julgar e condenar fulano e sicrano por corrupção (evidente, corriqueira e endémica, quase toda), ao mesmo tempo que gabam a virtude e a superlatividade civilizacional da máquina que os produz. Que o fulano e sicrano que tanto vituperam pertença geralmente ao bando de rufias rival é outro detalhe reiterado que, geralmente, exaure e avaliza, em absoluto, a virtude e a pureza do peticionário.

Pelo que, no geral, o diagnóstico de Mencken, tanto quanto lúcido em relação ao passado, foi profético em relação ao futuro. Não só da América como num mundo cada vez mais americanizado...

«Em democracia, um partido devota a maior parte das suas energias a tentar provar que o outro partido é impróprio para governar. O problema é que ambos são invariavelmente bem sucedidos nisso e estão ambos certos... Os Estados Unidos nunca geraram uma aristocracia desapegada ou uma inteligentzia realmente inteligente. A sua história é simplesmente um registo de vacilações entre dois gangues de fraudes.»







5 comentários:

  1. Os elitores não são vitimas do sistema , são cumplices!!

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  2. Pois, numa certa percentagem até são. Há toda uma massa gravitacional em redor do núcleo partidário, que, mais ou menos, retira dividendos e gratificações da desgovernação alternadeira.

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  3. Euro2cent9:11 da tarde

    > são cumplices

    Bah, com a chantagem psicológica de que os eleitores são vítimas - "se não votas a culpa é tua" - é preciso ser homem crescido (tipo maior de 50, com pelos no peito ;-) para resistir à pressão terrorista dos bandos partidários.

    Dragão, não o sabia também apreciador de Mencken. Já me impressionou mais, agora penso que o homem fumou demasiado Nietzsche e depois descaía com alguma facilidade para a prosa bombástica mas oca (que aliás criticava noutros). São uns bombons saborosos, mas pouco nutritivos. Mas as reportagens dele sobre as convenções nacionais dos partidos (nos anos 1920, para as nomeações presidenciais) são impressionantes trabalhos de observação da vida selvagem ...

    Em termos de penetração política, acho a obra mais recente do Gore Vidal uma continuação melhorada.

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  4. Andava a ler isto, antes daqui chegar:

    http://www.oje.pt/a-proposito-do-medo/

    http://www.oje.pt/nascido-em-1972/

    http://www.oje.pt/mudar-o-1089/

    Desculpe lá o spam, mas o homem bem que mereçe, nem que tenha sido pelo trabalho que fez à volta de Camarate...

    Phi

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  5. «Dragão, não o sabia também apreciador de Mencken.»

    Isso é porque só lê o Dragoscópio há menos de 5 anos. No tempo em que eu tinha tempo, isto aqui era só petiscos.


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