domingo, fevereiro 20, 2011

Subsídio para a questão do (des)ensino

Deviam capacitar-se todos os ilustres pensadores e opinadeiros das redondezas, e duma vez por todas, que nem as pessoas são chouriços, morcelas, linguiças ou qualquer outra modalidade de enchidos, nem a formação das pessoas obedece a regras típicas de salsicharia. A não ser que a questão se resuma a discernir qual o tipo de vazadouro mais apropriado para as digníssimas famílias depositarem as respectivas proles em idade aprendiz, durante o horário de serviço, que é como quem diz durante o maior número de horas possível; qual o aterro fito-sanitário mais selecto ou apenas menos oneroso para o contribuinte, esse otário incurável. Ou qual o picadeiro de apicavalgaduras com os melhores palhas, jóqueis e treinadores
De facto, o cerne do problema começa por algumas definições muito simples, mas deveras necessárias. Cito apenas um par delas: a) se a escola deve ser um local para adestramento de insectos colectivos ou formação de pessoas; b) se a escola deve integrar-se num esforço colectivo de formação de caracteres, ou apenas numa engrenagem geral - e generalíssima - de deformação e esterilização de mentes.
A limite, a questão até se resume a uma perplexidade muito breve, crua, mas todavia eloquente - a saber, porque é que o Liceu Nacional D.João de Castro do meu tempo, que era uma escola pública, como a generalidade das escolas públicas dos anos 60/70, dava uma abada de dez a zero nos melhores alfobres privados dos dias que correm?
É que, ninguém tenha dúvidas, dava mesmo. Eu, que fui um aluno pouco notável, a não ser na devoção ao futebol e à garupa das colegas, sou um exemplo vivo disso tudo. E não é preciso ir ao extremo de citar um super-liceu, verdadeiro olimpo das letras e ciências, como era o D.João (reitorado pelo temível e inigualável Luís G. Silva, se bem me lembro). Qualquer outro liceu vulgar, meramente humano e banal daqueles tempos, mesmo no Porto estou em crer, ou até no bairro de Alvalade, fosse este em Lisboa ou Luanda, funcionava dez vezes melhor que os melhores desta miserável e estéril época. E o busílis é, na verdade, esse: porque é que um ensino que outrora funcionava agora disfunciona?
Bem, pela mesma razão que tudo aquilo que funcionava mal no antigamente agora ainda funciona pior, tanto quanto tudo aquilo que funcionava razoavelmente, que não era assim tão pouco, agora, após não sei quantos experimentalismos e frankenstoinices de importação, disfunciona com alarvidade monumental. E essa razão tem um enunciado muito simples e prático: é que tudo o que se faz e tem feito nestes últimos trinta anos, a nível público, público/privado (e até privado, passe a redundância tripla) mais que texto para uma qualquer melhoria dos serviços e mecanismos da sociedade, tem servido de mero pretexto para o enriquecimento e o sustento sumptuoso de meia dúzia de indivíduos, geralmente organizados em forma de quadrilha legal, vulgo partido político. E isto, desenganem-se os sonsos da praxe, não é mera conversa de táxista. Pois da treta, em bom rigor, já nem sequer é a conversa: é o país.

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