domingo, setembro 20, 2009

A Osmose

Meditando sobre o postal anterior, e em especial sobre os números, ocorreram-me algumas intuições premonitórias que não desmerecem partilha.
Para começar, aqueles 76 milhões de "gravidezes indesejadas"/ano...
A semântica é elucidativa: não tardará muito e haverá "numerus clausus" não só para a universidade, a academia e a carreira artística, como também para a própria vida. Além disso, 76 milhões (molhões, se preferirem) de gentinha não planeada ou autorizada (e, por conseguinte, clandestina) à flor do planeta autorizará, por certo, o abate de outros tantos para efeitos ( e enfeite) de balanço anual e contas (acerto, esse, que, de resto, já presumo mais ou menos em andamento).
Depois, aquele atestado de estupenda contabilidade marçana onde somos solenemente notificados da poupança que representa, em toneladas de dióxido da treta, cada 7 dólares de "planeamento familiar". Magnífico, irmãos! Nada como o investimento em preservativos para antipirético global. Já imagino até a euforia da Goldman Sachs a traficar produtos financeiros em conformidade. Cada barrete que o indígena, no seguimento da cabeça de cima, enfie na cabeça de baixo, vai ajudar a salvar os gelos polares e, por alma deles, os insectódromos à beira-mar plantados. Aceitam-se apostas.
Isto - toda esta obsessão planificadora da incubação alheia -, entretanto, transporta-me a algumas considerações abismais. A principal é que estes tipos neo-tudo e mais alguma coisa, que manifestam uma verdadeira e ululante fobia por tudo o que seja ou represente planeamento económico, regulação financeira ou travão industrial, depois, numa espécie de compensação perversa, desatam em ímpetos e fogosidades de planeamento familiar, como se, afinal, o verdadeiro culpado da poluição global não fosse a emissão de gases, mas a emissão de esperma. Quer dizer, a culpa não é do consumo desenfreado, nem da ganância massificada e exorbitante; não, a culpa é do caralho. E da sua cúmplice pérfida no sinistro empreendimento: a vagina fértil. Torna-se assim mais que evidente que tal qual os comunas cultivavam o frenesim de planear e controlar o colectivo, estes agora ardem em furores de planificar e formatar o indivíduo. A minha explicação para um fenómeno do entroncamento destes? Se repararmos com alguma atenção, constataremos que grande parte destes mercantileiros fanáticos do presente foram comunistas ferozes no passado. Não perderam as taras, nem minimamente delas abdicaram: apenas as transferiram. Não foi, pois, o sujeito que mudou: foi sòmente o objecto. O filho da puta, profissional, aliás, possui essa idiossincrasia bestial: é imutável, insensível e acima de tudo, imune. À realidade.
Nunca tive problemas com Jesus. "Estradas de Damasco" é que, nem com molho de cebolada, engulo. O verniz muito superficial dos marranos, sejam eles de que escória forem, estala-lhes com a facilidade inerente aos caprichos da moda ou aos solavancos da conjuntura. E muda de cor -e de cor apenas - conforme muda o vento.

A verdade é que nem o capitalismo triunfou duma vez por todas, nem o comunismo faliu de vez. Nem esse mal apenas, nem esse bem tão pouco - foi o pior de dois mundos: fundiram-se. À competição sucedeu a amálgama. Culminar inerente à trampa: a osmose.

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