Primeiro, com a incompetência, negligência e leviandade que se lhes reconhece, os políticos causam a degradação socio-económica do país. Depois, com o seu porfiado, despudorado e impenitente esbulho do erário público e do património dos contribuintes, estimulam e semeiam a desmoralização, a criminalidade e a corrupção. Finalmente, com a maior cara de pau que imaginar se pode, colocam-se convenientemente fora de toda a babélica gesta e, feitos causa primeira inimputável, declaram os seus múltiplos efeitos como culpados uns pelos outros, quais pomos nascidos de frutos: a criminalidade é resultado exclusivo da degradação socio-económica; a degradação socio-económica é consequência absoluta do atraso; o atraso é obra única de gnomos orçamentais; e os gnomos são efeito avassalador de avetustos descuidados e preguiçosos. Entretanto, dois mil anos duma determinada ginástica mental só favorecem a trampolinice. Poderá o cristianismo estar fora de moda, mas nunca as suas psico-estruturas foram tão -e, sobretudo, tão perversa e sordidamente - aproveitadas. Dir-se-ia que, à escala duma micro-liliput, se recicla ad nauseam o episódio da "criação". O Criador da coisa - destituído agora de qualquer mistério e exibindo-se diariamente na infrascendência total, ou seja, no espectáculo permanente - arvora-se, por seu próprio decreto e alta recreação, em imaculado, benigno, impermeável e omnisciente; a coisa, a criatura, o criado é que é um grande filho da puta - estúpido que nem uma porta, teimoso que nem uma mula, bruto que nem um elefante e onde põe a pata fode tudo. A crise é, pois, pura culpa dele, dessa besta. Dele ou do pai, do avó, do quincavô dele, ou de quem quer que tenha sido proto-autor do défice original.
Segundo este neo-génesis de miniatura, ultra-demolaico, Deus não morreu. Apenas se pulverizou em pequeninas partículas absolutamente automáticas, irresponsáveis e impunes. Que vão a votos de quatro em quatro anos.
Ah, e já me esquecia de dizer: se, no Génesis, a Divindade gerava o cosmos, passe o termo, agora, neste neo-génesis, as poeiras divinas produzem o caos. Em vez do Fiat Lux é o Fiat Lixo. A crédito.
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