Segundo a demagogia imperatriz, - que amamenta e fertiliza o regime de "melhor dos mundos" em que vegetamos parcialmente lobotomizados -, somos todos iguais. O grande projecto globo-infestante que nos anima é mesmo o de nos tornarmos a nós cada vez mais iguais e aos outros cada vez mais parecidos connosco. Quem somos exactamente, ou quem são os outros de facto, senão tabu, é questão de somenos. O importante é não duvidar e, muito menos, fazer perguntas. Há quem acorde todos os dias encantado com a perspectiva e passe o dia a chilrear deslumbrado. Há quem se benza e implore ajuda ao Altíssimo -ou, senão Este, por óbito, pelo menos a alguma superpotência extraterrena e benemérita.
E há também outros, como os famigerados terroristas, que levam a fantasia a sério e distribuem explosivos e matanças em conformidade. Cumprem, num certo - se bem que perverso- sentido, as circunvoluções da mesma lógica: já que são todos iguais, então é indiferente onde se colocam os engenhos. Não há prioritários nem desprezíveis. Sendo todos iguais, não há que seleccionar melhores ou piores, até porque seria improfícuo; há é que matar muitos.
Por outro lado, ou face B do mesmo, se o bom músico é o que vende muitos discos, se o bom escritor é o que vende muitos livros, se o bom comunicador é o que deslumbra e cativa chusmejante plateia, como denegrir um terrorista que se socorre do mesmíssimo critério? Pois se mata muitos, se atinge (e pulveriza) numeroso público, não atesta isso da excelência do seu produto tanto quanto do seu desempenho?
Por bizarro que pareça, não deixa de soar a falso, a histerismo de frouxos e mulherzinhas, classificar-se esse terrorismo de mau, péssimo, execrável. Na verdade, enquanto terrorismo, é óptimo, é um best-killer, um Harry Potter das bombas. Nenhum terrorista, como nenhum estado ou empresa multinacional, se rege por imperativos morais, mas sim, e pragmaticamente, por objectivos, fins, metas de produção ou enriquecimento. Quer dizer, os parâmetros em que opera não são os da ética mas da eficácia. Ora, ninguém pode negar que este terrorismo Alcaidiano se tem desenvolvido com notório viço e proliferação exemplar. Poderemos acusá-lo de não nos ser conveniente, de ser nefasto aos nossos interesses, mas nunca, em tempo algum, de não ser eficaz ou consequente. Inconsequente e verdadeiramente bacoca, senão mesmo imbecil, tem sido a luta que, em tese, lhe tem sido movida. Ataca-se um bando de hienas ensandecidas bombardeando-as com nacos de carne. Quer dizer, em termos objectivos, ontológicos, de realização das respectivas potencialidades, não é o terrorismo que é péssimo – pelo contrário, como amargamente vamos descobrindo a cada nova explosão -ou cluster delas - por esse mundo fora, chega a raiar o brilhantismo. Não, péssima mesmo, confrangedoramente pateta, tem sido toda a panóplia de medidas e terapêuticas anti-terroristas que a vasta colecção de mentecaptos ao leme do 1º Mundo tem engendrado e semeado no planeta. Quando pensamos que um anão, físico e mental, do calibre dum António Vitorino (aqui entre nós, um turbo-microGuterres) se arroga em perito na luta anti-terrorista e, mais veloz que um Lucky Luke defronte da própria sombra, desata a golfar panaceias retóricas, é difícil não embarcarmos quase de imediato em dois estados de espírito tão exasperados quão antagónicos: por um lado, o pânico e a corrida a uma igreja a fim de rezarmos fervorosamente a Deus ou santo delegado por um milagre; por outro, um profundo nojo existencial pela espécie onde a Natureza nos distribuiu, senão mesmo uma ténue mas irreprimível simpatia pelos terroristas peregrinos. No fundo, como diria Breton, também eles são puros surrealistas: só que em vez de pistola em punho, atirando ao calhas na multidão avulsa, avançam de bomba ao colo. Ou melhor, são surrealistas não já apenas unidireccionais (do tiro), mas pandireccionais (da explosão).
Vituperais-me por contemplar tudo isto da mera perspectiva artística, estética?... É que a vislumbrá-lo de qualquer outro ponto de vista, em especial do político, banal, o assunto fede de tal modo, tresanda a tamanha balbúrdia e mistela excrementícia que a própria sanidade mental, só de ensaiar concebê-lo, oscilaria perigosamente, senão desabasse mesmo, com estrépito e perenidade.
Claro que Portugal nunca dará um bom exemplo, ainda menos em questões governamentais e políticas. Mas apenas se distingue porque exagera, porque hiperboliza os desvarios alheios. Os cidadãos desconfiam dos politicos, os políticos suspeitam dos cidadãos e todos se detestam e execram mútua e inoxidavelmente. O terrorismo constitui apenas mais um pretexto para este permanente ajuste de contas. Os terroristas, como prova de inteligência, utilizam este estado avançado de manicómio em seu proveito. Ao largarem bombas na massa anónima, escavam ainda mais o fosso entre esta e os respectivos dirigentes: os cidadãos tanto quanto culpar os terroristas, agravam a desconfiança para com os políticos poupados e estranhamente incólumes aos morticínios. Por seu turno, os políticos, junkies da irresponsabilidade, aproveitam para culpar a massa anónima de se auto-atacar, ou seja, segundo eles, são partes da massa anónima, células metastizadas, que agridem as células sãs. Daqui ao regime de internamento para tratamento, estudo e observação da própria massa é um passo lógico e necessário.
Resultado: mais importante que combater efectivamente o terrorismo é retirar vantagens e lucrar com ele. Ou dito por outras palavras: mais que uma missão prioritária, ou sequer séria, o combate ao terrorismo tende a devir negócio. E quanto mais se transformar num, mais por via da cegueira e dependência global ao lucro, tende a perenizar-se, complicar-se e fortalecer-se.
Não espantará que um dia, quando tal for conveniente, se revele como uma joint-venture entre grandes empresas, políticos avençados (que fazem biscates à frente dessas entidades cada vez mais fantásticas chamadas países) e investidores árabes... Como o simultaneamente nusquíquo e ubíquo senhor Bin Laden. Um tipo, há que reconhecê-lo, ainda mais completo que Deus: Este só está em toda a parte; aquele consegue o prodígio, a todos os títulos vertiginoso, de estar ao mesmo tempo em toda a parte e em parte nenhuma.
O Vitorino como turbo-microGuterres é uma definição de antologia!
ResponderEliminarAliás todo este texto constitui uma das mais fulminantes análises dos embrutecidos tempos de hoje que se resumem a uma verdadeira calamidade boçal, pasto de sanguessugas e insectos rastejantes, negociada interminavel e permanentemente por merceeiros chilreantes e acalentada por políticos inoxidáveis.
Alguém falou em extraterrestres?!?!?!
ResponderEliminarOlhe que pelos vistos....
Brevemente vou explanar a tal da Conspiração.
Até lhe descobri os esquemas,organigramas e tudo...
A documentação bombástica que está em meu poder vai elucidar em definitivo o Dragão ;)
(brevemente)
O sr.Bin Laden não me admira nada que tenha todos estes poderes....vindo de onde vem. :))
imerso
ResponderEliminarUm verborreico lamento de alguem profundamente angustiado com a sua propria inadaptacao e consequente inutilidade neste mundo.
ResponderEliminarO ponto de vista não deixa de ser original, mas penso que o assunto tem demasiadas condicionantes morais para poder ser abordado dessa forma. Mas esquecendo-os, o artigo é de louvar. Aí está alguèm que vê as coisas de outro prisma sem medo de o assumir.
ResponderEliminarÉ uma perspectiva desprovida de moral e cultura (no sentido latu do termo) e, por perfeitamente desumana, imensamente verdadeira. Inaugura (?) uma estética fria e científica. Só aceitável num ambiente de relativismo em estado puro.
ResponderEliminarCicuta
Fez-me lembrar "O Ovo da Serpente".
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