Alguns amigos meus, gente anacrónica e afeiçoada a valores completamente fora de moda, assaltam-me ciclicamente, em tons indignados, escandalizados até, com a seguinte questão:
-“Mas, ó Dragão, tu não achas que estes políticos são uma caterva de traidores à Pátria?”
Eu, velho pirata empedernido, infame predador dos altos mares, que já assisti (e ajudei, enfim) a mais óbitos que partos, olho-os com alguma piedade, sincera comiseração, e largo pelo cerro dos dentes:
“Mas como raio quereis vós, almas de Deus, que eles sejam fiéis a uma coisa de que não fazem a mínima noção?!...nem Pátria, nem Povo, nem Humanidade, tão pouco! Sabem lá eles o que isso é. Não sabem, não querem saber e, naturalmente, têm espumante raiva de quem sabe. Porque se passar por traidores não os aflige nem uma milésima cagagésima parte dum pintelho anão, já passar por ignorantes chateia-os um bocado. Afinal, são licenciados, que diabo. E um licenciado, nesta pátria que eles fazem por desconhecer, sabe tudo. Brota da gestação universitária em triunfo, em apoteose; quer dizer: jubiloso, omnisciente, e de canudo em riste!”
Encaram-me então um tanto ou quanto perplexos, os meus interlocutores, mas não se dão por vencidos e voltam à carga, já mais em desespero, que, propriamente, em convicção:
-“Mas é demais, chiça! É que não têm um pingo de vergonha na cara!...”
-“E vós a dar-lhe!... – rebrindo-os, eu. – Pois se não têm cara como queríeis vós que eles a salpicassem com vergonha ou o que quer que fosse? Se vós a tendes e cultivais esse obsoleto hábito de a borrifar com um certo pudor, eles, não a tendo, borrifam-se outrossim para isso tudo!...O breve simulacro de ventas com que desfilam, num perpétuo carnaval, serve para suporte da maquilhagem, do disfarce ou da peruca. E poupem-me de antemão às lamúrias da falta de verticalidade, de dignidade, de hombridade!...A primeira operação a que se entregam, esses tais políticos, mal - ainda adolescentes - lhes aflora a vocação, é a extracção da coluna (eles chamam-lhe o “osso do siso”); depois depilam-se de todos e quaisquer escrúpulos; finalmente, almofadam-se com um silicone de velhacaria multi-usos, lubrificam o esfíncter, dissolvem os testículos, anabolizam a língua, desatravancam a bocarra de qualquer pejo ou verdade, e pronto: ai tendes os vossos políticos!...Agora, desamparem-me a loja, secai as lágrimas, e ide lá votar, que eu tenho mais que fazer!...”
-“Mas, ó Dragão, tu não achas que estes políticos são uma caterva de traidores à Pátria?”
Eu, velho pirata empedernido, infame predador dos altos mares, que já assisti (e ajudei, enfim) a mais óbitos que partos, olho-os com alguma piedade, sincera comiseração, e largo pelo cerro dos dentes:
“Mas como raio quereis vós, almas de Deus, que eles sejam fiéis a uma coisa de que não fazem a mínima noção?!...nem Pátria, nem Povo, nem Humanidade, tão pouco! Sabem lá eles o que isso é. Não sabem, não querem saber e, naturalmente, têm espumante raiva de quem sabe. Porque se passar por traidores não os aflige nem uma milésima cagagésima parte dum pintelho anão, já passar por ignorantes chateia-os um bocado. Afinal, são licenciados, que diabo. E um licenciado, nesta pátria que eles fazem por desconhecer, sabe tudo. Brota da gestação universitária em triunfo, em apoteose; quer dizer: jubiloso, omnisciente, e de canudo em riste!”
Encaram-me então um tanto ou quanto perplexos, os meus interlocutores, mas não se dão por vencidos e voltam à carga, já mais em desespero, que, propriamente, em convicção:
-“Mas é demais, chiça! É que não têm um pingo de vergonha na cara!...”
-“E vós a dar-lhe!... – rebrindo-os, eu. – Pois se não têm cara como queríeis vós que eles a salpicassem com vergonha ou o que quer que fosse? Se vós a tendes e cultivais esse obsoleto hábito de a borrifar com um certo pudor, eles, não a tendo, borrifam-se outrossim para isso tudo!...O breve simulacro de ventas com que desfilam, num perpétuo carnaval, serve para suporte da maquilhagem, do disfarce ou da peruca. E poupem-me de antemão às lamúrias da falta de verticalidade, de dignidade, de hombridade!...A primeira operação a que se entregam, esses tais políticos, mal - ainda adolescentes - lhes aflora a vocação, é a extracção da coluna (eles chamam-lhe o “osso do siso”); depois depilam-se de todos e quaisquer escrúpulos; finalmente, almofadam-se com um silicone de velhacaria multi-usos, lubrificam o esfíncter, dissolvem os testículos, anabolizam a língua, desatravancam a bocarra de qualquer pejo ou verdade, e pronto: ai tendes os vossos políticos!...Agora, desamparem-me a loja, secai as lágrimas, e ide lá votar, que eu tenho mais que fazer!...”
"eles chamam-lhe o “osso do siso”) ":O))))
ResponderEliminaró rapaz, temos coveiro, temos coveiro por estas bandas. E bem que o José lamentava a falta de talentos para se enterrar esta choldra toda.
Este texto é de antologia, ó Dragão! Quando o li, estava em fase de choco de um postal deprimente que acabei por colocar há pouco. Ri-me com isto que li. Francamente e com gosto!
ResponderEliminarÉ melhor que os textos actuais, forçados e pretensamente humorísticos do RAP.
Ainda bem. E estou em crer que a Zazie não me desmente.
Mil vezes melhor! Ainda que o concorrente, quanto a mim, seja um tanto fraquito...
ResponderEliminarE o nosso Dragão anda para aqui a requintar o humor e até mínimos detalhes de pontuação. Já no outro conseguiu aquela passagem com o “É sim” no penúltimo parágrafo que é uma delícia.
Eu nem invejo isto que não tenho o menor talento sequer, mas o sentido de humor com esta prosa bem cuidada é uma coisa muito rara.
E também fiquei bem disposta para o resto da tarde “:O)))
Se com essa conversa melíflua julgam que eu vos aumento o ordenado, é melhor tirarem o cavalinho da chuva!...:O)
ResponderEliminarJá vos pago principescamente. Nem o Luís delgado recebe melhor do Dr. Santana et al. Aliás, essas aves de arribação da blogocoisa que pr'aí esvoaçam soubessem a quanto é pago aqui o encómio, eu tinha as caixas de comentários infestadas e engarrafadas a toda a hora. Acho que as bichas (quero que se foda esse brasileirismo coninhas das "filas") iam atingir quilómetros de auto-estrada. Isto, não tenham dúvida, mais pareceria as portagens da Ponte, em regresso de ponte, que propriamente um blogue.
Gananciosos!... :O[
Se com essa conversa melíflua julgam que eu vos aumento o ordenado, é melhor tirarem o cavalinho da chuva!...:O)
ResponderEliminarJá vos pago principescamente. Nem o Luís delgado recebe melhor do Dr. Santana et al. Aliás, essas aves de arribação da blogocoisa que pr'aí esvoaçam soubessem a quanto é pago aqui o encómio, eu tinha as caixas de comentários infestadas e engarrafadas a toda a hora. Acho que as bichas (quero que se foda esse brasileirismo coninhas das "filas") iam atingir quilómetros de auto-estrada. Isto, não tenham dúvida, mais pareceria as portagens da Ponte, em regresso de ponte, que propriamente um blogue.
Gananciosos!... :O[
Á malandro que nos tramaste!
ResponderEliminarE agora como é que eu continuo a disfarçar que o Ferrari amarelo é emprestado? Hããã?
E cuida-te que também vais ter o fisco à perna “:OP
O Sr. Dragão, por acaso, não quer comparecer no jantar de sábado?
ResponderEliminar;)
Bem... e com esta (que nem tem a ver com o texto em si) quebraste-me a fronteira do sorrir com o rir: "Acho que as bichas (quero que se foda esse brasileirismo coninhas das "filas")"
ResponderEliminar:-)))