domingo, junho 27, 2004

Confissões...


Eu, desenganai-vos, não sou um modelo de virtudes. E o meu patriotismo não é imaculado. Já nem falo do facto de não ter bandeira pendurada à janela, ou, tão pouco, andar com ela desfraldada na viatura, em amor à pátria itinerante. Não, é mais grave. Eu conto. (Os mais sensíveis de vós é melhor mudarem de site, os outros, os temerários, fiquem, mas à vossa inteira responsabilidade).
Então, é assim: se eu fosse a passar e visse o Quim Barreiros pendurado pelo pescoço, a baloiçar duma árvore, dizia: "Olha o Quim Barreiros a baloiçar numa árvore!". Mas já se fosse o Toy a ser espancado por um gang de símpaticos luso-africanos eu bradava "Força, rapazes! Ah, valentes!". E então se em lugar do Toy estivesse o Emanuel, aí, eu não me continha e juntava-me ao gang. Garanto-vos que dificilmente o calhau cantante escaparia de lá vivo.
Acho que já perceberam. Pois é: não gosto de música Pimba.
Mas tem pior: também não gosto de fado. Ao ouvir aquilo, aquela melopeia rançosa, aquele basqueiro lamurioso, não me dá para ficar emocionado, vejam lá bem: apetece-me é atirar cadeiras, romper em zaragatas. Só aquele anúncio prévio "Sílêncio que se vai cantar o fado", só isso, chega para me fazer perder logo a tramontana. Que pesporrência do caraças! Então fazemos silêncio para irem dar cado dele com um chavascal daqueles?! Tenham dó. Aliás, tenham dó-ré-mi-fá-sol-lá-si, a escala toda, bem medida, já que não têm os alqueires, e vão-se atirar ao Tejo para lavar as máguas.
Portanto, aqui têm: musicalmente não sou um perfeito patriota. Até gosto dos Beatles. Até tenho para ali, na cave, uma guitarra eléctrica, e sei tocá-la, há mais de vinte anos! Ainda me lembro, era eu chavalo, em cima dum palco, ali prós lados de Pedrouços, nos santos populares, a atirar com Led Zepelin ao pagode, eh-eh!... Com o Lou Reed de "Vicious" e os Stones de "Simpathy for the Devil". Naquele tempo era preciso coragem. Agora ainda seria preciso mais. Os filhos dos bimbos estão piores que os pais.
Eu sou de Lisboa, meus amigos, e quero que o mau gosto se foda!...Se eu gostasse de fado, era do Benfica.
Quanto à nação... toca aí, Paredes! Toca aí homem do diabo, comunista dum raio! Sangra aí essa puta dessa guitarra! Se é Portugal que eles querem, dá-lhes com Portugal nas trombas, dá-nos com Portugal na cara, nos olhos, na alma. A cara petrifica, os olhos pingam e a alma, por instantes, é uma caravela que regressa.

2 comentários:

  1. Também não gramo o fado por aí além. A Amália deixa-me frio e o Marceneiro nem conta. Não tenho discos de fado tirando um que o Público ofereceu há uns dias. Jaz para aí, em cima da banca de cozinha, à espera de vez para ser arrumado, misturado em papéis vários e apanha por vezes com cascas de queijo.

    Mas abro uma excepção nesta confissão filistina: gosto de alguns fados de Coimbra. São poucos, que o lamento plangente daquelas cordas é diferente do que sabe a sardinha.
    Aqui há uns meses, os associados de sempre da AAC, decidiram faser uma homenagem a um eterno capista que colaborava nas queimas de décadas: Tó Nogueira.
    Um dos que participaram na homenagem, cantou um fado que me impressionou pela beleza formal invulgar. Não sei se há gravação, mas é das mais belas melodias que já ouvi. E o meu ouvido não costuma enganar.

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  2. Nem me lembrei de Coimbra. Referia-me ao fado castiço, clássico, cá do burgo. Eu sei do que estou a falar. Coimbra é outra loiça, aí tens razão. Até a afinação das guitarras é diferente.

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