Como dizia a canção do Chico Buarque, “agora eu era o herói, e o meu cavalo já falava inglês”. Pois, e a primeira coisa que eu fazia era dar um tiro no cabrão do cavalo que era pra não armar em esperto ou anglófono (o que vai dar ao mesmo). Abatido o solípede poliglota, imaginem que eu era também Presidente da República. Portuguesa, pra não forçar muito a imaginação.
Pois muito bem...agora eu, Dragão, era o Presidente da República...
Cá estou eu, todo repimpado, na minha cadeira plenipotenciária, a mirar o mapa na parede e a coçar os tomates. Qual é a primeira coisa que faço?...Não tem nada que saber: Vou convocar o Primeiro Ministro e a ministra das Finanças. De emergência, já, imediatamente, a galope nos mercedes pretos, com as sirenes a romperem caminho. Uma telefonadela e já está!...
Não demora nada... Já os oiço. As portas batem...Ouvem-se passos apressados, nervosos. Esboço o meu sorriso maquiavélico nº 3.
Agora um pormenor essencial: vou fazê-los secar duas horas que é pra verem quem manda. Antes, já mandei retirar toda a espécie de revistas ou jornais da sala de espera. Quero que experimentem o chamado síndrome do dentista, mas sem paliativos de qualquer espécie.
Eis-me, portanto, a tamborilar os dedos e a escrever cartas anónimas ao procurador geral da República, onde enfatizo as pernoitas da esposa com gente de aluguer. E uma paixão avassaladora pela criada. Aproveito pra escrever também aos juízes do Supremo, aos directores dos jornais e ao presidente Bush a insultá-lo (esta, porém, assino como Bin Laden). O tempo arrasta-se. Até que as duas horas, a custo, lá se esgotam.
Lá vem o PM e a acólita. A bruxa da acólita, devo acrescentar, o que ainda mais me enfurece. Não poder imaginá-la de cinto de ligas sem que isso me cause náuseas e vómitos, confesso que me irrita. Estou com ar de poucos amigos e nem me levanto quando entram. Prescindo do protocolo, cago deveras na etiqueta e ordeno que se sentem sem mais delongas. Vamos lá fazer o balanço da “governação”..."Olha lá, ó badameco, explica-me aqui uma coisinhas!...", irrompo, qual avalanche justiceira.
Começa o interrogatório em forma:
-“O Défice baixou?”, pergunto.
-“Na verdade manteve-se.”, responde ele.
-“O investimento?...”, interrogo.
-“ Diminuiu...” – murmura.
- “O Desemprego?”, inquiro.
-“ Disparou em flecha!”, confessa.
-“ A produção?”
- “Caíu...”
- “ As falências?”...
- “ Multiplicaram-se...”
- “A criminalidade?...”
- “Aumentou!...”
- “O património do Estado?”
- “Já está quase todo alienado:::”
- “A política externa e a imagem do país no exterior?”
- “Uma desgraça: maltrapilhos, pedófilos, prostitutos!...”
-“ As instituições?...”
-“À beira do colapso...”
-“ A educação e a investigação científica?...”
-“ De rastos...”
-“ O nepotismo e a corrupção?
-“Na mesma, senão pior!...”
Nesta altura suspiro. Não vale a pena continuar. É demasiado penoso.
Agora eu, Dragão, Presidente da República imaginário do vosso país quase imaginário, pergunto-vos: No meu lugar o que é que dírieis a um c***** dum primeiro ministro destes?
Pois eu digo-vos o que é que eu, no meu lugar, dizia a um c***** dum primeiro ministro destes: Nada. Nicles. Patavina.
Chamava era o oficial às ordens, aquele soldadinho com ar de músico filarmónico que pr’ali ciranda feito mainate, e dizia-lhe: "Ó coiso, ó bombeiro, traga-me o meu cavalo marinho e mande entrar a imprensa!"
Depois, em directo prá nação, no horário nobre, calma e pausadamente, fazia um belo e esclarecedor discurso, com o cavalo marinho, em cima dos costados governamentais. Era malhar nos dois estafermos até que me viessem as cãibras. Havieis de ver se a depressão, a crise, ou lá o que é, no dia seguinte, não tinha desaparecido!... Havieis de ver se o povo não ficava todo alegre e de grimpa levantada!...
Isto, meus amigos, o que faz falta não são receitas de propaganda nem demagogias da trêta: o que é preciso é saber falar ao coração das pessoas!...
PS: Já perceberam agora que, tivesse eu pachorra, e o útil que não seria elegerem-me, ó otários?!...
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