segunda-feira, janeiro 30, 2012

Dos bois, dos otários e das galinhas




Bem, à falta gritante de ideias próprias, o cromo que nos pastoreia teve a humildade de apelar às ideias dos outros. Louve-se o público reconhecimento e auto-penitência deste vácuo cabeludo. O problema é que, para bucólico enredo, as ovelhinhas são de todo dignas do pastor. E como se tal monturo não  bastasse, sobram  umas regras ainda mais lazarentas que o presépio. Atente-se só neste detalhe formidável: a melhor ideia é necessariamente a mais votada. Supimpa! Fazendo fé nos últimos trinta anos, o resultado acabado e resplandecente duma série de votações maioritárias em determinadas "ideias" a concurso  é, entre várias outras maravilhas, a bancarrota, a perda da independência, a ruína moral e económica, a usurpação da república por seitas e séquitos, a administração da injustiça, a cleptocracia burocrática. Convenhamos que não abona muito do método. Tão puco o recomenda. Dizer que é assim porque assim é que é democrático não colhe como argumento. Mesmo que tendam, não significa que sejam forçosamente a mesma coisa - estupidez e democracia. Se não, atentemos na ideia que neste momento colhe maior número de votos: o que é que as corridas de Touros têm de prioritário para a resolução dos reais problemas da nacinha? Não seria mais premente propor a abolição das Corridas de Pessoas - para o desemprego, para o estrangeiro, para o limbo da impotência e da insignificância? Ou se insistem em dar prioridade às alimariazinhas que sofrem, mais dignos de piedade e socorro urgente não serão, bem mais que os bovinos cornúpetos, os otários contribuintes (sobretudo quando acumulam com assalariados)? Abolição por abolição, não seria imensamente mais profícuo acabar com as corridas de otários às urnas, às portagens, às bilheteiras e demais manjedouras de estupefacção e da lobotomia suavizada?
E quem nos garante que os mesmos que elegeram esta besta rigorosamente destituída de ideias (geminada por partogénese fecal da anterior) que nos atormenta, não acabam a eleger uma ideia qualquer peregrina que lhes lustre ao aleive? E depois o (des) governo faz o quê com ideia? Faz o mesmo que fez ao ror de ideias, cada qual mais milagreira que a anterior, com que se apresentou a votos: manda-a para a retrete. Que é o que trinta anos de desgovernos têm andado a fazer aos respectivos programas eleitorais. A seriedade deste tipo de "ideias simples"? Nula, zero, nenhuma. Puro arrelvamento propagandulo.  Enfim, mais do mesmo. Ao animal feroz sucedeu um coelho ilusionista. O circo continua.

PS: Mas a peste não se confina ao nosso território. Alastra pela Europa que nem praga de gafanhotos legisladeiros... Cá ainda vamos nos bois. Lá já estão de roda das galinhas:

«A Comissão Europeia abriu hoje um processo de infração contra 13 Estados-membros, incluindo Portugal, pelo atraso na aplicação da legislação sobre as gaiolas das galinhas poedeiras, que deveria estar em vigor desde dia 1.»



 



A 5ª Lei da Ratafísica (rep)



Antes de publicar a 6ª Lei da Ratafísica Desantropológica, convém recordar a 5ª  Lei da mesma ciência.
  
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- Então? Não corremos mais, agora?...

- Não, agora caímos.

- Então, mas se não corremos não existimos. Não foste tu que estipulaste o dromo-cogito, ou seja, o "corro, logo existo"? Afinal, em que é que ficamos? Desistimos (que é como quem diz: "des-existimos")?...

- Além de estúpido, crónico, tens acessos de burrice, aguda! As regras têm excepções. Esta é uma delas. Quando se cai, não se corre. Neste momento não corremos porque estamos em queda livre e quando se está em queda livre a corrida torna-se redundante e dispensável!...

- Ah, portanto, despenhamo-nos. Quer dizer, caímos num enormíssimo buraco, cratera, falésia ou abismo. É isso?

- Não, pá. Chama-se uma crise. Estamos a precipitar-nos por uma crise abaixo. Uma situação excepcional e complexa que não adianta explicar-te. Jamais entenderias.

- Mas assim, vista por dentro, deixa que te diga: parece um grande buraco. Poderá chamar-se crise, não discuto, mas é da cor dos poços imensos, tenebrosos. Todas estas trevas à nossa volta... mais parece que vamos pelo cano do infinito abaixo!... estou pasmado.

- Isso é porque estás a cair às cegas. Não compreendes. Ciclicamente, há quedas!...

- Foi pena que não te lembrasses disso antes de cairmos. Nós corríamos, num tal galope, como se nada mais houvesse, então e para todo o sempre, senão corrida e mais corrida!

- Se fossem previsíveis, as crises, não seriam crises. Nem teriam piada. A piada toda está em sermos surpreendidos por elas. É como nos filmes de terror! Toda uma volúpia do suspense, do frisson, do stress. Sem as crises, caía-se na monotonia!...

- Ah, finalmente, percebo: toda aquela correria era para nos despenhar-nos na crise!... Por conseguinte, "corro, logo existo, ou seja, vou prá crise." E, por outro lado, a queda na crise é boa porque é para nos salvar da queda má: caímos na crise para não cairmos na monotonia.

- Mais ou menos isso. A finalidade da corrida é a queda. Corremos para cair.

- Bem, então está alcançado o objectivo. Deveríamos comemorar. Todavia, estranhamente, toda esta escuridão está repleta de choro e ai Jesus-Deus nos acuda!... Em vez duma festa, mais parece um velório. Dir-se-ia que a surpresa não lhes agradou assim tanto.

- É porque são como tu: caem às cegas! De olhos fechados ou vendados.

- Bem, mas há uma certa lógica nisso, não?...

- Como assim?

- Então, uma vez que corriam às cegas, é natural que caiam da mesma maneira.

- Nem por sombras! Tu cais às cegas mas não corrias às cegas por uma razão muito óbvia e simples...

- Ah sim, qual é?

- Corrias atrás de mim. Logo não corrias às cegas: corrias atrás de mim.

- Bem, então eu corria doidamente, atrás de ti, é um facto. Tu é que corrias às cegas.

- Não eu também não corria às cegas: eu corria atrás deles.

- Óptimo, acho que percebo. Então ambos corríamos feitos doidos, eu atrás de ti e tu atrás deles: eles é que corriam às cegas.

- Nada disso. Eles corriam à nossa frente, nós corríamos atrás deles. E nós corríamos atrás deles precisamente porque eles corriam mais avançados que nós. Tornava-se impossível, portanto, não correr atrás deles. Já que eles corriam à nossa frente.

- Enfim, para não cairmos na monotonia, além da crise, caímos também na tautologia! Mas se ninguém corria às cegas, como é que agora um ror de gente cai às cegas?

- Pela mesma razão que tu cais às cegas embora não corresses às cegas: porque já não cais atrás de mim, mas à minha frente.

- Olha...pois é! Mal desatámos a cair, deixaste de estar à minha frente para passares logo para trás de mim.

- Pois, porque na queda as posições da corrida invertem-se, necessariamente. O mais avançado deixa de estar à frente para passar a estar detrás, ou seja, por cima. E o mais atrasado chega-se à frente, isto é, cai mais depressa, de modo a servir, entre outras coisas, de almofada, quando se bater no fundo.

- Muito bem, corríamos então para isto - para cair. E quando acabarmos de cair, quando batermos no fundo, o que é que fazemos?
- Batermos não: bateres. Tu é que bates no fundo; eu bato em cima de ti. Depois disso, é simples: corremos outra vez. Corremos para cair e caímos para correr de novo, é a lei das coisas. Tu, atrás de mim; e eu, à tua frente. Até à próxima crise.
- Francamente, não percebo porque é que depois desta crise não hei-de eu correr à frente. Até estou a ganhar uma certa perícia por aqui abaixo!... Só é pena esta escuridão toda que não deixa ver nada.

- Não podes correr à frente porque és um cegueta. Não terias discernimento para escolher atrás de quem é que haveríamos de correr, de modo a caírmos na crise e não na monotonia! Só eu possuo essa faculdade. Herdei-a dos meus pais, que a herdaram dos pais deles e por aí fora. Ou então comprei-a, vai dar ao mesmo. Seja como for, há prerrogativas que são pessoais e intransmissíveis. As ideias, por exemplo.

- Ah, pronto. Se assim é... Entretanto, quanto tempo é que vamos estar a cair, fazes alguma ideia?...
- Aí não há problema. Logo que iniciámos a queda, comecei de imediato a elaborar um cálculo exacto, complexo e meticuloso. A todo o momento estabeleço uma estimativa quase perfeita, que burilo, transmito e aperfeiçoo no instante seguinte!...
- Fico muito feliz. É bom saber que os mesmos que não foram capazes de prever minimamente o abismo, se sentem, em contrapartida, plenamente aptos para calcular a fundura e a duração do despenhamento. Despencados pela falésia abaixo é que se acham em excelentes condições para lhe adivinhar as medidas!...

5º Lei da Ratafísica Desantropológica: A finalidade da corrida é a liberdade. Através da queda.

domingo, janeiro 22, 2012

Balanço e (ajuste de) Contas. - I



O ano transacto foi pródigo em episódios  múltiplos, que oscilaram garridamente entre o caricato e o deplorável. O caso do vídeo dos americoisos a urinarem ufanamente em inimigos defuntos escapou, porém,  a essa lúgubre fatalidade. Comprova como nalgumas áreas da civilização sempre vão acontecendo sérios progressos. Nem pensem que brinco. Não há muito tempo, os americanos, com desenvoltura análoga, nem sequer esperavam que eles morressem.!... 
Abu não-sei-quantos, lembram-se?...

sábado, janeiro 21, 2012

Re-enter the Dragon



Há duas coisas, pelo menos, em que os chineses nos ganham de abada: a medicina e a astrologia. Ultimamente, parece que também na economia, mas isso não vem agora ao caso. O certo é que, segundo a astrologia chinesa, essa venerável e milenar sabedoria, termina hoje o ano do Coelho e inicia-se amanhã o ano do Dragão. Bem a propósito, convenhamos. Tratarei de agir em conformidade.
Assim, declaro solenemente encerrada a minha licença blogo-sabática. A bordoada - melhor dizendo: o churrasco - segue dentro de momentos. Há que aproveitar, tanto quanto o sorriso dos astros, a bênção dos planetas! Ou não nos ensinassem eles as virtudes da visão superior: a de cima... Lá muito de cima!